As consequências do COVID-19 impuseram aos brasileiros impactos no orçamento, aumentaram a concentração de renda e agudizaram a já elevada desigualdade social para a população brasileira. O desemprego se eleva continuamente, o comércio segue em crise e o reflexo são problemas econômicos. A taxa de desocupação para o primeiro trimestre de 2021 foi de 14,8%, segundo o IBGE - Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística. Isso significa que 14,8 milhões de pessoas estão desempregadas atualmente no Brasil - o maior número da série histórica da Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios Contínua - PNAD.
Em São Paulo, por exemplo, 25% dos bares e restaurantes fecharam as portas de maneira definitiva em virtude das restrições de acesso e limitação de frequência que a pandemia impôs. Segundo a Associação Brasileira de Bares e Restaurantes - ABRASEL - desde o início da pandemia 12.000 bares e restaurantes fecharam em definitivo na cidade de São Paulo. No Estado, dos 250 mil estabelecimentos do setor, 50 mil deixaram de existir. Em um ano de pandemia o Brasil fechou 7,8 milhões de postos de trabalho.
Pandemia esta que ainda tem destino indefinido pela morosidade da vacinação que inevitavelmente se alongará para 2022. Com isso, o retorno do ritmo da economia é incerto e, quiçá, sabemos se haverá um regresso ao patamar anterior à pandemia que já não era de grande alento. Com a escassez de recursos, outras desigualdades afloram e se aprofundam como as raciais, educacionais, além é claro das sociais e econômicas.
No fim de 2020, 29% dos trabalhadores ocupados tinham jornada menor do que a de antes da pandemia. A consequência foi a redução da renda: 37% dos ocupados passaram a ganhar menos. Os que mais perderam foram os com menor escolaridade. Em paripasso o custo com as despesas básicas aumentou 30% acima da inflação. A pobreza se acentua e a desigualdade social se evidencia ainda mais.
O aumento da pobreza em decorrência da falta de recursos fez com que a percentagem das pessoas que passaram de uma condição econômica mediana para a pobreza e muitos migraram da pobreza para a extrema pobreza. Segundo os dados mais recentes do IBGE, em 2018 o país tinha 13,5 milhões de pessoas em situação de extrema pobreza, de acordo com critérios do Banco Mundial. Somadas aos que estão na linha da pobreza, chegam a 25% da população do país.
A extrema pobreza aumentou de 5,8% da população em 2012 para 6,5% em 2018 - um recorde em sete anos. Por conta das incertezas que envolvem a realização do CENSO em 2021, que deixou de ser realizado em 2020, os dados estão desatualizados em relação ao impacto da pandemia na realidade social, porém, com estatísticas de 2019 a realidade já era impactante: Segundo o IBGE, o Brasil tem quase 52 milhões de pessoas na pobreza que, de acordo com dados do Banco Mundial, vivem com até R$ 436 por mês, e 13 milhões na extrema pobreza que, de acordo com os mesmos dados, vivem com até R$ 151 por mês. Refletimos.
A crise econômica expôs o que já era cotidiano no país: a concentração de renda e a proliferação da pobreza. O fenômeno não é exclusivo do Brasil, no entanto, a disparidade entre a concentração e a desigualdade foram desvelados de maneira inapelável pelo COVID-19. As pessoas têm obtido menos renda, cortado suas despesas básicas, educação, e até funcionários, como doméstica, para continuarem a sobreviver.
Se no Brasil a desigualdade se acentua, no mundo, o COVID-19 também desvelou o incremento da disparidade econômica e social. Segundo a Organização Mundial de Saúde, os países de alta renda, com 15% da população mundial compraram 45% de todas as vacinas. Ao passo que dez países, a maioria da África, sequer aplicaram uma única dose.
Se a desigualdade e a concentração de renda aumentam tanto no Brasil como no mundo, como, então, o Governo Federal poderá resolver ou minorar o problema? A resposta não é simples e envolve, além de planejamento, ações concretas em políticas públicas que o país não investe de maneira adequada, como a infraestrutura.
Enquanto a população não está apta a retomar o trabalho presencial em sua totalidade, ou nem perto disso, aperfeiçoamentos podem e devem ser feitos no orçamento federal. Como dissemos, a atual missão do Governo Federal é lidar com os efeitos da pandemia, a desigualdade, o aumento da pobreza e da pobreza extrema sem comprometer ainda mais as contas. Claro está que são necessárias políticas públicas para resolver os problemas e antigas soluções podem trazer resultados aquém do esperado.
O primeiro passo é a reestrutura e adequação de programas sociais já existentes como, por exemplo, o Bolsa Família. Os programas sociais já consomem R$150 bilhões, sem políticas extraordinárias da pandemia. A questão que se coloca é: o valor é proporcional à efetividade do resultado? Há margem para aperfeiçoamento e aprimoramento. A inserção para acesso prioritário a educação, uma maior equalização entre o sistema público e privado, acesso ao mercado de trabalho, qualificação profissional, melhor assistência básica e educacional são alguns dos pontos que podem e devem ser revistos.
Para mitigar os efeitos da pandemia e minorar o impacto da desigualdade social e econômica o Brasil precisa investir em infraestrutura e em educação. O país tem colhido, sem nenhum trocadilho, resultados positivos com o agronegócio, porém, seguem sendo a mola motriz do PIB o terceiro setor - os serviços - e a exportação de bens primários. A indústria ainda claudica e padece. Há a carência evidente de um projeto de desenvolvimento econômico e social para o Estado Brasileiro. Mas como implementar mudanças se as pessoas não estão vacinadas e aptas a trabalhar de maneira plena e sem restrições?
A prioridade para a retomada econômica brasileira é o avanço da vacinação no Brasil. É sabido que o país possui dimensões continentais e por isso a distribuição de vacina não é simples ou imediata, porém, enquanto o mundo vê queda de 14% dos casos de COVID-19 - a Europa com 25% -, o Brasil ainda segue no ritmo diametralmente oposto, com índices de crescimento da infecção, inclusive com risco de uma terceira onda, sendo que, atualmente, ocupa o segundo lugar na América Latina - somente atrás da Argentina - e com a agudização de casos na Índia.
A demora na vacinação impede que novos postos de trabalho sejam criados, que estratégias inéditas sejam feitas e que novos negócios comecem a serem realizados. Hoje o compasso é de espera, o que mais parece uma agonia. A escala de vacina prevê que adentraremos o primeiro semestre de 2022 ainda sem ter os jovens vacinados, um atraso acentuado para a retomada. O plano de crescimento do Governo Federal claudica e se não for feita uma estratégia de ação voltada para a infraestrutura e a educação, como dissemos, os danos ainda demorarão mais tempo para serem revertidos.
A crise, a desigualdade, a concentração de renda somente aumentam e se acentuam. O Governo Federal tem a áspera missão de fazer o seu papel: construir novos caminhos para o país, porém, falha miseravelmente, pois, não investe em vacina, não incrementa a velocidade da mesma e, tampouco, se preocupa com o desenvolvimento da indústria através de investimento em infraestrutura e, tampouco, se preocupa com a educação. Enquanto não investir maciçamente em nossas crianças e na base da indústria o Brasil seguirá colhendo mais do mesmo: desigualdade e desesperança. Que se pense menos em eleições e desculpas e mais na população e no futuro da Nação.
*Antonio Baptista Gonçalves é advogado, pós-doutor em Desafios en la postmodernidad para los Derechos Humanos y los Derechos Fundamentales pela Universidade de Santiago de Compostela, pós-doutor em Ciência da Religião pela PUC/SP, pós-doutor em Ciências Jurídicas pela Universidade de La Matanza. Doutor e mestre em Filosofia do Direito pela PUC/SP, MBA em Relações Internacionais da Fundação Getúlio Vargas; especialista em Direitos Fundamentais pela Universidade de Coimbra, especialista em Direito Penal Econômico Europeu pela Universidade de Coimbra, pós-graduado em Teoria dos Delitos - Universidade de Salamanca, pós-graduado em Direito Penal Econômico e em Direito Tributário pela Fundação Getúlio Vargas - FGV, bacharel em Direito pela Universidade Presbiteriana Mackenzie e em Filosofia pela PUC/SP