No início deste ano ocorreu um fato inédito e muito promissor: grande número de jovens de 16 e 17 anos, para quem o alistamento eleitoral e o voto são facultativos, inscreveu-se no sistema eleitoral a fim de votar nas eleições de outubro. Em comparação a 2018, o número de adolescentes dessa faixa etária cresceu mais de 51%, passando de 1,4 milhão de votantes para 2.116.781 de eleitoras e eleitores. Segundo o portal do TSE, com essa elevação foi revertida uma série estatística de sucessivas quedas no interesse dos adolescentes pelo voto, desde as eleições de 2010.
Diante desses dados, uma pergunta é inevitável: o que determinou esta mudança de atitude e reversão de queda do interesse dos jovens pelas eleições? De acordo com o portal do Tribunal, parte do crescimento da consciência cidadã com o processo eleitoral entre os jovens pode ser atribuído às campanhas "Bora Votar!", lançada pelo TSE em 2021, e a Semana do Jovem Eleitor, em 2022. Esta última teve o apoio da grande imprensa e repercutiu entre artistas, atletas, celebridades e influenciadores digitais.
Além disso, a alteração do quadro político eleitoral após anos de alternância entre PT e PSDB na disputa, a tendência à participação dos jovens em situações de grande polarização política e o engajamento em momentos de crise também devem ser considerados fatos explicativos desse comportamento. Mas, aceitar esses condicionantes externos apenas como responsáveis pelo aumento do interesse desses jovens ainda parece insuficiente. Afinal, o que mais pode ter contribuído para que queiram desde já eleger os representantes da população à Presidência da República, à Câmara, ao Senado e aos governos e assembleias estaduais?
Desde que ingressaram na escola, parte dos adolescentes que hoje possuem 16 e 17 anos vêm tendo contato com jornais e revistas infantojuvenis, que trazem os acontecimentos do Brasil e do mundo de forma contextualizada e com linguagem adequada. Nas escolas há projetos de trabalho com os periódicos e são garantidos momentos semanais de leitura e comentários sobre as matérias. Ao se informar, o adolescente, via de regra, sente-se parte da sociedade e vê despertado seu interesse em atuar como protagonista de ações para a melhoria de seu entorno, seu bairro e até sua cidade.
Mesmo ao longo dos dois anos e meio de pandemia, em que a maior parte das pessoas permaneceu em casa, vimos ocorrer o contato intenso com as notícias através dos múltiplos meios de comunicação disponíveis: TV, rádio, internet (sites, redes sociais, Youtube) e até aplicativos de mensagem. O acesso cada vez maior às informações provavelmente levou o jovem preparado e atento a manter os procedimentos de verificação das fontes das matérias e de crítica e reflexão sobre o que lê.
Assim, poder participar do processo eleitoral antes dos 18 anos por meio do voto surge como uma oportunidade de manifestação concreta do exercício da cidadania e de contribuição, como indivíduo, para a construção de uma sociedade melhor. A vontade e consciência desses 717 mil novos jovens eleitores revela a importância e a necessidade cada vez maior da formação das crianças e adolescentes como leitores de notícias desde cedo.
* Mônica S. Gouvêa, socióloga, psicóloga e Mestre em Educação (Unicamp), é diretora educacional do jornal Joca, publicação para crianças e adolescentes.