No final das contas, o que faz com que um país seja percebido como mais ou menos corrupto é a capacidade de o Estado coibir e punir aqueles que tentam burlar as regras do jogo, como por meio do pagamento de subornos.
Como os Estados são soberanos, ainda que existam acordos globais, como o Pacto da ONU de combate à corrupção ou a convenção da OCDE contra o suborno internacional, a verdade é que cada país define as suas próprias regras de combate à corrupção de acordo com aspectos culturais e, também, com interesses políticos.
Só que, na medida em que malfeitos dessa natureza são praticados de forma cada vez mais transnacional, é importante que empresas e profissionais contem com uma referência global capaz de harmonizar boas práticas em suas operações mundo afora ou mesmo para adequar uma operação local à realidade de seus parceiros de negócios no exterior.
Se as peculiaridades locais (tantos as culturais quanto as legais) serão sempre um ponto de atenção a exigir adaptações no programa de compliance, contar com um padrão aceito globalmente é um avanço. Essa é a importância da norma ISO 37001, desenhada pela Organização Internacional para Padronização (ISO) para certificar sistemas de gestão antissuborno.
A ISO 37001 tem como base pontos em comum requeridos pelas legislações de combate à corrupção ao redor do mundo. Apesar de contar com regras globais, a ISO permite a cada país para o qual a norma é traduzida, caso do Brasil, agregar pontos que não necessariamente constam do texto original, mas que são abordados pela legislação local.
Resumidamente, a ISO 37001 fornece um conjunto de regras básicas e internacionalmente aceitas, mas que podem ganhar um "tempero" local, se isso for necessário para atender às peculiaridades do ambiente regulatório do país. O objetivo é permitir um aprimoramento natural do texto em cada país.
No caso do Brasil, esse "tempero" adiciona pontos que tratam de fraudes em licitações de contratos com o setor público, por exemplo.
A ISO 37001 foi considerada para a celebração de acordos de leniência em casos de corrupção, mostrando um posicionamento favorável por parte dos órgãos reguladores brasileiros. Certamente, ao estabelecer um padrão de mecanismos antissuborno, empresas e reguladores tendem a poupar tempo e energia para interpretar como aplicar e analisar a eficácia de cada item do programa.
No entanto, ao mesmo tempo que funciona como um selo de qualidade, obter a certificação ISO 37001 não é garantia de blindagem para as empresas. A ENI, gigante italiana da área de óleo e gás, foi a primeira empresa a receber a certificação no mundo. Pouco tempo depois, seu CEO, Claudio Descalzi, foi indiciado por corrupção internacional.
Uma certificação ou um selo, portanto, não tornam a empresa imune a problemas como esse. Mas com a adoção dos mecanismos exigidos pela norma ISO, que em parte já integram programas de compliance efetivos, a empresa é capaz de diminuir sensivelmente o risco de ocorrências de subornos.
A certificação demonstra a todos os colaboradores, fornecedores e clientes que uma decisão contrária ao suborno foi tomada pela empresa. Todos, inclusive autoridades responsáveis por eventuais investigações criminais, terão a certeza de que criteriosos controles internos estão implementados para evitar essa prática danosa.
*Sócio e diretor de novos negócios da LEC (www.lecnews.com). Formado em Direito pelo Mackenzie, é especialista em processo civil e mestre em ciências jurídico-forenses pela Universidade de Coimbra, em Portugal