Especial para o Estadão - A Justiça do Trabalho de São Bernardo do Campo, no ABC paulista, decidiu manter a demissão por justa causa de um trabalhador de uma montadora que proferiu falas de cunho racista contra um colega. Para a juíza Renata Curiati Tibério, ao chamar o colega de “negão de Diadema” em um contexto discriminatório e racista, o ex-funcionário cometeu uma falta grave o suficiente para justificar o rompimento do contrato de trabalho imposto pela empresa.
Segundo os autos, em setembro de 2023, houve uma discussão entre os trabalhadores após uma reunião do sindicato, em que foi informado que haveria uma terceirização do setor em que trabalhavam. O funcionário interpretou que um dos colegas teria concordado com a decisão da entidade e o chamou de “baba-ovo”, “puxa-saco da Comissão” e “negão de Diadema”.
Ao ser demitido, o trabalhador argumentou que o “desentendimento” com o colega não configura a falta grave necessária para sustentar o desligamento por justa causa. No entanto, a magistrada entendeu que, no contexto da fala, o operário sugeriu que o colega, enquanto homem negro, não poderia tomar o partido do sindicato na questão envolvendo a terceirização do setor.
“Ou seja, o reclamante concluiu, a partir da cor da pele do colega de trabalho, que este não teria o direito de se posicionar livremente sobre a questão discutida na reunião e teria o dever de se comportar de uma forma específica”, considerou.
Renata Curiati Tibério ressalta que a conduta do ex-funcionário minou, por completo, “a confiança na relação com o empregador, que tem o dever de zelar por um ambiente de trabalho sadio e respeitoso”. O alvo da injúria racial testemunhou na ação, afirmando que foi ofendido pelo colega, que fez uma reclamação formal na empresa e chegou a iniciar um Boletim de Ocorrência na Delegacia, mas não quis dar seguimento.
No pedido, o trabalhador autor da ofensa afirmou que estava em tratamento psiquiátrico, que se desculpou e foi perdoado pelo colega. Destacou que o aviso de dispensa não mencionou a injúria racial e que tudo não passou de um “mero desentendimento”. A ação também pontua que, após o episódio, o trabalhador passou a ter “sua honra questionada e a ser tratado com desdém, de forma humilhante e injustificada”.
A juíza da 8ª Vara do Trabalho de São Bernardo do Campo entendeu que o fato de o ofendido ter perdoado o ex-funcionário não influencia em nada na análise do caso e que não haveria necessidade de repetir, no aviso de dispensa, a ofensa racial. “A conduta do reclamante atingiu um colega de trabalho e sua ex-empregadora, mas apenas as consequências em relação a esta última interessam na presente demanda”, destacou Renata Curiati Tibério.
Ela também considerou que os atestados médicos e as receitas juntadas pelo autor das ofensas ao processo não comprovaram um tratamento para bipolaridade ou uma incapacidade, por motivos de saúde, de responder pelos seus atos.