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Última sessão


Por Luis Cosme Pinto
Luis Cosme Pinto. Foto: Arquivo pessoal

- A gente entra no cinema e deixa o mundo lá fora.

Nelson ouviu a frase em Lisboa mas bem podia ter escutado na paulistana rua Augusta. Aquela que vai do centro aos Jardins. Na primeira parte, calçadas estreitas nos levam a botecos, brechós, ambulantes. A gente se anima com sons e cores, nem sente a ladeira acima até chegar à Paulista. Então, no segundo trecho, é colina abaixo com lojas, restaurantes, hotéis. Tudo caro. Dois mundos na mesma rua.

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Nelson nunca duvidou: O cinema com nome de banco era o melhor programa de toda semana, de preferência nas tardes vadias de ingressos mais baratos. Por duas horas, o mundo e a vida ficavam lá fora.

Num documentário de Eduardo Coutinho, a sala, de apenas trinta e três lugares, lotou. Em uma dessas coincidências, que ele viu como sorte, a única poltrona vazia, a 5G, era ao lado dele.

A sorte aumentou quando viu, mesmo com a sala escura, a morena de pernas longas e saia curta. Gentil, se levantou e ela se acomodou.

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As entrevistas preciosas de Coutinho emocionavam a plateia enquanto Nelson só pensava naquilo. Não podia desperdiçar o presente inesperado. O que dizer à vizinha de poltrona? Os créditos deslizavam na tela e o nervosismo crescia. Como se aproximar? Meu Deus, me ajude.

A moça alongou os braços e sacudiu o pescoço. Seria professora de yoga? Estaria cansada? Ou apenas oferecia, naqueles derradeiros segundos, a oportunidade de uma conversa? O ultimato veio quando as luzes se acenderam e revelaram a sala deserta.

No silêncio ensurdecedor, a inspiração explodiu na mais óbvia das perguntas.

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- Gostou do filme?

Não, Fátima não gostou, Fátima adorou. O filme e tudo o mais. O rapaz charmoso, a chance de conversar e o convite que veio em seguida.

- Topa um café?

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Fátima respondeu com o melhor sorriso e Nelson trouxe os expressos. Depois, empanadas com cerveja e, então, mais cerveja. Tudo ali, no bar Fellini do cinema anexo da Augusta. Debaixo da árvore, o ex-fumante Nelson deu umas tragadas no cigarro de Fátima, que sentiu-se ainda mais feliz quando soube que era solidariedade. Agora confiante, Nelson perguntou mirando os olhos pretos.

- Moro aqui perto, quer conhecer?

Fátima foi e mora lá até hoje.

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Por vinte anos viram, quase sempre de mãos dadas, os melhores filmes de suas vidas nas duas salas do anexo, enquanto a árvore, no jardim do Fellini, crescia com sombra e ar puro a poucos metros da balbúrdia. No sossego do refúgio, viajavam nas emoções do que viam na tela e no que experimentavam na vida. Íntimos da casa, batiam papo com o bilheteiro Alberto e a equipe de garçonetes. Também no refresco daquela sombra, Fátima deu a melhor notícia: Isabela ia chegar no fim do ano. Era maio de 2004.

Quase vinte anos depois, a cena é outra. O prédio do cinema e as lojas vizinhas podem desaparecer. A ordem é botar tudo abaixo e construir um prédio bem alto. Mais um. Houve protesto e a justiça decidirá o fim da história. A última sessão foi exibida mês passado. Dessa vez, Nelson e Fátima preferiram o mundo aqui fora.

*Luis Cosme Pinto é autor do livro de crônicas Birinaites, Catiripapos e Borogodó

Luis Cosme Pinto. Foto: Arquivo pessoal

- A gente entra no cinema e deixa o mundo lá fora.

Nelson ouviu a frase em Lisboa mas bem podia ter escutado na paulistana rua Augusta. Aquela que vai do centro aos Jardins. Na primeira parte, calçadas estreitas nos levam a botecos, brechós, ambulantes. A gente se anima com sons e cores, nem sente a ladeira acima até chegar à Paulista. Então, no segundo trecho, é colina abaixo com lojas, restaurantes, hotéis. Tudo caro. Dois mundos na mesma rua.

Nelson nunca duvidou: O cinema com nome de banco era o melhor programa de toda semana, de preferência nas tardes vadias de ingressos mais baratos. Por duas horas, o mundo e a vida ficavam lá fora.

Num documentário de Eduardo Coutinho, a sala, de apenas trinta e três lugares, lotou. Em uma dessas coincidências, que ele viu como sorte, a única poltrona vazia, a 5G, era ao lado dele.

A sorte aumentou quando viu, mesmo com a sala escura, a morena de pernas longas e saia curta. Gentil, se levantou e ela se acomodou.

As entrevistas preciosas de Coutinho emocionavam a plateia enquanto Nelson só pensava naquilo. Não podia desperdiçar o presente inesperado. O que dizer à vizinha de poltrona? Os créditos deslizavam na tela e o nervosismo crescia. Como se aproximar? Meu Deus, me ajude.

A moça alongou os braços e sacudiu o pescoço. Seria professora de yoga? Estaria cansada? Ou apenas oferecia, naqueles derradeiros segundos, a oportunidade de uma conversa? O ultimato veio quando as luzes se acenderam e revelaram a sala deserta.

No silêncio ensurdecedor, a inspiração explodiu na mais óbvia das perguntas.

- Gostou do filme?

Não, Fátima não gostou, Fátima adorou. O filme e tudo o mais. O rapaz charmoso, a chance de conversar e o convite que veio em seguida.

- Topa um café?

Fátima respondeu com o melhor sorriso e Nelson trouxe os expressos. Depois, empanadas com cerveja e, então, mais cerveja. Tudo ali, no bar Fellini do cinema anexo da Augusta. Debaixo da árvore, o ex-fumante Nelson deu umas tragadas no cigarro de Fátima, que sentiu-se ainda mais feliz quando soube que era solidariedade. Agora confiante, Nelson perguntou mirando os olhos pretos.

- Moro aqui perto, quer conhecer?

Fátima foi e mora lá até hoje.

Por vinte anos viram, quase sempre de mãos dadas, os melhores filmes de suas vidas nas duas salas do anexo, enquanto a árvore, no jardim do Fellini, crescia com sombra e ar puro a poucos metros da balbúrdia. No sossego do refúgio, viajavam nas emoções do que viam na tela e no que experimentavam na vida. Íntimos da casa, batiam papo com o bilheteiro Alberto e a equipe de garçonetes. Também no refresco daquela sombra, Fátima deu a melhor notícia: Isabela ia chegar no fim do ano. Era maio de 2004.

Quase vinte anos depois, a cena é outra. O prédio do cinema e as lojas vizinhas podem desaparecer. A ordem é botar tudo abaixo e construir um prédio bem alto. Mais um. Houve protesto e a justiça decidirá o fim da história. A última sessão foi exibida mês passado. Dessa vez, Nelson e Fátima preferiram o mundo aqui fora.

*Luis Cosme Pinto é autor do livro de crônicas Birinaites, Catiripapos e Borogodó

Luis Cosme Pinto. Foto: Arquivo pessoal

- A gente entra no cinema e deixa o mundo lá fora.

Nelson ouviu a frase em Lisboa mas bem podia ter escutado na paulistana rua Augusta. Aquela que vai do centro aos Jardins. Na primeira parte, calçadas estreitas nos levam a botecos, brechós, ambulantes. A gente se anima com sons e cores, nem sente a ladeira acima até chegar à Paulista. Então, no segundo trecho, é colina abaixo com lojas, restaurantes, hotéis. Tudo caro. Dois mundos na mesma rua.

Nelson nunca duvidou: O cinema com nome de banco era o melhor programa de toda semana, de preferência nas tardes vadias de ingressos mais baratos. Por duas horas, o mundo e a vida ficavam lá fora.

Num documentário de Eduardo Coutinho, a sala, de apenas trinta e três lugares, lotou. Em uma dessas coincidências, que ele viu como sorte, a única poltrona vazia, a 5G, era ao lado dele.

A sorte aumentou quando viu, mesmo com a sala escura, a morena de pernas longas e saia curta. Gentil, se levantou e ela se acomodou.

As entrevistas preciosas de Coutinho emocionavam a plateia enquanto Nelson só pensava naquilo. Não podia desperdiçar o presente inesperado. O que dizer à vizinha de poltrona? Os créditos deslizavam na tela e o nervosismo crescia. Como se aproximar? Meu Deus, me ajude.

A moça alongou os braços e sacudiu o pescoço. Seria professora de yoga? Estaria cansada? Ou apenas oferecia, naqueles derradeiros segundos, a oportunidade de uma conversa? O ultimato veio quando as luzes se acenderam e revelaram a sala deserta.

No silêncio ensurdecedor, a inspiração explodiu na mais óbvia das perguntas.

- Gostou do filme?

Não, Fátima não gostou, Fátima adorou. O filme e tudo o mais. O rapaz charmoso, a chance de conversar e o convite que veio em seguida.

- Topa um café?

Fátima respondeu com o melhor sorriso e Nelson trouxe os expressos. Depois, empanadas com cerveja e, então, mais cerveja. Tudo ali, no bar Fellini do cinema anexo da Augusta. Debaixo da árvore, o ex-fumante Nelson deu umas tragadas no cigarro de Fátima, que sentiu-se ainda mais feliz quando soube que era solidariedade. Agora confiante, Nelson perguntou mirando os olhos pretos.

- Moro aqui perto, quer conhecer?

Fátima foi e mora lá até hoje.

Por vinte anos viram, quase sempre de mãos dadas, os melhores filmes de suas vidas nas duas salas do anexo, enquanto a árvore, no jardim do Fellini, crescia com sombra e ar puro a poucos metros da balbúrdia. No sossego do refúgio, viajavam nas emoções do que viam na tela e no que experimentavam na vida. Íntimos da casa, batiam papo com o bilheteiro Alberto e a equipe de garçonetes. Também no refresco daquela sombra, Fátima deu a melhor notícia: Isabela ia chegar no fim do ano. Era maio de 2004.

Quase vinte anos depois, a cena é outra. O prédio do cinema e as lojas vizinhas podem desaparecer. A ordem é botar tudo abaixo e construir um prédio bem alto. Mais um. Houve protesto e a justiça decidirá o fim da história. A última sessão foi exibida mês passado. Dessa vez, Nelson e Fátima preferiram o mundo aqui fora.

*Luis Cosme Pinto é autor do livro de crônicas Birinaites, Catiripapos e Borogodó

Luis Cosme Pinto. Foto: Arquivo pessoal

- A gente entra no cinema e deixa o mundo lá fora.

Nelson ouviu a frase em Lisboa mas bem podia ter escutado na paulistana rua Augusta. Aquela que vai do centro aos Jardins. Na primeira parte, calçadas estreitas nos levam a botecos, brechós, ambulantes. A gente se anima com sons e cores, nem sente a ladeira acima até chegar à Paulista. Então, no segundo trecho, é colina abaixo com lojas, restaurantes, hotéis. Tudo caro. Dois mundos na mesma rua.

Nelson nunca duvidou: O cinema com nome de banco era o melhor programa de toda semana, de preferência nas tardes vadias de ingressos mais baratos. Por duas horas, o mundo e a vida ficavam lá fora.

Num documentário de Eduardo Coutinho, a sala, de apenas trinta e três lugares, lotou. Em uma dessas coincidências, que ele viu como sorte, a única poltrona vazia, a 5G, era ao lado dele.

A sorte aumentou quando viu, mesmo com a sala escura, a morena de pernas longas e saia curta. Gentil, se levantou e ela se acomodou.

As entrevistas preciosas de Coutinho emocionavam a plateia enquanto Nelson só pensava naquilo. Não podia desperdiçar o presente inesperado. O que dizer à vizinha de poltrona? Os créditos deslizavam na tela e o nervosismo crescia. Como se aproximar? Meu Deus, me ajude.

A moça alongou os braços e sacudiu o pescoço. Seria professora de yoga? Estaria cansada? Ou apenas oferecia, naqueles derradeiros segundos, a oportunidade de uma conversa? O ultimato veio quando as luzes se acenderam e revelaram a sala deserta.

No silêncio ensurdecedor, a inspiração explodiu na mais óbvia das perguntas.

- Gostou do filme?

Não, Fátima não gostou, Fátima adorou. O filme e tudo o mais. O rapaz charmoso, a chance de conversar e o convite que veio em seguida.

- Topa um café?

Fátima respondeu com o melhor sorriso e Nelson trouxe os expressos. Depois, empanadas com cerveja e, então, mais cerveja. Tudo ali, no bar Fellini do cinema anexo da Augusta. Debaixo da árvore, o ex-fumante Nelson deu umas tragadas no cigarro de Fátima, que sentiu-se ainda mais feliz quando soube que era solidariedade. Agora confiante, Nelson perguntou mirando os olhos pretos.

- Moro aqui perto, quer conhecer?

Fátima foi e mora lá até hoje.

Por vinte anos viram, quase sempre de mãos dadas, os melhores filmes de suas vidas nas duas salas do anexo, enquanto a árvore, no jardim do Fellini, crescia com sombra e ar puro a poucos metros da balbúrdia. No sossego do refúgio, viajavam nas emoções do que viam na tela e no que experimentavam na vida. Íntimos da casa, batiam papo com o bilheteiro Alberto e a equipe de garçonetes. Também no refresco daquela sombra, Fátima deu a melhor notícia: Isabela ia chegar no fim do ano. Era maio de 2004.

Quase vinte anos depois, a cena é outra. O prédio do cinema e as lojas vizinhas podem desaparecer. A ordem é botar tudo abaixo e construir um prédio bem alto. Mais um. Houve protesto e a justiça decidirá o fim da história. A última sessão foi exibida mês passado. Dessa vez, Nelson e Fátima preferiram o mundo aqui fora.

*Luis Cosme Pinto é autor do livro de crônicas Birinaites, Catiripapos e Borogodó

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