Nas últimas semanas, a possibilidade de racionamento de energia voltou à pauta no Brasil. O período chuvoso, que terminou em abril, foi o mais seco dos últimos 91 anos, levando a Agência Nacional de Águas (ANA) a emitir um alerta de risco hídrico devido à baixa no nível dos reservatórios na Região Hidrográfica do Paraná, que abrange parte dos territórios do Paraná, São Paulo, Minas Gerais, Mato Grosso do Sul e Goiás. A declaração trouxe à tona memórias de 2001, quando uma situação semelhante levou à implementação de medidas que estabeleciam redução obrigatória de 20% no consumo de energia elétrica, na tentativa de evitar um apagão.
Em 20 anos, o que mudou? Com o avanço das fontes renováveis como a solar e a eólica, o Brasil tem se tornado menos dependente das hidrelétricas e, consequentemente, das chuvas. Contudo, a representatividade dessas fontes ainda é baixa e, em um momento de risco hídrico, a principal alternativa é o acionamento de usinas termelétricas - poluentes e mais caras. Além do impacto ambiental, será possível sentir o impacto no bolso: com o acionamento da bandeira vermelha patamar 2, teremos um acréscimo no custo da energia, no qual o valor da Bandeira Tarifária a cada 100 kWh passará de R$ 6,243 para R$ 9,49.
O cenário se torna ainda mais preocupante quando lembramos que o Brasil tem altos índices de desperdício de energia. Dados da Associação Brasileira das Empresas de Serviços de Conservação de Energia (ABESCO) indicaram que, em 2017, o desperdício de energia elétrica no país tinha impacto de R$ 71 milhões por dia, montante que, em 2021, deve ser ainda maior.
Além de questões comportamentais, parte relevante desse desperdício é decorrente da utilização de equipamentos antigos, desgastados e de tecnologia ultrapassada. Uma das iniciativas mais conhecidas que visam mitigar esse problema foi a implementação do Selo Procel de Eficiência Energética, muito comum em geladeiras e outros eletrodomésticos, visando informar ao consumidor a classificação de eficiência daquele equipamento, bem como fomentar a redução do desperdício de energia.
No entanto, é preciso lembrar que o Brasil tem mais de 573 mil indústrias em operação, que consomem aproximadamente 41% da energia elétrica do país, de acordo com dados da Confederação Nacional da Indústria (CNI) - o que nos leva a inferir que parte significativa do desperdício de energia também advém desse segmento. De acordo com o Plano Decenal de Expansão de Energia - PDE 2029, se nada for feito, os setores de Indústria e Serviço serão responsáveis, em 2029, por um desperdício de energia na ordem de 30TWh - o equivalente a quase 40% da geração de Itaipu no ano passado.
Projeções da ABESCO mostram que, com projetos de eficiência energética, a indústria tem potencial de economizar R$ 4 bilhões por ano; para o varejo, a estimativa é de R$ 2,4 bilhões - uma alternativa viável e sustentável para auxiliar o país a se recuperar da crise decorrente da pandemia de COVID-19. Além disso, substituir equipamentos desgastados ou ultrapassados por versões mais modernas e em perfeito funcionamento resulta em maior produtividade, visto que paradas não programadas para conserto de equipamentos, por exemplo, levam à redução da produção - e, consequentemente, prejuízo.
Do ponto de vista ambiental, reduzir o desperdício de energia impacta, diretamente, na pegada de carbono de uma empresa. Em uma conta simples, baseada em dados de emissões de CO2 do Ministério da Ciência e Tecnologia para 2020, a cada 10 megawatts-hora economizados, quase três toneladas de CO2 deixam de ser lançadas na atmosfera. Em um momento em que as práticas de ESG têm se tornado cada vez mais relevantes para as empresas, isso se torna um diferencial estratégico.
A prerrogativa da eficiência energética é: produzir o mesmo produto ou serviço (ou até mais) utilizando menos recursos. Segundo a EPE - Empresa de Pesquisa Energética, o Brasil ficou 14% mais eficiente energeticamente entre 2005 e 2018, mas segue sendo um dos que menos investe na modalidade: é o 15º do ranking mundial, com US$ 0,94 per capita, enquanto na Alemanha, no topo do ranking, o investimento é 33 vezes maior (US$ 31,30 per capita).
A situação atual é preocupante e, mais do que nunca, é preciso conscientização de que desligar aparelhos da tomada pode até gerar uma pequena economia na conta de luz, mas não é suficiente para impactar positivamente a crise hídrica do país. Investir em eficiência energética e torná-la acessível a cada vez mais consumidores - sejam eles pequenos, médios ou grandes - é crucial e trará benefícios econômicos, ambientais e sociais não apenas de curto, como também de médio e longo prazos, visto que as soluções de eficiência energética são permanentes.
Da mesma forma que vemos a expansão da energia renovável no país, devemos investir na popularização e disseminação da eficiência energética. Esse é o primeiro passo para otimizar o consumo e os gastos com energia elétrica. Quando o consumidor reduz o desperdício, a economia é garantida - e os benefícios também. Consumir energia de forma eficiente e consciente. Afinal, para uma empresa ser sustentável de verdade é preciso, primeiro, ser eficiente.
*Marcel Haratz, CEO da Nexway Eficiência