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Opinião|Os excessivos ônus aos proprietários de bens tombados


Sob a ótica dos proprietários, as restrições imputadas ao bem desde a instauração do processo de tombamento afetam o seu uso, disponibilidade e valor de mercado. Tudo isso sem qualquer oportunidade de contraditório, incentivo ou contrapartida do poder público para a adequada manutenção e preservação do bem

Por Marcus Vinícius Siqueira Dezem

É indiscutível a importância da proteção do patrimônio histórico-cultural, essencial para a preservação da identidade, memória coletiva, educação e diversidade cultural de uma sociedade.

No Brasil, a proteção do patrimônio histórico-cultural sempre foi uma preocupação de estatura constitucional: desde a Carta Magna de 1937, observa-se a previsão de proteção, bem como a necessidade dos chamados “cuidados especiais da Nação, dos Estados e dos Municípios” com os “monumentos históricos, artísticos e naturais”.

Desde então, diversas foram as leis, entidades governamentais e políticas públicas criadas ao longo do tempo para o desempenho dessa função. Iniciando-se pela criação do “Serviço do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional”, antiga denominação do Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (“IPHAN”), também em 1937.

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Não obstante essa longa trajetória, o sistema de proteção do patrimônio histórico-cultural ainda enfrenta desafios até os dias atuais.

Percebe-se que há um desequilíbrio entre os “interesses difusos” (leia-se, o interesse de toda a coletividade pela proteção dos bens histórico-culturais) e os interesses individuais inerentes à propriedade, causando, por vezes, ônus desproporcionais ao titular de um bem tombado.

Sob esse aspecto, destaca-se os casos em que o órgão de proteção promove a abertura de processo de tombamento e já estabelece, de antemão, rigorosas restrições aos bens atingidos, muitas vezes antecipando o próprio regime completo de preservação que derivará do tombamento definitivo. Não bastasse isso, é comum que, a partir desse momento, o processo seja negligenciado pelo órgão competente, levando anos ou até décadas para a conclusão e edição do ato formal de tombamento.

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Essa mora pode causar prejuízos, seja para os proprietários, seja para o próprio patrimônio histórico-cultural ou mesmo para o planejamento e desenvolvimento da cidade.

Sob a ótica dos proprietários, as restrições imputadas ao bem desde a instauração do processo de tombamento afetam o seu uso, disponibilidade e valor de mercado. Tudo isso sem qualquer oportunidade de contraditório, incentivo ou contrapartida do Poder Público para a adequada manutenção e preservação do bem.

Vale mencionar que a recente revisão do Plano Diretor de São Paulo trouxe mecanismos para mitigação desses ônus, como por exemplo, a possibilidade de renovação da chamada “Transferência do Direito de Construir” (permissão dada ao proprietário de um imóvel urbano para transferir seu potencial construtivo não utilizado a outro imóvel) a cada 10 ou 15 anos.

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Tais mecanismos, no entanto, não têm se mostrado suficientes, vide o “Casarão das Muletas”, que foi a ruína por falta de recursos para a sua proteção e manutenção, e os oito prédios recentemente erigidos em imóveis tombados sem alvará de construção, todos no bairro da Bela Vista, em São Paulo.

Outra alternativa seria ingressar com demanda judicial, fundamentada na mora da administração pública na conclusão dos processos de tombamento. Atualmente é possível verificar precedentes em que o Poder Judiciário fixou prazo máximo para decisão final pelos órgãos de tombamento, sob a justificativa de que o particular não pode ser obrigado a esperar indefinidamente pela atuação do Poder Público. Em outros casos mais pontuais, reconheceu a caducidade do processo de tombamento.

Por outro lado, sob a ótica do planejamento da cidade, o instituto do tombamento pode ser utilizado indevidamente para a defesa de interesses de particulares pequenos grupos, gerando ainda mais insegurança jurídica.

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Por essa razão, é fundamental que os processos sejam conduzidos com critérios objetivos, reduzindo-se, ao máximo, a interferência na política urbanística e ordenação do território local de competência municipal, conforme destacado, inclusive, pelo órgão de tombamento do Município de São Paulo (CONPRESP) quando do parecer de abertura do processo de tombamento de centenas de imóveis no bairro dos Pinheiros.

Segundo o relator do referido processo é “imprescindível que se proceda o cotejo do estudo preliminar, de natureza histórica e arquitetônica, já acostado aos autos, com os prováveis impactos que eventual decisão final deste E. CONPRESP causará no regular desenvolvimento da política urbana municipal”.

Sob o aspecto judicial, malgrado os ônus acima destacados, o particular ainda poderá ser responsabilizado por eventuais danos ao bem tombado mesmo que não detenha mais a sua posse ou propriedade.

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Em julgamento recente, o Superior Tribunal de Justiça (AREsp 1.886.951-RJ) entendeu pela possibilidade de um proprietário de um bem tombado ser responsabilizado, solidariamente com o Poder Público, por danos (materiais e morais coletivos) mesmo após ter sido regularmente desapropriado, com base em princípios do direito ambiental em que “todas as responsabilidades se somam: nenhuma pode excluir a outra”.

Esse julgado, somado a todos os demais aspectos acima, reforça a conclusão inicial de que há um evidente desequilíbrio entre o interesse na proteção do patrimônio histórico-cultural e os elevados ônus que tal sistema de proteção pode trazer aos proprietários.

Por fim, destaca-se que há iniciativas legislativas que procuram reverter esse cenário, tal como o Projeto de Lei nº 422/2024 que tramite na Câmara dos Deputados, que visa estabelecer um prazo de 90 dias para o tombamento provisório, a partir da notificação ao proprietário.

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Essas iniciativas, no entanto, devem ser combinadas com esforços dos próprios órgãos de tombamento para uma análise célere e objetiva do processos, de forma a tornar o sistema de proteção ao patrimônio histórico-cultural mais eficaz, previsível e transparente.

É indiscutível a importância da proteção do patrimônio histórico-cultural, essencial para a preservação da identidade, memória coletiva, educação e diversidade cultural de uma sociedade.

No Brasil, a proteção do patrimônio histórico-cultural sempre foi uma preocupação de estatura constitucional: desde a Carta Magna de 1937, observa-se a previsão de proteção, bem como a necessidade dos chamados “cuidados especiais da Nação, dos Estados e dos Municípios” com os “monumentos históricos, artísticos e naturais”.

Desde então, diversas foram as leis, entidades governamentais e políticas públicas criadas ao longo do tempo para o desempenho dessa função. Iniciando-se pela criação do “Serviço do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional”, antiga denominação do Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (“IPHAN”), também em 1937.

Não obstante essa longa trajetória, o sistema de proteção do patrimônio histórico-cultural ainda enfrenta desafios até os dias atuais.

Percebe-se que há um desequilíbrio entre os “interesses difusos” (leia-se, o interesse de toda a coletividade pela proteção dos bens histórico-culturais) e os interesses individuais inerentes à propriedade, causando, por vezes, ônus desproporcionais ao titular de um bem tombado.

Sob esse aspecto, destaca-se os casos em que o órgão de proteção promove a abertura de processo de tombamento e já estabelece, de antemão, rigorosas restrições aos bens atingidos, muitas vezes antecipando o próprio regime completo de preservação que derivará do tombamento definitivo. Não bastasse isso, é comum que, a partir desse momento, o processo seja negligenciado pelo órgão competente, levando anos ou até décadas para a conclusão e edição do ato formal de tombamento.

Essa mora pode causar prejuízos, seja para os proprietários, seja para o próprio patrimônio histórico-cultural ou mesmo para o planejamento e desenvolvimento da cidade.

Sob a ótica dos proprietários, as restrições imputadas ao bem desde a instauração do processo de tombamento afetam o seu uso, disponibilidade e valor de mercado. Tudo isso sem qualquer oportunidade de contraditório, incentivo ou contrapartida do Poder Público para a adequada manutenção e preservação do bem.

Vale mencionar que a recente revisão do Plano Diretor de São Paulo trouxe mecanismos para mitigação desses ônus, como por exemplo, a possibilidade de renovação da chamada “Transferência do Direito de Construir” (permissão dada ao proprietário de um imóvel urbano para transferir seu potencial construtivo não utilizado a outro imóvel) a cada 10 ou 15 anos.

Tais mecanismos, no entanto, não têm se mostrado suficientes, vide o “Casarão das Muletas”, que foi a ruína por falta de recursos para a sua proteção e manutenção, e os oito prédios recentemente erigidos em imóveis tombados sem alvará de construção, todos no bairro da Bela Vista, em São Paulo.

Outra alternativa seria ingressar com demanda judicial, fundamentada na mora da administração pública na conclusão dos processos de tombamento. Atualmente é possível verificar precedentes em que o Poder Judiciário fixou prazo máximo para decisão final pelos órgãos de tombamento, sob a justificativa de que o particular não pode ser obrigado a esperar indefinidamente pela atuação do Poder Público. Em outros casos mais pontuais, reconheceu a caducidade do processo de tombamento.

Por outro lado, sob a ótica do planejamento da cidade, o instituto do tombamento pode ser utilizado indevidamente para a defesa de interesses de particulares pequenos grupos, gerando ainda mais insegurança jurídica.

Por essa razão, é fundamental que os processos sejam conduzidos com critérios objetivos, reduzindo-se, ao máximo, a interferência na política urbanística e ordenação do território local de competência municipal, conforme destacado, inclusive, pelo órgão de tombamento do Município de São Paulo (CONPRESP) quando do parecer de abertura do processo de tombamento de centenas de imóveis no bairro dos Pinheiros.

Segundo o relator do referido processo é “imprescindível que se proceda o cotejo do estudo preliminar, de natureza histórica e arquitetônica, já acostado aos autos, com os prováveis impactos que eventual decisão final deste E. CONPRESP causará no regular desenvolvimento da política urbana municipal”.

Sob o aspecto judicial, malgrado os ônus acima destacados, o particular ainda poderá ser responsabilizado por eventuais danos ao bem tombado mesmo que não detenha mais a sua posse ou propriedade.

Em julgamento recente, o Superior Tribunal de Justiça (AREsp 1.886.951-RJ) entendeu pela possibilidade de um proprietário de um bem tombado ser responsabilizado, solidariamente com o Poder Público, por danos (materiais e morais coletivos) mesmo após ter sido regularmente desapropriado, com base em princípios do direito ambiental em que “todas as responsabilidades se somam: nenhuma pode excluir a outra”.

Esse julgado, somado a todos os demais aspectos acima, reforça a conclusão inicial de que há um evidente desequilíbrio entre o interesse na proteção do patrimônio histórico-cultural e os elevados ônus que tal sistema de proteção pode trazer aos proprietários.

Por fim, destaca-se que há iniciativas legislativas que procuram reverter esse cenário, tal como o Projeto de Lei nº 422/2024 que tramite na Câmara dos Deputados, que visa estabelecer um prazo de 90 dias para o tombamento provisório, a partir da notificação ao proprietário.

Essas iniciativas, no entanto, devem ser combinadas com esforços dos próprios órgãos de tombamento para uma análise célere e objetiva do processos, de forma a tornar o sistema de proteção ao patrimônio histórico-cultural mais eficaz, previsível e transparente.

É indiscutível a importância da proteção do patrimônio histórico-cultural, essencial para a preservação da identidade, memória coletiva, educação e diversidade cultural de uma sociedade.

No Brasil, a proteção do patrimônio histórico-cultural sempre foi uma preocupação de estatura constitucional: desde a Carta Magna de 1937, observa-se a previsão de proteção, bem como a necessidade dos chamados “cuidados especiais da Nação, dos Estados e dos Municípios” com os “monumentos históricos, artísticos e naturais”.

Desde então, diversas foram as leis, entidades governamentais e políticas públicas criadas ao longo do tempo para o desempenho dessa função. Iniciando-se pela criação do “Serviço do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional”, antiga denominação do Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (“IPHAN”), também em 1937.

Não obstante essa longa trajetória, o sistema de proteção do patrimônio histórico-cultural ainda enfrenta desafios até os dias atuais.

Percebe-se que há um desequilíbrio entre os “interesses difusos” (leia-se, o interesse de toda a coletividade pela proteção dos bens histórico-culturais) e os interesses individuais inerentes à propriedade, causando, por vezes, ônus desproporcionais ao titular de um bem tombado.

Sob esse aspecto, destaca-se os casos em que o órgão de proteção promove a abertura de processo de tombamento e já estabelece, de antemão, rigorosas restrições aos bens atingidos, muitas vezes antecipando o próprio regime completo de preservação que derivará do tombamento definitivo. Não bastasse isso, é comum que, a partir desse momento, o processo seja negligenciado pelo órgão competente, levando anos ou até décadas para a conclusão e edição do ato formal de tombamento.

Essa mora pode causar prejuízos, seja para os proprietários, seja para o próprio patrimônio histórico-cultural ou mesmo para o planejamento e desenvolvimento da cidade.

Sob a ótica dos proprietários, as restrições imputadas ao bem desde a instauração do processo de tombamento afetam o seu uso, disponibilidade e valor de mercado. Tudo isso sem qualquer oportunidade de contraditório, incentivo ou contrapartida do Poder Público para a adequada manutenção e preservação do bem.

Vale mencionar que a recente revisão do Plano Diretor de São Paulo trouxe mecanismos para mitigação desses ônus, como por exemplo, a possibilidade de renovação da chamada “Transferência do Direito de Construir” (permissão dada ao proprietário de um imóvel urbano para transferir seu potencial construtivo não utilizado a outro imóvel) a cada 10 ou 15 anos.

Tais mecanismos, no entanto, não têm se mostrado suficientes, vide o “Casarão das Muletas”, que foi a ruína por falta de recursos para a sua proteção e manutenção, e os oito prédios recentemente erigidos em imóveis tombados sem alvará de construção, todos no bairro da Bela Vista, em São Paulo.

Outra alternativa seria ingressar com demanda judicial, fundamentada na mora da administração pública na conclusão dos processos de tombamento. Atualmente é possível verificar precedentes em que o Poder Judiciário fixou prazo máximo para decisão final pelos órgãos de tombamento, sob a justificativa de que o particular não pode ser obrigado a esperar indefinidamente pela atuação do Poder Público. Em outros casos mais pontuais, reconheceu a caducidade do processo de tombamento.

Por outro lado, sob a ótica do planejamento da cidade, o instituto do tombamento pode ser utilizado indevidamente para a defesa de interesses de particulares pequenos grupos, gerando ainda mais insegurança jurídica.

Por essa razão, é fundamental que os processos sejam conduzidos com critérios objetivos, reduzindo-se, ao máximo, a interferência na política urbanística e ordenação do território local de competência municipal, conforme destacado, inclusive, pelo órgão de tombamento do Município de São Paulo (CONPRESP) quando do parecer de abertura do processo de tombamento de centenas de imóveis no bairro dos Pinheiros.

Segundo o relator do referido processo é “imprescindível que se proceda o cotejo do estudo preliminar, de natureza histórica e arquitetônica, já acostado aos autos, com os prováveis impactos que eventual decisão final deste E. CONPRESP causará no regular desenvolvimento da política urbana municipal”.

Sob o aspecto judicial, malgrado os ônus acima destacados, o particular ainda poderá ser responsabilizado por eventuais danos ao bem tombado mesmo que não detenha mais a sua posse ou propriedade.

Em julgamento recente, o Superior Tribunal de Justiça (AREsp 1.886.951-RJ) entendeu pela possibilidade de um proprietário de um bem tombado ser responsabilizado, solidariamente com o Poder Público, por danos (materiais e morais coletivos) mesmo após ter sido regularmente desapropriado, com base em princípios do direito ambiental em que “todas as responsabilidades se somam: nenhuma pode excluir a outra”.

Esse julgado, somado a todos os demais aspectos acima, reforça a conclusão inicial de que há um evidente desequilíbrio entre o interesse na proteção do patrimônio histórico-cultural e os elevados ônus que tal sistema de proteção pode trazer aos proprietários.

Por fim, destaca-se que há iniciativas legislativas que procuram reverter esse cenário, tal como o Projeto de Lei nº 422/2024 que tramite na Câmara dos Deputados, que visa estabelecer um prazo de 90 dias para o tombamento provisório, a partir da notificação ao proprietário.

Essas iniciativas, no entanto, devem ser combinadas com esforços dos próprios órgãos de tombamento para uma análise célere e objetiva do processos, de forma a tornar o sistema de proteção ao patrimônio histórico-cultural mais eficaz, previsível e transparente.

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