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Pactos antenupciais e as cláusulas existenciais


Por Joyceane Bezerra de Menezes
Joyceane Bezerra de Menezes. Foto: Divulgação

No direito de família atual, observa-se uma expansão da contratualização, prestigiando-se a autonomia privada das pessoas para delimitarem, inclusive, os contornos de sua vida conjugal. Sob essa motivação, muitos civilistas têm sustentado a expansão do objeto dos pactos antenupciais que, tradicionalmente, limitavam-se à regência das relações patrimoniais na sociedade conjugal.

Segundo o Código Civil brasileiro (CC) "É lícito aos nubentes, antes de celebrado o casamento, estipular, quanto aos seus bens, o que lhes aprouver" (art.1.639). Podem convencionar, por meio do pacto antenupcial, a opção por um dos regimes de bens típicos ou primários, assinalados em lei, ou estabelecer regras específicas quanto aos seus bens, delineando um regime jurídico patrimonial singular. No exercício dessa liberdade, esbarrarão nos limites da lei (art.1.655, CC) e da ordem pública, expressão de conteúdo aberto que pode suscitar injustificada intrusão do Estado na vida privada, se interpretada fora da legalidade constitucional.

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Nesse sentido, a considerar o direito civil-constitucional, sob influência do princípio fundamental da dignidade da pessoa humana, a ordem pública perpassa o respeito à pessoa e ao seu livre desenvolvimento. Uma vez que não haja sacrifício ou ameaça ao direito de terceiros, sobretudo, aqueles mais vulneráveis, as pessoas devem ter assegurado o direito de traçar vetores para nortear o seu projeto de vida, conforme o que entendam por melhor.

A conjugação dos arts.1.511 e 1.513, do CC, inspira o respeito a essa autonomia. O primeiro, dispõe que o casamento estabelece uma comunhão plena baseada na igualdade substancial de direitos e deveres entre os cônjuges; enquanto o segundo, veda a interferência de qualquer pessoa, de direito público ou de direito privado, nessa comunhão plena de vida que institui a família. Aplique-se o mesmo entendimento à família derivada da união estável que, emergente no mundo dos fatos, espelha o  negócio jurídico casamento.

A comunhão plena de vida evoca o compartilhamento de interesses patrimoniais e existenciais, legitimando a gestão dos projetos comuns pelo casal e a negociação quanto aos projetos individuais de cada cônjuge. À vista disso e para otimizar a harmonia conjugal, é salutar que possam estabelecer as normas que balizarão as escolhas sobre certas questões.

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Com fundamento nos princípios constitucionais da dignidade da pessoa humana e do direito geral de liberdade, é possível utilizar o pacto antenupcial para inscrever essas normas, cujo teor não poderá ferir disposição absoluta de lei, prejudicar direitos de terceiro ou a igualdade substancial entre os pactuantes. De acordo com o Enunciado no.635, da VIII Jornada de Direito Civil do CJF, "O pacto  antenupcial e o contrato de convivência podem conter cláusulas existenciais, desde que estas não violem os princípios da dignidade da pessoa humana, da igualdade entre os cônjuges e da solidariedade familiar."

Nesses termos, os nubentes poderão estipular cláusulas sobre os deveres conjugais, organização da casa, aspectos sobre a criação dos filhos ou, como no exemplo recente, chancelado pelo TJMG, estabelecer uma espécie de "indenização" a ser paga à vítima de uma traição. Coube à juíza da Vara de Registros Públicos daquele Tribunal, reconhecer a adequação da cláusula que, no seu entender, prestigia a autonomia do casal e não viola os princípios da dignidade humana, a igualdade substancial e a solidariedade familiar.

Disposições como essas se tornaram comuns entre os artistas, sendo conhecidas como cláusulas hollywoodianas. Catherine Zeta-Jones e Michael Douglas acordaram em estabelecer uma multa milionária para a vítima, em caso de adultério. Justin Timberlake e Jessica Biel também previram multa para a hipótese de traição. Além desse tipo de multa, o casal Mark Zuckerberg (criador do Facebook) e Priscilla Chan estipulou que o marido dedicaria, pelo menos, cem minutos de atenção semanal à esposa. Entre Jennifer Lopez e Ben Affleck, o acordo pré-nupcial previu o mínimo de quatro relações sexuais por semana. O pacto entre Kim Kardashian e Kanye West estabelecia que a estrela receberia o valor de um milhão de dólares por ano que permanecesse casada, limitando-se ao valor de dez anos. Nesse último caso, o casamento perdurou apenas por 72 dias.

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Conquanto não haja uma opinião unânime dos civilistas brasileiros quanto à expansão do pacto antenupcial para albergar cláusulas de natureza existencial, autores como Ana Carolina Brochado Teixeira, Ana Carla Harmatiuk Matos, Débora Gozzo, Gustavo Tepedino, Maria Berenice Dias, Maria Celina Bodin de Moraes e Rodrigo Pereira da Cunha vêm sustentando essa possibilidade. Se a ampliação do conteúdo dos pactos antenupciais está sujeita à licitude, em caso de inobservância à lei, o negócio jurídico poderá sofrer os riscos de invalidade. Exemplo de vedação legal são as estipulações sobre herança. De acordo com o art.426, do CC, a herança de pessoa viva não pode ser objeto de contratação.

*Joyceane Bezerra de Menezes, doutora em Direito pela Universidade Federal de Pernambuco. Mestre em Direito pela Universidade Federal do Ceará. Professora titular da Universidade de Fortaleza, vinculada ao Programa de Pós-Graduação Strictu Senso em Direito (Mestrado/Doutorado), na disciplina Tutela da pessoa na sociedade das incertezas. Professora associado da Universidade Federal do Ceará

Joyceane Bezerra de Menezes. Foto: Divulgação

No direito de família atual, observa-se uma expansão da contratualização, prestigiando-se a autonomia privada das pessoas para delimitarem, inclusive, os contornos de sua vida conjugal. Sob essa motivação, muitos civilistas têm sustentado a expansão do objeto dos pactos antenupciais que, tradicionalmente, limitavam-se à regência das relações patrimoniais na sociedade conjugal.

Segundo o Código Civil brasileiro (CC) "É lícito aos nubentes, antes de celebrado o casamento, estipular, quanto aos seus bens, o que lhes aprouver" (art.1.639). Podem convencionar, por meio do pacto antenupcial, a opção por um dos regimes de bens típicos ou primários, assinalados em lei, ou estabelecer regras específicas quanto aos seus bens, delineando um regime jurídico patrimonial singular. No exercício dessa liberdade, esbarrarão nos limites da lei (art.1.655, CC) e da ordem pública, expressão de conteúdo aberto que pode suscitar injustificada intrusão do Estado na vida privada, se interpretada fora da legalidade constitucional.

Nesse sentido, a considerar o direito civil-constitucional, sob influência do princípio fundamental da dignidade da pessoa humana, a ordem pública perpassa o respeito à pessoa e ao seu livre desenvolvimento. Uma vez que não haja sacrifício ou ameaça ao direito de terceiros, sobretudo, aqueles mais vulneráveis, as pessoas devem ter assegurado o direito de traçar vetores para nortear o seu projeto de vida, conforme o que entendam por melhor.

A conjugação dos arts.1.511 e 1.513, do CC, inspira o respeito a essa autonomia. O primeiro, dispõe que o casamento estabelece uma comunhão plena baseada na igualdade substancial de direitos e deveres entre os cônjuges; enquanto o segundo, veda a interferência de qualquer pessoa, de direito público ou de direito privado, nessa comunhão plena de vida que institui a família. Aplique-se o mesmo entendimento à família derivada da união estável que, emergente no mundo dos fatos, espelha o  negócio jurídico casamento.

A comunhão plena de vida evoca o compartilhamento de interesses patrimoniais e existenciais, legitimando a gestão dos projetos comuns pelo casal e a negociação quanto aos projetos individuais de cada cônjuge. À vista disso e para otimizar a harmonia conjugal, é salutar que possam estabelecer as normas que balizarão as escolhas sobre certas questões.

Com fundamento nos princípios constitucionais da dignidade da pessoa humana e do direito geral de liberdade, é possível utilizar o pacto antenupcial para inscrever essas normas, cujo teor não poderá ferir disposição absoluta de lei, prejudicar direitos de terceiro ou a igualdade substancial entre os pactuantes. De acordo com o Enunciado no.635, da VIII Jornada de Direito Civil do CJF, "O pacto  antenupcial e o contrato de convivência podem conter cláusulas existenciais, desde que estas não violem os princípios da dignidade da pessoa humana, da igualdade entre os cônjuges e da solidariedade familiar."

Nesses termos, os nubentes poderão estipular cláusulas sobre os deveres conjugais, organização da casa, aspectos sobre a criação dos filhos ou, como no exemplo recente, chancelado pelo TJMG, estabelecer uma espécie de "indenização" a ser paga à vítima de uma traição. Coube à juíza da Vara de Registros Públicos daquele Tribunal, reconhecer a adequação da cláusula que, no seu entender, prestigia a autonomia do casal e não viola os princípios da dignidade humana, a igualdade substancial e a solidariedade familiar.

Disposições como essas se tornaram comuns entre os artistas, sendo conhecidas como cláusulas hollywoodianas. Catherine Zeta-Jones e Michael Douglas acordaram em estabelecer uma multa milionária para a vítima, em caso de adultério. Justin Timberlake e Jessica Biel também previram multa para a hipótese de traição. Além desse tipo de multa, o casal Mark Zuckerberg (criador do Facebook) e Priscilla Chan estipulou que o marido dedicaria, pelo menos, cem minutos de atenção semanal à esposa. Entre Jennifer Lopez e Ben Affleck, o acordo pré-nupcial previu o mínimo de quatro relações sexuais por semana. O pacto entre Kim Kardashian e Kanye West estabelecia que a estrela receberia o valor de um milhão de dólares por ano que permanecesse casada, limitando-se ao valor de dez anos. Nesse último caso, o casamento perdurou apenas por 72 dias.

Conquanto não haja uma opinião unânime dos civilistas brasileiros quanto à expansão do pacto antenupcial para albergar cláusulas de natureza existencial, autores como Ana Carolina Brochado Teixeira, Ana Carla Harmatiuk Matos, Débora Gozzo, Gustavo Tepedino, Maria Berenice Dias, Maria Celina Bodin de Moraes e Rodrigo Pereira da Cunha vêm sustentando essa possibilidade. Se a ampliação do conteúdo dos pactos antenupciais está sujeita à licitude, em caso de inobservância à lei, o negócio jurídico poderá sofrer os riscos de invalidade. Exemplo de vedação legal são as estipulações sobre herança. De acordo com o art.426, do CC, a herança de pessoa viva não pode ser objeto de contratação.

*Joyceane Bezerra de Menezes, doutora em Direito pela Universidade Federal de Pernambuco. Mestre em Direito pela Universidade Federal do Ceará. Professora titular da Universidade de Fortaleza, vinculada ao Programa de Pós-Graduação Strictu Senso em Direito (Mestrado/Doutorado), na disciplina Tutela da pessoa na sociedade das incertezas. Professora associado da Universidade Federal do Ceará

Joyceane Bezerra de Menezes. Foto: Divulgação

No direito de família atual, observa-se uma expansão da contratualização, prestigiando-se a autonomia privada das pessoas para delimitarem, inclusive, os contornos de sua vida conjugal. Sob essa motivação, muitos civilistas têm sustentado a expansão do objeto dos pactos antenupciais que, tradicionalmente, limitavam-se à regência das relações patrimoniais na sociedade conjugal.

Segundo o Código Civil brasileiro (CC) "É lícito aos nubentes, antes de celebrado o casamento, estipular, quanto aos seus bens, o que lhes aprouver" (art.1.639). Podem convencionar, por meio do pacto antenupcial, a opção por um dos regimes de bens típicos ou primários, assinalados em lei, ou estabelecer regras específicas quanto aos seus bens, delineando um regime jurídico patrimonial singular. No exercício dessa liberdade, esbarrarão nos limites da lei (art.1.655, CC) e da ordem pública, expressão de conteúdo aberto que pode suscitar injustificada intrusão do Estado na vida privada, se interpretada fora da legalidade constitucional.

Nesse sentido, a considerar o direito civil-constitucional, sob influência do princípio fundamental da dignidade da pessoa humana, a ordem pública perpassa o respeito à pessoa e ao seu livre desenvolvimento. Uma vez que não haja sacrifício ou ameaça ao direito de terceiros, sobretudo, aqueles mais vulneráveis, as pessoas devem ter assegurado o direito de traçar vetores para nortear o seu projeto de vida, conforme o que entendam por melhor.

A conjugação dos arts.1.511 e 1.513, do CC, inspira o respeito a essa autonomia. O primeiro, dispõe que o casamento estabelece uma comunhão plena baseada na igualdade substancial de direitos e deveres entre os cônjuges; enquanto o segundo, veda a interferência de qualquer pessoa, de direito público ou de direito privado, nessa comunhão plena de vida que institui a família. Aplique-se o mesmo entendimento à família derivada da união estável que, emergente no mundo dos fatos, espelha o  negócio jurídico casamento.

A comunhão plena de vida evoca o compartilhamento de interesses patrimoniais e existenciais, legitimando a gestão dos projetos comuns pelo casal e a negociação quanto aos projetos individuais de cada cônjuge. À vista disso e para otimizar a harmonia conjugal, é salutar que possam estabelecer as normas que balizarão as escolhas sobre certas questões.

Com fundamento nos princípios constitucionais da dignidade da pessoa humana e do direito geral de liberdade, é possível utilizar o pacto antenupcial para inscrever essas normas, cujo teor não poderá ferir disposição absoluta de lei, prejudicar direitos de terceiro ou a igualdade substancial entre os pactuantes. De acordo com o Enunciado no.635, da VIII Jornada de Direito Civil do CJF, "O pacto  antenupcial e o contrato de convivência podem conter cláusulas existenciais, desde que estas não violem os princípios da dignidade da pessoa humana, da igualdade entre os cônjuges e da solidariedade familiar."

Nesses termos, os nubentes poderão estipular cláusulas sobre os deveres conjugais, organização da casa, aspectos sobre a criação dos filhos ou, como no exemplo recente, chancelado pelo TJMG, estabelecer uma espécie de "indenização" a ser paga à vítima de uma traição. Coube à juíza da Vara de Registros Públicos daquele Tribunal, reconhecer a adequação da cláusula que, no seu entender, prestigia a autonomia do casal e não viola os princípios da dignidade humana, a igualdade substancial e a solidariedade familiar.

Disposições como essas se tornaram comuns entre os artistas, sendo conhecidas como cláusulas hollywoodianas. Catherine Zeta-Jones e Michael Douglas acordaram em estabelecer uma multa milionária para a vítima, em caso de adultério. Justin Timberlake e Jessica Biel também previram multa para a hipótese de traição. Além desse tipo de multa, o casal Mark Zuckerberg (criador do Facebook) e Priscilla Chan estipulou que o marido dedicaria, pelo menos, cem minutos de atenção semanal à esposa. Entre Jennifer Lopez e Ben Affleck, o acordo pré-nupcial previu o mínimo de quatro relações sexuais por semana. O pacto entre Kim Kardashian e Kanye West estabelecia que a estrela receberia o valor de um milhão de dólares por ano que permanecesse casada, limitando-se ao valor de dez anos. Nesse último caso, o casamento perdurou apenas por 72 dias.

Conquanto não haja uma opinião unânime dos civilistas brasileiros quanto à expansão do pacto antenupcial para albergar cláusulas de natureza existencial, autores como Ana Carolina Brochado Teixeira, Ana Carla Harmatiuk Matos, Débora Gozzo, Gustavo Tepedino, Maria Berenice Dias, Maria Celina Bodin de Moraes e Rodrigo Pereira da Cunha vêm sustentando essa possibilidade. Se a ampliação do conteúdo dos pactos antenupciais está sujeita à licitude, em caso de inobservância à lei, o negócio jurídico poderá sofrer os riscos de invalidade. Exemplo de vedação legal são as estipulações sobre herança. De acordo com o art.426, do CC, a herança de pessoa viva não pode ser objeto de contratação.

*Joyceane Bezerra de Menezes, doutora em Direito pela Universidade Federal de Pernambuco. Mestre em Direito pela Universidade Federal do Ceará. Professora titular da Universidade de Fortaleza, vinculada ao Programa de Pós-Graduação Strictu Senso em Direito (Mestrado/Doutorado), na disciplina Tutela da pessoa na sociedade das incertezas. Professora associado da Universidade Federal do Ceará

Joyceane Bezerra de Menezes. Foto: Divulgação

No direito de família atual, observa-se uma expansão da contratualização, prestigiando-se a autonomia privada das pessoas para delimitarem, inclusive, os contornos de sua vida conjugal. Sob essa motivação, muitos civilistas têm sustentado a expansão do objeto dos pactos antenupciais que, tradicionalmente, limitavam-se à regência das relações patrimoniais na sociedade conjugal.

Segundo o Código Civil brasileiro (CC) "É lícito aos nubentes, antes de celebrado o casamento, estipular, quanto aos seus bens, o que lhes aprouver" (art.1.639). Podem convencionar, por meio do pacto antenupcial, a opção por um dos regimes de bens típicos ou primários, assinalados em lei, ou estabelecer regras específicas quanto aos seus bens, delineando um regime jurídico patrimonial singular. No exercício dessa liberdade, esbarrarão nos limites da lei (art.1.655, CC) e da ordem pública, expressão de conteúdo aberto que pode suscitar injustificada intrusão do Estado na vida privada, se interpretada fora da legalidade constitucional.

Nesse sentido, a considerar o direito civil-constitucional, sob influência do princípio fundamental da dignidade da pessoa humana, a ordem pública perpassa o respeito à pessoa e ao seu livre desenvolvimento. Uma vez que não haja sacrifício ou ameaça ao direito de terceiros, sobretudo, aqueles mais vulneráveis, as pessoas devem ter assegurado o direito de traçar vetores para nortear o seu projeto de vida, conforme o que entendam por melhor.

A conjugação dos arts.1.511 e 1.513, do CC, inspira o respeito a essa autonomia. O primeiro, dispõe que o casamento estabelece uma comunhão plena baseada na igualdade substancial de direitos e deveres entre os cônjuges; enquanto o segundo, veda a interferência de qualquer pessoa, de direito público ou de direito privado, nessa comunhão plena de vida que institui a família. Aplique-se o mesmo entendimento à família derivada da união estável que, emergente no mundo dos fatos, espelha o  negócio jurídico casamento.

A comunhão plena de vida evoca o compartilhamento de interesses patrimoniais e existenciais, legitimando a gestão dos projetos comuns pelo casal e a negociação quanto aos projetos individuais de cada cônjuge. À vista disso e para otimizar a harmonia conjugal, é salutar que possam estabelecer as normas que balizarão as escolhas sobre certas questões.

Com fundamento nos princípios constitucionais da dignidade da pessoa humana e do direito geral de liberdade, é possível utilizar o pacto antenupcial para inscrever essas normas, cujo teor não poderá ferir disposição absoluta de lei, prejudicar direitos de terceiro ou a igualdade substancial entre os pactuantes. De acordo com o Enunciado no.635, da VIII Jornada de Direito Civil do CJF, "O pacto  antenupcial e o contrato de convivência podem conter cláusulas existenciais, desde que estas não violem os princípios da dignidade da pessoa humana, da igualdade entre os cônjuges e da solidariedade familiar."

Nesses termos, os nubentes poderão estipular cláusulas sobre os deveres conjugais, organização da casa, aspectos sobre a criação dos filhos ou, como no exemplo recente, chancelado pelo TJMG, estabelecer uma espécie de "indenização" a ser paga à vítima de uma traição. Coube à juíza da Vara de Registros Públicos daquele Tribunal, reconhecer a adequação da cláusula que, no seu entender, prestigia a autonomia do casal e não viola os princípios da dignidade humana, a igualdade substancial e a solidariedade familiar.

Disposições como essas se tornaram comuns entre os artistas, sendo conhecidas como cláusulas hollywoodianas. Catherine Zeta-Jones e Michael Douglas acordaram em estabelecer uma multa milionária para a vítima, em caso de adultério. Justin Timberlake e Jessica Biel também previram multa para a hipótese de traição. Além desse tipo de multa, o casal Mark Zuckerberg (criador do Facebook) e Priscilla Chan estipulou que o marido dedicaria, pelo menos, cem minutos de atenção semanal à esposa. Entre Jennifer Lopez e Ben Affleck, o acordo pré-nupcial previu o mínimo de quatro relações sexuais por semana. O pacto entre Kim Kardashian e Kanye West estabelecia que a estrela receberia o valor de um milhão de dólares por ano que permanecesse casada, limitando-se ao valor de dez anos. Nesse último caso, o casamento perdurou apenas por 72 dias.

Conquanto não haja uma opinião unânime dos civilistas brasileiros quanto à expansão do pacto antenupcial para albergar cláusulas de natureza existencial, autores como Ana Carolina Brochado Teixeira, Ana Carla Harmatiuk Matos, Débora Gozzo, Gustavo Tepedino, Maria Berenice Dias, Maria Celina Bodin de Moraes e Rodrigo Pereira da Cunha vêm sustentando essa possibilidade. Se a ampliação do conteúdo dos pactos antenupciais está sujeita à licitude, em caso de inobservância à lei, o negócio jurídico poderá sofrer os riscos de invalidade. Exemplo de vedação legal são as estipulações sobre herança. De acordo com o art.426, do CC, a herança de pessoa viva não pode ser objeto de contratação.

*Joyceane Bezerra de Menezes, doutora em Direito pela Universidade Federal de Pernambuco. Mestre em Direito pela Universidade Federal do Ceará. Professora titular da Universidade de Fortaleza, vinculada ao Programa de Pós-Graduação Strictu Senso em Direito (Mestrado/Doutorado), na disciplina Tutela da pessoa na sociedade das incertezas. Professora associado da Universidade Federal do Ceará

Joyceane Bezerra de Menezes. Foto: Divulgação

No direito de família atual, observa-se uma expansão da contratualização, prestigiando-se a autonomia privada das pessoas para delimitarem, inclusive, os contornos de sua vida conjugal. Sob essa motivação, muitos civilistas têm sustentado a expansão do objeto dos pactos antenupciais que, tradicionalmente, limitavam-se à regência das relações patrimoniais na sociedade conjugal.

Segundo o Código Civil brasileiro (CC) "É lícito aos nubentes, antes de celebrado o casamento, estipular, quanto aos seus bens, o que lhes aprouver" (art.1.639). Podem convencionar, por meio do pacto antenupcial, a opção por um dos regimes de bens típicos ou primários, assinalados em lei, ou estabelecer regras específicas quanto aos seus bens, delineando um regime jurídico patrimonial singular. No exercício dessa liberdade, esbarrarão nos limites da lei (art.1.655, CC) e da ordem pública, expressão de conteúdo aberto que pode suscitar injustificada intrusão do Estado na vida privada, se interpretada fora da legalidade constitucional.

Nesse sentido, a considerar o direito civil-constitucional, sob influência do princípio fundamental da dignidade da pessoa humana, a ordem pública perpassa o respeito à pessoa e ao seu livre desenvolvimento. Uma vez que não haja sacrifício ou ameaça ao direito de terceiros, sobretudo, aqueles mais vulneráveis, as pessoas devem ter assegurado o direito de traçar vetores para nortear o seu projeto de vida, conforme o que entendam por melhor.

A conjugação dos arts.1.511 e 1.513, do CC, inspira o respeito a essa autonomia. O primeiro, dispõe que o casamento estabelece uma comunhão plena baseada na igualdade substancial de direitos e deveres entre os cônjuges; enquanto o segundo, veda a interferência de qualquer pessoa, de direito público ou de direito privado, nessa comunhão plena de vida que institui a família. Aplique-se o mesmo entendimento à família derivada da união estável que, emergente no mundo dos fatos, espelha o  negócio jurídico casamento.

A comunhão plena de vida evoca o compartilhamento de interesses patrimoniais e existenciais, legitimando a gestão dos projetos comuns pelo casal e a negociação quanto aos projetos individuais de cada cônjuge. À vista disso e para otimizar a harmonia conjugal, é salutar que possam estabelecer as normas que balizarão as escolhas sobre certas questões.

Com fundamento nos princípios constitucionais da dignidade da pessoa humana e do direito geral de liberdade, é possível utilizar o pacto antenupcial para inscrever essas normas, cujo teor não poderá ferir disposição absoluta de lei, prejudicar direitos de terceiro ou a igualdade substancial entre os pactuantes. De acordo com o Enunciado no.635, da VIII Jornada de Direito Civil do CJF, "O pacto  antenupcial e o contrato de convivência podem conter cláusulas existenciais, desde que estas não violem os princípios da dignidade da pessoa humana, da igualdade entre os cônjuges e da solidariedade familiar."

Nesses termos, os nubentes poderão estipular cláusulas sobre os deveres conjugais, organização da casa, aspectos sobre a criação dos filhos ou, como no exemplo recente, chancelado pelo TJMG, estabelecer uma espécie de "indenização" a ser paga à vítima de uma traição. Coube à juíza da Vara de Registros Públicos daquele Tribunal, reconhecer a adequação da cláusula que, no seu entender, prestigia a autonomia do casal e não viola os princípios da dignidade humana, a igualdade substancial e a solidariedade familiar.

Disposições como essas se tornaram comuns entre os artistas, sendo conhecidas como cláusulas hollywoodianas. Catherine Zeta-Jones e Michael Douglas acordaram em estabelecer uma multa milionária para a vítima, em caso de adultério. Justin Timberlake e Jessica Biel também previram multa para a hipótese de traição. Além desse tipo de multa, o casal Mark Zuckerberg (criador do Facebook) e Priscilla Chan estipulou que o marido dedicaria, pelo menos, cem minutos de atenção semanal à esposa. Entre Jennifer Lopez e Ben Affleck, o acordo pré-nupcial previu o mínimo de quatro relações sexuais por semana. O pacto entre Kim Kardashian e Kanye West estabelecia que a estrela receberia o valor de um milhão de dólares por ano que permanecesse casada, limitando-se ao valor de dez anos. Nesse último caso, o casamento perdurou apenas por 72 dias.

Conquanto não haja uma opinião unânime dos civilistas brasileiros quanto à expansão do pacto antenupcial para albergar cláusulas de natureza existencial, autores como Ana Carolina Brochado Teixeira, Ana Carla Harmatiuk Matos, Débora Gozzo, Gustavo Tepedino, Maria Berenice Dias, Maria Celina Bodin de Moraes e Rodrigo Pereira da Cunha vêm sustentando essa possibilidade. Se a ampliação do conteúdo dos pactos antenupciais está sujeita à licitude, em caso de inobservância à lei, o negócio jurídico poderá sofrer os riscos de invalidade. Exemplo de vedação legal são as estipulações sobre herança. De acordo com o art.426, do CC, a herança de pessoa viva não pode ser objeto de contratação.

*Joyceane Bezerra de Menezes, doutora em Direito pela Universidade Federal de Pernambuco. Mestre em Direito pela Universidade Federal do Ceará. Professora titular da Universidade de Fortaleza, vinculada ao Programa de Pós-Graduação Strictu Senso em Direito (Mestrado/Doutorado), na disciplina Tutela da pessoa na sociedade das incertezas. Professora associado da Universidade Federal do Ceará

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