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Os softwares e a tributação


Por Priscila Calil
Priscila Calil. FOTO: DIVULGAÇÃO  

A tributação das operações com softwares sempre foi um tema que trouxe muita insegurança jurídica aos contribuintes, na medida em que tanto os Municípios quanto os Estados cobravam a sua parcela e os contribuintes não sabiam para qual ente federativo deveriam recolher o tributo nessas operações, sem correr o risco de serem surpreendidos por cobranças adicionais.

Recentemente, o Plenário do Supremo Tribunal Federal (STF) formou um novo entendimento sobre a tributação dos softwares, ao concluir o julgamento das Ações Diretas de Inconstitucionalidade - ADIs nº 1945 e 5659, no sentido de que a atividade de licenciamento ou cessão de uso de softwares está sujeita exclusivamente ao Imposto sobre Serviços (ISS), afastando, assim, a cobrança pelos Estados do Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços (ICMS).

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Essa decisão traz sensível mudança de entendimento sobre o tema, tendo em vista que o STF já havia enfrentado esse assunto, em 1998, no julgamento do RE nº 176.626, em que se estabeleceu a famosa distinção entre os "softwares de prateleira" (softwares produzidos em larga escala), e os "softwares sob encomenda" (desenvolvidos para atender às demandas específicas de um cliente), e, com isso, determinou a incidência do ICMS e do ISS, respectivamente.

Com a recente decisão do STF, a atividade de licenciamento ou cessão de uso de softwares fica sujeita exclusivamente ao ISS nas duas situações acima.

Aspecto importante refere-se aos efeitos dessa decisão, que são vinculantes já a partir de 03/03/21, data de publicação da ata de julgamento das referidas ADIs . O STF propõe oito tipos de modulação dos efeitos da decisão: Contribuinte que recolheram somente o ICMS: não têm direito à restituição do ICMS, e o ISS pretérito não pode ser cobrado; Contribuintes que recolheram somente o ISS:  confirmação da validade do pagamento e o ICMS não pode ser cobrado; Contribuintes que não recolheram ICMS nem ISS: somente podem ser cobrados do ISS , observado prazo de cinco anos; Contribuintes que recolheram ICMS e ISS, mas não ingressaram com ação de repetição de indébito: podem ser restituídos do ICMS pago nos últimos cinco anos e fica validado o pagamento do ISS; Ações judiciais em andamento, movidas pelos contribuintes, questionando a incidência de ICMS: julgamento de acordo com a orientação do STF, afastando a cobrança de ICMS e com possibilidade de repetição desse imposto; Ações judiciais em andamento, movidas pelos Estados, para cobrança do ICMS: julgamento de acordo com a orientação do STF, afastando a cobrança de ICMS; Ações judiciais em andamento, movidas pelos Municípios, para cobrança do ISS: julgamento de acordo com a orientação do STF, reconhecendo a incidência de ISS, com exceção dos casos em que o contribuinte recolheu o ICMS; e Ações judiciais em andamento, movidas pelos contribuintes, questionando a incidência de ISS: julgamento de acordo com a orientação do STF, reconhecendo a incidência de ISS.

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Em relação à modulação dos efeitos da decisão, chama a atenção o fato de que apenas os contribuintes que pagaram os dois tributos (ICMS e ISS) tiveram reconhecido o seu direito à restituição do ICMS, sendo que os contribuintes que pagaram somente o ICMS, não tiveram esse direito reconhecido. Muito embora exista previsão de que para esses últimos não haverá a cobrança retroativa do ISS, a nosso ver, nesse particular, a modulação merece reparo, sob pena de gerar prejuízos para alguns contribuintes.

Isso porque a alíquota de ICMS das operações com softwares varia, dependendo do Estado, de 5% a 18%, e a alíquota máxima do ISS é 5%. Assim, aquele contribuinte que recolheu o ICMS muito provavelmente arcou com carga superior ao que seria efetivamente devido, nos termos da decisão do STF, se tivesse recolhido o ISS.

Há enriquecimento ilícito do Estado nas duas situações e, portanto, ambos contribuintes deveriam ter direito a reaver os valores recolhidos indevidamente a título de ICMS, cabendo, obviamente, àqueles que não recolherem o ISS, fazê-lo agora.

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O atual posicionamento do STF sobre o assunto é relevante não só pela definição da incidência do ISS sobre as operações com softwares, mas também pela indicação da natureza jurídica dessas atividades e pelos impactos sobre a tributação das operações digitais, inclusive em âmbito federal.

Sobre remessas de valores para o exterior relativas a tais operações, a Receita Federal do Brasil (RFB) possui entendimento, baseado na decisão de 1998, no sentido de que nos casos de licenciamento ou cessão do direito de uso de programas de computador, o "software de prateleira" deve ser tratado como mercadoria e, portanto, as respectivas remessas não se sujeitam ao Imposto de Renda retido na fonte. Essa posição da RFB deverá ser alterada.

A recente decisão do STF também repercute na determinação dos percentuais de presunção de lucratividade do regime do lucro presumido (se serviço, 32% para Imposto de Renda (IR) e Contribuição Social sobre o Lucro Líquido (CSLL), e, se comércio, 8% para IR e 12% para CSLL). Isso porque as operações com softwares que vinham sendo tratadas como comércio, com a mudança de entendimento do STF, passam a ser consideradas prestação de serviços e, com isso, os percentuais de presunção de lucratividade que vinham sendo praticados pelos contribuintes saltam de 8% e 12% para 32%. A opção pelo lucro presumido, que se mostrava mais vantajosa quando baseada nos percentuais de 8% e 12%, pode não se apresentar mais como alternativa menos onerosa para as empresas desse setor a partir da aplicação do percentual de 32%, exigível no caso de prestação de serviços.

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Assim, apesar de haver segurança jurídica para eventos após a publicação do acórdão do STF, em relação ao passado há questões que deixam contribuintes em situação de absoluta insegurança em razão de o STF ter mudado seu entendimento sem levar em consideração os reflexos da modulação de efeitos para aqueles que cumpriram - ao menos à época dos fatos - as suas obrigações fiscais.

*Priscila Calil, sócia de tributário do PLKC Advogados

Priscila Calil. FOTO: DIVULGAÇÃO  

A tributação das operações com softwares sempre foi um tema que trouxe muita insegurança jurídica aos contribuintes, na medida em que tanto os Municípios quanto os Estados cobravam a sua parcela e os contribuintes não sabiam para qual ente federativo deveriam recolher o tributo nessas operações, sem correr o risco de serem surpreendidos por cobranças adicionais.

Recentemente, o Plenário do Supremo Tribunal Federal (STF) formou um novo entendimento sobre a tributação dos softwares, ao concluir o julgamento das Ações Diretas de Inconstitucionalidade - ADIs nº 1945 e 5659, no sentido de que a atividade de licenciamento ou cessão de uso de softwares está sujeita exclusivamente ao Imposto sobre Serviços (ISS), afastando, assim, a cobrança pelos Estados do Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços (ICMS).

Essa decisão traz sensível mudança de entendimento sobre o tema, tendo em vista que o STF já havia enfrentado esse assunto, em 1998, no julgamento do RE nº 176.626, em que se estabeleceu a famosa distinção entre os "softwares de prateleira" (softwares produzidos em larga escala), e os "softwares sob encomenda" (desenvolvidos para atender às demandas específicas de um cliente), e, com isso, determinou a incidência do ICMS e do ISS, respectivamente.

Com a recente decisão do STF, a atividade de licenciamento ou cessão de uso de softwares fica sujeita exclusivamente ao ISS nas duas situações acima.

Aspecto importante refere-se aos efeitos dessa decisão, que são vinculantes já a partir de 03/03/21, data de publicação da ata de julgamento das referidas ADIs . O STF propõe oito tipos de modulação dos efeitos da decisão: Contribuinte que recolheram somente o ICMS: não têm direito à restituição do ICMS, e o ISS pretérito não pode ser cobrado; Contribuintes que recolheram somente o ISS:  confirmação da validade do pagamento e o ICMS não pode ser cobrado; Contribuintes que não recolheram ICMS nem ISS: somente podem ser cobrados do ISS , observado prazo de cinco anos; Contribuintes que recolheram ICMS e ISS, mas não ingressaram com ação de repetição de indébito: podem ser restituídos do ICMS pago nos últimos cinco anos e fica validado o pagamento do ISS; Ações judiciais em andamento, movidas pelos contribuintes, questionando a incidência de ICMS: julgamento de acordo com a orientação do STF, afastando a cobrança de ICMS e com possibilidade de repetição desse imposto; Ações judiciais em andamento, movidas pelos Estados, para cobrança do ICMS: julgamento de acordo com a orientação do STF, afastando a cobrança de ICMS; Ações judiciais em andamento, movidas pelos Municípios, para cobrança do ISS: julgamento de acordo com a orientação do STF, reconhecendo a incidência de ISS, com exceção dos casos em que o contribuinte recolheu o ICMS; e Ações judiciais em andamento, movidas pelos contribuintes, questionando a incidência de ISS: julgamento de acordo com a orientação do STF, reconhecendo a incidência de ISS.

Em relação à modulação dos efeitos da decisão, chama a atenção o fato de que apenas os contribuintes que pagaram os dois tributos (ICMS e ISS) tiveram reconhecido o seu direito à restituição do ICMS, sendo que os contribuintes que pagaram somente o ICMS, não tiveram esse direito reconhecido. Muito embora exista previsão de que para esses últimos não haverá a cobrança retroativa do ISS, a nosso ver, nesse particular, a modulação merece reparo, sob pena de gerar prejuízos para alguns contribuintes.

Isso porque a alíquota de ICMS das operações com softwares varia, dependendo do Estado, de 5% a 18%, e a alíquota máxima do ISS é 5%. Assim, aquele contribuinte que recolheu o ICMS muito provavelmente arcou com carga superior ao que seria efetivamente devido, nos termos da decisão do STF, se tivesse recolhido o ISS.

Há enriquecimento ilícito do Estado nas duas situações e, portanto, ambos contribuintes deveriam ter direito a reaver os valores recolhidos indevidamente a título de ICMS, cabendo, obviamente, àqueles que não recolherem o ISS, fazê-lo agora.

O atual posicionamento do STF sobre o assunto é relevante não só pela definição da incidência do ISS sobre as operações com softwares, mas também pela indicação da natureza jurídica dessas atividades e pelos impactos sobre a tributação das operações digitais, inclusive em âmbito federal.

Sobre remessas de valores para o exterior relativas a tais operações, a Receita Federal do Brasil (RFB) possui entendimento, baseado na decisão de 1998, no sentido de que nos casos de licenciamento ou cessão do direito de uso de programas de computador, o "software de prateleira" deve ser tratado como mercadoria e, portanto, as respectivas remessas não se sujeitam ao Imposto de Renda retido na fonte. Essa posição da RFB deverá ser alterada.

A recente decisão do STF também repercute na determinação dos percentuais de presunção de lucratividade do regime do lucro presumido (se serviço, 32% para Imposto de Renda (IR) e Contribuição Social sobre o Lucro Líquido (CSLL), e, se comércio, 8% para IR e 12% para CSLL). Isso porque as operações com softwares que vinham sendo tratadas como comércio, com a mudança de entendimento do STF, passam a ser consideradas prestação de serviços e, com isso, os percentuais de presunção de lucratividade que vinham sendo praticados pelos contribuintes saltam de 8% e 12% para 32%. A opção pelo lucro presumido, que se mostrava mais vantajosa quando baseada nos percentuais de 8% e 12%, pode não se apresentar mais como alternativa menos onerosa para as empresas desse setor a partir da aplicação do percentual de 32%, exigível no caso de prestação de serviços.

Assim, apesar de haver segurança jurídica para eventos após a publicação do acórdão do STF, em relação ao passado há questões que deixam contribuintes em situação de absoluta insegurança em razão de o STF ter mudado seu entendimento sem levar em consideração os reflexos da modulação de efeitos para aqueles que cumpriram - ao menos à época dos fatos - as suas obrigações fiscais.

*Priscila Calil, sócia de tributário do PLKC Advogados

Priscila Calil. FOTO: DIVULGAÇÃO  

A tributação das operações com softwares sempre foi um tema que trouxe muita insegurança jurídica aos contribuintes, na medida em que tanto os Municípios quanto os Estados cobravam a sua parcela e os contribuintes não sabiam para qual ente federativo deveriam recolher o tributo nessas operações, sem correr o risco de serem surpreendidos por cobranças adicionais.

Recentemente, o Plenário do Supremo Tribunal Federal (STF) formou um novo entendimento sobre a tributação dos softwares, ao concluir o julgamento das Ações Diretas de Inconstitucionalidade - ADIs nº 1945 e 5659, no sentido de que a atividade de licenciamento ou cessão de uso de softwares está sujeita exclusivamente ao Imposto sobre Serviços (ISS), afastando, assim, a cobrança pelos Estados do Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços (ICMS).

Essa decisão traz sensível mudança de entendimento sobre o tema, tendo em vista que o STF já havia enfrentado esse assunto, em 1998, no julgamento do RE nº 176.626, em que se estabeleceu a famosa distinção entre os "softwares de prateleira" (softwares produzidos em larga escala), e os "softwares sob encomenda" (desenvolvidos para atender às demandas específicas de um cliente), e, com isso, determinou a incidência do ICMS e do ISS, respectivamente.

Com a recente decisão do STF, a atividade de licenciamento ou cessão de uso de softwares fica sujeita exclusivamente ao ISS nas duas situações acima.

Aspecto importante refere-se aos efeitos dessa decisão, que são vinculantes já a partir de 03/03/21, data de publicação da ata de julgamento das referidas ADIs . O STF propõe oito tipos de modulação dos efeitos da decisão: Contribuinte que recolheram somente o ICMS: não têm direito à restituição do ICMS, e o ISS pretérito não pode ser cobrado; Contribuintes que recolheram somente o ISS:  confirmação da validade do pagamento e o ICMS não pode ser cobrado; Contribuintes que não recolheram ICMS nem ISS: somente podem ser cobrados do ISS , observado prazo de cinco anos; Contribuintes que recolheram ICMS e ISS, mas não ingressaram com ação de repetição de indébito: podem ser restituídos do ICMS pago nos últimos cinco anos e fica validado o pagamento do ISS; Ações judiciais em andamento, movidas pelos contribuintes, questionando a incidência de ICMS: julgamento de acordo com a orientação do STF, afastando a cobrança de ICMS e com possibilidade de repetição desse imposto; Ações judiciais em andamento, movidas pelos Estados, para cobrança do ICMS: julgamento de acordo com a orientação do STF, afastando a cobrança de ICMS; Ações judiciais em andamento, movidas pelos Municípios, para cobrança do ISS: julgamento de acordo com a orientação do STF, reconhecendo a incidência de ISS, com exceção dos casos em que o contribuinte recolheu o ICMS; e Ações judiciais em andamento, movidas pelos contribuintes, questionando a incidência de ISS: julgamento de acordo com a orientação do STF, reconhecendo a incidência de ISS.

Em relação à modulação dos efeitos da decisão, chama a atenção o fato de que apenas os contribuintes que pagaram os dois tributos (ICMS e ISS) tiveram reconhecido o seu direito à restituição do ICMS, sendo que os contribuintes que pagaram somente o ICMS, não tiveram esse direito reconhecido. Muito embora exista previsão de que para esses últimos não haverá a cobrança retroativa do ISS, a nosso ver, nesse particular, a modulação merece reparo, sob pena de gerar prejuízos para alguns contribuintes.

Isso porque a alíquota de ICMS das operações com softwares varia, dependendo do Estado, de 5% a 18%, e a alíquota máxima do ISS é 5%. Assim, aquele contribuinte que recolheu o ICMS muito provavelmente arcou com carga superior ao que seria efetivamente devido, nos termos da decisão do STF, se tivesse recolhido o ISS.

Há enriquecimento ilícito do Estado nas duas situações e, portanto, ambos contribuintes deveriam ter direito a reaver os valores recolhidos indevidamente a título de ICMS, cabendo, obviamente, àqueles que não recolherem o ISS, fazê-lo agora.

O atual posicionamento do STF sobre o assunto é relevante não só pela definição da incidência do ISS sobre as operações com softwares, mas também pela indicação da natureza jurídica dessas atividades e pelos impactos sobre a tributação das operações digitais, inclusive em âmbito federal.

Sobre remessas de valores para o exterior relativas a tais operações, a Receita Federal do Brasil (RFB) possui entendimento, baseado na decisão de 1998, no sentido de que nos casos de licenciamento ou cessão do direito de uso de programas de computador, o "software de prateleira" deve ser tratado como mercadoria e, portanto, as respectivas remessas não se sujeitam ao Imposto de Renda retido na fonte. Essa posição da RFB deverá ser alterada.

A recente decisão do STF também repercute na determinação dos percentuais de presunção de lucratividade do regime do lucro presumido (se serviço, 32% para Imposto de Renda (IR) e Contribuição Social sobre o Lucro Líquido (CSLL), e, se comércio, 8% para IR e 12% para CSLL). Isso porque as operações com softwares que vinham sendo tratadas como comércio, com a mudança de entendimento do STF, passam a ser consideradas prestação de serviços e, com isso, os percentuais de presunção de lucratividade que vinham sendo praticados pelos contribuintes saltam de 8% e 12% para 32%. A opção pelo lucro presumido, que se mostrava mais vantajosa quando baseada nos percentuais de 8% e 12%, pode não se apresentar mais como alternativa menos onerosa para as empresas desse setor a partir da aplicação do percentual de 32%, exigível no caso de prestação de serviços.

Assim, apesar de haver segurança jurídica para eventos após a publicação do acórdão do STF, em relação ao passado há questões que deixam contribuintes em situação de absoluta insegurança em razão de o STF ter mudado seu entendimento sem levar em consideração os reflexos da modulação de efeitos para aqueles que cumpriram - ao menos à época dos fatos - as suas obrigações fiscais.

*Priscila Calil, sócia de tributário do PLKC Advogados

Priscila Calil. FOTO: DIVULGAÇÃO  

A tributação das operações com softwares sempre foi um tema que trouxe muita insegurança jurídica aos contribuintes, na medida em que tanto os Municípios quanto os Estados cobravam a sua parcela e os contribuintes não sabiam para qual ente federativo deveriam recolher o tributo nessas operações, sem correr o risco de serem surpreendidos por cobranças adicionais.

Recentemente, o Plenário do Supremo Tribunal Federal (STF) formou um novo entendimento sobre a tributação dos softwares, ao concluir o julgamento das Ações Diretas de Inconstitucionalidade - ADIs nº 1945 e 5659, no sentido de que a atividade de licenciamento ou cessão de uso de softwares está sujeita exclusivamente ao Imposto sobre Serviços (ISS), afastando, assim, a cobrança pelos Estados do Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços (ICMS).

Essa decisão traz sensível mudança de entendimento sobre o tema, tendo em vista que o STF já havia enfrentado esse assunto, em 1998, no julgamento do RE nº 176.626, em que se estabeleceu a famosa distinção entre os "softwares de prateleira" (softwares produzidos em larga escala), e os "softwares sob encomenda" (desenvolvidos para atender às demandas específicas de um cliente), e, com isso, determinou a incidência do ICMS e do ISS, respectivamente.

Com a recente decisão do STF, a atividade de licenciamento ou cessão de uso de softwares fica sujeita exclusivamente ao ISS nas duas situações acima.

Aspecto importante refere-se aos efeitos dessa decisão, que são vinculantes já a partir de 03/03/21, data de publicação da ata de julgamento das referidas ADIs . O STF propõe oito tipos de modulação dos efeitos da decisão: Contribuinte que recolheram somente o ICMS: não têm direito à restituição do ICMS, e o ISS pretérito não pode ser cobrado; Contribuintes que recolheram somente o ISS:  confirmação da validade do pagamento e o ICMS não pode ser cobrado; Contribuintes que não recolheram ICMS nem ISS: somente podem ser cobrados do ISS , observado prazo de cinco anos; Contribuintes que recolheram ICMS e ISS, mas não ingressaram com ação de repetição de indébito: podem ser restituídos do ICMS pago nos últimos cinco anos e fica validado o pagamento do ISS; Ações judiciais em andamento, movidas pelos contribuintes, questionando a incidência de ICMS: julgamento de acordo com a orientação do STF, afastando a cobrança de ICMS e com possibilidade de repetição desse imposto; Ações judiciais em andamento, movidas pelos Estados, para cobrança do ICMS: julgamento de acordo com a orientação do STF, afastando a cobrança de ICMS; Ações judiciais em andamento, movidas pelos Municípios, para cobrança do ISS: julgamento de acordo com a orientação do STF, reconhecendo a incidência de ISS, com exceção dos casos em que o contribuinte recolheu o ICMS; e Ações judiciais em andamento, movidas pelos contribuintes, questionando a incidência de ISS: julgamento de acordo com a orientação do STF, reconhecendo a incidência de ISS.

Em relação à modulação dos efeitos da decisão, chama a atenção o fato de que apenas os contribuintes que pagaram os dois tributos (ICMS e ISS) tiveram reconhecido o seu direito à restituição do ICMS, sendo que os contribuintes que pagaram somente o ICMS, não tiveram esse direito reconhecido. Muito embora exista previsão de que para esses últimos não haverá a cobrança retroativa do ISS, a nosso ver, nesse particular, a modulação merece reparo, sob pena de gerar prejuízos para alguns contribuintes.

Isso porque a alíquota de ICMS das operações com softwares varia, dependendo do Estado, de 5% a 18%, e a alíquota máxima do ISS é 5%. Assim, aquele contribuinte que recolheu o ICMS muito provavelmente arcou com carga superior ao que seria efetivamente devido, nos termos da decisão do STF, se tivesse recolhido o ISS.

Há enriquecimento ilícito do Estado nas duas situações e, portanto, ambos contribuintes deveriam ter direito a reaver os valores recolhidos indevidamente a título de ICMS, cabendo, obviamente, àqueles que não recolherem o ISS, fazê-lo agora.

O atual posicionamento do STF sobre o assunto é relevante não só pela definição da incidência do ISS sobre as operações com softwares, mas também pela indicação da natureza jurídica dessas atividades e pelos impactos sobre a tributação das operações digitais, inclusive em âmbito federal.

Sobre remessas de valores para o exterior relativas a tais operações, a Receita Federal do Brasil (RFB) possui entendimento, baseado na decisão de 1998, no sentido de que nos casos de licenciamento ou cessão do direito de uso de programas de computador, o "software de prateleira" deve ser tratado como mercadoria e, portanto, as respectivas remessas não se sujeitam ao Imposto de Renda retido na fonte. Essa posição da RFB deverá ser alterada.

A recente decisão do STF também repercute na determinação dos percentuais de presunção de lucratividade do regime do lucro presumido (se serviço, 32% para Imposto de Renda (IR) e Contribuição Social sobre o Lucro Líquido (CSLL), e, se comércio, 8% para IR e 12% para CSLL). Isso porque as operações com softwares que vinham sendo tratadas como comércio, com a mudança de entendimento do STF, passam a ser consideradas prestação de serviços e, com isso, os percentuais de presunção de lucratividade que vinham sendo praticados pelos contribuintes saltam de 8% e 12% para 32%. A opção pelo lucro presumido, que se mostrava mais vantajosa quando baseada nos percentuais de 8% e 12%, pode não se apresentar mais como alternativa menos onerosa para as empresas desse setor a partir da aplicação do percentual de 32%, exigível no caso de prestação de serviços.

Assim, apesar de haver segurança jurídica para eventos após a publicação do acórdão do STF, em relação ao passado há questões que deixam contribuintes em situação de absoluta insegurança em razão de o STF ter mudado seu entendimento sem levar em consideração os reflexos da modulação de efeitos para aqueles que cumpriram - ao menos à época dos fatos - as suas obrigações fiscais.

*Priscila Calil, sócia de tributário do PLKC Advogados

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