No calor dos debates sobre o Novo Arcabouço Fiscal, discute-se a pertinência, os prós e os contras de se estabelecer uma meta fiscal superavitária, deficitária ou de equilíbrio entre despesas e receitas públicas.
Somente o equilíbrio fiscal pode garantir educação e saúde de qualidade, reduzir o nível de insegurança alimentar grave etc., viabilizando a erradicação ou pelo menos redução da linha de pobreza. Daí derivam as seguintes questões:
O objetivo do Governo deve ser arrecadar tributos e auferir outras receitas em montante pelo menos igual ao que ele gasta?
O objetivo do Governo deve ser gastar um montante no máximo igual ao que ele aufere com tributos e outras receitas?
Para a maioria dos economistas é o equilíbrio fiscal que mantém a economia saudável; mas como alcançá-lo? É a receita que deve se ajustar à despesa ou esta àquela?
Em matéria publicada pela imprensa no último dia 23 de abril, Henrique Meirelles afirmou que “ajuste fiscal se faz pela despesa; não pela receita”.
Embora essa afirmação, absolutamente correta, possa surpreender políticos e responsáveis pela administração pública, ela reflete nada mais nada menos daquilo que é óbvio para gestores da iniciativa privada: a garantia da sobrevivência das empresas se faz pelo ajuste de custos, não pela receita.
Não é que a administração de entidades públicas – União, estados e municípios – seja guiada pelos mesmos princípios da administração de empresas. O modelo de gestão é diferente. Mas o propósito fundamental subjacente à Ciência Econômica é o mesmo em ambos os casos: buscar a eficiência, a eficácia e a efetividade no uso de recursos escassos para gerar e distribuir valor. E essa é a essência da gestão eficaz de custos.
Mais que apenas perseguir o equilíbrio primário, é necessário mitigar a asfixia do custo financeiro da dívida pública – mas isso depende... do equilíbrio fiscal.
Como o gargalo dos gastos obrigatórios encontra-se num nível hierárquico superior, político, apresentamos a seguir algumas sugestões de ações e iniciativas que podem ser implementadas no âmbito dos gastos discricionários:
- Identificar e eliminar (ou pelo menos reduzir), os custos dissimulados, sorrateiros, desnecessários: atividades realizadas em duplicidade, sobreposição de funções, retrabalho, processos burocráticos e ineficientes, movimentação excessiva de processos e documentos etc. Uma iniciativa, que já se vê timidamente, é a constituição de Centros de Serviços Compartilhados; é preciso ampliar seu uso.
- Por parte de uma minoria, há desperdícios e perdas voluntárias, decorrentes de comportamento humano com interesses espúrios.
- Não é possível realizar as atividades com equipamentos obsoletos, inadequados, mas é preciso utilizar os recursos tecnológicos, sistemas de hardware e software com parcimônia. É comum gastar com novos sistemas, mais avançados, sendo que os recursos atuais podem estar sendo subutilizados. Nessa linha, é aconselhável, para uma boa gestão de custos, evitar a diversidade de sistemas e equipamentos, buscando a padronização sempre que possível.
- Dois custos elevadíssimos são ociosidade dos imóveis e alto nível de absenteísmo em muitos órgãos da administração pública.
Felizmente há também fatores favoráveis:
- A Nova Lei de Licitações é um avanço considerável; se bem utilizada, pode propiciar aos gestores públicos a possibilidade de realizar compra de bens e contratação de serviços em condições favoráveis à gestão de custos considerando o custo total ao longo da vida útil dos bens (custos de operação, manutenção, descarte etc.) e não apenas o preço de aquisição. Espera-se coragem dos gestores para contratar não necessariamente com base no menor preço e aperfeiçoamento dos tribunais de contas nesse avanço.
- Alto nível de qualificação dos servidores públicos. De forma geral os quadros são muito bem preparados, tanto do ponto de vista de formação acadêmica como de conhecimentos técnicos e nível cultural. Embora haja exceções, é alto o nível de comprometimento para com a eficácia e a efetividade dos programas e das políticas públicas.
- Também digno de nota é a entrada em vigor, em janeiro de 2024, da Norma de Sistemas de Custos para o setor público: NBC TSP 34, do Conselho Federal de Contabilidade. Porém, tal sistema, por si só, não garante uma boa gestão de custos; além da mensuração, é preciso que a informação seja utilizada para planejamento e controle dos custos que, em última instância, são suportados por todos os contribuintes, quer dizer, por toda a população.
- Por fim, embora pouco provável pelo que até agora se vê, seria desejável que a Reforma Administrativa fosse realmente séria, de verdade, mesmo sem ser radical. Uma Reforma que introduzisse mecanismos dinâmicos, autoalimentados, capazes de motivar e induzir os gestores públicos na direção aqui sinalizada. Uma Reforma justa, sem privilégios.
*Welington Rocha, presidente da Fipecafi e professor sênior da FEA-USP