Os investigadores da Operação Última Milha querem usar os diálogos de dois policiais federais e um sargento que integravam a ‘Abin Paralela’, além de outras provas sobre a espionagem ilegal de autoridades públicas, para abastecer os inquéritos das fake news, das milícias digitais e dos atos antidemocráticos. A PF identificou “referências a rompimento democrático” por parte três expoentes da Abin paralela e diz que o trio, no mínimo, tinha “potencial conhecimento do planejamento das ações que culminaram na construção da minuta do decreto de intervenção”.
A integração entre os policiais federais e o sargento levaram a PF a concluir que as ações clandestinas na Abin ainda se relacionam com os delitos que culminaram na tentativa de abolição violência do estado democrático de direito - os atos golpistas de 8 de janeiro.
A suspeita recai sobre o agente Marcelo Araújo Bormevet e o sargento Giancarlo Gomes Rodrigues, que atuavam no Centro de Inteligência Nacional da Agência Brasileira de Inteligência sob o comando de Alexandre Ramagem, hoje deputado federal. Além deles, a PF levanta suspeitas sobre o policial Carlos Magno, que já foi alvo de fase anterior da Última Milha.
Segundo a corporação, Bormevet e Carlos Magno apresentaram “conduta de difundir desinformação, inclusive relacionada a incitação das forças armadas, durante e após segundo turno das eleições, inclusive por meio de perfis fake nos moldes praticados pela estrutura paralela de inteligência”.
Ambos acabaram deixando os quadros da Abin. Bormevet ficou cedido à Agência até setembro de 2022 e depois foi cedido à Presidência da República, até o dia 25 de dezembro daquele ano. A PF vê em tal movimentação a “integração da estrutura paralela de inteligência de Estado” à Presidência.
À época, ele manteve contato com Cargos Magno, que exerceu cargo de Coordenador-Geral de Credenciamento de Segurança e Análise de Integridade Corporativa na Abin, mas estava lotado do Ministério Público Federal.
Tal interlocução, de acordo com os investigadores, demonstra a “continuidade de produção de desinformação”, agora em razão do resultado do primeiro turno do pleito, em uma “tentativa de desestabilizar o processo eleitoral”. Em um dos diálogos, Bormevet afirma: “Vou montar um perfil e começar a escrever. Não vou ficar parado. A inércia é prejudicial. Não podemos nos furtar dessa missão”.
Na avaliação da PF, a produção e disseminação de fake news por parte de integrantes da corporação, enquanto estes atuavam em estruturas de alta administração, agravam a reprovabilidade da conduta de ambos. “Essas circunstâncias fazem com que a desinformação propagada adquira inevitavelmente um peso maior, dado o prestígio e a credibilidade associados às suas funções”.
Nos diálogos, Bormevet diz que vai mandar ao colega vídeos que baixou do Twitter. “Você pode largar o dedo” diz a Magno, quanto à disseminação da desinformação. O colega responde: “Nos grupos estou inundando e municiando a galera”.
De acordo com a PF, as ações de difusão de fake news era realizado inclusive com a incitação das Forças Armadas e a realização de greve por parte de caminhoneiros. Em um dos diálogos, no dia 27 de dezembro de 2022, os policiais falam sobre a invocação do artigo 142 – o qual bolsonaristas invocavam, erroneamente, para justificar um golpe de estado.
Além disso, antes de tal conversa, Bormevet conversou, no dia 21 de dezembro, com Giancarlo, sobre a possibilidade do então presidente assinar a “porra do decreto”. “Nosso PR imbrochável já assinou a porra do decreto?”, escreveu. Giancarlo responde: “Tá foda essa espera, se é que vai ter alguma coisa”.