Na tarde de 6/6 foi realizada a tão esperada leitura do Relatório do Grupo de Trabalho da Reforma Tributária, pelo deputado Aguinaldo Ribeiro (PP/PB). De acordo com o deputado, o intuito do Relatório é dar publicidade às diretrizes que irão pautar o novo texto do Substitutivo às PECs 45 e 110, que somente deverá ser apresentado na primeira semana de julho, diretamente ao Plenário da Câmara dos Deputados.
Apesar de não apresentar muitos detalhes, o Relatório parece pretender atender aos anseios da sociedade quanto à definição do modelo do novo tributo, sobretudo quanto à forma de unificação, alíquotas, regimes de créditos e os tão polêmicos benefícios fiscais.
Do texto, compreende-se que foi definido que a proposta contemplará uma espécie de IVA dual, de modo a coexistir um tributo federal e outro estadual/municipal, ainda que sob a mesma base de cálculo. No entanto, essa dualidade preocupa, pois, de partida, admite-se a fragilidade da proposta. O histórico das tentativas de reforma tributária no Brasil nos leva a constatação que, apesar da busca pela unificação, sempre as discussões são cindidas, como retrato da falta de consenso dos entes federativos em ceder suas competências tributárias.
Sob essa perspectiva, o questionamento que desponta é se dessa vez o Congresso conseguirá conciliar os interesses de Estados e Municípios, principalmente para garantir que a reforma não retire a autonomia dos municípios, que, na prática, já é bastante diminuta. Do contrário, a probabilidade é que reste apenas uma unificação das contribuições PIS e COFINS, com a substituição do IPI pelo Imposto Seletivo.
Outro aspecto importante, o Relatório prevê que o texto contemplará alíquotas padrão e diferenciadas para bens e serviços relacionados à saúde, educação, transporte público coletivo urbano, semi urbano ou metropolitano, aviação regional, produção rural e cesta básica. Aqui, de imediato, surge uma controvérsia em relação à abrangência do conceito de cada uma dessas atividades, e, igualmente, vislumbra-se uma complexidade em definir a extensão da cadeia sobre a qual recairá a benesse.
Em que pese tratar da possibilidade de alíquotas diferenciadas, fato é que o percentual da alíquota padrão permanece como verdadeira incógnita. Especula-se que será em torno de 25%. Se assim o for, certamente o efeito será o expressivo aumento da carga tributária sobre os serviços, a despeito do amplo direito ao crédito.
De fato, o Relatório prevê que será garantido "aproveitamento pleno do crédito dos bens e serviços adquiridos pelos diversos elos da cadeia produtiva", bem como que deve ser concedido o creditamento quando o imposto estiver destacado na nota fiscal, independentemente da comprovação do efetivo recolhimento.
É em razão desse direito pleno de crédito que os congressistas afirmam que não haverá aumento de carga tributária. Contudo, na realidade, o que se pretende é a manutenção dos níveis de arrecadação e, considerando a implementação de mecanismo que eliminam a cumulatividade do ICMS, ISS, PIS, COFINS e o IPI é eminente o aumento de carga tributária para as operações que estavam sujeitas ao ISS. Esse aumento de carga tributária, por sua vez, não poderá ser neutralizado pela sistemática da não cumulatividade porque, em grande parte, os serviços são prestados diretamente ao consumidor final.
Os congressistas estão cientes disso, mas entendem que, de modo geral, quem consome serviços são os mais ricos. Mas, ainda que essa seja uma verdade, fato é que, como bem reconhecido no relatório, a "servitização" é uma tendência da economia, que vem sendo perseguida por novos empreendedores. São inúmeros os novos negócios que, de forma disruptiva, buscam descentralizar o acesso a bens e serviços, oferecendo soluções das mais variadas, para todo o espectro da população. Porém, um expressivo aumento de carga tributária, certamente, reduzirá o potencial de escalabilidade dessas soluções, não pela sua natureza em si, mas pela incapacidade do mercado de absorver tamanha majoração de preços.
Por fim, destaca-se que o relatório não traça diretrizes sobre a possibilidade de concessão de novos benefícios fiscais, mas tão somente aduz que os benefícios fiscais do ICMS convalidados até 2032 pela Lei Complementar nº 160, de 7 de agosto de 2017 devem ser respeitados. De fato, a PEC 45 definia os setores que estavam excetuados, por 12 anos, da vedação aos benefícios fiscais, enquanto a PEC 110 definia que a Lei Complementar poderia definir benefícios fiscais. Ora, no mínimo, os congressistas precisarão discutir melhor esses aspectos, pois, embora essa temática remete à Guerra Fiscal entre os Estado, não se pode olvidar da necessidade de o Brasil manter mecanismos fiscais que lhe permitam guiar políticas públicas para atração de investimentos em setores estratégicos, como infraestrutura e energia.
Diante desse cenário, fica claro que os congressistas têm um árduo caminho pela frente, seja para a construção do texto substitutivo, seja nas futuras discussões no Plenário da Câmara e do Senado, para aprovar um texto que seja condizente com os anseios da sociedade.
*Fernanda Sá Freire, André Menon e Mércia Braga são, respectivamente, sócios e advogada do Machado Meyer Advogados