Neste mês de dezembro, o Acordo de Paris completou cinco anos. É esta data que marca também o momento no qual os 189 países signatários devem atualizar as suas metas nacionais. Na Europa que, a meu ver, lidera este processo, a Comissão Europeia anunciou que a nova meta da União Europeia para 2030 será a redução de até 55% da emissão de gases do efeito estufa em relação aos níveis de emissão de 1990 - em 2015 a meta era de 40%. Mais, o bloco quer equilibrar suas emissões de gás carbônico - no que chamam de climate neutral - até 2050. Tal medida vem a tempo de endereçarmos a urgência e consciência que temos que tomar pois estamos muito próximos do limite de aquecimento global sem que o estrago ja feito tomem proporções exponenciais irreparáveis.
Empresas como Apple, Microsoft, Patagonia, Tesla, Google entre outras já começaram a direcionar suas responsabilidades em suas respectivas cadeias produtivas e, assim como elas, muitas pessoas já começaram a ter uma atitude mais responsável com relação ao consumo. Nesse contexto é essencial que a sociedade conheça, discuta e cobre os impactos da construção civil, como a conhecemos hoje, no meio ambiente. Para se ter uma ideia do tamanho do problema, 39% das emissões de gases de efeito estufa hoje vêm das construções e manutenção de edifícios - ar-condicionado, aquecimento, operação em geral. O processo de obras representa 21%. Se formos fatiar apenas a cadeia produtiva do aço e do concreto - dois elementos centrais neste tipo de construção - falamos de 11% das emissões globais de carbono - é como se fosse o terceiro país mais emissor de CO2 do planeta.
Diante destes números e desse impacto, é urgente que mudemos a forma como fomentamos este tipo de atividade que claramente não é sustentável. Não adianta pensarmos em consumo consciente de roupas por exemplo, morando e trabalhando em lugares que, para serem feitos, tiraram alguns anos de qualidade de vida de nossos netos. O consumo consciente terá que passar necessariamente pelo mercado imobiliário.
Voltando ao Acordo de Paris, considero um avanço que a meta da França tenha ido na direção de dirimir os efeitos da construção baseada em aço e concreto: o país firmou o compromisso de que, a partir de 2022, todos os novos edifícios públicos do país serão construídos com uso de madeira ou outros materiais sustentáveis numa proporção de pelo menos 50% das edificações. Neste sentido, o Canadá tem leis de incentivo para quem realiza construção com madeira e, com isso, já viu sua floresta de Pinus se expandir nos últimos anos.
Há 20 anos, Áustria, Canadá, Austrália, Estados Unidos e outros países europeus perceberam que dá para fazer diferente nesta área e constroem com base na madeira. A técnica mais utilizada é o CLT - Cross Laminated Timber, que chamamos aqui de madeira engenheirada.
O Brasil, um país continental, com inúmeras fontes renováveis, grande extensão territorial, industria florestal forte e profissional e clima propício tem grande potencial para ver estas construções mais sustentáveis como uma realidade - o setor de papel e celulose é um bom exemplo disso. Além disso, nossa agenda climática, embora ainda não esteja nos patamares que gostaríamos, nos traz responsabilidades e todos os setores precisam se mover na direção das metas traçadas, inclusive para superá-las. Por isso é preciso rapidamente colocarmos em ação práticas como estas.
Ao longo dos últimos dois. anos venho pesquisando como é realizada a construção em madeira em países que já têm este material como realidade em seus processos construtivos. Os benefícios são realmente verdadeiros e em grande quantidade. Primeiramente, temos o aspecto ambiental e para mencionar apenas uma vantagem, os edifícios chegam a ser carbono negativo, já que a madeira "sequestra" gás carbônico do meio ambiente e o armazena. Mas há outras qualidades que ainda não são conhecida por aqui, como a funcionalidade da madeira, um material leve, extremamente resistente e modelável que permite mais rapidez e escala fabril. A diminuição do tempo de obra - perto da metade dos prédios baseados em aço e concreto - e um canteiro de obras sem ruídos, sem maquinários pesados e praticamente sem desperdícios. Temos também um aumento do bem-estar das pessoas que convivem em ambientes construídos com madeira, um elemento natural agradável aos olhos, que acaba influenciando até na produtividade de equipes que trabalham em prédios como esses, apontam estudos. Benefícios relacionados à arquitetura também são visivelmente identificados, já que a própria madeira aparente da estrutura do prédio já contribui para a decoração, exigindo menos acabamentos e reforçando a tendência da biofilia, aplicada por diversos designers já há algum tempo. O aspecto financeiro é outra variável importante, visto que existe espaço para termos custos potencialmente menores com a disseminação desse processo construtivo. Além disso a perspectiva de redução de tempo da construção também traz uma queda expressiva do risco de desenvolvimento imobiliário e aumento dos retornos, uma vez que se ativa aquele imovel muito mais cedo para renda.
Acreditando que há muito espaço para esse olhar disruptivo na construção civil e, diante de tudo o que pudemos ver acontecendo no exterior, há um ano criamos a Noah, construtech que vai desenvolver os primeiros edifícios corporativos de madeira do Brasil. Com esta iniciativa, entendemos que conseguiremos envolver vários atores da construção civil, convidando-os a pensar de uma forma mais verde, sustentável e tecnológica.
Além do mais, é urgente a responsabilidade de atualizar nosso estilo de vida, adaptando-o para uma forma que prejudique menos o ambiente. Temos convicção de que é possível mudar a lógica da cadeia produtiva do setor construtivo em busca de um mundo mais sustentável. Estas mudanças são fundamentais para nós e as novas gerações. E deve ser não só um propósito mas um compromisso de todos nós.
*Nicolaos Theodorakis, CEO e fundador da Noah. Sócio e investidor da Alfa Realty e sócio da FinCapital