Em meio aos esforços mundiais para promover a transição verde e mitigar os impactos das mudanças climáticas, surge uma nova ameaça: a green corruption ou corrupção verde. Esse tipo de corrupção pode ser definido como o abuso de poder para ganhos pessoais, comprometendo a proteção ambiental, envolvendo o uso indevido de recursos destinados ao meio ambiente. Alguns exemplos de green corruption são: as concessões ilegais para exploração de recursos naturais, emissão de licenças ambientais fraudulentas, mineração ilegal, pesca predatória, manipulação de fundos ambientais, entre outras.
A green corruption e o greenwashing são práticas distintas, embora inter-relacionadas. Ambas prejudicam os esforços globais de melhoria da integridade em relação aos aspectos ambientais. Enquanto a green corruption consiste no abuso de poder para ganhos privados em detrimento da proteção ambiental, o greenwashing trata da manipulação da percepção pública por meio de estratégias de comunicação enganosas, nas quais empresas promovem uma imagem de responsabilidade ambiental sem adotar práticas concretas para tal fim. Enquanto a green corruption resulta em impactos materiais e prejudica diretamente o meio ambiente e as comunidades locais, o greenwashing afeta a confiança dos consumidores e investidores, criando uma barreira à transparência e à responsabilidade corporativa. Sem a menor dúvida, ambos comprometem a agenda ESG (Ambiental, Social e Governança), ao distorcerem a realidade dos compromissos empresariais com a sustentabilidade e dificultarem o avanço de políticas efetivas de combate à degradação ambiental.
Os impactos econômicos e ambientais de práticas de green corruption são devastadores, afetando a biodiversidade, os direitos das comunidades indígenas e o desenvolvimento sustentável. Além disso, a green corruption coloca em risco os compromissos ESG, comprometendo a transição para economias verdes e ameaçando a integridade dos esforços de sustentabilidade global. É esse tipo de corrupção que facilita o desmatamento ilegal e o comércio desregulado de madeira, afetando florestas tropicais como a Amazônia, por exemplo. Subornos permitem que atividades de mineração e exploração de petróleo ocorram em áreas ambientais protegidas, sem a devida avaliação de impacto ambiental. Além disso, empresas de gestão de resíduos acabam descartando materiais de forma inadequada, poluindo o solo e a água, contando com redes corruptas para evitar responsabilidade civil e criminal.
A green corruption evidencia uma crise ética que transcende fronteiras e setores. A Task Force Integrity & Compliance do B20 Brasil 2024 aborda essa questão em seu relatório final[1], destacando a urgência de combater a corrupção verde. O relatório identificou como essa prática prejudica a exploração de recursos naturais e o financiamento de atividades ambientalmente insustentáveis. Foram apresentadas recomendações específicas para governos, setor privado e ONGs, com o objetivo de fortalecer a luta contra essa forma de corrupção. De acordo com o relatório do B20 Integrity & Compliance, é essencial que governos e empresas implementem medidas de integridade e transparência, combatendo práticas que prejudicam a biodiversidade e afetam diretamente as comunidades locais e a integridade dos ecossistemas.
A luta contra a green corruption enfrenta desafios. A dificuldade de fiscalização, os interesses econômicos envolvidos e a falta de uma regulamentação internacional tornam o combate a essa forma de corrupção especialmente complexo. Outros desafios incluem a disparidade na aplicação de leis ambientais anticorrupção. O referido relatório do B20 propôs algumas medidas para enfrentar o problema. Entre as principais recomendações estão: a adoção de normas harmonizadas de sustentabilidade, que facilitem o cumprimento por parte das empresas e promovam maior transparência; incentivos fiscais e reconhecimento público para empresas que demonstrem compromisso com a integridade ambiental; e o uso de novas tecnologias, como a inteligência artificial, para rastrear e monitorar atividades suspeitas em áreas de conservação.
A colaboração entre o setor público, privado e a sociedade civil através de ações coletivas é fundamental para combater a green corruption. Ação coletiva é um esforço coordenado entre múltiplos stakeholders, como empresas, governos e organizações da sociedade civil, para enfrentar desafios comuns, promovendo maior eficácia na implementação de soluções e mitigando riscos que não podem ser abordados isoladamente. O relatório do B20 enfatiza que a integridade no setor privado, somada ao compromisso governamental com a transparência e a responsabilidade formam a base para um futuro sustentável e justo. Em um mundo interconectado, a responsabilidade coletiva é o único caminho para preservar o planeta e garantir que os recursos destinados à sustentabilidade sejam aplicados corretamente, promovendo o futuro que queremos.
A green corruption é um obstáculo para a integridade do meio ambiente. No entanto, com ações conjuntas, transparência e o uso de novas tecnologias, é possível reduzir significativamente o impacto dessa prática. O relatório do B20 Brasil Integrity & Compliance reforça a importância de políticas e ações eficazes que promovam um futuro sustentável. O combate à green corruption requer uma ação global e coordenação entre todos os stakeholders, colocando a integridade e o meio ambiente no centro do debate e promovendo uma governança responsável, que valorize tanto a sustentabilidade para a geração de hoje quanto os direitos das futuras gerações.
[1] B20 Brasil, 2024. Integrity & Compliance Policy Paper, disponível em https://b20brasil.org/integrity-compliance.
Este texto reflete única e exclusivamente a opinião do(a) autor(a) e não representa a visão do Instituto Não Aceito Corrupção (Inac). Esta série é uma parceria entre o Blog do Fausto Macedo e o Instituto Não Aceito Corrupção. Os artigos têm publicação periódica