Há um estudo do Departamento Intersindical de Estatísticas e Estudos Socioeconômico (DIEESE), bastante citado por quem alega que a terceirização causa mais acidentes, que, além de ser desatualizado, (dados da Relação Anual de Informações Sociais, publicada em 2013 pelo Ministério do Trabalho), adota uma metodologia questionável para definir quem seria considerado "terceirizado" e quem seria "empregado direto".
Essa definição impacta sobremaneira no resultado dos dados do estudo, porque todo trabalhador que presta serviços por meio de uma empresa denominada terceirizada foi contratado como "empregado direto" dessa empresa. Ou seja, antes de ser um "terceirizado", ele é um "empregado direto", com registro do seu contrato de trabalho em carteira e garantia dos direitos trabalhistas como todo empregado. Como, então, esse estudo definiu quem é "empregado direto" e quem é "terceirizado"?
O próprio estudo revela imprecisão ao informar que reagrupou classes setoriais em setores que entendeu serem "tipicamente terceirizados" e "tipicamente contratantes". E com base nesse reagrupamento produziu toda a sorte de tabelas, gráficos, percentuais e conclusões, que vêm sendo disseminados por todos aqueles que são, de alguma forma, contrários à terceirização.
Mas, afinal, será que a terceirização gera mais acidentes de trabalho mesmo? Será que esse dado é verdadeiro e corresponde ao mundo real?
A dúvida surgiu porque parecia estranho que o simples fato de o trabalhador estar empregado por outra empresa fosse suficiente para criar condições de risco aumentadas. Ao mesmo tempo, diversos setores "tipicamente" terceirizados, como o da tecnologia de informação, por exemplo, nunca tiveram alto grau de acidentes de trabalho.
Com o primeiro aniversário da Lei nº 13.429/2017, conhecida como Lei de Terceirização, e a proximidade de julgamento da Ação Direta de Inconstitucionalidade n. 5735 proposta perante o Supremo Tribunal Federal (STF) pela Procuradoria Geral da República questionando a constitucionalidade dessa lei, analisamos os dados estatísticos oficiais relacionados a acidentes de trabalho. Se fosse verdade que a aprovação da terceirização estivesse causando mais acidentes do trabalho, após um ano de vigência da Lei nº 13.429/2017, seria natural que os dados estatísticos indicassem esse aumento.
O Observatório Digital de Saúde e Segurança do Trabalho, desenvolvido e mantido pelo Ministério Público do Trabalho (MPT), em cooperação com a Organização Internacional do Trabalho OIT), no âmbito do fórum Smartlab de Trabalho Decente, traz parâmetros científicos da pesquisa "Acidente de Trabalho: da Análise Sócio Técnica à Construção Social de Mudanças", da Faculdade de Saúde Pública da USP (com o apoio da FAPESP) em cooperação com o MPT.
Com base nas estatísticas publicadas pelo Observatório Digital conclui-se que, com ou sem a terceirização, a quantidade de acidentes de trabalho tem diminuído substancialmente, ano a ano, incluindo o ano de 2017, ou seja, o ano de vigência da Lei nº 13.429/2017.
Os acidentes de trabalho registrados caíram de 1.339.908, em 2016, para 797.992 em 2017, uma redução de 40,5%. No período anterior, ou seja, de 2015 para 2016, a redução foi 2.106.063 para 1.399.908 - redução de 33,5%. Nas empresas prestadoras de serviços, por exemplo, às quais, em tese, poderiam ser consideradas "tipicamente" terceirizadas, também há uma redução drástica no número de acidentes de trabalho ocorridos. De 2016 para 2017, o número de acidentes de trabalho nessas empresas caiu de 107.054 para 57.389, ou seja, quase pela metade. Na área rural, como outro exemplo, o número de acidentes foi reduzido de 43.233 para 23.807 no mesmo período - queda de 45%.
Ora, se o número de acidentes vem diminuindo nos últimos anos, incluindo o ano de vigência da Lei nº 13.429/2017, a terceirização não aumenta, nem diminui a quantidade de acidentes do trabalho.
Na verdade, a terceirização favorece a melhoria na prevenção de acidentes e na segurança do ambiente do trabalho, pois há, por exemplo, norma regulamentadora do Ministério do Trabalho determinando que as empresas tomadoras dos serviços e as empresas "tipicamente" terceirizadas devem implementar, de forma integrada, medidas de prevenção de acidentes do trabalho, de forma a garantir o mesmo nível de proteção em matéria de segurança a todos os trabalhadores.
Parece claro, portanto, que a energia, o foco e os esforços para que se continue reduzindo cada vez mais a quantidade de acidentes de trabalho devem estar concentrados na prevenção de acidentes, especialmente nas atividades e ambientes de trabalho que envolvam mais riscos de acidentes e não no fato de haver ou não terceirização.
*Dario Abrahão Rabay e Fernanda Frezarin Kazakevicius são, respectivamente, sócio e advogada do escritório Mattos Filho