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Polarização política e falta de unidade entre candidatos ao centro alimentam ceticismo sobre viabilidade de 'terceira via'


Por Mário Braga
Mário Braga. FOTO: ARQUIVO PESSOAL Foto: Estadão

Faltando um ano para as eleições presidenciais, pesquisas de intenção de voto apontam para uma disputa polarizada entre o presidente Jair Bolsonaro e o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva (2003-10). Em meio a um cenário econômico desafiador, incluindo alta inflação e dificuldades no avanço de uma agenda econômica pró-negócios, a tensão política e protestos ocasionais a favor e contra o governo devem seguir no radar. Porém, uma onda generalizada de agitação civil é improvável ao longo do próximo ano. Na esfera política, pré-candidatos de centro vêm esboçando tentativas de liderar candidaturas competitivas, mas o fraco desempenho nas pesquisas, a falta de consenso em torno de um nome e a ausência de uma plataforma política clara alimentam ceticismo sobre a viabilidade de uma "terceira via".

Segundo pesquisa do Datafolha publicada em 17 de setembro, o ex-presidente Lula tem 44% das intenções de voto no primeiro turno e 56% no segundo turno, enquanto Bolsonaro é a escolha de 25% dos eleitores no primeiro turno e de 31% no segundo. Ciro Gomes (PDT) tem 9% das intenções de voto e segue em terceiro lugar, mesma posição em que terminou o primeiro turno de 2018, com 12,47% dos votos válidos. Os demais prováveis candidatos se embolam com menos de 5% das intenções de voto em diferentes cenários traçados pela pesquisa.

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Os novos números trazem pouca mudança em relação a última pesquisa do instituto, realizada em julho, indicando uma cristalização da opinião pública em direção aos polos do espectro político. Bolsonaro e Lula mobilizam grande parte do eleitorado tanto em seu favor, como também em oposição ao que representam. De acordo com o Datafolha, o índice de rejeição de Lula ficou em 38% e a do presidente Bolsonaro está em 59%, mantendo a mesma taxa de julho.

O movimento revelado nas pesquisas (ou a falta dele) sugere não só uma opção dos eleitores pelo candidato de sua preferência, mas também uma escolha para inviabilizar a eleição do candidato opositor. Os altos níveis de rejeição a Bolsonaro e a Lula retroalimentam o cenário de polarização política no país. Isto diminui o espaço para que um político moderado seja capaz de apresentar uma candidatura suficientemente forte a ponto de pôr um fim ao clima de "Fla x Flu" político que prevalece no País.

Além disso, Bolsonaro e Lula já deram a largada na corrida eleitoral, seja com declarações e demonstrações para inflamar simpatizantes, seja com reuniões de bastidores para costurar apoio político. Já os centristas enfrentam uma batalha contra o relógio: quanto mais próximo do lançamento oficial das das campanhas, em agosto de 2022, menores as chances de suas candidaturas decolarem. Outro fator que reforça o ceticismo em relação à "terceira via" é a ausência de uma narrativa consistente e assertiva por parte dos pré-candidatos de centro. Sem a comunicação clara de uma ideia central que defendam, esses políticos depositam suas esperanças na tentativa de converter os altos níveis de rejeição a Bolsonaro e Lula em apoio popular para si mesmos. No entanto, em uma espécie de profecia autorrealizável às avessas por não demonstrarem, por enquanto, chances de bater Lula ou Bolsonaro nas urnas, é improvável que eleitores desembarquem de suas posições atuais e arrisquem facilitar o caminho de seus adversários ao Palácio do Planalto.

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Evitar a dispersão de votos e concentrar os eleitores de centro e os descontentes com Lula e Bolsonaro em torno de uma única candidatura parece ser uma das poucas alternativas às forças políticas que tentam romper com a polarização. No entanto, uma aliança abrangente entre pré-candidatos de centro, já no primeiro turno, segue improvável.

Temas centrais

À medida em que a inflação chega nos dois dígitos, com destaque para alta de preços de energia, combustíveis e alimentos, e o desemprego atinge 14 milhões de brasileiros, a economia será um tema ainda mais central no cenário eleitoral de 2022. Com índices de aprovação e intenção de voto persistentemente baixos, Bolsonaro deve deixar a agenda agenda pró-negócios ainda mais de lado - uma vez que já não empenhou capital político de maneira expressiva para aprovação de reformas e por vezes apoiou nos bastidores medidas de aumento do gasto público na contramão das pregações de seu ministro da Economia, Paulo Guedes. A priorização de suas chances na disputa eleitoral devem levar a um cenário de baixa previsibilidade na condução de políticas públicas e seguir causando volatilidade financeira em decorrência das preocupações fiscais no médio prazo.

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Em meio às restrições no orçamento, o presidente deve ter dificuldades em aumentar gastos públicos o suficiente a ponto de impulsionar seus índices de popularidade. Entre os desafios, estão uma saída para os precatórios sem estilhaçar completamente o teto de gastos e abalar o mercado financeiro e também atender aos interesses do centrão por emendas parlamentares para garantir apoio político no Congresso (seja para barrar um eventual processo de impeachment ou para aprovar propostas de interesse do governo). Neste cenário, mesmo que o programa Auxílio Brasil saia do papel com um benefício maior e atingindo mais famílias, parece não haver recursos suficientes para fazer desta uma bala de prata na eleição.

Para tentar garantir uma vaga no segundo turno, Bolsonaro deve continuar tentando empurrar para o colo dos governadores a culpa pelo desemprego devido às medidas restritivas adotadas durante a pandemia. Para manter o apoio de seus eleitores mais fiéis, seguirá com sua retórica conservadora, anticomunista e antiglobalista adotada em 2018. Para seguir adotando a postura anti-establishment de 2018 mesmo após acolher o "centrão" no coração do governo, o presidente vai eleger novos inimigos de ocasião entre as instituições democráticas, com os ministros do Supremo Tribunal Federal (STF) e do Tribunal Superior Eleitoral figurando no topo da lista desta vez. Por fim, para surfar no antipetismo que continua arraigado em grande parte do eleitorado, Bolsonaro seguirá associando Lula e o PT a atos de corrupção enquanto tenta empurrar quantidades cada vez maiores de poeira para debaixo do tapete - à medida que diversas investigações avançam sobre aliados e, principalmente, sobre sua família.

Na outra ponta, Lula deve apresentar-se como um político experiente, disposto a negociar com diferentes grupos políticos em prol da pacificação do país e fazer um aceno ao centro para angariar apoio de pelo menos parte dos viúvos e viúvas da terceira via. Isso não significa um abandono completo de bandeiras do PT, como foco na distribuição de renda e no papel do Estado como indutor de crescimento econômico. Na esfera internacional, o ex-presidente deve explorar a agenda ambiental no campo da infraestrutura verde, seguindo os passos do presidente dos EUA, Joe Biden, com o intuito de se diferenciar de seu adversário também na arena global.

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*Mário Braga, analista líder da Control Risks para o Brasil

Mário Braga. FOTO: ARQUIVO PESSOAL Foto: Estadão

Faltando um ano para as eleições presidenciais, pesquisas de intenção de voto apontam para uma disputa polarizada entre o presidente Jair Bolsonaro e o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva (2003-10). Em meio a um cenário econômico desafiador, incluindo alta inflação e dificuldades no avanço de uma agenda econômica pró-negócios, a tensão política e protestos ocasionais a favor e contra o governo devem seguir no radar. Porém, uma onda generalizada de agitação civil é improvável ao longo do próximo ano. Na esfera política, pré-candidatos de centro vêm esboçando tentativas de liderar candidaturas competitivas, mas o fraco desempenho nas pesquisas, a falta de consenso em torno de um nome e a ausência de uma plataforma política clara alimentam ceticismo sobre a viabilidade de uma "terceira via".

Segundo pesquisa do Datafolha publicada em 17 de setembro, o ex-presidente Lula tem 44% das intenções de voto no primeiro turno e 56% no segundo turno, enquanto Bolsonaro é a escolha de 25% dos eleitores no primeiro turno e de 31% no segundo. Ciro Gomes (PDT) tem 9% das intenções de voto e segue em terceiro lugar, mesma posição em que terminou o primeiro turno de 2018, com 12,47% dos votos válidos. Os demais prováveis candidatos se embolam com menos de 5% das intenções de voto em diferentes cenários traçados pela pesquisa.

Os novos números trazem pouca mudança em relação a última pesquisa do instituto, realizada em julho, indicando uma cristalização da opinião pública em direção aos polos do espectro político. Bolsonaro e Lula mobilizam grande parte do eleitorado tanto em seu favor, como também em oposição ao que representam. De acordo com o Datafolha, o índice de rejeição de Lula ficou em 38% e a do presidente Bolsonaro está em 59%, mantendo a mesma taxa de julho.

O movimento revelado nas pesquisas (ou a falta dele) sugere não só uma opção dos eleitores pelo candidato de sua preferência, mas também uma escolha para inviabilizar a eleição do candidato opositor. Os altos níveis de rejeição a Bolsonaro e a Lula retroalimentam o cenário de polarização política no país. Isto diminui o espaço para que um político moderado seja capaz de apresentar uma candidatura suficientemente forte a ponto de pôr um fim ao clima de "Fla x Flu" político que prevalece no País.

Além disso, Bolsonaro e Lula já deram a largada na corrida eleitoral, seja com declarações e demonstrações para inflamar simpatizantes, seja com reuniões de bastidores para costurar apoio político. Já os centristas enfrentam uma batalha contra o relógio: quanto mais próximo do lançamento oficial das das campanhas, em agosto de 2022, menores as chances de suas candidaturas decolarem. Outro fator que reforça o ceticismo em relação à "terceira via" é a ausência de uma narrativa consistente e assertiva por parte dos pré-candidatos de centro. Sem a comunicação clara de uma ideia central que defendam, esses políticos depositam suas esperanças na tentativa de converter os altos níveis de rejeição a Bolsonaro e Lula em apoio popular para si mesmos. No entanto, em uma espécie de profecia autorrealizável às avessas por não demonstrarem, por enquanto, chances de bater Lula ou Bolsonaro nas urnas, é improvável que eleitores desembarquem de suas posições atuais e arrisquem facilitar o caminho de seus adversários ao Palácio do Planalto.

Evitar a dispersão de votos e concentrar os eleitores de centro e os descontentes com Lula e Bolsonaro em torno de uma única candidatura parece ser uma das poucas alternativas às forças políticas que tentam romper com a polarização. No entanto, uma aliança abrangente entre pré-candidatos de centro, já no primeiro turno, segue improvável.

Temas centrais

À medida em que a inflação chega nos dois dígitos, com destaque para alta de preços de energia, combustíveis e alimentos, e o desemprego atinge 14 milhões de brasileiros, a economia será um tema ainda mais central no cenário eleitoral de 2022. Com índices de aprovação e intenção de voto persistentemente baixos, Bolsonaro deve deixar a agenda agenda pró-negócios ainda mais de lado - uma vez que já não empenhou capital político de maneira expressiva para aprovação de reformas e por vezes apoiou nos bastidores medidas de aumento do gasto público na contramão das pregações de seu ministro da Economia, Paulo Guedes. A priorização de suas chances na disputa eleitoral devem levar a um cenário de baixa previsibilidade na condução de políticas públicas e seguir causando volatilidade financeira em decorrência das preocupações fiscais no médio prazo.

Em meio às restrições no orçamento, o presidente deve ter dificuldades em aumentar gastos públicos o suficiente a ponto de impulsionar seus índices de popularidade. Entre os desafios, estão uma saída para os precatórios sem estilhaçar completamente o teto de gastos e abalar o mercado financeiro e também atender aos interesses do centrão por emendas parlamentares para garantir apoio político no Congresso (seja para barrar um eventual processo de impeachment ou para aprovar propostas de interesse do governo). Neste cenário, mesmo que o programa Auxílio Brasil saia do papel com um benefício maior e atingindo mais famílias, parece não haver recursos suficientes para fazer desta uma bala de prata na eleição.

Para tentar garantir uma vaga no segundo turno, Bolsonaro deve continuar tentando empurrar para o colo dos governadores a culpa pelo desemprego devido às medidas restritivas adotadas durante a pandemia. Para manter o apoio de seus eleitores mais fiéis, seguirá com sua retórica conservadora, anticomunista e antiglobalista adotada em 2018. Para seguir adotando a postura anti-establishment de 2018 mesmo após acolher o "centrão" no coração do governo, o presidente vai eleger novos inimigos de ocasião entre as instituições democráticas, com os ministros do Supremo Tribunal Federal (STF) e do Tribunal Superior Eleitoral figurando no topo da lista desta vez. Por fim, para surfar no antipetismo que continua arraigado em grande parte do eleitorado, Bolsonaro seguirá associando Lula e o PT a atos de corrupção enquanto tenta empurrar quantidades cada vez maiores de poeira para debaixo do tapete - à medida que diversas investigações avançam sobre aliados e, principalmente, sobre sua família.

Na outra ponta, Lula deve apresentar-se como um político experiente, disposto a negociar com diferentes grupos políticos em prol da pacificação do país e fazer um aceno ao centro para angariar apoio de pelo menos parte dos viúvos e viúvas da terceira via. Isso não significa um abandono completo de bandeiras do PT, como foco na distribuição de renda e no papel do Estado como indutor de crescimento econômico. Na esfera internacional, o ex-presidente deve explorar a agenda ambiental no campo da infraestrutura verde, seguindo os passos do presidente dos EUA, Joe Biden, com o intuito de se diferenciar de seu adversário também na arena global.

*Mário Braga, analista líder da Control Risks para o Brasil

Mário Braga. FOTO: ARQUIVO PESSOAL Foto: Estadão

Faltando um ano para as eleições presidenciais, pesquisas de intenção de voto apontam para uma disputa polarizada entre o presidente Jair Bolsonaro e o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva (2003-10). Em meio a um cenário econômico desafiador, incluindo alta inflação e dificuldades no avanço de uma agenda econômica pró-negócios, a tensão política e protestos ocasionais a favor e contra o governo devem seguir no radar. Porém, uma onda generalizada de agitação civil é improvável ao longo do próximo ano. Na esfera política, pré-candidatos de centro vêm esboçando tentativas de liderar candidaturas competitivas, mas o fraco desempenho nas pesquisas, a falta de consenso em torno de um nome e a ausência de uma plataforma política clara alimentam ceticismo sobre a viabilidade de uma "terceira via".

Segundo pesquisa do Datafolha publicada em 17 de setembro, o ex-presidente Lula tem 44% das intenções de voto no primeiro turno e 56% no segundo turno, enquanto Bolsonaro é a escolha de 25% dos eleitores no primeiro turno e de 31% no segundo. Ciro Gomes (PDT) tem 9% das intenções de voto e segue em terceiro lugar, mesma posição em que terminou o primeiro turno de 2018, com 12,47% dos votos válidos. Os demais prováveis candidatos se embolam com menos de 5% das intenções de voto em diferentes cenários traçados pela pesquisa.

Os novos números trazem pouca mudança em relação a última pesquisa do instituto, realizada em julho, indicando uma cristalização da opinião pública em direção aos polos do espectro político. Bolsonaro e Lula mobilizam grande parte do eleitorado tanto em seu favor, como também em oposição ao que representam. De acordo com o Datafolha, o índice de rejeição de Lula ficou em 38% e a do presidente Bolsonaro está em 59%, mantendo a mesma taxa de julho.

O movimento revelado nas pesquisas (ou a falta dele) sugere não só uma opção dos eleitores pelo candidato de sua preferência, mas também uma escolha para inviabilizar a eleição do candidato opositor. Os altos níveis de rejeição a Bolsonaro e a Lula retroalimentam o cenário de polarização política no país. Isto diminui o espaço para que um político moderado seja capaz de apresentar uma candidatura suficientemente forte a ponto de pôr um fim ao clima de "Fla x Flu" político que prevalece no País.

Além disso, Bolsonaro e Lula já deram a largada na corrida eleitoral, seja com declarações e demonstrações para inflamar simpatizantes, seja com reuniões de bastidores para costurar apoio político. Já os centristas enfrentam uma batalha contra o relógio: quanto mais próximo do lançamento oficial das das campanhas, em agosto de 2022, menores as chances de suas candidaturas decolarem. Outro fator que reforça o ceticismo em relação à "terceira via" é a ausência de uma narrativa consistente e assertiva por parte dos pré-candidatos de centro. Sem a comunicação clara de uma ideia central que defendam, esses políticos depositam suas esperanças na tentativa de converter os altos níveis de rejeição a Bolsonaro e Lula em apoio popular para si mesmos. No entanto, em uma espécie de profecia autorrealizável às avessas por não demonstrarem, por enquanto, chances de bater Lula ou Bolsonaro nas urnas, é improvável que eleitores desembarquem de suas posições atuais e arrisquem facilitar o caminho de seus adversários ao Palácio do Planalto.

Evitar a dispersão de votos e concentrar os eleitores de centro e os descontentes com Lula e Bolsonaro em torno de uma única candidatura parece ser uma das poucas alternativas às forças políticas que tentam romper com a polarização. No entanto, uma aliança abrangente entre pré-candidatos de centro, já no primeiro turno, segue improvável.

Temas centrais

À medida em que a inflação chega nos dois dígitos, com destaque para alta de preços de energia, combustíveis e alimentos, e o desemprego atinge 14 milhões de brasileiros, a economia será um tema ainda mais central no cenário eleitoral de 2022. Com índices de aprovação e intenção de voto persistentemente baixos, Bolsonaro deve deixar a agenda agenda pró-negócios ainda mais de lado - uma vez que já não empenhou capital político de maneira expressiva para aprovação de reformas e por vezes apoiou nos bastidores medidas de aumento do gasto público na contramão das pregações de seu ministro da Economia, Paulo Guedes. A priorização de suas chances na disputa eleitoral devem levar a um cenário de baixa previsibilidade na condução de políticas públicas e seguir causando volatilidade financeira em decorrência das preocupações fiscais no médio prazo.

Em meio às restrições no orçamento, o presidente deve ter dificuldades em aumentar gastos públicos o suficiente a ponto de impulsionar seus índices de popularidade. Entre os desafios, estão uma saída para os precatórios sem estilhaçar completamente o teto de gastos e abalar o mercado financeiro e também atender aos interesses do centrão por emendas parlamentares para garantir apoio político no Congresso (seja para barrar um eventual processo de impeachment ou para aprovar propostas de interesse do governo). Neste cenário, mesmo que o programa Auxílio Brasil saia do papel com um benefício maior e atingindo mais famílias, parece não haver recursos suficientes para fazer desta uma bala de prata na eleição.

Para tentar garantir uma vaga no segundo turno, Bolsonaro deve continuar tentando empurrar para o colo dos governadores a culpa pelo desemprego devido às medidas restritivas adotadas durante a pandemia. Para manter o apoio de seus eleitores mais fiéis, seguirá com sua retórica conservadora, anticomunista e antiglobalista adotada em 2018. Para seguir adotando a postura anti-establishment de 2018 mesmo após acolher o "centrão" no coração do governo, o presidente vai eleger novos inimigos de ocasião entre as instituições democráticas, com os ministros do Supremo Tribunal Federal (STF) e do Tribunal Superior Eleitoral figurando no topo da lista desta vez. Por fim, para surfar no antipetismo que continua arraigado em grande parte do eleitorado, Bolsonaro seguirá associando Lula e o PT a atos de corrupção enquanto tenta empurrar quantidades cada vez maiores de poeira para debaixo do tapete - à medida que diversas investigações avançam sobre aliados e, principalmente, sobre sua família.

Na outra ponta, Lula deve apresentar-se como um político experiente, disposto a negociar com diferentes grupos políticos em prol da pacificação do país e fazer um aceno ao centro para angariar apoio de pelo menos parte dos viúvos e viúvas da terceira via. Isso não significa um abandono completo de bandeiras do PT, como foco na distribuição de renda e no papel do Estado como indutor de crescimento econômico. Na esfera internacional, o ex-presidente deve explorar a agenda ambiental no campo da infraestrutura verde, seguindo os passos do presidente dos EUA, Joe Biden, com o intuito de se diferenciar de seu adversário também na arena global.

*Mário Braga, analista líder da Control Risks para o Brasil

Mário Braga. FOTO: ARQUIVO PESSOAL Foto: Estadão

Faltando um ano para as eleições presidenciais, pesquisas de intenção de voto apontam para uma disputa polarizada entre o presidente Jair Bolsonaro e o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva (2003-10). Em meio a um cenário econômico desafiador, incluindo alta inflação e dificuldades no avanço de uma agenda econômica pró-negócios, a tensão política e protestos ocasionais a favor e contra o governo devem seguir no radar. Porém, uma onda generalizada de agitação civil é improvável ao longo do próximo ano. Na esfera política, pré-candidatos de centro vêm esboçando tentativas de liderar candidaturas competitivas, mas o fraco desempenho nas pesquisas, a falta de consenso em torno de um nome e a ausência de uma plataforma política clara alimentam ceticismo sobre a viabilidade de uma "terceira via".

Segundo pesquisa do Datafolha publicada em 17 de setembro, o ex-presidente Lula tem 44% das intenções de voto no primeiro turno e 56% no segundo turno, enquanto Bolsonaro é a escolha de 25% dos eleitores no primeiro turno e de 31% no segundo. Ciro Gomes (PDT) tem 9% das intenções de voto e segue em terceiro lugar, mesma posição em que terminou o primeiro turno de 2018, com 12,47% dos votos válidos. Os demais prováveis candidatos se embolam com menos de 5% das intenções de voto em diferentes cenários traçados pela pesquisa.

Os novos números trazem pouca mudança em relação a última pesquisa do instituto, realizada em julho, indicando uma cristalização da opinião pública em direção aos polos do espectro político. Bolsonaro e Lula mobilizam grande parte do eleitorado tanto em seu favor, como também em oposição ao que representam. De acordo com o Datafolha, o índice de rejeição de Lula ficou em 38% e a do presidente Bolsonaro está em 59%, mantendo a mesma taxa de julho.

O movimento revelado nas pesquisas (ou a falta dele) sugere não só uma opção dos eleitores pelo candidato de sua preferência, mas também uma escolha para inviabilizar a eleição do candidato opositor. Os altos níveis de rejeição a Bolsonaro e a Lula retroalimentam o cenário de polarização política no país. Isto diminui o espaço para que um político moderado seja capaz de apresentar uma candidatura suficientemente forte a ponto de pôr um fim ao clima de "Fla x Flu" político que prevalece no País.

Além disso, Bolsonaro e Lula já deram a largada na corrida eleitoral, seja com declarações e demonstrações para inflamar simpatizantes, seja com reuniões de bastidores para costurar apoio político. Já os centristas enfrentam uma batalha contra o relógio: quanto mais próximo do lançamento oficial das das campanhas, em agosto de 2022, menores as chances de suas candidaturas decolarem. Outro fator que reforça o ceticismo em relação à "terceira via" é a ausência de uma narrativa consistente e assertiva por parte dos pré-candidatos de centro. Sem a comunicação clara de uma ideia central que defendam, esses políticos depositam suas esperanças na tentativa de converter os altos níveis de rejeição a Bolsonaro e Lula em apoio popular para si mesmos. No entanto, em uma espécie de profecia autorrealizável às avessas por não demonstrarem, por enquanto, chances de bater Lula ou Bolsonaro nas urnas, é improvável que eleitores desembarquem de suas posições atuais e arrisquem facilitar o caminho de seus adversários ao Palácio do Planalto.

Evitar a dispersão de votos e concentrar os eleitores de centro e os descontentes com Lula e Bolsonaro em torno de uma única candidatura parece ser uma das poucas alternativas às forças políticas que tentam romper com a polarização. No entanto, uma aliança abrangente entre pré-candidatos de centro, já no primeiro turno, segue improvável.

Temas centrais

À medida em que a inflação chega nos dois dígitos, com destaque para alta de preços de energia, combustíveis e alimentos, e o desemprego atinge 14 milhões de brasileiros, a economia será um tema ainda mais central no cenário eleitoral de 2022. Com índices de aprovação e intenção de voto persistentemente baixos, Bolsonaro deve deixar a agenda agenda pró-negócios ainda mais de lado - uma vez que já não empenhou capital político de maneira expressiva para aprovação de reformas e por vezes apoiou nos bastidores medidas de aumento do gasto público na contramão das pregações de seu ministro da Economia, Paulo Guedes. A priorização de suas chances na disputa eleitoral devem levar a um cenário de baixa previsibilidade na condução de políticas públicas e seguir causando volatilidade financeira em decorrência das preocupações fiscais no médio prazo.

Em meio às restrições no orçamento, o presidente deve ter dificuldades em aumentar gastos públicos o suficiente a ponto de impulsionar seus índices de popularidade. Entre os desafios, estão uma saída para os precatórios sem estilhaçar completamente o teto de gastos e abalar o mercado financeiro e também atender aos interesses do centrão por emendas parlamentares para garantir apoio político no Congresso (seja para barrar um eventual processo de impeachment ou para aprovar propostas de interesse do governo). Neste cenário, mesmo que o programa Auxílio Brasil saia do papel com um benefício maior e atingindo mais famílias, parece não haver recursos suficientes para fazer desta uma bala de prata na eleição.

Para tentar garantir uma vaga no segundo turno, Bolsonaro deve continuar tentando empurrar para o colo dos governadores a culpa pelo desemprego devido às medidas restritivas adotadas durante a pandemia. Para manter o apoio de seus eleitores mais fiéis, seguirá com sua retórica conservadora, anticomunista e antiglobalista adotada em 2018. Para seguir adotando a postura anti-establishment de 2018 mesmo após acolher o "centrão" no coração do governo, o presidente vai eleger novos inimigos de ocasião entre as instituições democráticas, com os ministros do Supremo Tribunal Federal (STF) e do Tribunal Superior Eleitoral figurando no topo da lista desta vez. Por fim, para surfar no antipetismo que continua arraigado em grande parte do eleitorado, Bolsonaro seguirá associando Lula e o PT a atos de corrupção enquanto tenta empurrar quantidades cada vez maiores de poeira para debaixo do tapete - à medida que diversas investigações avançam sobre aliados e, principalmente, sobre sua família.

Na outra ponta, Lula deve apresentar-se como um político experiente, disposto a negociar com diferentes grupos políticos em prol da pacificação do país e fazer um aceno ao centro para angariar apoio de pelo menos parte dos viúvos e viúvas da terceira via. Isso não significa um abandono completo de bandeiras do PT, como foco na distribuição de renda e no papel do Estado como indutor de crescimento econômico. Na esfera internacional, o ex-presidente deve explorar a agenda ambiental no campo da infraestrutura verde, seguindo os passos do presidente dos EUA, Joe Biden, com o intuito de se diferenciar de seu adversário também na arena global.

*Mário Braga, analista líder da Control Risks para o Brasil

Mário Braga. FOTO: ARQUIVO PESSOAL Foto: Estadão

Faltando um ano para as eleições presidenciais, pesquisas de intenção de voto apontam para uma disputa polarizada entre o presidente Jair Bolsonaro e o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva (2003-10). Em meio a um cenário econômico desafiador, incluindo alta inflação e dificuldades no avanço de uma agenda econômica pró-negócios, a tensão política e protestos ocasionais a favor e contra o governo devem seguir no radar. Porém, uma onda generalizada de agitação civil é improvável ao longo do próximo ano. Na esfera política, pré-candidatos de centro vêm esboçando tentativas de liderar candidaturas competitivas, mas o fraco desempenho nas pesquisas, a falta de consenso em torno de um nome e a ausência de uma plataforma política clara alimentam ceticismo sobre a viabilidade de uma "terceira via".

Segundo pesquisa do Datafolha publicada em 17 de setembro, o ex-presidente Lula tem 44% das intenções de voto no primeiro turno e 56% no segundo turno, enquanto Bolsonaro é a escolha de 25% dos eleitores no primeiro turno e de 31% no segundo. Ciro Gomes (PDT) tem 9% das intenções de voto e segue em terceiro lugar, mesma posição em que terminou o primeiro turno de 2018, com 12,47% dos votos válidos. Os demais prováveis candidatos se embolam com menos de 5% das intenções de voto em diferentes cenários traçados pela pesquisa.

Os novos números trazem pouca mudança em relação a última pesquisa do instituto, realizada em julho, indicando uma cristalização da opinião pública em direção aos polos do espectro político. Bolsonaro e Lula mobilizam grande parte do eleitorado tanto em seu favor, como também em oposição ao que representam. De acordo com o Datafolha, o índice de rejeição de Lula ficou em 38% e a do presidente Bolsonaro está em 59%, mantendo a mesma taxa de julho.

O movimento revelado nas pesquisas (ou a falta dele) sugere não só uma opção dos eleitores pelo candidato de sua preferência, mas também uma escolha para inviabilizar a eleição do candidato opositor. Os altos níveis de rejeição a Bolsonaro e a Lula retroalimentam o cenário de polarização política no país. Isto diminui o espaço para que um político moderado seja capaz de apresentar uma candidatura suficientemente forte a ponto de pôr um fim ao clima de "Fla x Flu" político que prevalece no País.

Além disso, Bolsonaro e Lula já deram a largada na corrida eleitoral, seja com declarações e demonstrações para inflamar simpatizantes, seja com reuniões de bastidores para costurar apoio político. Já os centristas enfrentam uma batalha contra o relógio: quanto mais próximo do lançamento oficial das das campanhas, em agosto de 2022, menores as chances de suas candidaturas decolarem. Outro fator que reforça o ceticismo em relação à "terceira via" é a ausência de uma narrativa consistente e assertiva por parte dos pré-candidatos de centro. Sem a comunicação clara de uma ideia central que defendam, esses políticos depositam suas esperanças na tentativa de converter os altos níveis de rejeição a Bolsonaro e Lula em apoio popular para si mesmos. No entanto, em uma espécie de profecia autorrealizável às avessas por não demonstrarem, por enquanto, chances de bater Lula ou Bolsonaro nas urnas, é improvável que eleitores desembarquem de suas posições atuais e arrisquem facilitar o caminho de seus adversários ao Palácio do Planalto.

Evitar a dispersão de votos e concentrar os eleitores de centro e os descontentes com Lula e Bolsonaro em torno de uma única candidatura parece ser uma das poucas alternativas às forças políticas que tentam romper com a polarização. No entanto, uma aliança abrangente entre pré-candidatos de centro, já no primeiro turno, segue improvável.

Temas centrais

À medida em que a inflação chega nos dois dígitos, com destaque para alta de preços de energia, combustíveis e alimentos, e o desemprego atinge 14 milhões de brasileiros, a economia será um tema ainda mais central no cenário eleitoral de 2022. Com índices de aprovação e intenção de voto persistentemente baixos, Bolsonaro deve deixar a agenda agenda pró-negócios ainda mais de lado - uma vez que já não empenhou capital político de maneira expressiva para aprovação de reformas e por vezes apoiou nos bastidores medidas de aumento do gasto público na contramão das pregações de seu ministro da Economia, Paulo Guedes. A priorização de suas chances na disputa eleitoral devem levar a um cenário de baixa previsibilidade na condução de políticas públicas e seguir causando volatilidade financeira em decorrência das preocupações fiscais no médio prazo.

Em meio às restrições no orçamento, o presidente deve ter dificuldades em aumentar gastos públicos o suficiente a ponto de impulsionar seus índices de popularidade. Entre os desafios, estão uma saída para os precatórios sem estilhaçar completamente o teto de gastos e abalar o mercado financeiro e também atender aos interesses do centrão por emendas parlamentares para garantir apoio político no Congresso (seja para barrar um eventual processo de impeachment ou para aprovar propostas de interesse do governo). Neste cenário, mesmo que o programa Auxílio Brasil saia do papel com um benefício maior e atingindo mais famílias, parece não haver recursos suficientes para fazer desta uma bala de prata na eleição.

Para tentar garantir uma vaga no segundo turno, Bolsonaro deve continuar tentando empurrar para o colo dos governadores a culpa pelo desemprego devido às medidas restritivas adotadas durante a pandemia. Para manter o apoio de seus eleitores mais fiéis, seguirá com sua retórica conservadora, anticomunista e antiglobalista adotada em 2018. Para seguir adotando a postura anti-establishment de 2018 mesmo após acolher o "centrão" no coração do governo, o presidente vai eleger novos inimigos de ocasião entre as instituições democráticas, com os ministros do Supremo Tribunal Federal (STF) e do Tribunal Superior Eleitoral figurando no topo da lista desta vez. Por fim, para surfar no antipetismo que continua arraigado em grande parte do eleitorado, Bolsonaro seguirá associando Lula e o PT a atos de corrupção enquanto tenta empurrar quantidades cada vez maiores de poeira para debaixo do tapete - à medida que diversas investigações avançam sobre aliados e, principalmente, sobre sua família.

Na outra ponta, Lula deve apresentar-se como um político experiente, disposto a negociar com diferentes grupos políticos em prol da pacificação do país e fazer um aceno ao centro para angariar apoio de pelo menos parte dos viúvos e viúvas da terceira via. Isso não significa um abandono completo de bandeiras do PT, como foco na distribuição de renda e no papel do Estado como indutor de crescimento econômico. Na esfera internacional, o ex-presidente deve explorar a agenda ambiental no campo da infraestrutura verde, seguindo os passos do presidente dos EUA, Joe Biden, com o intuito de se diferenciar de seu adversário também na arena global.

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