O Supremo Tribunal Federal já tem maioria para colocar a deputada Carla Zambelli (PL-SP) no banco dos réus por perseguir, de arma em punho, um homem negro - Luan Araújo, jornalista - pelas ruas de São Paulo na véspera do segundo turno das eleições de 2022. Cinco ministros acompanharam o relator, Gilmar Mendes, no entendimento de que há evidências para a abertura de uma ação penal contra a bolsonarista por supostos crimes de porte ilegal de arma de fogo e constrangimento ilegal com emprego de arma de fogo.
Ao final do julgamento sobre a procedência da acusação da Procuradoria-Geral da República, a deputada será instada a apresentar sua defesa. Em seguida, terá início a instrução do processo, com a oitiva de testemunhas e produção de outras provas. Ao fim, será marcado o julgamento em que o STF decidirá se condena ou não Zambelli. Não há data para que isso ocorra.
Agora ré, Zambelli ainda é alvo de outras investigações no Supremo Tribunal Federal. No início de agosto ela teve a casa vasculhada pela Polícia Federal no bojo do inquérito sobre a suposta invasão aos sistemas do Conselho Nacional de Justiça com a inserção de uma ordem de prisão falsa contra o ministro Alexandre de Moraes.
No campo da política, como mostrou o Estadão, a parlamentar está isolada no PL. O partido considera como certa a cassação da bolsonarista.
A Corte máxima analisa a validade das imputações da PGR em sessão virtual que tem previsão de terminar na segunda, 21. Também já votaram pela abertura da ação penal os ministros Alexandre de Moraes, Cristiano Zanin, Edson Fachin, Luís Roberto Barroso e Cármen Lúcia.
O ministro André Mendonça abriu divergência. Alegou que o caso não tem relação ‘verdadeira e direta com o desempenho da atividade funcional da parlamentar’ e por isso não seria abarcado pelo foro por prerrogativa de função da deputada. O ministro defendeu que o processo não fique sob a alçada do STF e sim seja remetido para uma das Varas Criminais de São Paulo.
A denúncia atribui a Zambelli crimes nos Jardins, em São Paulo, na tarde de 29 de outubro do ano passado, véspera do segundo turno das eleições presidenciais. Na ocasião, ela sacou uma arma durante uma discussão e correu atrás do jornalista Luan Araújo pelas ruas. Um guarda-costa de Zambelli também sacou uma arma para intimidar o jornalista e disparou um tiro ‘por acidente’.
Segundo a PGR, Zambelli ‘de forma livre, consciente e voluntária, constrangeu’ o jornalista ‘mediante grave ameaça exercida com o emprego de arma de fogo, a fazer o que a lei não manda, consistente em permanecer no mencionado estabelecimento comercial e a deitar no chão’.
Em seu voto, Gilmar apontou que as evidências colhidas ao longo da investigação são suficientes para o recebimento da denúncia, abrindo-se espaço para a instrução do processo e para o julgamento do caso.
O decano destacou que, ainda que Zambelli tenha porte de arma, ‘o uso fora dos limites da defesa pessoal, em contexto público e ostensivo, ainda mais às vésperas das eleições, em tese, pode significar responsabilidade penal’.
“No caso concreto, desde a comunicação do fato à autoridade policial, com a aquisição dos vídeos da conduta, depoimentos, busca e apreensão das armas, para fins de admissão da acusação, verifica-se a materialidade em relação à existência do evento, da arma [apreendida], com indicadores de realidade quanto ao porte ostensivo de arma de fogo às vésperas das eleições, em situação vedada e de risco, com a perseguição e submissão da vítima à restrição espacial, isto é, do ponto de vista abstrato, os elementos angariados são suficientes ao exercício da ação penal, sem prejuízo da apuração das circunstâncias do evento durante a instrução processual”, anotou Gilmar.