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Opinião|Tecnologia anticorrupção


Por Marcelo Zenkner* e Fabio R. Heilberg*
Atualização:

Antes de o combate à corrupção entrar na pauta de grandes corporações e países, já se falava nesse combate através da tecnologia. Ela possibilitou a redução de papéis impressos e substitui pagamentos em espécie por transferências bancárias e digitais. A corrupção se alimenta da burocracia, então, todas as ferramentas que a reduzem auxiliam a combater desvios e trazer mais transparência e controles. Mas como a tecnologia irá evoluir para continuar a ajudar no combate à corrupção? Qual será o próximo salto tecnológico que irá trazer ainda mais transparência e controle aos recursos públicos?

Marcelo Zenkner Foto: Inac/Divulgação

No meio da tecnologia e inovação, fala-se na chamada Web 3, uma nova fase na internet das coisas que trará mais transparência no uso e propriedade dos dados. Se hoje não sabemos exatamente quais entidades detêm e como usam as nossas informações, com a Web 3 a tendência é que cada indivíduo ou empresa passe a ter maior controle sobre os seus dados.

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A ferramenta que permite este maior controle através da Web 3 é o blockchain (o blockchain é na verdade um tipo de DLT (Distributed Ledger Technology), mas usaremos o termo de forma ampla). Mais conhecido no Brasil por permitir transações com criptomoedas, como o Bitcoin, o blockchain é, na verdade, uma ferramenta muito mais versátil e o seu uso vem se expandindo bastante ao redor do mundo. Por um lado, o blockchain permite que duas partes transacionem por meio digital, com o uso de criptoativos (que têm definição mais ampla que as criptomoedas). Por outro, ele também pode trazer maior transparência e proteção ao uso de dados. Isso porque, ao recordar uma transação, o blockchain automaticamente registra e endossa todas as transações anteriores realizadas, fazendo com que essas transações fiquem imutáveis e visíveis para os outros membros da rede.

Essas características fazem do blockchain uma ferramenta eficaz no fomento à transparência pública e combate à corrupção. E por mais que o tema possa parecer futurista, o blockchain já está sendo utilizado nos dias de hoje com essas finalidades. Uma das primeiras organizações a reconhecer a sua utilidade foi o Banco Interamericano de Desenvolvimento (BID), que liderou, através do seu laboratório de inovação, o desenvolvimento da LACChain, uma rede de blockchain com o objetivo de fomentar a inovação, reduzir desigualdades sociais e econômicas e promover integridade de mercados através da tecnologia.

Como exemplo, podemos imaginar uma licitação pública em que todas as propostas são submetidas automaticamente, de forma imutável e pública. Em vez de passar por uma junta decisória, a própria ferramenta irá avaliar automaticamente, e de forma segura, as propostas que se enquadram dentro do edital, com o resultado sendo publicado em segundos — por sua natureza, o blockchain dificulta a realização de fraudes contra o sistema. O dinheiro público é automaticamente transferido ao ganhador da licitação apenas se as metas preestabelecidas no edital forem aprovadas. Por ser uma codificação, as metas contratuais estabelecidas através do blockchain são binárias, o que traz mais controle e transparência na execução do contrato. A aplicação dos recursos pelo licitante pode ser acompanhada — inclusive os pagamentos para outros eventuais prestadores de serviços que atuem na obra pública — e isso ajuda a controlar desvios e direcionamento de dinheiro público para corrupção.

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Todo esse processo pode ser auditado de forma rápida e segura. Além de torná-lo mais transparente, o blockchain ainda irá reduzir, substancialmente, o custo de se realizar um processo como esse, o que implica em maior economia do dinheiro público.

É claro que uma situação como essa depende de diversas variáveis legais, regulatórias e sistêmicas para que seja possível. Mas, pelo menos aqui no Brasil, essa realidade não parece estar tão longe. O Brasil, acredite se quiser, é um dos pioneiros no uso do blockchain no setor público. O nosso Banco Central foi um dos primeiros a lançar a sua moeda digital (também chamada em inglês de CBDC), o Drex, que nada mais é do que o nosso Real que pode ser utilizado em um blockchain. Ou seja, a possibilidade econômica já existe.

Mas não para por aí. Em 2022, o Tribunal de Contas da União (TCU) e o Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES) lançaram a Rede Blockchain Brasil, uma base de dados pública, sem fins lucrativos, que irá armazenar informações e dados em blocos e, nas palavras do próprio TCU, “vai garantir mais segurança a atos e contratos públicos”. Dentre as possibilidades, incluem-se emissão de identidades digitais, sistemas notariais, rastreamento de cadeia de suprimentos e contratos públicos, certificações e auditorias públicas.

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Os benefícios do blockchain no fomento à integridade não se limitam ao setor público. Empresas que estiverem dispostas a desbravar este novo mundo tecnológico podem se utilizar de blockchains para melhorar os seus controles internos, reduzir custos e processos e até mesmo transacionar de forma muito mais rápida e segura, com entidades públicas e privadas. No mundo privado, o blockchain já vem sendo utilizado principalmente por empresas com grandes cadeias de suprimento, como varejo e logística, no mercado de seguros, imobiliário e no setor financeiro.

É fato que a tecnologia está mudando o mundo e, conforme evolui, as transformações vão ocorrendo de forma cada vez mais rápidas. O Brasil incentiva o uso dessas tecnologias, o que abre enorme mercado e possibilidades para todos os cidadãos. No entanto, o blockchain não é uma solução por si só e deve ser combinado com esforços regulatórios, políticos e sociais para atingir a maior eficácia possível. A sua implementação bem-sucedida requer planejamento, recursos e cooperação entre os setores público e privado. De toda forma, o horizonte parece ser bem promissor.

*Marcelo Zenkner, sócio na área de Compliance e Investigação de TozziniFreire Advogados e conselheiro superior no Instituto Não Aceito Corrupção

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*Fabio R. Heilberg, advogado na área de Compliance e Investigação de TozziniFreire Advogados

Este texto reflete única e exclusivamente a opinião do(a) autor(a) e não representa a visão do Instituto Não Aceito Corrupção. Esta série é uma parceria entre o blog e o Instituto Não Aceito Corrupção (Inac). Os artigos têm publicação periódica

Antes de o combate à corrupção entrar na pauta de grandes corporações e países, já se falava nesse combate através da tecnologia. Ela possibilitou a redução de papéis impressos e substitui pagamentos em espécie por transferências bancárias e digitais. A corrupção se alimenta da burocracia, então, todas as ferramentas que a reduzem auxiliam a combater desvios e trazer mais transparência e controles. Mas como a tecnologia irá evoluir para continuar a ajudar no combate à corrupção? Qual será o próximo salto tecnológico que irá trazer ainda mais transparência e controle aos recursos públicos?

Marcelo Zenkner Foto: Inac/Divulgação

No meio da tecnologia e inovação, fala-se na chamada Web 3, uma nova fase na internet das coisas que trará mais transparência no uso e propriedade dos dados. Se hoje não sabemos exatamente quais entidades detêm e como usam as nossas informações, com a Web 3 a tendência é que cada indivíduo ou empresa passe a ter maior controle sobre os seus dados.

A ferramenta que permite este maior controle através da Web 3 é o blockchain (o blockchain é na verdade um tipo de DLT (Distributed Ledger Technology), mas usaremos o termo de forma ampla). Mais conhecido no Brasil por permitir transações com criptomoedas, como o Bitcoin, o blockchain é, na verdade, uma ferramenta muito mais versátil e o seu uso vem se expandindo bastante ao redor do mundo. Por um lado, o blockchain permite que duas partes transacionem por meio digital, com o uso de criptoativos (que têm definição mais ampla que as criptomoedas). Por outro, ele também pode trazer maior transparência e proteção ao uso de dados. Isso porque, ao recordar uma transação, o blockchain automaticamente registra e endossa todas as transações anteriores realizadas, fazendo com que essas transações fiquem imutáveis e visíveis para os outros membros da rede.

Essas características fazem do blockchain uma ferramenta eficaz no fomento à transparência pública e combate à corrupção. E por mais que o tema possa parecer futurista, o blockchain já está sendo utilizado nos dias de hoje com essas finalidades. Uma das primeiras organizações a reconhecer a sua utilidade foi o Banco Interamericano de Desenvolvimento (BID), que liderou, através do seu laboratório de inovação, o desenvolvimento da LACChain, uma rede de blockchain com o objetivo de fomentar a inovação, reduzir desigualdades sociais e econômicas e promover integridade de mercados através da tecnologia.

Como exemplo, podemos imaginar uma licitação pública em que todas as propostas são submetidas automaticamente, de forma imutável e pública. Em vez de passar por uma junta decisória, a própria ferramenta irá avaliar automaticamente, e de forma segura, as propostas que se enquadram dentro do edital, com o resultado sendo publicado em segundos — por sua natureza, o blockchain dificulta a realização de fraudes contra o sistema. O dinheiro público é automaticamente transferido ao ganhador da licitação apenas se as metas preestabelecidas no edital forem aprovadas. Por ser uma codificação, as metas contratuais estabelecidas através do blockchain são binárias, o que traz mais controle e transparência na execução do contrato. A aplicação dos recursos pelo licitante pode ser acompanhada — inclusive os pagamentos para outros eventuais prestadores de serviços que atuem na obra pública — e isso ajuda a controlar desvios e direcionamento de dinheiro público para corrupção.

Todo esse processo pode ser auditado de forma rápida e segura. Além de torná-lo mais transparente, o blockchain ainda irá reduzir, substancialmente, o custo de se realizar um processo como esse, o que implica em maior economia do dinheiro público.

É claro que uma situação como essa depende de diversas variáveis legais, regulatórias e sistêmicas para que seja possível. Mas, pelo menos aqui no Brasil, essa realidade não parece estar tão longe. O Brasil, acredite se quiser, é um dos pioneiros no uso do blockchain no setor público. O nosso Banco Central foi um dos primeiros a lançar a sua moeda digital (também chamada em inglês de CBDC), o Drex, que nada mais é do que o nosso Real que pode ser utilizado em um blockchain. Ou seja, a possibilidade econômica já existe.

Mas não para por aí. Em 2022, o Tribunal de Contas da União (TCU) e o Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES) lançaram a Rede Blockchain Brasil, uma base de dados pública, sem fins lucrativos, que irá armazenar informações e dados em blocos e, nas palavras do próprio TCU, “vai garantir mais segurança a atos e contratos públicos”. Dentre as possibilidades, incluem-se emissão de identidades digitais, sistemas notariais, rastreamento de cadeia de suprimentos e contratos públicos, certificações e auditorias públicas.

Os benefícios do blockchain no fomento à integridade não se limitam ao setor público. Empresas que estiverem dispostas a desbravar este novo mundo tecnológico podem se utilizar de blockchains para melhorar os seus controles internos, reduzir custos e processos e até mesmo transacionar de forma muito mais rápida e segura, com entidades públicas e privadas. No mundo privado, o blockchain já vem sendo utilizado principalmente por empresas com grandes cadeias de suprimento, como varejo e logística, no mercado de seguros, imobiliário e no setor financeiro.

É fato que a tecnologia está mudando o mundo e, conforme evolui, as transformações vão ocorrendo de forma cada vez mais rápidas. O Brasil incentiva o uso dessas tecnologias, o que abre enorme mercado e possibilidades para todos os cidadãos. No entanto, o blockchain não é uma solução por si só e deve ser combinado com esforços regulatórios, políticos e sociais para atingir a maior eficácia possível. A sua implementação bem-sucedida requer planejamento, recursos e cooperação entre os setores público e privado. De toda forma, o horizonte parece ser bem promissor.

*Marcelo Zenkner, sócio na área de Compliance e Investigação de TozziniFreire Advogados e conselheiro superior no Instituto Não Aceito Corrupção

*Fabio R. Heilberg, advogado na área de Compliance e Investigação de TozziniFreire Advogados

Este texto reflete única e exclusivamente a opinião do(a) autor(a) e não representa a visão do Instituto Não Aceito Corrupção. Esta série é uma parceria entre o blog e o Instituto Não Aceito Corrupção (Inac). Os artigos têm publicação periódica

Antes de o combate à corrupção entrar na pauta de grandes corporações e países, já se falava nesse combate através da tecnologia. Ela possibilitou a redução de papéis impressos e substitui pagamentos em espécie por transferências bancárias e digitais. A corrupção se alimenta da burocracia, então, todas as ferramentas que a reduzem auxiliam a combater desvios e trazer mais transparência e controles. Mas como a tecnologia irá evoluir para continuar a ajudar no combate à corrupção? Qual será o próximo salto tecnológico que irá trazer ainda mais transparência e controle aos recursos públicos?

Marcelo Zenkner Foto: Inac/Divulgação

No meio da tecnologia e inovação, fala-se na chamada Web 3, uma nova fase na internet das coisas que trará mais transparência no uso e propriedade dos dados. Se hoje não sabemos exatamente quais entidades detêm e como usam as nossas informações, com a Web 3 a tendência é que cada indivíduo ou empresa passe a ter maior controle sobre os seus dados.

A ferramenta que permite este maior controle através da Web 3 é o blockchain (o blockchain é na verdade um tipo de DLT (Distributed Ledger Technology), mas usaremos o termo de forma ampla). Mais conhecido no Brasil por permitir transações com criptomoedas, como o Bitcoin, o blockchain é, na verdade, uma ferramenta muito mais versátil e o seu uso vem se expandindo bastante ao redor do mundo. Por um lado, o blockchain permite que duas partes transacionem por meio digital, com o uso de criptoativos (que têm definição mais ampla que as criptomoedas). Por outro, ele também pode trazer maior transparência e proteção ao uso de dados. Isso porque, ao recordar uma transação, o blockchain automaticamente registra e endossa todas as transações anteriores realizadas, fazendo com que essas transações fiquem imutáveis e visíveis para os outros membros da rede.

Essas características fazem do blockchain uma ferramenta eficaz no fomento à transparência pública e combate à corrupção. E por mais que o tema possa parecer futurista, o blockchain já está sendo utilizado nos dias de hoje com essas finalidades. Uma das primeiras organizações a reconhecer a sua utilidade foi o Banco Interamericano de Desenvolvimento (BID), que liderou, através do seu laboratório de inovação, o desenvolvimento da LACChain, uma rede de blockchain com o objetivo de fomentar a inovação, reduzir desigualdades sociais e econômicas e promover integridade de mercados através da tecnologia.

Como exemplo, podemos imaginar uma licitação pública em que todas as propostas são submetidas automaticamente, de forma imutável e pública. Em vez de passar por uma junta decisória, a própria ferramenta irá avaliar automaticamente, e de forma segura, as propostas que se enquadram dentro do edital, com o resultado sendo publicado em segundos — por sua natureza, o blockchain dificulta a realização de fraudes contra o sistema. O dinheiro público é automaticamente transferido ao ganhador da licitação apenas se as metas preestabelecidas no edital forem aprovadas. Por ser uma codificação, as metas contratuais estabelecidas através do blockchain são binárias, o que traz mais controle e transparência na execução do contrato. A aplicação dos recursos pelo licitante pode ser acompanhada — inclusive os pagamentos para outros eventuais prestadores de serviços que atuem na obra pública — e isso ajuda a controlar desvios e direcionamento de dinheiro público para corrupção.

Todo esse processo pode ser auditado de forma rápida e segura. Além de torná-lo mais transparente, o blockchain ainda irá reduzir, substancialmente, o custo de se realizar um processo como esse, o que implica em maior economia do dinheiro público.

É claro que uma situação como essa depende de diversas variáveis legais, regulatórias e sistêmicas para que seja possível. Mas, pelo menos aqui no Brasil, essa realidade não parece estar tão longe. O Brasil, acredite se quiser, é um dos pioneiros no uso do blockchain no setor público. O nosso Banco Central foi um dos primeiros a lançar a sua moeda digital (também chamada em inglês de CBDC), o Drex, que nada mais é do que o nosso Real que pode ser utilizado em um blockchain. Ou seja, a possibilidade econômica já existe.

Mas não para por aí. Em 2022, o Tribunal de Contas da União (TCU) e o Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES) lançaram a Rede Blockchain Brasil, uma base de dados pública, sem fins lucrativos, que irá armazenar informações e dados em blocos e, nas palavras do próprio TCU, “vai garantir mais segurança a atos e contratos públicos”. Dentre as possibilidades, incluem-se emissão de identidades digitais, sistemas notariais, rastreamento de cadeia de suprimentos e contratos públicos, certificações e auditorias públicas.

Os benefícios do blockchain no fomento à integridade não se limitam ao setor público. Empresas que estiverem dispostas a desbravar este novo mundo tecnológico podem se utilizar de blockchains para melhorar os seus controles internos, reduzir custos e processos e até mesmo transacionar de forma muito mais rápida e segura, com entidades públicas e privadas. No mundo privado, o blockchain já vem sendo utilizado principalmente por empresas com grandes cadeias de suprimento, como varejo e logística, no mercado de seguros, imobiliário e no setor financeiro.

É fato que a tecnologia está mudando o mundo e, conforme evolui, as transformações vão ocorrendo de forma cada vez mais rápidas. O Brasil incentiva o uso dessas tecnologias, o que abre enorme mercado e possibilidades para todos os cidadãos. No entanto, o blockchain não é uma solução por si só e deve ser combinado com esforços regulatórios, políticos e sociais para atingir a maior eficácia possível. A sua implementação bem-sucedida requer planejamento, recursos e cooperação entre os setores público e privado. De toda forma, o horizonte parece ser bem promissor.

*Marcelo Zenkner, sócio na área de Compliance e Investigação de TozziniFreire Advogados e conselheiro superior no Instituto Não Aceito Corrupção

*Fabio R. Heilberg, advogado na área de Compliance e Investigação de TozziniFreire Advogados

Este texto reflete única e exclusivamente a opinião do(a) autor(a) e não representa a visão do Instituto Não Aceito Corrupção. Esta série é uma parceria entre o blog e o Instituto Não Aceito Corrupção (Inac). Os artigos têm publicação periódica

Antes de o combate à corrupção entrar na pauta de grandes corporações e países, já se falava nesse combate através da tecnologia. Ela possibilitou a redução de papéis impressos e substitui pagamentos em espécie por transferências bancárias e digitais. A corrupção se alimenta da burocracia, então, todas as ferramentas que a reduzem auxiliam a combater desvios e trazer mais transparência e controles. Mas como a tecnologia irá evoluir para continuar a ajudar no combate à corrupção? Qual será o próximo salto tecnológico que irá trazer ainda mais transparência e controle aos recursos públicos?

Marcelo Zenkner Foto: Inac/Divulgação

No meio da tecnologia e inovação, fala-se na chamada Web 3, uma nova fase na internet das coisas que trará mais transparência no uso e propriedade dos dados. Se hoje não sabemos exatamente quais entidades detêm e como usam as nossas informações, com a Web 3 a tendência é que cada indivíduo ou empresa passe a ter maior controle sobre os seus dados.

A ferramenta que permite este maior controle através da Web 3 é o blockchain (o blockchain é na verdade um tipo de DLT (Distributed Ledger Technology), mas usaremos o termo de forma ampla). Mais conhecido no Brasil por permitir transações com criptomoedas, como o Bitcoin, o blockchain é, na verdade, uma ferramenta muito mais versátil e o seu uso vem se expandindo bastante ao redor do mundo. Por um lado, o blockchain permite que duas partes transacionem por meio digital, com o uso de criptoativos (que têm definição mais ampla que as criptomoedas). Por outro, ele também pode trazer maior transparência e proteção ao uso de dados. Isso porque, ao recordar uma transação, o blockchain automaticamente registra e endossa todas as transações anteriores realizadas, fazendo com que essas transações fiquem imutáveis e visíveis para os outros membros da rede.

Essas características fazem do blockchain uma ferramenta eficaz no fomento à transparência pública e combate à corrupção. E por mais que o tema possa parecer futurista, o blockchain já está sendo utilizado nos dias de hoje com essas finalidades. Uma das primeiras organizações a reconhecer a sua utilidade foi o Banco Interamericano de Desenvolvimento (BID), que liderou, através do seu laboratório de inovação, o desenvolvimento da LACChain, uma rede de blockchain com o objetivo de fomentar a inovação, reduzir desigualdades sociais e econômicas e promover integridade de mercados através da tecnologia.

Como exemplo, podemos imaginar uma licitação pública em que todas as propostas são submetidas automaticamente, de forma imutável e pública. Em vez de passar por uma junta decisória, a própria ferramenta irá avaliar automaticamente, e de forma segura, as propostas que se enquadram dentro do edital, com o resultado sendo publicado em segundos — por sua natureza, o blockchain dificulta a realização de fraudes contra o sistema. O dinheiro público é automaticamente transferido ao ganhador da licitação apenas se as metas preestabelecidas no edital forem aprovadas. Por ser uma codificação, as metas contratuais estabelecidas através do blockchain são binárias, o que traz mais controle e transparência na execução do contrato. A aplicação dos recursos pelo licitante pode ser acompanhada — inclusive os pagamentos para outros eventuais prestadores de serviços que atuem na obra pública — e isso ajuda a controlar desvios e direcionamento de dinheiro público para corrupção.

Todo esse processo pode ser auditado de forma rápida e segura. Além de torná-lo mais transparente, o blockchain ainda irá reduzir, substancialmente, o custo de se realizar um processo como esse, o que implica em maior economia do dinheiro público.

É claro que uma situação como essa depende de diversas variáveis legais, regulatórias e sistêmicas para que seja possível. Mas, pelo menos aqui no Brasil, essa realidade não parece estar tão longe. O Brasil, acredite se quiser, é um dos pioneiros no uso do blockchain no setor público. O nosso Banco Central foi um dos primeiros a lançar a sua moeda digital (também chamada em inglês de CBDC), o Drex, que nada mais é do que o nosso Real que pode ser utilizado em um blockchain. Ou seja, a possibilidade econômica já existe.

Mas não para por aí. Em 2022, o Tribunal de Contas da União (TCU) e o Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES) lançaram a Rede Blockchain Brasil, uma base de dados pública, sem fins lucrativos, que irá armazenar informações e dados em blocos e, nas palavras do próprio TCU, “vai garantir mais segurança a atos e contratos públicos”. Dentre as possibilidades, incluem-se emissão de identidades digitais, sistemas notariais, rastreamento de cadeia de suprimentos e contratos públicos, certificações e auditorias públicas.

Os benefícios do blockchain no fomento à integridade não se limitam ao setor público. Empresas que estiverem dispostas a desbravar este novo mundo tecnológico podem se utilizar de blockchains para melhorar os seus controles internos, reduzir custos e processos e até mesmo transacionar de forma muito mais rápida e segura, com entidades públicas e privadas. No mundo privado, o blockchain já vem sendo utilizado principalmente por empresas com grandes cadeias de suprimento, como varejo e logística, no mercado de seguros, imobiliário e no setor financeiro.

É fato que a tecnologia está mudando o mundo e, conforme evolui, as transformações vão ocorrendo de forma cada vez mais rápidas. O Brasil incentiva o uso dessas tecnologias, o que abre enorme mercado e possibilidades para todos os cidadãos. No entanto, o blockchain não é uma solução por si só e deve ser combinado com esforços regulatórios, políticos e sociais para atingir a maior eficácia possível. A sua implementação bem-sucedida requer planejamento, recursos e cooperação entre os setores público e privado. De toda forma, o horizonte parece ser bem promissor.

*Marcelo Zenkner, sócio na área de Compliance e Investigação de TozziniFreire Advogados e conselheiro superior no Instituto Não Aceito Corrupção

*Fabio R. Heilberg, advogado na área de Compliance e Investigação de TozziniFreire Advogados

Este texto reflete única e exclusivamente a opinião do(a) autor(a) e não representa a visão do Instituto Não Aceito Corrupção. Esta série é uma parceria entre o blog e o Instituto Não Aceito Corrupção (Inac). Os artigos têm publicação periódica

Antes de o combate à corrupção entrar na pauta de grandes corporações e países, já se falava nesse combate através da tecnologia. Ela possibilitou a redução de papéis impressos e substitui pagamentos em espécie por transferências bancárias e digitais. A corrupção se alimenta da burocracia, então, todas as ferramentas que a reduzem auxiliam a combater desvios e trazer mais transparência e controles. Mas como a tecnologia irá evoluir para continuar a ajudar no combate à corrupção? Qual será o próximo salto tecnológico que irá trazer ainda mais transparência e controle aos recursos públicos?

Marcelo Zenkner Foto: Inac/Divulgação

No meio da tecnologia e inovação, fala-se na chamada Web 3, uma nova fase na internet das coisas que trará mais transparência no uso e propriedade dos dados. Se hoje não sabemos exatamente quais entidades detêm e como usam as nossas informações, com a Web 3 a tendência é que cada indivíduo ou empresa passe a ter maior controle sobre os seus dados.

A ferramenta que permite este maior controle através da Web 3 é o blockchain (o blockchain é na verdade um tipo de DLT (Distributed Ledger Technology), mas usaremos o termo de forma ampla). Mais conhecido no Brasil por permitir transações com criptomoedas, como o Bitcoin, o blockchain é, na verdade, uma ferramenta muito mais versátil e o seu uso vem se expandindo bastante ao redor do mundo. Por um lado, o blockchain permite que duas partes transacionem por meio digital, com o uso de criptoativos (que têm definição mais ampla que as criptomoedas). Por outro, ele também pode trazer maior transparência e proteção ao uso de dados. Isso porque, ao recordar uma transação, o blockchain automaticamente registra e endossa todas as transações anteriores realizadas, fazendo com que essas transações fiquem imutáveis e visíveis para os outros membros da rede.

Essas características fazem do blockchain uma ferramenta eficaz no fomento à transparência pública e combate à corrupção. E por mais que o tema possa parecer futurista, o blockchain já está sendo utilizado nos dias de hoje com essas finalidades. Uma das primeiras organizações a reconhecer a sua utilidade foi o Banco Interamericano de Desenvolvimento (BID), que liderou, através do seu laboratório de inovação, o desenvolvimento da LACChain, uma rede de blockchain com o objetivo de fomentar a inovação, reduzir desigualdades sociais e econômicas e promover integridade de mercados através da tecnologia.

Como exemplo, podemos imaginar uma licitação pública em que todas as propostas são submetidas automaticamente, de forma imutável e pública. Em vez de passar por uma junta decisória, a própria ferramenta irá avaliar automaticamente, e de forma segura, as propostas que se enquadram dentro do edital, com o resultado sendo publicado em segundos — por sua natureza, o blockchain dificulta a realização de fraudes contra o sistema. O dinheiro público é automaticamente transferido ao ganhador da licitação apenas se as metas preestabelecidas no edital forem aprovadas. Por ser uma codificação, as metas contratuais estabelecidas através do blockchain são binárias, o que traz mais controle e transparência na execução do contrato. A aplicação dos recursos pelo licitante pode ser acompanhada — inclusive os pagamentos para outros eventuais prestadores de serviços que atuem na obra pública — e isso ajuda a controlar desvios e direcionamento de dinheiro público para corrupção.

Todo esse processo pode ser auditado de forma rápida e segura. Além de torná-lo mais transparente, o blockchain ainda irá reduzir, substancialmente, o custo de se realizar um processo como esse, o que implica em maior economia do dinheiro público.

É claro que uma situação como essa depende de diversas variáveis legais, regulatórias e sistêmicas para que seja possível. Mas, pelo menos aqui no Brasil, essa realidade não parece estar tão longe. O Brasil, acredite se quiser, é um dos pioneiros no uso do blockchain no setor público. O nosso Banco Central foi um dos primeiros a lançar a sua moeda digital (também chamada em inglês de CBDC), o Drex, que nada mais é do que o nosso Real que pode ser utilizado em um blockchain. Ou seja, a possibilidade econômica já existe.

Mas não para por aí. Em 2022, o Tribunal de Contas da União (TCU) e o Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES) lançaram a Rede Blockchain Brasil, uma base de dados pública, sem fins lucrativos, que irá armazenar informações e dados em blocos e, nas palavras do próprio TCU, “vai garantir mais segurança a atos e contratos públicos”. Dentre as possibilidades, incluem-se emissão de identidades digitais, sistemas notariais, rastreamento de cadeia de suprimentos e contratos públicos, certificações e auditorias públicas.

Os benefícios do blockchain no fomento à integridade não se limitam ao setor público. Empresas que estiverem dispostas a desbravar este novo mundo tecnológico podem se utilizar de blockchains para melhorar os seus controles internos, reduzir custos e processos e até mesmo transacionar de forma muito mais rápida e segura, com entidades públicas e privadas. No mundo privado, o blockchain já vem sendo utilizado principalmente por empresas com grandes cadeias de suprimento, como varejo e logística, no mercado de seguros, imobiliário e no setor financeiro.

É fato que a tecnologia está mudando o mundo e, conforme evolui, as transformações vão ocorrendo de forma cada vez mais rápidas. O Brasil incentiva o uso dessas tecnologias, o que abre enorme mercado e possibilidades para todos os cidadãos. No entanto, o blockchain não é uma solução por si só e deve ser combinado com esforços regulatórios, políticos e sociais para atingir a maior eficácia possível. A sua implementação bem-sucedida requer planejamento, recursos e cooperação entre os setores público e privado. De toda forma, o horizonte parece ser bem promissor.

*Marcelo Zenkner, sócio na área de Compliance e Investigação de TozziniFreire Advogados e conselheiro superior no Instituto Não Aceito Corrupção

*Fabio R. Heilberg, advogado na área de Compliance e Investigação de TozziniFreire Advogados

Este texto reflete única e exclusivamente a opinião do(a) autor(a) e não representa a visão do Instituto Não Aceito Corrupção. Esta série é uma parceria entre o blog e o Instituto Não Aceito Corrupção (Inac). Os artigos têm publicação periódica

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