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Governo pede e comissão barra acesso a 4.000 páginas de monitoramento de redes sociais


Planalto busca impôr sigilo sobre documentos desde o ano passado, conforme revelou reportagem do Estadão; Comissão Mista de Reavaliação de Informações (CMRI), última instância da Lei de Acesso, decidiu a favor da União e bloqueou a liberação de 540 relatórios feitos por agência de publicidade

Por Paulo Roberto Netto

O governo Jair Bolsonaro pediu e a Comissão Mista de Reavaliação de Informações (CMRI) barrou acesso a quatro mil páginas de relatórios de monitoramento de redes sociais produzidos pela Secretaria de Comunicação Social (Secom) durante o ano de 2019. A CMRI é a última instância da Lei de Acesso à Informação e sua decisão mantém longe do público documentos que a União tenta impôr sigilo desde o ano passado.

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Reportagem do Estadão mostrou em dezembro de 2019 que inicialmente a Secom alegou que a divulgação dos relatórios violaria a Lei de Direitos Autorais - entendimento rechaçado por especialistas em transparência pública. Em março, o governo mudou a argumentação, afirmando que se tratam de documentos preparatórios - ou seja, usados para tomada de decisão.

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O Planalto alegou ainda que 'não se vislumbra interesse público' na divulgação dos relatórios, que acompanham o 'humor' de usuários de quatro redes sociais em relação a ações do governo.

Apesar de parecer técnico determinar a liberação dos documentos, a CGU atendeu a Secom no início do ano, e o processo subiu para análise da CMRI. Perante à comissão, o governo afirmou pela primeira vez a quantidade de documentos produzidos e a presença de informações pessoais de terceiros e dados que estariam protegidos por 'sigilo empresarial'.

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Relatórios foram produzidos no ano passado ao custo de R$ 2,7 milhões pela Secom, comandada por Fabio Wajngarten. Foto; Gabriela Biló / Estadão  

Os relatórios de monitoramento foram produzidos pela Isobar em diversos contextos para o Planalto, incluindo durante a tramitação da reforma da Previdência, em abril do ano passado. Segundo a própria Secom, somente entre janeiro a novembro do ano passado foram elaborados 540 documentos, com 4 mil páginas ao todo, sobre interações de usuários no Twitter, Facebook, Instagram e Youtube. O serviço custou R$ 2,7 milhões aos cofres públicos em 2019.

Ordens de serviço obtidas pela reportagem do Estadão apontam que o objetivo do governo é identificar a 'repercussão, reputação, evolução do sentimento, principais influenciadores e demais informações estratégicas para tomada de decisões' do Planalto.

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"Situações que indiquem possíveis repercussões com alto volume de menções devem ser alertadas, especialmente aquelas que possam gerar crise", exigiu a Secom.

A Comissão Parlamentar Mista de Inquérito (CPMI) das 'fake news' já elaborou requerimento para ouvir quatro servidores responsáveis por coordenar o trabalho. A Secom já informou que os documentos elaborados a partir do monitoramento são compartilhados com outros órgãos do governo.

reference
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Ao ser cobrada pela CMRI que explicasse o motivo para segurar os documentos, o governo Bolsonaro alegou que a divulgação dos relatórios poderia ferir o sigilo empresarial. Segundo o Planalto, constam nos documentos detalhes sobre a metodologia de trabalho da agência contratada, o que poderia ferir sua competitividade no mercado.

Além disso, a União afirmou que há informações de usuários nos documentos que precisariam ser tarjadas antes de serem divulgadas ao público - e, em razão do 'trabalho adicional', pediu que fosse indeferido o pedido de liberação dos relatórios.

"Para identificar em quais das 4.000 páginas poderiam constar informações sensíveis (metodologia de trabalho e dados pessoais), a Secom teria que realizar análise integral de cada uma delas, bem como o tarjamento dos trechos restritos, para uma possível concessão de acesso", argumentou a CMRI, em decisão. "Para tanto, seria necessário o deslocamento de servidores especificamente para a tarefa, por período considerável, o que justificaria a negativa de acesso por configurar trabalhos adicionais".

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A CMRI é formada por integrantes do primeiro escalão do governo Bolsonaro, e liderada pelo ministro-chefe da Casa Civil, general Braga Netto. As decisões foram assinadas por suplentes, indicados para atuar perante à comissão enquanto os titulares estão ausentes.

Especialistas em transparência criticam decisão:

A decisão da CMRI foi criticada por especialistas ouvidos pelo Estadão. Segundo o diretor-geral da Transparência Brasil, Manoel Galdino, as sucessivas mudanças de posição da Secom sobre os motivos para barrar a divulgação dos relatórios é 'grave' e já foi detectada pela organização.

Inicialmente, a Secom alegou que dar acesso aos relatórios iria ferir a Lei de Direitos Autorais. Ao responder um recurso do Estadão, a pasta mudou a argumentação e disse que, na verdade, os documentos eram preparatórios e seriam usados para uma decisão futura - sem dizer qual. Perante à CMRI, a Secom trocou a justificativa e usou a prerrogativa de sigilo empresarial e presença de informações pessoais para barrar o acesso, afirmando que daria 'trabalho adicional' revisar as páginas para tarjar os dados considerados sensíveis.

"Quando o governo começa a mudar de argumento, percebe-se que o que ele quer é procurar alguma justificativa legal que o autorize a não conceder uma informação. Ou seja, ao invés de tratar a publicidade como regra e o sigilo como exceção, ele quer colocar o sigilo como regra e a publicidade como exceção", afirmou Galdino. "É muito grave que o governo esteja fazendo isso - mais grave ainda numa situação que a própria CGU contraria seus próprios pareceres técnicos e politicamente decide defender o governo".

Fabio Wajngarten, chefe da Secom, e o presidente Jair Bolsonaro durante cerimônia no Palácio do Alvorada. Foto: Ueslei Marcelino / Reuters

Para Joara Marchezine, especialista em transparência pública e acesso à informação, a CMRI ignorou o debate sobre a necessidade de fiscalização dos gastos públicos, focando exclusivamente nos argumentos apresentados pela Secom para negar o acesso. "Em nenhum momento se fala ou se dá ênfase nos benefícios da divulgação desses relatórios e da necessidade de se saber como está sendo investido o dinheiro público", afirmou.

"É lamentável que o Executivo Federal, que vinha tendo muito bom desempenho em termos de implementação da LAI em comparação com os poderes Legislativo e Judiciário, esteja desacreditando o processo de revisão de decisões a respeito da transparência e do acesso a informação pública", afirmou Fabiano Angélico, mestre em administração pública pela Fundação Getúlio Vargas (FGV) e especialista em transparência.

A reportagem entrou em contato com a Secom, mas não obteve resposta até a publicação deste texto.

COM A PALAVRA, A SECOM 1. A Secretaria Especial de Comunicação Social reitera os argumentos apresentados à Comissão Mista de Reavaliação de Informações (CMRI), e por ela acertadamente acatados, de impedir o acesso público às 4 mil páginas dos relatórios de monitoramento de redes sociais.

2. O jornal buscou todos os meios jurídicos dentro da administração pública para tentar obter as informações, mas esbarrou no entendimento da necessidade de se preservar o sigilo empresarial e a preservação do pessoal da Secom para suas atividade regulares.

3. Causa estranheza a insistência do veículo de comunicação em tentar obter informações que dizem respeito, exclusivamente, ao trato de monitoramentos, avaliações e percepções específicas, que de modo algum são de interesse público ou jornalístico. No caso, não  há outra narrativa senão essa.

4. A postura jurídica e profissional da Secom, para preservar a administração pública e o respeito à decisão da CRMI, é transparente e assertiva e reitera sua obediência ao compromisso com a transparência e com o que estabelece a legislação no âmbito do acesso à informação pública.

O governo Jair Bolsonaro pediu e a Comissão Mista de Reavaliação de Informações (CMRI) barrou acesso a quatro mil páginas de relatórios de monitoramento de redes sociais produzidos pela Secretaria de Comunicação Social (Secom) durante o ano de 2019. A CMRI é a última instância da Lei de Acesso à Informação e sua decisão mantém longe do público documentos que a União tenta impôr sigilo desde o ano passado.

Reportagem do Estadão mostrou em dezembro de 2019 que inicialmente a Secom alegou que a divulgação dos relatórios violaria a Lei de Direitos Autorais - entendimento rechaçado por especialistas em transparência pública. Em março, o governo mudou a argumentação, afirmando que se tratam de documentos preparatórios - ou seja, usados para tomada de decisão.

O Planalto alegou ainda que 'não se vislumbra interesse público' na divulgação dos relatórios, que acompanham o 'humor' de usuários de quatro redes sociais em relação a ações do governo.

Apesar de parecer técnico determinar a liberação dos documentos, a CGU atendeu a Secom no início do ano, e o processo subiu para análise da CMRI. Perante à comissão, o governo afirmou pela primeira vez a quantidade de documentos produzidos e a presença de informações pessoais de terceiros e dados que estariam protegidos por 'sigilo empresarial'.

Relatórios foram produzidos no ano passado ao custo de R$ 2,7 milhões pela Secom, comandada por Fabio Wajngarten. Foto; Gabriela Biló / Estadão  

Os relatórios de monitoramento foram produzidos pela Isobar em diversos contextos para o Planalto, incluindo durante a tramitação da reforma da Previdência, em abril do ano passado. Segundo a própria Secom, somente entre janeiro a novembro do ano passado foram elaborados 540 documentos, com 4 mil páginas ao todo, sobre interações de usuários no Twitter, Facebook, Instagram e Youtube. O serviço custou R$ 2,7 milhões aos cofres públicos em 2019.

Ordens de serviço obtidas pela reportagem do Estadão apontam que o objetivo do governo é identificar a 'repercussão, reputação, evolução do sentimento, principais influenciadores e demais informações estratégicas para tomada de decisões' do Planalto.

"Situações que indiquem possíveis repercussões com alto volume de menções devem ser alertadas, especialmente aquelas que possam gerar crise", exigiu a Secom.

A Comissão Parlamentar Mista de Inquérito (CPMI) das 'fake news' já elaborou requerimento para ouvir quatro servidores responsáveis por coordenar o trabalho. A Secom já informou que os documentos elaborados a partir do monitoramento são compartilhados com outros órgãos do governo.

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Ao ser cobrada pela CMRI que explicasse o motivo para segurar os documentos, o governo Bolsonaro alegou que a divulgação dos relatórios poderia ferir o sigilo empresarial. Segundo o Planalto, constam nos documentos detalhes sobre a metodologia de trabalho da agência contratada, o que poderia ferir sua competitividade no mercado.

Além disso, a União afirmou que há informações de usuários nos documentos que precisariam ser tarjadas antes de serem divulgadas ao público - e, em razão do 'trabalho adicional', pediu que fosse indeferido o pedido de liberação dos relatórios.

"Para identificar em quais das 4.000 páginas poderiam constar informações sensíveis (metodologia de trabalho e dados pessoais), a Secom teria que realizar análise integral de cada uma delas, bem como o tarjamento dos trechos restritos, para uma possível concessão de acesso", argumentou a CMRI, em decisão. "Para tanto, seria necessário o deslocamento de servidores especificamente para a tarefa, por período considerável, o que justificaria a negativa de acesso por configurar trabalhos adicionais".

A CMRI é formada por integrantes do primeiro escalão do governo Bolsonaro, e liderada pelo ministro-chefe da Casa Civil, general Braga Netto. As decisões foram assinadas por suplentes, indicados para atuar perante à comissão enquanto os titulares estão ausentes.

Especialistas em transparência criticam decisão:

A decisão da CMRI foi criticada por especialistas ouvidos pelo Estadão. Segundo o diretor-geral da Transparência Brasil, Manoel Galdino, as sucessivas mudanças de posição da Secom sobre os motivos para barrar a divulgação dos relatórios é 'grave' e já foi detectada pela organização.

Inicialmente, a Secom alegou que dar acesso aos relatórios iria ferir a Lei de Direitos Autorais. Ao responder um recurso do Estadão, a pasta mudou a argumentação e disse que, na verdade, os documentos eram preparatórios e seriam usados para uma decisão futura - sem dizer qual. Perante à CMRI, a Secom trocou a justificativa e usou a prerrogativa de sigilo empresarial e presença de informações pessoais para barrar o acesso, afirmando que daria 'trabalho adicional' revisar as páginas para tarjar os dados considerados sensíveis.

"Quando o governo começa a mudar de argumento, percebe-se que o que ele quer é procurar alguma justificativa legal que o autorize a não conceder uma informação. Ou seja, ao invés de tratar a publicidade como regra e o sigilo como exceção, ele quer colocar o sigilo como regra e a publicidade como exceção", afirmou Galdino. "É muito grave que o governo esteja fazendo isso - mais grave ainda numa situação que a própria CGU contraria seus próprios pareceres técnicos e politicamente decide defender o governo".

Fabio Wajngarten, chefe da Secom, e o presidente Jair Bolsonaro durante cerimônia no Palácio do Alvorada. Foto: Ueslei Marcelino / Reuters

Para Joara Marchezine, especialista em transparência pública e acesso à informação, a CMRI ignorou o debate sobre a necessidade de fiscalização dos gastos públicos, focando exclusivamente nos argumentos apresentados pela Secom para negar o acesso. "Em nenhum momento se fala ou se dá ênfase nos benefícios da divulgação desses relatórios e da necessidade de se saber como está sendo investido o dinheiro público", afirmou.

"É lamentável que o Executivo Federal, que vinha tendo muito bom desempenho em termos de implementação da LAI em comparação com os poderes Legislativo e Judiciário, esteja desacreditando o processo de revisão de decisões a respeito da transparência e do acesso a informação pública", afirmou Fabiano Angélico, mestre em administração pública pela Fundação Getúlio Vargas (FGV) e especialista em transparência.

A reportagem entrou em contato com a Secom, mas não obteve resposta até a publicação deste texto.

COM A PALAVRA, A SECOM 1. A Secretaria Especial de Comunicação Social reitera os argumentos apresentados à Comissão Mista de Reavaliação de Informações (CMRI), e por ela acertadamente acatados, de impedir o acesso público às 4 mil páginas dos relatórios de monitoramento de redes sociais.

2. O jornal buscou todos os meios jurídicos dentro da administração pública para tentar obter as informações, mas esbarrou no entendimento da necessidade de se preservar o sigilo empresarial e a preservação do pessoal da Secom para suas atividade regulares.

3. Causa estranheza a insistência do veículo de comunicação em tentar obter informações que dizem respeito, exclusivamente, ao trato de monitoramentos, avaliações e percepções específicas, que de modo algum são de interesse público ou jornalístico. No caso, não  há outra narrativa senão essa.

4. A postura jurídica e profissional da Secom, para preservar a administração pública e o respeito à decisão da CRMI, é transparente e assertiva e reitera sua obediência ao compromisso com a transparência e com o que estabelece a legislação no âmbito do acesso à informação pública.

O governo Jair Bolsonaro pediu e a Comissão Mista de Reavaliação de Informações (CMRI) barrou acesso a quatro mil páginas de relatórios de monitoramento de redes sociais produzidos pela Secretaria de Comunicação Social (Secom) durante o ano de 2019. A CMRI é a última instância da Lei de Acesso à Informação e sua decisão mantém longe do público documentos que a União tenta impôr sigilo desde o ano passado.

Reportagem do Estadão mostrou em dezembro de 2019 que inicialmente a Secom alegou que a divulgação dos relatórios violaria a Lei de Direitos Autorais - entendimento rechaçado por especialistas em transparência pública. Em março, o governo mudou a argumentação, afirmando que se tratam de documentos preparatórios - ou seja, usados para tomada de decisão.

O Planalto alegou ainda que 'não se vislumbra interesse público' na divulgação dos relatórios, que acompanham o 'humor' de usuários de quatro redes sociais em relação a ações do governo.

Apesar de parecer técnico determinar a liberação dos documentos, a CGU atendeu a Secom no início do ano, e o processo subiu para análise da CMRI. Perante à comissão, o governo afirmou pela primeira vez a quantidade de documentos produzidos e a presença de informações pessoais de terceiros e dados que estariam protegidos por 'sigilo empresarial'.

Relatórios foram produzidos no ano passado ao custo de R$ 2,7 milhões pela Secom, comandada por Fabio Wajngarten. Foto; Gabriela Biló / Estadão  

Os relatórios de monitoramento foram produzidos pela Isobar em diversos contextos para o Planalto, incluindo durante a tramitação da reforma da Previdência, em abril do ano passado. Segundo a própria Secom, somente entre janeiro a novembro do ano passado foram elaborados 540 documentos, com 4 mil páginas ao todo, sobre interações de usuários no Twitter, Facebook, Instagram e Youtube. O serviço custou R$ 2,7 milhões aos cofres públicos em 2019.

Ordens de serviço obtidas pela reportagem do Estadão apontam que o objetivo do governo é identificar a 'repercussão, reputação, evolução do sentimento, principais influenciadores e demais informações estratégicas para tomada de decisões' do Planalto.

"Situações que indiquem possíveis repercussões com alto volume de menções devem ser alertadas, especialmente aquelas que possam gerar crise", exigiu a Secom.

A Comissão Parlamentar Mista de Inquérito (CPMI) das 'fake news' já elaborou requerimento para ouvir quatro servidores responsáveis por coordenar o trabalho. A Secom já informou que os documentos elaborados a partir do monitoramento são compartilhados com outros órgãos do governo.

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Ao ser cobrada pela CMRI que explicasse o motivo para segurar os documentos, o governo Bolsonaro alegou que a divulgação dos relatórios poderia ferir o sigilo empresarial. Segundo o Planalto, constam nos documentos detalhes sobre a metodologia de trabalho da agência contratada, o que poderia ferir sua competitividade no mercado.

Além disso, a União afirmou que há informações de usuários nos documentos que precisariam ser tarjadas antes de serem divulgadas ao público - e, em razão do 'trabalho adicional', pediu que fosse indeferido o pedido de liberação dos relatórios.

"Para identificar em quais das 4.000 páginas poderiam constar informações sensíveis (metodologia de trabalho e dados pessoais), a Secom teria que realizar análise integral de cada uma delas, bem como o tarjamento dos trechos restritos, para uma possível concessão de acesso", argumentou a CMRI, em decisão. "Para tanto, seria necessário o deslocamento de servidores especificamente para a tarefa, por período considerável, o que justificaria a negativa de acesso por configurar trabalhos adicionais".

A CMRI é formada por integrantes do primeiro escalão do governo Bolsonaro, e liderada pelo ministro-chefe da Casa Civil, general Braga Netto. As decisões foram assinadas por suplentes, indicados para atuar perante à comissão enquanto os titulares estão ausentes.

Especialistas em transparência criticam decisão:

A decisão da CMRI foi criticada por especialistas ouvidos pelo Estadão. Segundo o diretor-geral da Transparência Brasil, Manoel Galdino, as sucessivas mudanças de posição da Secom sobre os motivos para barrar a divulgação dos relatórios é 'grave' e já foi detectada pela organização.

Inicialmente, a Secom alegou que dar acesso aos relatórios iria ferir a Lei de Direitos Autorais. Ao responder um recurso do Estadão, a pasta mudou a argumentação e disse que, na verdade, os documentos eram preparatórios e seriam usados para uma decisão futura - sem dizer qual. Perante à CMRI, a Secom trocou a justificativa e usou a prerrogativa de sigilo empresarial e presença de informações pessoais para barrar o acesso, afirmando que daria 'trabalho adicional' revisar as páginas para tarjar os dados considerados sensíveis.

"Quando o governo começa a mudar de argumento, percebe-se que o que ele quer é procurar alguma justificativa legal que o autorize a não conceder uma informação. Ou seja, ao invés de tratar a publicidade como regra e o sigilo como exceção, ele quer colocar o sigilo como regra e a publicidade como exceção", afirmou Galdino. "É muito grave que o governo esteja fazendo isso - mais grave ainda numa situação que a própria CGU contraria seus próprios pareceres técnicos e politicamente decide defender o governo".

Fabio Wajngarten, chefe da Secom, e o presidente Jair Bolsonaro durante cerimônia no Palácio do Alvorada. Foto: Ueslei Marcelino / Reuters

Para Joara Marchezine, especialista em transparência pública e acesso à informação, a CMRI ignorou o debate sobre a necessidade de fiscalização dos gastos públicos, focando exclusivamente nos argumentos apresentados pela Secom para negar o acesso. "Em nenhum momento se fala ou se dá ênfase nos benefícios da divulgação desses relatórios e da necessidade de se saber como está sendo investido o dinheiro público", afirmou.

"É lamentável que o Executivo Federal, que vinha tendo muito bom desempenho em termos de implementação da LAI em comparação com os poderes Legislativo e Judiciário, esteja desacreditando o processo de revisão de decisões a respeito da transparência e do acesso a informação pública", afirmou Fabiano Angélico, mestre em administração pública pela Fundação Getúlio Vargas (FGV) e especialista em transparência.

A reportagem entrou em contato com a Secom, mas não obteve resposta até a publicação deste texto.

COM A PALAVRA, A SECOM 1. A Secretaria Especial de Comunicação Social reitera os argumentos apresentados à Comissão Mista de Reavaliação de Informações (CMRI), e por ela acertadamente acatados, de impedir o acesso público às 4 mil páginas dos relatórios de monitoramento de redes sociais.

2. O jornal buscou todos os meios jurídicos dentro da administração pública para tentar obter as informações, mas esbarrou no entendimento da necessidade de se preservar o sigilo empresarial e a preservação do pessoal da Secom para suas atividade regulares.

3. Causa estranheza a insistência do veículo de comunicação em tentar obter informações que dizem respeito, exclusivamente, ao trato de monitoramentos, avaliações e percepções específicas, que de modo algum são de interesse público ou jornalístico. No caso, não  há outra narrativa senão essa.

4. A postura jurídica e profissional da Secom, para preservar a administração pública e o respeito à decisão da CRMI, é transparente e assertiva e reitera sua obediência ao compromisso com a transparência e com o que estabelece a legislação no âmbito do acesso à informação pública.

O governo Jair Bolsonaro pediu e a Comissão Mista de Reavaliação de Informações (CMRI) barrou acesso a quatro mil páginas de relatórios de monitoramento de redes sociais produzidos pela Secretaria de Comunicação Social (Secom) durante o ano de 2019. A CMRI é a última instância da Lei de Acesso à Informação e sua decisão mantém longe do público documentos que a União tenta impôr sigilo desde o ano passado.

Reportagem do Estadão mostrou em dezembro de 2019 que inicialmente a Secom alegou que a divulgação dos relatórios violaria a Lei de Direitos Autorais - entendimento rechaçado por especialistas em transparência pública. Em março, o governo mudou a argumentação, afirmando que se tratam de documentos preparatórios - ou seja, usados para tomada de decisão.

O Planalto alegou ainda que 'não se vislumbra interesse público' na divulgação dos relatórios, que acompanham o 'humor' de usuários de quatro redes sociais em relação a ações do governo.

Apesar de parecer técnico determinar a liberação dos documentos, a CGU atendeu a Secom no início do ano, e o processo subiu para análise da CMRI. Perante à comissão, o governo afirmou pela primeira vez a quantidade de documentos produzidos e a presença de informações pessoais de terceiros e dados que estariam protegidos por 'sigilo empresarial'.

Relatórios foram produzidos no ano passado ao custo de R$ 2,7 milhões pela Secom, comandada por Fabio Wajngarten. Foto; Gabriela Biló / Estadão  

Os relatórios de monitoramento foram produzidos pela Isobar em diversos contextos para o Planalto, incluindo durante a tramitação da reforma da Previdência, em abril do ano passado. Segundo a própria Secom, somente entre janeiro a novembro do ano passado foram elaborados 540 documentos, com 4 mil páginas ao todo, sobre interações de usuários no Twitter, Facebook, Instagram e Youtube. O serviço custou R$ 2,7 milhões aos cofres públicos em 2019.

Ordens de serviço obtidas pela reportagem do Estadão apontam que o objetivo do governo é identificar a 'repercussão, reputação, evolução do sentimento, principais influenciadores e demais informações estratégicas para tomada de decisões' do Planalto.

"Situações que indiquem possíveis repercussões com alto volume de menções devem ser alertadas, especialmente aquelas que possam gerar crise", exigiu a Secom.

A Comissão Parlamentar Mista de Inquérito (CPMI) das 'fake news' já elaborou requerimento para ouvir quatro servidores responsáveis por coordenar o trabalho. A Secom já informou que os documentos elaborados a partir do monitoramento são compartilhados com outros órgãos do governo.

reference

Ao ser cobrada pela CMRI que explicasse o motivo para segurar os documentos, o governo Bolsonaro alegou que a divulgação dos relatórios poderia ferir o sigilo empresarial. Segundo o Planalto, constam nos documentos detalhes sobre a metodologia de trabalho da agência contratada, o que poderia ferir sua competitividade no mercado.

Além disso, a União afirmou que há informações de usuários nos documentos que precisariam ser tarjadas antes de serem divulgadas ao público - e, em razão do 'trabalho adicional', pediu que fosse indeferido o pedido de liberação dos relatórios.

"Para identificar em quais das 4.000 páginas poderiam constar informações sensíveis (metodologia de trabalho e dados pessoais), a Secom teria que realizar análise integral de cada uma delas, bem como o tarjamento dos trechos restritos, para uma possível concessão de acesso", argumentou a CMRI, em decisão. "Para tanto, seria necessário o deslocamento de servidores especificamente para a tarefa, por período considerável, o que justificaria a negativa de acesso por configurar trabalhos adicionais".

A CMRI é formada por integrantes do primeiro escalão do governo Bolsonaro, e liderada pelo ministro-chefe da Casa Civil, general Braga Netto. As decisões foram assinadas por suplentes, indicados para atuar perante à comissão enquanto os titulares estão ausentes.

Especialistas em transparência criticam decisão:

A decisão da CMRI foi criticada por especialistas ouvidos pelo Estadão. Segundo o diretor-geral da Transparência Brasil, Manoel Galdino, as sucessivas mudanças de posição da Secom sobre os motivos para barrar a divulgação dos relatórios é 'grave' e já foi detectada pela organização.

Inicialmente, a Secom alegou que dar acesso aos relatórios iria ferir a Lei de Direitos Autorais. Ao responder um recurso do Estadão, a pasta mudou a argumentação e disse que, na verdade, os documentos eram preparatórios e seriam usados para uma decisão futura - sem dizer qual. Perante à CMRI, a Secom trocou a justificativa e usou a prerrogativa de sigilo empresarial e presença de informações pessoais para barrar o acesso, afirmando que daria 'trabalho adicional' revisar as páginas para tarjar os dados considerados sensíveis.

"Quando o governo começa a mudar de argumento, percebe-se que o que ele quer é procurar alguma justificativa legal que o autorize a não conceder uma informação. Ou seja, ao invés de tratar a publicidade como regra e o sigilo como exceção, ele quer colocar o sigilo como regra e a publicidade como exceção", afirmou Galdino. "É muito grave que o governo esteja fazendo isso - mais grave ainda numa situação que a própria CGU contraria seus próprios pareceres técnicos e politicamente decide defender o governo".

Fabio Wajngarten, chefe da Secom, e o presidente Jair Bolsonaro durante cerimônia no Palácio do Alvorada. Foto: Ueslei Marcelino / Reuters

Para Joara Marchezine, especialista em transparência pública e acesso à informação, a CMRI ignorou o debate sobre a necessidade de fiscalização dos gastos públicos, focando exclusivamente nos argumentos apresentados pela Secom para negar o acesso. "Em nenhum momento se fala ou se dá ênfase nos benefícios da divulgação desses relatórios e da necessidade de se saber como está sendo investido o dinheiro público", afirmou.

"É lamentável que o Executivo Federal, que vinha tendo muito bom desempenho em termos de implementação da LAI em comparação com os poderes Legislativo e Judiciário, esteja desacreditando o processo de revisão de decisões a respeito da transparência e do acesso a informação pública", afirmou Fabiano Angélico, mestre em administração pública pela Fundação Getúlio Vargas (FGV) e especialista em transparência.

A reportagem entrou em contato com a Secom, mas não obteve resposta até a publicação deste texto.

COM A PALAVRA, A SECOM 1. A Secretaria Especial de Comunicação Social reitera os argumentos apresentados à Comissão Mista de Reavaliação de Informações (CMRI), e por ela acertadamente acatados, de impedir o acesso público às 4 mil páginas dos relatórios de monitoramento de redes sociais.

2. O jornal buscou todos os meios jurídicos dentro da administração pública para tentar obter as informações, mas esbarrou no entendimento da necessidade de se preservar o sigilo empresarial e a preservação do pessoal da Secom para suas atividade regulares.

3. Causa estranheza a insistência do veículo de comunicação em tentar obter informações que dizem respeito, exclusivamente, ao trato de monitoramentos, avaliações e percepções específicas, que de modo algum são de interesse público ou jornalístico. No caso, não  há outra narrativa senão essa.

4. A postura jurídica e profissional da Secom, para preservar a administração pública e o respeito à decisão da CRMI, é transparente e assertiva e reitera sua obediência ao compromisso com a transparência e com o que estabelece a legislação no âmbito do acesso à informação pública.

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