Não há dúvida: a população do Brasil envelhece. O Censo do IBGE de 2022, publicadas recentemente, mostra que a parcela acima dos 60 anos cresceu em 10 anos de 11,3% para 14,7%, quase 9 milhões de brasileiros – um Portugal! Daí a importância de ajustar políticas públicas e recursos para prover demandas desta população. Estamos falando de um grupo que, apesar de parte se manter mais ativo e produtivo, tem necessidades típicas dos longevos: maior incidência de doenças (cardiopatias, neoplasias), redução visual e auditiva, perda óssea e muscular, risco de queda e perda cognitiva. São pessoas que precisam de uma linha de cuidados específica caso a caso – na maioria das vezes muito cara.
Não podemos nos limitar aos cuidados básicos da saúde, o que já é bastante oneroso. Medicamentos, terapias, órteses, próteses, suplementação alimentar atrasam doenças e a morte, mas não garantem vida plena e digna. A pandemia mostrou que, mesmo quem tinha funcionalidade plena, perdeu muito em cognição e desempenho por falta de estímulos sociais, culturais e físicos.
Morar é um grande desafio. Manter a independência apesar da perda de parceiros é ideal, mas a dependência de familiares para prover necessidades básicas (alimentação, dispensação de medicamentos e cuidados de higiene) passa a ser a regra. O custo não se resume a valores dispendidos nestas ações, mas no deslocamento de familiares produtivos que zelam pelos parentes e no desgaste nas relações afetivas, quando se transforma em relação de cuidados.
Portanto, cabe pensar alternativas de moradia. Residenciais para Idosos aparecem como solução. A proposta é oferecer cuidados supervisionados num mesmo local junto a outros idosos e garantir necessidades básicas, estímulo funcional, intelectual e social para seu melhor desempenho. Temos um problema: o grande preconceito com os antigos asilos. Verdadeiros depósitos, sem adaptações, atenção a necessidades individuais ou estímulo aos seus “hóspedes”, considerados locais onde as pessoas esperavam a morte. Esta realidade tem se transformado. A demanda crescente da população com recursos gera investimentos e a exigência de diferenciais para manutenção de felicidade de seus próximos. Casas projetadas para essas necessidades, com boa iluminação, recursos para locomoção (barras e elevadores), controle de farmácia, nutrição, supervisão médica, fisioterapia e atividades como música, salão de beleza, biblioteca, passeios supervisionados, pet-terapia surgiram com repercussões positivas.
Infelizmente a padronização dos residenciais é falha, sendo um setor pouquíssimo organizado. As diferenças entre serviços oferecidos ao público são enormes e entidades públicas validam tais locais baseados em documentação básica, muitas vezes pela sua incapacidade de avaliação. Há ainda inúmeras casas clandestinas, sem registro de suas atividades em órgãos públicos, como prefeituras, Corpo de Bombeiros ou Vigilância Sanitária. A organização deste setor é urgente frente à pressão que já existe e se move sobre nossa sociedade. Mecanismos de controle e entidades de fiscalização precisam ser rapidamente estruturados.
O preparo do futuro, que está à nossa porta, deve interessar a todos. Provavelmente precisaremos delas em alguns anos. É do interesse comum, tanto de entidades públicas quanto de agentes privados. Já passou do momento de nos aprofundarmos neste tema.
*Marcello Barduco, médico cardiologista do corpo clínico do Hospital Sírio-Libanês com pós-graduação em geriatria pelo IEP - Hospital Sirio-Libanês, membro da Comissão de Ética do Hospital Sírio-Libanês e do conselho editorial da plataforma TREVOO