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‘Tem gado de tudo que é lado’, diz Duvivier, hostilizado por cobrar ‘coerência’ de Lula no STF


Humorista turbinou campanha por jurista negra para a vaga que será aberta com a aposentadoria da ministra Rosa Weber, ainda em setembro; ‘O STF é onde o Lula talvez tenha errado mais claramente’, avalia comediante do programa Greg News, da HBO

Por Daniel Haidar

O humorista e jornalista Gregório Duvivier virou o alvo mais recente de apoiadores radicais do presidente Luiz Inácio Lula da Silva. Ele aderiu e promoveu no seu programa Greg News, da HBO, a campanha pela indicação de uma jurista negra ao Supremo Tribunal Federal (STF) na vaga que será aberta com a aposentadoria da ministra Rosa Weber em setembro. Duvivier argumenta que apenas faz uma ‘cobrança’ para que Lula seja coerente.

“O governo subiu a rampa com o cacique Raoni, com pessoas com deficiências (PCDs) e com pessoas negras, então isso foi uma promessa. É só para subir a rampa ou é para ter poder de fato? É isso que Lula precisa responder através da indicação de uma jurista negra. É uma demanda por coerência”, afirmou o humorista em entrevista ao Estadão.

Duvivier lançou o site www.tomaumcafecomelas.com.br como parte da campanha promovida por diferentes grupos para que Lula pelo menos conheça juristas negras como a juíza carioca Adriana Cruz, a promotora baiana Lívia Sant’Anna Vaz ou a advogada gaúcha Soraia Mendes, antes de fazer sua próxima nomeação ao STF.

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O ator e humorista Gregorio Duvivier, integrante do grupo Porta dos Fundos Foto: Mauro Pimentel/ AFP

Apesar dos ataques concentrados a Duvivier, ele não é o único crítico das nomeações estudadas e feitas por Lula ao Supremo.

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O presidente tem sido criticado por diferentes personalidades e aliados porque sinalizou a escolha de um homem para a vaga de Rosa Weber. Os mais cotados na disputa são Jorge Messias, ministro-chefe da Advocacia-Geral da União (AGU), e Bruno Dantas, presidente do Tribunal de Contas da União (TCU).

A interlocutores, Lula justificou que deseja colocar no STF alguém com quem tenha liberdade para ‘trocar ideias’.

Mesmo entre grupos de esquerda e apoiadores, Lula viu crescerem as críticas às suas escolhas para o Supremo depois da nomeação de Cristiano Zanin, seu advogado pessoal, na vaga aberta com a saída de Ricardo Lewandowski.

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“Eu sabia que Zanin era conservador, mas a surpresa é que eu não sabia que ele era tão despreparado. O voto sobre drogas (contra a descriminalização do porte pessoal) vai além do conservadorismo. Tem erros básicos”, afirma Duvivier.

LEIA GREGÓRIO DUVIVIER

ESTADÃO: Como nasceu a decisão de apoiar, pelo seu programa, a campanha pela indicação de uma jurista negra ao Supremo Tribunal Federal?

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GREGÓRIO DUVIVIER: A gente só divulgou uma campanha que já existia. Tem várias demandas do mesmo tipo, da Coalizão Negra por Direitos, das juristas negras. Fizemos apenas um programa de televisão, divulgando iniciativas que já existem há muito tempo. Tem muita gente qualificada. Essa é a loucura. Tem a juíza carioca Adriana Cruz, a promotora baiana Lívia Sant’Anna Vaz e a advogada gaúcha Soraia Mendes (citadas na campanha apoiada em www.tomaumcafecomelas.com.br). Tem muita gente legal. Só que não sou eu quem tem que indicar. O argumento principal (de quem criticou a campanha) é que quem indica é o Lula. Sim, Lula é o presidente. Mas não significa que ele esteja imune à pressão. Não é uma monarquia absoluta. As pessoas acham que Lula não está sofrendo pressão da bancada ruralista, evangélica etc. A pressão conservadora em cima dele é gigante. A pressão do lado de cá é necessária para equilibrar. A gente precisa fazer pressão da sociedade civil para que ele possa responder à pressão conservadora. É uma loucura essa opinião dele de que votos do STF deveriam ser secretos. Ele acha que se votos forem secretos não vai ter lobby? Não vai ter pressão? Sim, vai ter pressão do empresariado, dos ruralistas, de todos os lobistas profissionais. Só que não vai ter pressão do povo. A indicação dele para o STF é a mesma coisa. Só quem não está nessa equação é o povo que o elegeu. Tem uma base que quer ser mais lulista que o Lula. Acho muito ruim. Eles deviam ter aprendido não só com a história da (ex-presidente) Dilma Rousseff, mas também do (ex-presidente) Jair Bolsonaro. Bolsonaro caiu e perdeu muito por causa da Carla Zambelli, do Roberto Jefferson, dos apoiadores mais fanáticos, que só ajudaram a derrubá-lo. Quando alguém brada em alto e bom som que eu estou sendo financiado por Washington para indicar uma ministra negra e enfraquecer a democracia brasileira, a pessoa está descredibilizando por tabela o Lula. Você olha e pensa que não quer fazer parte desse gado. Tem um povo terraplanista de esquerda.

ESTADÃO: Como recebeu os ataques nas redes que o acusaram de chantagear Lula?

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DUVIVIER: A verdade é que tem gado de tudo que é lado. Lula não tem nada a ver com Bolsonaro. O lulismo não tem nada a ver com o bolsonarismo. Mas a base de fãs tem, sim, pessoas igualmente estúpidas. Existe uma distribuição de estupidez, que é muito ruim. A sorte é que o Lula, ao contrário do Bolsonaro, não mergulha nisso. Mas o importante é que o site www.tomaumcafecomelas.com.br já está com mais de 70 mil assinaturas (na quarta-feira, 6), que foi o site que a gente sugeriu. Chegaram 70 mil assinaturas na campanha, que é imensamente maior do que eu. Não foram feitas assinaturas porque eu pedi. Não tem nada a ver comigo. A principal defesa por uma jurista negra é que também seria bom para o governo. O governo subiu a rampa com o cacique Raoni, com pessoas com deficiências (PCDs) e com pessoas negras, então isso foi uma promessa. É só para subir a rampa ou é para ter poder de fato? É isso que Lula precisa responder através da indicação de uma jurista negra. É uma demanda por coerência. Não é uma demanda por algo novo.

ESTADÃO: Há ainda esperança de que a campanha dê resultados?

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DUVIVIER: Não tenho conhecimento nenhum sobre o interior do Palácio do Planalto, menos ainda sobre a cabeça do Lula. Mas torço para que ele esteja considerando. A base de fãs falou que eu estava emparedando, assediando e chantageando o Lula. É comovente o poder que dão para um comediante. Nosso pedido é apenas para que ele conheça essas juristas negras. Isso é meia hora, que seja. Não tenho relação nenhuma com o governo. Acho que é bonito que seja assim. Meu lugar é este, de comediante e jornalista. Quando faço pressão, é como um eleitor apenas. Não como alguém a quem se deve algo. É algo a se considerar, apenas isso. É desse lugar de um eleitor que tem a sorte de se comunicar com muitos eleitores.

ESTADÃO: No meio dos ataques ao seu envolvimento na campanha houve até quem resgatasse a história do seu tataravô. Isso o surpreendeu?

DUVIVIER: O argumento de um modo geral das pessoas furiosas com essa sugestão é um argumento anti-identitário. Dizem que não importa cor ou gênero, que tem que ser um ótimo jurista. Para eles, apenas por acaso tem 11 brancos hoje lá. Para eles, Dias Toffoli foi escolhido pela excelência dele, não porque era advogado do PT. Mas essas mesmas pessoas me chamam de humorista branco do Leblon, de bisneto de belga. As pessoas com discurso anti-identitário foram buscar a identidade do meu tataravô para me descredibilizar. Fizeram a coisa mais fascista do mundo, que é julgar a pessoa pela identidade do seu tataravô. Dizer que por causa disso sua opinião é da classe dominante. Todos os argumentos são de que estou querendo tutelar Lula. Sou um eleitor apenas.

ESTADÃO: Já tinha recebido pedidos para não cobrar Lula em outros momentos?

DUVIVIER: Agora foi sui generis o que está acontecendo. Porque antes do Cristiano Zanin ser indicado para o STF existia o argumento de que havia preconceito, de que Lula não colocaria lá um ministro conservador. Eu critiquei: ‘vamos ver’. Provou-se que realmente ele botou um cara conservador lá dentro. E aí acabou esse argumento. O argumento passou a ser então que o Lula faz o que quiser, o que é um argumento muito perigoso sobretudo para Lula e para o governo. Ele não tirou a Ana Moser do Ministério dos Esportes porque quer. Está tirando porque o presidente da Câmara dos Deputados, Arthur Lira (PP-AL), mandou. Achar que Lula faz o que quer é uma estupidez. A pressão faria bem ao Lula. Lula precisa ser pressionado para governar. Theodore Roosevelt (1858-1919) foi eleito presidente dos Estados Unidos com apoio dos sindicatos e governou pela direita sem concessão nenhuma. Os sindicatos foram lá reclamar e Roosevelt disse: ‘mas por que vocês não exigiram nada? Acharam que eu ia dar de graça?’ É assim a política. Você precisa exigir. Se a sua adesão for imediata, na política ela não conta. Quem está pressionando hoje é a bancada ruralista, da bala, evangélica etc. São os grandes lobbies do Brasil. Se só eles pressionarem, Lula vai governar para eles. Então a gente tem que vocalizar mesmo. Eu gritei, fui a Curitiba (em defesa de Lula), fui processado por isso. Foi realmente uma injustiça gigante a eleição do Bolsonaro, com consequências desastrosas. Acho que a revolta em parte é justificada por isso. É muito diferente acusar Lula de ladrão e falar assim: ‘que tal se você conhecesse algumas juristas negras?’ Se isso for golpismo, aí você está achando que o Lula é de cristal. E não é, pelo amor de Deus.

ESTADÃO: Por que a preocupação com o Supremo agora?

DUVIVIER: Na Suprema Corte, a indicação vai durar 30 anos. Vimos a importância que um ministro pode ter. Foi apenas o ministro Dias Toffoli quem impediu Lula de ir ao enterro do irmão (Vavá). Foi apenas um ministro, Alexandre de Moraes, quem garantiu o segundo turno das eleições quando todo mundo tentou cancelar. O STF é muito central e é onde Lula talvez tenha errado mais claramente. Em outros casos, dá para dizer que ele foi pressionado e perdeu, como o caso da Ana Moser. É um caso que ele foi obrigado a ceder. Mas no caso dele indicar o próprio advogado não acho que tenha sido pressão. Acho que foi realmente um erro. Foi uma escolha baseada apenas na confiança e na intimidade pessoal, para um cargo que vai ultrapassar a sua vida em muitos anos.

ESTADÃO: Zanin o surpreendeu?

DUVIVIER: Eu sabia que Zanin era conservador, mas a surpresa é que eu não sabia que ele era tão despreparado. O voto sobre drogas (contra a descriminalização do porte pessoal) vai além do conservadorismo. Tem erros básicos. Ele diz que a Califórnia foi um fracasso na legalização da maconha. Depois da Califórnia, praticamente todos os estados americanos legalizaram. Me surpreendeu pelo despreparo.

O humorista e jornalista Gregório Duvivier virou o alvo mais recente de apoiadores radicais do presidente Luiz Inácio Lula da Silva. Ele aderiu e promoveu no seu programa Greg News, da HBO, a campanha pela indicação de uma jurista negra ao Supremo Tribunal Federal (STF) na vaga que será aberta com a aposentadoria da ministra Rosa Weber em setembro. Duvivier argumenta que apenas faz uma ‘cobrança’ para que Lula seja coerente.

“O governo subiu a rampa com o cacique Raoni, com pessoas com deficiências (PCDs) e com pessoas negras, então isso foi uma promessa. É só para subir a rampa ou é para ter poder de fato? É isso que Lula precisa responder através da indicação de uma jurista negra. É uma demanda por coerência”, afirmou o humorista em entrevista ao Estadão.

Duvivier lançou o site www.tomaumcafecomelas.com.br como parte da campanha promovida por diferentes grupos para que Lula pelo menos conheça juristas negras como a juíza carioca Adriana Cruz, a promotora baiana Lívia Sant’Anna Vaz ou a advogada gaúcha Soraia Mendes, antes de fazer sua próxima nomeação ao STF.

O ator e humorista Gregorio Duvivier, integrante do grupo Porta dos Fundos Foto: Mauro Pimentel/ AFP

Apesar dos ataques concentrados a Duvivier, ele não é o único crítico das nomeações estudadas e feitas por Lula ao Supremo.

O presidente tem sido criticado por diferentes personalidades e aliados porque sinalizou a escolha de um homem para a vaga de Rosa Weber. Os mais cotados na disputa são Jorge Messias, ministro-chefe da Advocacia-Geral da União (AGU), e Bruno Dantas, presidente do Tribunal de Contas da União (TCU).

A interlocutores, Lula justificou que deseja colocar no STF alguém com quem tenha liberdade para ‘trocar ideias’.

Mesmo entre grupos de esquerda e apoiadores, Lula viu crescerem as críticas às suas escolhas para o Supremo depois da nomeação de Cristiano Zanin, seu advogado pessoal, na vaga aberta com a saída de Ricardo Lewandowski.

“Eu sabia que Zanin era conservador, mas a surpresa é que eu não sabia que ele era tão despreparado. O voto sobre drogas (contra a descriminalização do porte pessoal) vai além do conservadorismo. Tem erros básicos”, afirma Duvivier.

LEIA GREGÓRIO DUVIVIER

ESTADÃO: Como nasceu a decisão de apoiar, pelo seu programa, a campanha pela indicação de uma jurista negra ao Supremo Tribunal Federal?

GREGÓRIO DUVIVIER: A gente só divulgou uma campanha que já existia. Tem várias demandas do mesmo tipo, da Coalizão Negra por Direitos, das juristas negras. Fizemos apenas um programa de televisão, divulgando iniciativas que já existem há muito tempo. Tem muita gente qualificada. Essa é a loucura. Tem a juíza carioca Adriana Cruz, a promotora baiana Lívia Sant’Anna Vaz e a advogada gaúcha Soraia Mendes (citadas na campanha apoiada em www.tomaumcafecomelas.com.br). Tem muita gente legal. Só que não sou eu quem tem que indicar. O argumento principal (de quem criticou a campanha) é que quem indica é o Lula. Sim, Lula é o presidente. Mas não significa que ele esteja imune à pressão. Não é uma monarquia absoluta. As pessoas acham que Lula não está sofrendo pressão da bancada ruralista, evangélica etc. A pressão conservadora em cima dele é gigante. A pressão do lado de cá é necessária para equilibrar. A gente precisa fazer pressão da sociedade civil para que ele possa responder à pressão conservadora. É uma loucura essa opinião dele de que votos do STF deveriam ser secretos. Ele acha que se votos forem secretos não vai ter lobby? Não vai ter pressão? Sim, vai ter pressão do empresariado, dos ruralistas, de todos os lobistas profissionais. Só que não vai ter pressão do povo. A indicação dele para o STF é a mesma coisa. Só quem não está nessa equação é o povo que o elegeu. Tem uma base que quer ser mais lulista que o Lula. Acho muito ruim. Eles deviam ter aprendido não só com a história da (ex-presidente) Dilma Rousseff, mas também do (ex-presidente) Jair Bolsonaro. Bolsonaro caiu e perdeu muito por causa da Carla Zambelli, do Roberto Jefferson, dos apoiadores mais fanáticos, que só ajudaram a derrubá-lo. Quando alguém brada em alto e bom som que eu estou sendo financiado por Washington para indicar uma ministra negra e enfraquecer a democracia brasileira, a pessoa está descredibilizando por tabela o Lula. Você olha e pensa que não quer fazer parte desse gado. Tem um povo terraplanista de esquerda.

ESTADÃO: Como recebeu os ataques nas redes que o acusaram de chantagear Lula?

DUVIVIER: A verdade é que tem gado de tudo que é lado. Lula não tem nada a ver com Bolsonaro. O lulismo não tem nada a ver com o bolsonarismo. Mas a base de fãs tem, sim, pessoas igualmente estúpidas. Existe uma distribuição de estupidez, que é muito ruim. A sorte é que o Lula, ao contrário do Bolsonaro, não mergulha nisso. Mas o importante é que o site www.tomaumcafecomelas.com.br já está com mais de 70 mil assinaturas (na quarta-feira, 6), que foi o site que a gente sugeriu. Chegaram 70 mil assinaturas na campanha, que é imensamente maior do que eu. Não foram feitas assinaturas porque eu pedi. Não tem nada a ver comigo. A principal defesa por uma jurista negra é que também seria bom para o governo. O governo subiu a rampa com o cacique Raoni, com pessoas com deficiências (PCDs) e com pessoas negras, então isso foi uma promessa. É só para subir a rampa ou é para ter poder de fato? É isso que Lula precisa responder através da indicação de uma jurista negra. É uma demanda por coerência. Não é uma demanda por algo novo.

ESTADÃO: Há ainda esperança de que a campanha dê resultados?

DUVIVIER: Não tenho conhecimento nenhum sobre o interior do Palácio do Planalto, menos ainda sobre a cabeça do Lula. Mas torço para que ele esteja considerando. A base de fãs falou que eu estava emparedando, assediando e chantageando o Lula. É comovente o poder que dão para um comediante. Nosso pedido é apenas para que ele conheça essas juristas negras. Isso é meia hora, que seja. Não tenho relação nenhuma com o governo. Acho que é bonito que seja assim. Meu lugar é este, de comediante e jornalista. Quando faço pressão, é como um eleitor apenas. Não como alguém a quem se deve algo. É algo a se considerar, apenas isso. É desse lugar de um eleitor que tem a sorte de se comunicar com muitos eleitores.

ESTADÃO: No meio dos ataques ao seu envolvimento na campanha houve até quem resgatasse a história do seu tataravô. Isso o surpreendeu?

DUVIVIER: O argumento de um modo geral das pessoas furiosas com essa sugestão é um argumento anti-identitário. Dizem que não importa cor ou gênero, que tem que ser um ótimo jurista. Para eles, apenas por acaso tem 11 brancos hoje lá. Para eles, Dias Toffoli foi escolhido pela excelência dele, não porque era advogado do PT. Mas essas mesmas pessoas me chamam de humorista branco do Leblon, de bisneto de belga. As pessoas com discurso anti-identitário foram buscar a identidade do meu tataravô para me descredibilizar. Fizeram a coisa mais fascista do mundo, que é julgar a pessoa pela identidade do seu tataravô. Dizer que por causa disso sua opinião é da classe dominante. Todos os argumentos são de que estou querendo tutelar Lula. Sou um eleitor apenas.

ESTADÃO: Já tinha recebido pedidos para não cobrar Lula em outros momentos?

DUVIVIER: Agora foi sui generis o que está acontecendo. Porque antes do Cristiano Zanin ser indicado para o STF existia o argumento de que havia preconceito, de que Lula não colocaria lá um ministro conservador. Eu critiquei: ‘vamos ver’. Provou-se que realmente ele botou um cara conservador lá dentro. E aí acabou esse argumento. O argumento passou a ser então que o Lula faz o que quiser, o que é um argumento muito perigoso sobretudo para Lula e para o governo. Ele não tirou a Ana Moser do Ministério dos Esportes porque quer. Está tirando porque o presidente da Câmara dos Deputados, Arthur Lira (PP-AL), mandou. Achar que Lula faz o que quer é uma estupidez. A pressão faria bem ao Lula. Lula precisa ser pressionado para governar. Theodore Roosevelt (1858-1919) foi eleito presidente dos Estados Unidos com apoio dos sindicatos e governou pela direita sem concessão nenhuma. Os sindicatos foram lá reclamar e Roosevelt disse: ‘mas por que vocês não exigiram nada? Acharam que eu ia dar de graça?’ É assim a política. Você precisa exigir. Se a sua adesão for imediata, na política ela não conta. Quem está pressionando hoje é a bancada ruralista, da bala, evangélica etc. São os grandes lobbies do Brasil. Se só eles pressionarem, Lula vai governar para eles. Então a gente tem que vocalizar mesmo. Eu gritei, fui a Curitiba (em defesa de Lula), fui processado por isso. Foi realmente uma injustiça gigante a eleição do Bolsonaro, com consequências desastrosas. Acho que a revolta em parte é justificada por isso. É muito diferente acusar Lula de ladrão e falar assim: ‘que tal se você conhecesse algumas juristas negras?’ Se isso for golpismo, aí você está achando que o Lula é de cristal. E não é, pelo amor de Deus.

ESTADÃO: Por que a preocupação com o Supremo agora?

DUVIVIER: Na Suprema Corte, a indicação vai durar 30 anos. Vimos a importância que um ministro pode ter. Foi apenas o ministro Dias Toffoli quem impediu Lula de ir ao enterro do irmão (Vavá). Foi apenas um ministro, Alexandre de Moraes, quem garantiu o segundo turno das eleições quando todo mundo tentou cancelar. O STF é muito central e é onde Lula talvez tenha errado mais claramente. Em outros casos, dá para dizer que ele foi pressionado e perdeu, como o caso da Ana Moser. É um caso que ele foi obrigado a ceder. Mas no caso dele indicar o próprio advogado não acho que tenha sido pressão. Acho que foi realmente um erro. Foi uma escolha baseada apenas na confiança e na intimidade pessoal, para um cargo que vai ultrapassar a sua vida em muitos anos.

ESTADÃO: Zanin o surpreendeu?

DUVIVIER: Eu sabia que Zanin era conservador, mas a surpresa é que eu não sabia que ele era tão despreparado. O voto sobre drogas (contra a descriminalização do porte pessoal) vai além do conservadorismo. Tem erros básicos. Ele diz que a Califórnia foi um fracasso na legalização da maconha. Depois da Califórnia, praticamente todos os estados americanos legalizaram. Me surpreendeu pelo despreparo.

O humorista e jornalista Gregório Duvivier virou o alvo mais recente de apoiadores radicais do presidente Luiz Inácio Lula da Silva. Ele aderiu e promoveu no seu programa Greg News, da HBO, a campanha pela indicação de uma jurista negra ao Supremo Tribunal Federal (STF) na vaga que será aberta com a aposentadoria da ministra Rosa Weber em setembro. Duvivier argumenta que apenas faz uma ‘cobrança’ para que Lula seja coerente.

“O governo subiu a rampa com o cacique Raoni, com pessoas com deficiências (PCDs) e com pessoas negras, então isso foi uma promessa. É só para subir a rampa ou é para ter poder de fato? É isso que Lula precisa responder através da indicação de uma jurista negra. É uma demanda por coerência”, afirmou o humorista em entrevista ao Estadão.

Duvivier lançou o site www.tomaumcafecomelas.com.br como parte da campanha promovida por diferentes grupos para que Lula pelo menos conheça juristas negras como a juíza carioca Adriana Cruz, a promotora baiana Lívia Sant’Anna Vaz ou a advogada gaúcha Soraia Mendes, antes de fazer sua próxima nomeação ao STF.

O ator e humorista Gregorio Duvivier, integrante do grupo Porta dos Fundos Foto: Mauro Pimentel/ AFP

Apesar dos ataques concentrados a Duvivier, ele não é o único crítico das nomeações estudadas e feitas por Lula ao Supremo.

O presidente tem sido criticado por diferentes personalidades e aliados porque sinalizou a escolha de um homem para a vaga de Rosa Weber. Os mais cotados na disputa são Jorge Messias, ministro-chefe da Advocacia-Geral da União (AGU), e Bruno Dantas, presidente do Tribunal de Contas da União (TCU).

A interlocutores, Lula justificou que deseja colocar no STF alguém com quem tenha liberdade para ‘trocar ideias’.

Mesmo entre grupos de esquerda e apoiadores, Lula viu crescerem as críticas às suas escolhas para o Supremo depois da nomeação de Cristiano Zanin, seu advogado pessoal, na vaga aberta com a saída de Ricardo Lewandowski.

“Eu sabia que Zanin era conservador, mas a surpresa é que eu não sabia que ele era tão despreparado. O voto sobre drogas (contra a descriminalização do porte pessoal) vai além do conservadorismo. Tem erros básicos”, afirma Duvivier.

LEIA GREGÓRIO DUVIVIER

ESTADÃO: Como nasceu a decisão de apoiar, pelo seu programa, a campanha pela indicação de uma jurista negra ao Supremo Tribunal Federal?

GREGÓRIO DUVIVIER: A gente só divulgou uma campanha que já existia. Tem várias demandas do mesmo tipo, da Coalizão Negra por Direitos, das juristas negras. Fizemos apenas um programa de televisão, divulgando iniciativas que já existem há muito tempo. Tem muita gente qualificada. Essa é a loucura. Tem a juíza carioca Adriana Cruz, a promotora baiana Lívia Sant’Anna Vaz e a advogada gaúcha Soraia Mendes (citadas na campanha apoiada em www.tomaumcafecomelas.com.br). Tem muita gente legal. Só que não sou eu quem tem que indicar. O argumento principal (de quem criticou a campanha) é que quem indica é o Lula. Sim, Lula é o presidente. Mas não significa que ele esteja imune à pressão. Não é uma monarquia absoluta. As pessoas acham que Lula não está sofrendo pressão da bancada ruralista, evangélica etc. A pressão conservadora em cima dele é gigante. A pressão do lado de cá é necessária para equilibrar. A gente precisa fazer pressão da sociedade civil para que ele possa responder à pressão conservadora. É uma loucura essa opinião dele de que votos do STF deveriam ser secretos. Ele acha que se votos forem secretos não vai ter lobby? Não vai ter pressão? Sim, vai ter pressão do empresariado, dos ruralistas, de todos os lobistas profissionais. Só que não vai ter pressão do povo. A indicação dele para o STF é a mesma coisa. Só quem não está nessa equação é o povo que o elegeu. Tem uma base que quer ser mais lulista que o Lula. Acho muito ruim. Eles deviam ter aprendido não só com a história da (ex-presidente) Dilma Rousseff, mas também do (ex-presidente) Jair Bolsonaro. Bolsonaro caiu e perdeu muito por causa da Carla Zambelli, do Roberto Jefferson, dos apoiadores mais fanáticos, que só ajudaram a derrubá-lo. Quando alguém brada em alto e bom som que eu estou sendo financiado por Washington para indicar uma ministra negra e enfraquecer a democracia brasileira, a pessoa está descredibilizando por tabela o Lula. Você olha e pensa que não quer fazer parte desse gado. Tem um povo terraplanista de esquerda.

ESTADÃO: Como recebeu os ataques nas redes que o acusaram de chantagear Lula?

DUVIVIER: A verdade é que tem gado de tudo que é lado. Lula não tem nada a ver com Bolsonaro. O lulismo não tem nada a ver com o bolsonarismo. Mas a base de fãs tem, sim, pessoas igualmente estúpidas. Existe uma distribuição de estupidez, que é muito ruim. A sorte é que o Lula, ao contrário do Bolsonaro, não mergulha nisso. Mas o importante é que o site www.tomaumcafecomelas.com.br já está com mais de 70 mil assinaturas (na quarta-feira, 6), que foi o site que a gente sugeriu. Chegaram 70 mil assinaturas na campanha, que é imensamente maior do que eu. Não foram feitas assinaturas porque eu pedi. Não tem nada a ver comigo. A principal defesa por uma jurista negra é que também seria bom para o governo. O governo subiu a rampa com o cacique Raoni, com pessoas com deficiências (PCDs) e com pessoas negras, então isso foi uma promessa. É só para subir a rampa ou é para ter poder de fato? É isso que Lula precisa responder através da indicação de uma jurista negra. É uma demanda por coerência. Não é uma demanda por algo novo.

ESTADÃO: Há ainda esperança de que a campanha dê resultados?

DUVIVIER: Não tenho conhecimento nenhum sobre o interior do Palácio do Planalto, menos ainda sobre a cabeça do Lula. Mas torço para que ele esteja considerando. A base de fãs falou que eu estava emparedando, assediando e chantageando o Lula. É comovente o poder que dão para um comediante. Nosso pedido é apenas para que ele conheça essas juristas negras. Isso é meia hora, que seja. Não tenho relação nenhuma com o governo. Acho que é bonito que seja assim. Meu lugar é este, de comediante e jornalista. Quando faço pressão, é como um eleitor apenas. Não como alguém a quem se deve algo. É algo a se considerar, apenas isso. É desse lugar de um eleitor que tem a sorte de se comunicar com muitos eleitores.

ESTADÃO: No meio dos ataques ao seu envolvimento na campanha houve até quem resgatasse a história do seu tataravô. Isso o surpreendeu?

DUVIVIER: O argumento de um modo geral das pessoas furiosas com essa sugestão é um argumento anti-identitário. Dizem que não importa cor ou gênero, que tem que ser um ótimo jurista. Para eles, apenas por acaso tem 11 brancos hoje lá. Para eles, Dias Toffoli foi escolhido pela excelência dele, não porque era advogado do PT. Mas essas mesmas pessoas me chamam de humorista branco do Leblon, de bisneto de belga. As pessoas com discurso anti-identitário foram buscar a identidade do meu tataravô para me descredibilizar. Fizeram a coisa mais fascista do mundo, que é julgar a pessoa pela identidade do seu tataravô. Dizer que por causa disso sua opinião é da classe dominante. Todos os argumentos são de que estou querendo tutelar Lula. Sou um eleitor apenas.

ESTADÃO: Já tinha recebido pedidos para não cobrar Lula em outros momentos?

DUVIVIER: Agora foi sui generis o que está acontecendo. Porque antes do Cristiano Zanin ser indicado para o STF existia o argumento de que havia preconceito, de que Lula não colocaria lá um ministro conservador. Eu critiquei: ‘vamos ver’. Provou-se que realmente ele botou um cara conservador lá dentro. E aí acabou esse argumento. O argumento passou a ser então que o Lula faz o que quiser, o que é um argumento muito perigoso sobretudo para Lula e para o governo. Ele não tirou a Ana Moser do Ministério dos Esportes porque quer. Está tirando porque o presidente da Câmara dos Deputados, Arthur Lira (PP-AL), mandou. Achar que Lula faz o que quer é uma estupidez. A pressão faria bem ao Lula. Lula precisa ser pressionado para governar. Theodore Roosevelt (1858-1919) foi eleito presidente dos Estados Unidos com apoio dos sindicatos e governou pela direita sem concessão nenhuma. Os sindicatos foram lá reclamar e Roosevelt disse: ‘mas por que vocês não exigiram nada? Acharam que eu ia dar de graça?’ É assim a política. Você precisa exigir. Se a sua adesão for imediata, na política ela não conta. Quem está pressionando hoje é a bancada ruralista, da bala, evangélica etc. São os grandes lobbies do Brasil. Se só eles pressionarem, Lula vai governar para eles. Então a gente tem que vocalizar mesmo. Eu gritei, fui a Curitiba (em defesa de Lula), fui processado por isso. Foi realmente uma injustiça gigante a eleição do Bolsonaro, com consequências desastrosas. Acho que a revolta em parte é justificada por isso. É muito diferente acusar Lula de ladrão e falar assim: ‘que tal se você conhecesse algumas juristas negras?’ Se isso for golpismo, aí você está achando que o Lula é de cristal. E não é, pelo amor de Deus.

ESTADÃO: Por que a preocupação com o Supremo agora?

DUVIVIER: Na Suprema Corte, a indicação vai durar 30 anos. Vimos a importância que um ministro pode ter. Foi apenas o ministro Dias Toffoli quem impediu Lula de ir ao enterro do irmão (Vavá). Foi apenas um ministro, Alexandre de Moraes, quem garantiu o segundo turno das eleições quando todo mundo tentou cancelar. O STF é muito central e é onde Lula talvez tenha errado mais claramente. Em outros casos, dá para dizer que ele foi pressionado e perdeu, como o caso da Ana Moser. É um caso que ele foi obrigado a ceder. Mas no caso dele indicar o próprio advogado não acho que tenha sido pressão. Acho que foi realmente um erro. Foi uma escolha baseada apenas na confiança e na intimidade pessoal, para um cargo que vai ultrapassar a sua vida em muitos anos.

ESTADÃO: Zanin o surpreendeu?

DUVIVIER: Eu sabia que Zanin era conservador, mas a surpresa é que eu não sabia que ele era tão despreparado. O voto sobre drogas (contra a descriminalização do porte pessoal) vai além do conservadorismo. Tem erros básicos. Ele diz que a Califórnia foi um fracasso na legalização da maconha. Depois da Califórnia, praticamente todos os estados americanos legalizaram. Me surpreendeu pelo despreparo.

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