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Opinião|O injustificável benefício regional para a indústria automobilística


Por Maílson da Nóbrega*
Atualização:

Com razão, a Câmara dos Deputados rejeitou, na votação da proposta de reforma tributária (PEC 45), a prorrogação, para 2032, do benefício fiscal de que gozam fábricas da indústria automobilística cujos veículos sejam fabricados nas regiões Norte, Nordeste e Centro-Oeste. Foi uma decisão correta, baseada em evidências indiscutíveis, como se verá adiante. Apesar disso, a vantagem foi ressuscitada no texto aprovado pelo Senado.

Por qualquer ângulo que se analise essa política, fica cabalmente demonstrado que ela gera elevada ineficiência, acarretando ainda efeitos negativos na concorrência do setor, o que desestimula investimentos. Isso equivale ao que acontece quando monopólios e oligopólios causam danos ao adequado funcionamento de uma economia de mercado.

Maílson da Nóbrega Foto: Divulgação
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Não param aí as más consequências desse benefício fiscal. Estudos mostram que, para cada seis reais de gastos tributários, as montadoras que operam nessas regiões geram diretamente apenas um real de salário nos empregos criados. Comparações feitas com o Bolsa Família (BF) indicam que os salários dos seus empregados e seus efeitos multiplicadores geram benefícios sociais muito inferiores. Adicionalmente, dadas as suas condicionalidades, o BF tem maior capacidade de interiorização e consequências positivas mais amplas no longo prazo.

A política tampouco se justifica quando se consideram os custos de produção nas regiões abrangidas, o que desautorizaria a concessão do benefício fiscal. De fato, os custos de fabricação de automóveis em outras regiões não são superiores às do Norte, Nordeste e Centro Oeste. Embora sejam maiores os desembolsos com fretes e matérias primas, estas últimas regiões exibem vantagens com remuneração e encargos sociais. Por isso, modelos produzidos nas áreas objeto do benefício fiscal não têm menor preço. Adicionalmente, dada a estrutura similar de custos, não haveria justificativa plausível para o apoio oficial.

Os veículos fabricados são majoritariamente de luxo. Não são vendidos por preços médios menores do que os de modelos semelhantes dos concorrentes. Além disso, dada a mencionada similitude na estrutura de custos, suspeita-se que a política pode gerar ganhos de margem das montadoras. A magnitude do benefício fiscal pode gerar, portanto, vantagens que afetam a concorrência no setor. A soma dos benefícios alcança R$ 5 bilhões por ano.

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Um caso particular evidencia os efeitos danosos da política. Em 2014, uma montadora inaugurou um novo polo automotivo no município de Goiana (PE). Um ano antes, sua fábrica em Minas Gerais respondia por 22,0% da produção nacional. Essa participação caiu para 15,3% no ano seguinte ao da instalação da unidade de Pernambuco. Entre 2015 e 2019, Minas Gerais foi o estado que mais perdeu participação (-11,3%) e Pernambuco, o que mais ganhou (+7,5%). Tais dados reforçam a hipótese de mera transferência de parte dos investimentos e empregos de MG para PE, em razão do benefício da política no Nordeste. O atual patamar de empregos em Pernambuco, que pode refletir o total de empregos da montadora, é semelhante ao de 2010.

Tudo indica, pois, que não houve elevação agregada relevante dos empregos nos últimos anos. Pode-se concluir que os benefícios fiscais concedidos às montadoras instaladas nas regiões Norte, Nordeste e Centro não devem ter contribuído para elevar o potencial de crescimento do país. Teria sido mero desperdício, indicando que a prorrogação desses benefícios não tem a menor justificativa.

Os incentivos fiscais à fabricação de veículos nas regiões Norte, Nordeste e Centro-Oeste são operacionalizados mediante crédito presumido do IPI, tributo que é uma das bases para cálculo dos fundos de participação dos Estados e municípios (FPE e FPM). Entre 1998 e 2022, a política reduziu em R$ 25 bilhões o valor transferido pela União em favor desses fundos. Pior, as perdas são relativamente maiores nos Estados que ocupam as últimas posições no ranking de PIB per capita. O Amapá, que é relativamente o maior perdedor, é também o último classificado nesse ranking.

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Desse modo, os Estados das regiões Norte, Nordeste e Centro Oeste são proporcionalmente os maiores prejudicados pela política de concessão de benefícios fiscais a montadoras que ali produzem. Isso porque seus fundos de participação são os maiores perdedores. Até Pernambuco, onde se situa a montadora beneficiada com a política, sofre redução no seu FPM.

Por tudo que aqui se expõe, não dá para entender por que senadores que representam os Estados menos desenvolvidos do país, exatamente os que são prejudicados pelos benefícios concedidos à indústria automobilística, nos termos aqui mencionados, tenham apoiado a prorrogação desses benefícios. Espera-se, assim, que os deputados eleitos por essas mesmas regiões reeditem o voto proferido na votação da PEC 45 e rejeitem a prorrogação de um benefício fiscal tão injustificável.

*Maílson da Nóbrega, ex-ministro da Fazenda. Sócio da Tendências Consultoria

Com razão, a Câmara dos Deputados rejeitou, na votação da proposta de reforma tributária (PEC 45), a prorrogação, para 2032, do benefício fiscal de que gozam fábricas da indústria automobilística cujos veículos sejam fabricados nas regiões Norte, Nordeste e Centro-Oeste. Foi uma decisão correta, baseada em evidências indiscutíveis, como se verá adiante. Apesar disso, a vantagem foi ressuscitada no texto aprovado pelo Senado.

Por qualquer ângulo que se analise essa política, fica cabalmente demonstrado que ela gera elevada ineficiência, acarretando ainda efeitos negativos na concorrência do setor, o que desestimula investimentos. Isso equivale ao que acontece quando monopólios e oligopólios causam danos ao adequado funcionamento de uma economia de mercado.

Maílson da Nóbrega Foto: Divulgação

Não param aí as más consequências desse benefício fiscal. Estudos mostram que, para cada seis reais de gastos tributários, as montadoras que operam nessas regiões geram diretamente apenas um real de salário nos empregos criados. Comparações feitas com o Bolsa Família (BF) indicam que os salários dos seus empregados e seus efeitos multiplicadores geram benefícios sociais muito inferiores. Adicionalmente, dadas as suas condicionalidades, o BF tem maior capacidade de interiorização e consequências positivas mais amplas no longo prazo.

A política tampouco se justifica quando se consideram os custos de produção nas regiões abrangidas, o que desautorizaria a concessão do benefício fiscal. De fato, os custos de fabricação de automóveis em outras regiões não são superiores às do Norte, Nordeste e Centro Oeste. Embora sejam maiores os desembolsos com fretes e matérias primas, estas últimas regiões exibem vantagens com remuneração e encargos sociais. Por isso, modelos produzidos nas áreas objeto do benefício fiscal não têm menor preço. Adicionalmente, dada a estrutura similar de custos, não haveria justificativa plausível para o apoio oficial.

Os veículos fabricados são majoritariamente de luxo. Não são vendidos por preços médios menores do que os de modelos semelhantes dos concorrentes. Além disso, dada a mencionada similitude na estrutura de custos, suspeita-se que a política pode gerar ganhos de margem das montadoras. A magnitude do benefício fiscal pode gerar, portanto, vantagens que afetam a concorrência no setor. A soma dos benefícios alcança R$ 5 bilhões por ano.

Um caso particular evidencia os efeitos danosos da política. Em 2014, uma montadora inaugurou um novo polo automotivo no município de Goiana (PE). Um ano antes, sua fábrica em Minas Gerais respondia por 22,0% da produção nacional. Essa participação caiu para 15,3% no ano seguinte ao da instalação da unidade de Pernambuco. Entre 2015 e 2019, Minas Gerais foi o estado que mais perdeu participação (-11,3%) e Pernambuco, o que mais ganhou (+7,5%). Tais dados reforçam a hipótese de mera transferência de parte dos investimentos e empregos de MG para PE, em razão do benefício da política no Nordeste. O atual patamar de empregos em Pernambuco, que pode refletir o total de empregos da montadora, é semelhante ao de 2010.

Tudo indica, pois, que não houve elevação agregada relevante dos empregos nos últimos anos. Pode-se concluir que os benefícios fiscais concedidos às montadoras instaladas nas regiões Norte, Nordeste e Centro não devem ter contribuído para elevar o potencial de crescimento do país. Teria sido mero desperdício, indicando que a prorrogação desses benefícios não tem a menor justificativa.

Os incentivos fiscais à fabricação de veículos nas regiões Norte, Nordeste e Centro-Oeste são operacionalizados mediante crédito presumido do IPI, tributo que é uma das bases para cálculo dos fundos de participação dos Estados e municípios (FPE e FPM). Entre 1998 e 2022, a política reduziu em R$ 25 bilhões o valor transferido pela União em favor desses fundos. Pior, as perdas são relativamente maiores nos Estados que ocupam as últimas posições no ranking de PIB per capita. O Amapá, que é relativamente o maior perdedor, é também o último classificado nesse ranking.

Desse modo, os Estados das regiões Norte, Nordeste e Centro Oeste são proporcionalmente os maiores prejudicados pela política de concessão de benefícios fiscais a montadoras que ali produzem. Isso porque seus fundos de participação são os maiores perdedores. Até Pernambuco, onde se situa a montadora beneficiada com a política, sofre redução no seu FPM.

Por tudo que aqui se expõe, não dá para entender por que senadores que representam os Estados menos desenvolvidos do país, exatamente os que são prejudicados pelos benefícios concedidos à indústria automobilística, nos termos aqui mencionados, tenham apoiado a prorrogação desses benefícios. Espera-se, assim, que os deputados eleitos por essas mesmas regiões reeditem o voto proferido na votação da PEC 45 e rejeitem a prorrogação de um benefício fiscal tão injustificável.

*Maílson da Nóbrega, ex-ministro da Fazenda. Sócio da Tendências Consultoria

Com razão, a Câmara dos Deputados rejeitou, na votação da proposta de reforma tributária (PEC 45), a prorrogação, para 2032, do benefício fiscal de que gozam fábricas da indústria automobilística cujos veículos sejam fabricados nas regiões Norte, Nordeste e Centro-Oeste. Foi uma decisão correta, baseada em evidências indiscutíveis, como se verá adiante. Apesar disso, a vantagem foi ressuscitada no texto aprovado pelo Senado.

Por qualquer ângulo que se analise essa política, fica cabalmente demonstrado que ela gera elevada ineficiência, acarretando ainda efeitos negativos na concorrência do setor, o que desestimula investimentos. Isso equivale ao que acontece quando monopólios e oligopólios causam danos ao adequado funcionamento de uma economia de mercado.

Maílson da Nóbrega Foto: Divulgação

Não param aí as más consequências desse benefício fiscal. Estudos mostram que, para cada seis reais de gastos tributários, as montadoras que operam nessas regiões geram diretamente apenas um real de salário nos empregos criados. Comparações feitas com o Bolsa Família (BF) indicam que os salários dos seus empregados e seus efeitos multiplicadores geram benefícios sociais muito inferiores. Adicionalmente, dadas as suas condicionalidades, o BF tem maior capacidade de interiorização e consequências positivas mais amplas no longo prazo.

A política tampouco se justifica quando se consideram os custos de produção nas regiões abrangidas, o que desautorizaria a concessão do benefício fiscal. De fato, os custos de fabricação de automóveis em outras regiões não são superiores às do Norte, Nordeste e Centro Oeste. Embora sejam maiores os desembolsos com fretes e matérias primas, estas últimas regiões exibem vantagens com remuneração e encargos sociais. Por isso, modelos produzidos nas áreas objeto do benefício fiscal não têm menor preço. Adicionalmente, dada a estrutura similar de custos, não haveria justificativa plausível para o apoio oficial.

Os veículos fabricados são majoritariamente de luxo. Não são vendidos por preços médios menores do que os de modelos semelhantes dos concorrentes. Além disso, dada a mencionada similitude na estrutura de custos, suspeita-se que a política pode gerar ganhos de margem das montadoras. A magnitude do benefício fiscal pode gerar, portanto, vantagens que afetam a concorrência no setor. A soma dos benefícios alcança R$ 5 bilhões por ano.

Um caso particular evidencia os efeitos danosos da política. Em 2014, uma montadora inaugurou um novo polo automotivo no município de Goiana (PE). Um ano antes, sua fábrica em Minas Gerais respondia por 22,0% da produção nacional. Essa participação caiu para 15,3% no ano seguinte ao da instalação da unidade de Pernambuco. Entre 2015 e 2019, Minas Gerais foi o estado que mais perdeu participação (-11,3%) e Pernambuco, o que mais ganhou (+7,5%). Tais dados reforçam a hipótese de mera transferência de parte dos investimentos e empregos de MG para PE, em razão do benefício da política no Nordeste. O atual patamar de empregos em Pernambuco, que pode refletir o total de empregos da montadora, é semelhante ao de 2010.

Tudo indica, pois, que não houve elevação agregada relevante dos empregos nos últimos anos. Pode-se concluir que os benefícios fiscais concedidos às montadoras instaladas nas regiões Norte, Nordeste e Centro não devem ter contribuído para elevar o potencial de crescimento do país. Teria sido mero desperdício, indicando que a prorrogação desses benefícios não tem a menor justificativa.

Os incentivos fiscais à fabricação de veículos nas regiões Norte, Nordeste e Centro-Oeste são operacionalizados mediante crédito presumido do IPI, tributo que é uma das bases para cálculo dos fundos de participação dos Estados e municípios (FPE e FPM). Entre 1998 e 2022, a política reduziu em R$ 25 bilhões o valor transferido pela União em favor desses fundos. Pior, as perdas são relativamente maiores nos Estados que ocupam as últimas posições no ranking de PIB per capita. O Amapá, que é relativamente o maior perdedor, é também o último classificado nesse ranking.

Desse modo, os Estados das regiões Norte, Nordeste e Centro Oeste são proporcionalmente os maiores prejudicados pela política de concessão de benefícios fiscais a montadoras que ali produzem. Isso porque seus fundos de participação são os maiores perdedores. Até Pernambuco, onde se situa a montadora beneficiada com a política, sofre redução no seu FPM.

Por tudo que aqui se expõe, não dá para entender por que senadores que representam os Estados menos desenvolvidos do país, exatamente os que são prejudicados pelos benefícios concedidos à indústria automobilística, nos termos aqui mencionados, tenham apoiado a prorrogação desses benefícios. Espera-se, assim, que os deputados eleitos por essas mesmas regiões reeditem o voto proferido na votação da PEC 45 e rejeitem a prorrogação de um benefício fiscal tão injustificável.

*Maílson da Nóbrega, ex-ministro da Fazenda. Sócio da Tendências Consultoria

Com razão, a Câmara dos Deputados rejeitou, na votação da proposta de reforma tributária (PEC 45), a prorrogação, para 2032, do benefício fiscal de que gozam fábricas da indústria automobilística cujos veículos sejam fabricados nas regiões Norte, Nordeste e Centro-Oeste. Foi uma decisão correta, baseada em evidências indiscutíveis, como se verá adiante. Apesar disso, a vantagem foi ressuscitada no texto aprovado pelo Senado.

Por qualquer ângulo que se analise essa política, fica cabalmente demonstrado que ela gera elevada ineficiência, acarretando ainda efeitos negativos na concorrência do setor, o que desestimula investimentos. Isso equivale ao que acontece quando monopólios e oligopólios causam danos ao adequado funcionamento de uma economia de mercado.

Maílson da Nóbrega Foto: Divulgação

Não param aí as más consequências desse benefício fiscal. Estudos mostram que, para cada seis reais de gastos tributários, as montadoras que operam nessas regiões geram diretamente apenas um real de salário nos empregos criados. Comparações feitas com o Bolsa Família (BF) indicam que os salários dos seus empregados e seus efeitos multiplicadores geram benefícios sociais muito inferiores. Adicionalmente, dadas as suas condicionalidades, o BF tem maior capacidade de interiorização e consequências positivas mais amplas no longo prazo.

A política tampouco se justifica quando se consideram os custos de produção nas regiões abrangidas, o que desautorizaria a concessão do benefício fiscal. De fato, os custos de fabricação de automóveis em outras regiões não são superiores às do Norte, Nordeste e Centro Oeste. Embora sejam maiores os desembolsos com fretes e matérias primas, estas últimas regiões exibem vantagens com remuneração e encargos sociais. Por isso, modelos produzidos nas áreas objeto do benefício fiscal não têm menor preço. Adicionalmente, dada a estrutura similar de custos, não haveria justificativa plausível para o apoio oficial.

Os veículos fabricados são majoritariamente de luxo. Não são vendidos por preços médios menores do que os de modelos semelhantes dos concorrentes. Além disso, dada a mencionada similitude na estrutura de custos, suspeita-se que a política pode gerar ganhos de margem das montadoras. A magnitude do benefício fiscal pode gerar, portanto, vantagens que afetam a concorrência no setor. A soma dos benefícios alcança R$ 5 bilhões por ano.

Um caso particular evidencia os efeitos danosos da política. Em 2014, uma montadora inaugurou um novo polo automotivo no município de Goiana (PE). Um ano antes, sua fábrica em Minas Gerais respondia por 22,0% da produção nacional. Essa participação caiu para 15,3% no ano seguinte ao da instalação da unidade de Pernambuco. Entre 2015 e 2019, Minas Gerais foi o estado que mais perdeu participação (-11,3%) e Pernambuco, o que mais ganhou (+7,5%). Tais dados reforçam a hipótese de mera transferência de parte dos investimentos e empregos de MG para PE, em razão do benefício da política no Nordeste. O atual patamar de empregos em Pernambuco, que pode refletir o total de empregos da montadora, é semelhante ao de 2010.

Tudo indica, pois, que não houve elevação agregada relevante dos empregos nos últimos anos. Pode-se concluir que os benefícios fiscais concedidos às montadoras instaladas nas regiões Norte, Nordeste e Centro não devem ter contribuído para elevar o potencial de crescimento do país. Teria sido mero desperdício, indicando que a prorrogação desses benefícios não tem a menor justificativa.

Os incentivos fiscais à fabricação de veículos nas regiões Norte, Nordeste e Centro-Oeste são operacionalizados mediante crédito presumido do IPI, tributo que é uma das bases para cálculo dos fundos de participação dos Estados e municípios (FPE e FPM). Entre 1998 e 2022, a política reduziu em R$ 25 bilhões o valor transferido pela União em favor desses fundos. Pior, as perdas são relativamente maiores nos Estados que ocupam as últimas posições no ranking de PIB per capita. O Amapá, que é relativamente o maior perdedor, é também o último classificado nesse ranking.

Desse modo, os Estados das regiões Norte, Nordeste e Centro Oeste são proporcionalmente os maiores prejudicados pela política de concessão de benefícios fiscais a montadoras que ali produzem. Isso porque seus fundos de participação são os maiores perdedores. Até Pernambuco, onde se situa a montadora beneficiada com a política, sofre redução no seu FPM.

Por tudo que aqui se expõe, não dá para entender por que senadores que representam os Estados menos desenvolvidos do país, exatamente os que são prejudicados pelos benefícios concedidos à indústria automobilística, nos termos aqui mencionados, tenham apoiado a prorrogação desses benefícios. Espera-se, assim, que os deputados eleitos por essas mesmas regiões reeditem o voto proferido na votação da PEC 45 e rejeitem a prorrogação de um benefício fiscal tão injustificável.

*Maílson da Nóbrega, ex-ministro da Fazenda. Sócio da Tendências Consultoria

Com razão, a Câmara dos Deputados rejeitou, na votação da proposta de reforma tributária (PEC 45), a prorrogação, para 2032, do benefício fiscal de que gozam fábricas da indústria automobilística cujos veículos sejam fabricados nas regiões Norte, Nordeste e Centro-Oeste. Foi uma decisão correta, baseada em evidências indiscutíveis, como se verá adiante. Apesar disso, a vantagem foi ressuscitada no texto aprovado pelo Senado.

Por qualquer ângulo que se analise essa política, fica cabalmente demonstrado que ela gera elevada ineficiência, acarretando ainda efeitos negativos na concorrência do setor, o que desestimula investimentos. Isso equivale ao que acontece quando monopólios e oligopólios causam danos ao adequado funcionamento de uma economia de mercado.

Maílson da Nóbrega Foto: Divulgação

Não param aí as más consequências desse benefício fiscal. Estudos mostram que, para cada seis reais de gastos tributários, as montadoras que operam nessas regiões geram diretamente apenas um real de salário nos empregos criados. Comparações feitas com o Bolsa Família (BF) indicam que os salários dos seus empregados e seus efeitos multiplicadores geram benefícios sociais muito inferiores. Adicionalmente, dadas as suas condicionalidades, o BF tem maior capacidade de interiorização e consequências positivas mais amplas no longo prazo.

A política tampouco se justifica quando se consideram os custos de produção nas regiões abrangidas, o que desautorizaria a concessão do benefício fiscal. De fato, os custos de fabricação de automóveis em outras regiões não são superiores às do Norte, Nordeste e Centro Oeste. Embora sejam maiores os desembolsos com fretes e matérias primas, estas últimas regiões exibem vantagens com remuneração e encargos sociais. Por isso, modelos produzidos nas áreas objeto do benefício fiscal não têm menor preço. Adicionalmente, dada a estrutura similar de custos, não haveria justificativa plausível para o apoio oficial.

Os veículos fabricados são majoritariamente de luxo. Não são vendidos por preços médios menores do que os de modelos semelhantes dos concorrentes. Além disso, dada a mencionada similitude na estrutura de custos, suspeita-se que a política pode gerar ganhos de margem das montadoras. A magnitude do benefício fiscal pode gerar, portanto, vantagens que afetam a concorrência no setor. A soma dos benefícios alcança R$ 5 bilhões por ano.

Um caso particular evidencia os efeitos danosos da política. Em 2014, uma montadora inaugurou um novo polo automotivo no município de Goiana (PE). Um ano antes, sua fábrica em Minas Gerais respondia por 22,0% da produção nacional. Essa participação caiu para 15,3% no ano seguinte ao da instalação da unidade de Pernambuco. Entre 2015 e 2019, Minas Gerais foi o estado que mais perdeu participação (-11,3%) e Pernambuco, o que mais ganhou (+7,5%). Tais dados reforçam a hipótese de mera transferência de parte dos investimentos e empregos de MG para PE, em razão do benefício da política no Nordeste. O atual patamar de empregos em Pernambuco, que pode refletir o total de empregos da montadora, é semelhante ao de 2010.

Tudo indica, pois, que não houve elevação agregada relevante dos empregos nos últimos anos. Pode-se concluir que os benefícios fiscais concedidos às montadoras instaladas nas regiões Norte, Nordeste e Centro não devem ter contribuído para elevar o potencial de crescimento do país. Teria sido mero desperdício, indicando que a prorrogação desses benefícios não tem a menor justificativa.

Os incentivos fiscais à fabricação de veículos nas regiões Norte, Nordeste e Centro-Oeste são operacionalizados mediante crédito presumido do IPI, tributo que é uma das bases para cálculo dos fundos de participação dos Estados e municípios (FPE e FPM). Entre 1998 e 2022, a política reduziu em R$ 25 bilhões o valor transferido pela União em favor desses fundos. Pior, as perdas são relativamente maiores nos Estados que ocupam as últimas posições no ranking de PIB per capita. O Amapá, que é relativamente o maior perdedor, é também o último classificado nesse ranking.

Desse modo, os Estados das regiões Norte, Nordeste e Centro Oeste são proporcionalmente os maiores prejudicados pela política de concessão de benefícios fiscais a montadoras que ali produzem. Isso porque seus fundos de participação são os maiores perdedores. Até Pernambuco, onde se situa a montadora beneficiada com a política, sofre redução no seu FPM.

Por tudo que aqui se expõe, não dá para entender por que senadores que representam os Estados menos desenvolvidos do país, exatamente os que são prejudicados pelos benefícios concedidos à indústria automobilística, nos termos aqui mencionados, tenham apoiado a prorrogação desses benefícios. Espera-se, assim, que os deputados eleitos por essas mesmas regiões reeditem o voto proferido na votação da PEC 45 e rejeitem a prorrogação de um benefício fiscal tão injustificável.

*Maílson da Nóbrega, ex-ministro da Fazenda. Sócio da Tendências Consultoria

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