Estávamos em 1977. O Brasil ainda vivia a opressão do regime ditatorial, imobilizado pela camisa de força do AI-5. Mas com o fim do “milagre econômico” e a crise do petróleo, a sociedade começava a dar sinais de impaciência. Na presidência do País, o general Geisel sentiu que o regime não se sustentaria por muito tempo e lançou um movimento pela abertura “lenta e gradual e segura”, batizado como distensão. E quem foi que ele chamou para exercer a interlocução com a sociedade civil? Sim, a Ordem dos Advogados do Brasil (OAB), presidida então pelo gigante Raymundo Faoro.
O papel da OAB, exercendo uma resistência pacífica durante o regime autoritário, foi reconhecidamente fundamental no processo de redemocratização. O prestígio da entidade e de seu presidente eram tão grandes que obrigaram Geisel a cumprir logo de cara uma das condições que Faoro impôs para que a OAB apoiasse a distensão: o restabelecimento do habeas corpus, que levaria ao fim das torturas. Ao lado de outras entidades, também coube à OAB liderar os movimentos pelas Diretas Já e pela Constituinte.
Não é à toa que nossa Carta Magna delega à advocacia a missão de ser sua guardiã. O ativismo histórico da nossa Ordem foi o que lhe conferiu a responsabilidade de ser a responsável pela defesa dos direitos humanos e do Estado Democrático de Direito. Porém, hoje, infelizmente, é voz corrente de que foi-se o tempo...
A OAB foi criada para cuidar bem da advocacia, de modo que ela possa exercer o seu papel constitucional de defender a sociedade. Entretanto, percorrendo o Distrito Federal nos últimos meses, conversando com advogadas e advogados, o que pude sentir foi uma sensação de abandono, sobretudo entre os profissionais jovens e veteranos. A jovem advocacia reclama uma atenção efetiva, ações. Programas e projetos que não saem do papel já não convencem.
Ouvindo as demandas, estabelecemos propostas claras e factíveis para impulsionar a carreira dos que estão começando. Uma delas é a garantia de um desconto de 25% no valor da anuidade durante os 10 primeiros anos de filiação à OAB. Os veteranos poderão contar com apoio psicossocial e com programas de capacitação regulares, para que possam se adaptar às novas tecnologias. A evolução tecnológica é uma realidade e precisamos estar preparados para tirar o melhor proveito dela.
Nos últimos anos, a OAB, especialmente no DF, se encolheu, perdeu seu prestígio, perdeu a voz. E o resultado são as constantes ocorrências de desrespeito às prerrogativas asseguradas pelo Estatuto da Advocacia. Haja vista a omissão da seccional do DF diante das flagrantes violações aos direitos de advogados e advogadas que atuavam em defesa de clientes envolvidos no episódio de 8 de janeiro.
A OAB/DF vive um isolamento institucional que eu chamo de um processo de desidratação. Para não se comprometer, escolheu ficar em uma zona de conforto, perdendo seu protagonismo e, junto com ele, o respeito. Se já não consegue mais defender nem mesmo seus afiliados, que dirá a sociedade. O fato concreto é que há um descontentamento generalizado com a nossa Ordem. Sua reconstrução é necessária e urgente. Precisamos recolocar a OAB em seu lugar histórico de legítima representante da sociedade. E a hora é esta, em que acontecem as eleições para as seccionais em todo o País.
O respeito, a inclusão e a diversidade são valores fundamentais na advocacia e essenciais para a promoção da justiça e para a construção de uma sociedade mais equitativa. A diversidade na advocacia enriquece o debate jurídico, trazendo perspectivas diferentes e inovadoras para a solução de problemas complexos. A voz da advocacia negra e PCD precisa ser ouvida e terá lugar neste novo tempo da OAB/DF que vem aí. Um tempo em que o discurso será prática, em que nossa Ordem passará a ser verdadeiramente a casa da advocacia, em que ela terá recuperada a sua estatura, sendo capaz de garantir efetivamente todos os direitos conquistados à duras penas pela sociedade brasileira.
No Distrito Federal, representamos um grande grupo que congrega advogadas e advogados de diversas áreas movidos por um objetivo: uma Ordem com mais voz. Nosso compromisso é implantar na OAB/DF uma gestão representativa, plural, transparente, independente, com forte poder de interlocução. Como primeiro ato, vamos criar um Observatório de Prerrogativas, com uma equipe especializada percorrendo regularmente todas as 14 subseções para registrar os casos de violação das prerrogativas e agir por meio do diálogo ou ações que se fizerem necessárias junto às delegacias, fóruns ou no Supremo Tribunal Federal.
Esta é uma pauta prioritária, mas não a única. A transparência será também um dos pilares da nossa gestão. A transparência é a base da confiança e imprescindível para uma governança clara e eficaz. Por isso, vamos criar uma diretoria de Compliance, além de reestruturar a Ouvidoria da OAB/DF, que terá mandato fixo e publicará relatórios pontuais.
É preciso mudar para reconstruir, fazer com que a OAB recupere seu respeito institucional e possa estabelecer um diálogo qualificado com os Três Poderes da República e com os diversos setores da sociedade. A OAB deve ter seu lugar garantido em todas as mesas em que são discutidos temas relevantes para o País, seus cidadãos e cidadãs. É essencial distensionarmos as relações e reconstruí-las a partir de um diálogo franco, respeitoso.
Sabemos que as mulheres representam atualmente 50% da advocacia brasileira, e no DF, um pouco mais, 51%. Abrir espaço para as mulheres não é mais simplesmente uma questão de respeito, mas de justiça, reconhecimento de igualdade. Em nossa chapa, o respeito e a justiça começam pela sua composição, em que as advogadas ocupam metade dos cargos, entre eles a vice-presidência e a secretaria-geral. E serão elas as norteadoras da nossa política para maior apoio e garantia de voz à advocacia feminina.