Há basicamente dois modelos de atuação das Cortes Superiores pelo mundo.
No primeiro modelo, adotado pelo Brasil, o Supremo Tribunal Federal, além de Corte Constitucional, cuja competência é julgar a constitucionalidade das leis, também é o juiz natural da causa para processar na esfera criminal diversas autoridades com prerrogativa de foro, além de analisar recursos em última instância (recurso extraordinário).
No segundo modelo, adotado pela maioria dos países democráticos de primeiro mundo, a Suprema Corte é apenas uma corte constitucional, responsável por julgar a constitucionalidade das leis, o que reduz drasticamente o número de processos em tramitação.
É bom ressaltar que, na esmagadora maioria desses países, ou não há prerrogativa de foro, ou ela é limitada a poucas autoridades.
Não é preciso ser versado em direito para saber que nosso modelo transforma a Suprema Corte em uma tartaruga manca, levando à prescrição inúmeros crimes, quiçá a maioria.
Ademais, não raras vezes, a Suprema Corte, que possui a competência de julgar ações penais, fá-lo com viés ideológico, movida por razões políticas, o que é incompatível com o direito penal, que deve se ater a fatos e não à pessoa do acusado, relegando a segundo plano uma das características do direito penal, que é a impessoalidade, além de ferir o princípio da isonomia em que todos devem ser tratados da mesma maneira.
Além disso, comumente, o Supremo Tribunal Federal tem se imiscuído indevidamente nos demais Poderes, administrando o país, que é função do Executivo, e até mesmo criando leis, atribuição típica do Legislativo.
Não cabe à Suprema Corte implementar políticas públicas e invadir competência discricionária do Governo Federal, cujo representante máximo foi eleito para tanto. A gestão da pandemia pelos Estados, contrariando lei expressa que dava ao governo federal essa atribuição de forma geral, bem como a própria Constituição Federal, que determina caber à União instituir as regras gerais na gestão da saúde, é um dos exemplos marcantes de ativismo judicial.
Outro exemplo notório foi a cassação da nomeação do diretor da Polícia Federal, Alexandre Ramagem, de competência exclusiva do presidente da República, no mandato do então presidente Bolsonaro.
Na área da segurança pública, cuja competência é, em regra, dos Estados, o Pretório Excelso chegou a proibir operações policiais regulares nas comunidades do Rio de Janeiro, limitando-as a situações excepcionais, atividade típica esta dos órgãos de segurança pública e não de magistrados, sem praticamente nenhum conhecimento sobre o tema.
Além desses casos, há vários outros, inclusive relacionados à isenção ou redução de impostos.
Na seara legislativa os atos se repetem. Quem elabora lei são os parlamentares eleitos para essa finalidade. No entanto, a Excelsa Corte, de forma totalmente anômala e inusitada, criou o crime de homofobia por decisão judicial, mediante aplicação de analogia contra o réu, violando frontalmente o princípio da reserva legal.
Há, ainda, processo em andamento, que pretende a liberação do aborto até determinado mês de gestação. E já foi concluído o julgamento do processo em que foi descriminalizada a posse de até 40 g de maconha para consumo pessoal, matérias estas que deveriam ser discutidas e apreciadas pelos representantes do povo eleitos para essa finalidade.
A última investida na competência do Congresso Nacional é a regulação das redes sociais, que já é feita pelo Marco Civil da Internet a contento, tanto que os Parlamentares entenderam não haver nada a alterar. Porém, o STF, de modo anômalo, está julgando ação e pretende modificar dispositivos da referida lei, que se encontra vigente, válida e eficaz.
Como se trata de última instância, não há mais a quem recorrer, inexistindo o duplo grau de jurisdição, o que torna ainda mais deficiente o modelo adotado pelo Brasil, mormente em se tratando de ações penais, que deveriam se limitar a ter no polo passivo aquele que efetivamente possuir prerrogativa de foro pela natureza do cargo público ocupado por mandamento constitucional.
Claro que os detentores de prerrogativa de foro e os criminosos em geral, notadamente do colarinho branco, que pagam competentes e caros advogados, quando soltos, preferem nosso modelo, visto conseguirem protelar os processos de forma a alcançar a prescrição em inúmeros casos ou mesmo atrasá-los de tal maneira, que acabarão com o julgamento de extinção da punibilidade pela morte do investigado ou acusado.
O melhor seria, para a quase totalidade dos jurisdicionados e para o Brasil, que houvesse alteração da Constituição Federal para reformular a atuação do Supremo Tribunal Federal para ser apenas uma corte constitucional, tendo como função exclusiva julgar a adequação da legislação às normas constitucionais em ações diretas com essa finalidade, deixando para os demais tribunais o julgamento de ações penais e recursos em geral, exceto neste último caso quando houver evidente e relevante questão constitucional.
Também deve ser discutido outro modelo de escolha dos Ministros da Corte, visto que o atual não tem se mostrado adequado.
Cabe ao presidente da República sua indicação e nomeação dentre cidadãos com mais de trinta e cinco e menos de sessenta e cinco anos de idade, de notável saber jurídico e reputação ilibada. São requisitos impostos pela Constituição Federal.
O indicado será sabatinado por 27 Senadores integrantes da Comissão de Constituição e Justiça (CCJ). Caso aprovado por maioria simples (dos presentes) em votação secreta, caberá ao plenário da Casa referendar a indicação por maioria absoluta (41 votos) dos 81 possíveis.
Seria um modelo interessante se os Senadores realmente verificassem a presença dos requisitos para a aprovação da escolha, o que nem sempre ocorre.
Há outros modelos de escolha pelo mundo e o mandato temporário pode ser uma solução, muito embora possa ensejar mudanças de entendimento com o término do mandato de um ministro e a chegada de outro por meio de eleição, nomeação pelo Congresso Nacional, concurso público ou escolha pelos membros do Poder Judiciário, dentre outros métodos.
Enfim, não me parece boa a atual forma de nomeação e tampouco a competência demasiadamente alargada da Corte, deixando de lado sua verdadeira vocação, que é a defesa da ordem constitucional.