Os investigadores da Operação Churrascada suspeitam que ‘intermediadores’ do desembargador Ivo de Almeida, do Tribunal de Justiça de São Paulo, usavam postos de combustíveis para receber e ‘lavar’ propinas da venda de decisões judiciais. Um posto sob monitoramento da Procuradoria-Geral da República e da Polícia Federal fica estabelecido a cerca de 300 metros do gabinete do desembargador, situado à rua Conselheiro Furtado, Centro de São Paulo.
O Estadão tem reiterado pedidos de manifestação de Ivo de Almeida. O espaço está aberto.
Alvo principal da Churrascada, o desembargador foi afastado das funções por um ano. A decisão é do ministro Og Fernandes, do Superior Tribunal de Justiça, que acolheu manifestação da Procuradoria-Geral da República.
Aos 66 anos, desde 1987 na carreira, Almeida é presidente da 1.ª Câmara Criminal do TJ paulista. Na última quinta, 20, ele foi alvo de buscas na fase ostensiva do inquérito. Os agentes apreenderam R$ 170 mil em dinheiro vivo na residência de Ivo de Almeida, além de celulares. Em seu gabinete, em um prédio da Conselheiro Furtado - onde também ficam instalados outros desembargadores criminais-, foram apreendidos computadores.
Segundo os investigadores, dois postos de combustíveis estão vinculados diretamente a Wilson Júnior e Valmi Sampaio, supostos negociadores de propina em nome do desembargador.
A PGR considera a proximidade dos postos com o gabinete do magistrado como um dado relevante, especialmente o que fica mais próximo. “Os interlocutores frequentemente se utilizavam do posto como ponto de encontro pessoal para as negociatas.”
Como mostrou o Estadão na sexta, 21, a PGR e a PF investigam, por exemplo, pagamentos que teriam sido realizados por um advogado, Luiz Pires Moraes Neto, em favor de um dos postos dias antes de o desembargador colocar um de seus clientes - condenado por roubo e estelionato - em prisão domiciliar.
A Procuradoria-Geral da República e a PF analisam detidamente Relatórios de Informação Financeira produzidos pelo Coaf (Controle ) que indicam movimentações dos investigados. Os agentes identificaram transações imobiliárias entre familiares de Valmi e de Ivo.
Com base em diálogos interceptados na Operação Churrascada, a PF supõe que as transações ‘decorrem de ajustes econômicos referentes às propinas pagas por venda de sentença e distribuição do produto do crime’.
Os investigadores também não descartam a possibilidade de lavagem de dinheiro por ‘sub ou superfaturamento das transações ou pela simulação de transações inexistentes’.
A PGR põe sob suspeita decisões de Ivo em quatro casos. O mais sensível deles envolve Romilton Hosi, um narcotraficante internacional que seria homem de confiança de Fernandinho Beira Mar - condenado a 120 anos de prisão, Beira Mar está isolado na Penitenciária Federal de Mossoró, no Rio Grande do Norte.
Os procuradores suspeitam que a propina negociada para beneficiar o aliado de Beira-Mar, condenado a mais de 39 anos de prisão, chegou a R$ 1 milhão. O valor, no entanto, não foi pago e a transação não avançou porque, segundo a investigação, para autorizar a transferência de Hosi haveria necessidade do voto de mais um desembargador da 1.ª Câmara Criminal.
COM A PALAVRA, O DESEMBARGADOR
A reportagem do Estadão tem reiterado pedidos de manifestação de Ivo de Almeida. O espaço está aberto.
As suspeitas sobre o desembargador provocaram perplexidade no Tribunal de Justiça de São Paulo, a maior Corte estadual do País - são 358 desembargadores. Muitos colegas de Ivo de Almeida, incrédulos, têm se manifestado, reservadamente, atestando sua idoneidade. O grande tribunal está em choque.
Renomados advogados criminalistas, que não são defensores do desembargador, também relataram ao Estadão que Ivo de Almeida é um magistrado correto.
“Eu o conheço há mais de 30 anos, sempre um juiz sério, honesto, correto, preocupado com a realização da Justiça”, afirma o criminalista Alberto Zacharias Toron. “Custo a acreditar que tudo isso seja verdade. Ivo de Almeida é um excelente juiz. Não sei detalhes da investigação, mas espero que tudo se resolva bem e que a inocência dele fique muito bem demonstrada.”
O advogado Eduardo Pizarro Carnelós também depõe por Ivo de Almeida. “Um magistrado que nunca se desviou do ordenamento jurídico, nem da ética. Sempre defendeu com lhaneza a todos os advogados, ouvindo com respeito suas ponderações. Homem culto, conhecedor do Direito. Por sua coerência ao julgar e seu conhecido humanismo, suas decisões não surpreendem.”
Carnelós disse que ‘lamenta o sofrimento indevidamente imposto a um homem de bem’. “Que a injustiça seja reparada o mais breve possível.”