Em seu discurso de posse, em 1º em de janeiro, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva fez uma profissão de fé na "pacificação" do País.
"A ninguém interessa um país em permanente pé de guerra ou uma família vivendo em desarmonia. É hora de reatarmos os laços com amigos e familiares, rompidos pelo discurso de ódio e pela disseminação de tantas mentiras", disse. "O povo brasileiro rejeita a violência de uma pequena minoria."
Decorridos apenas 25 dias de sua volta ao Planalto, porém, o "espírito de conciliação" pregado por Lula tem se revelado uma miragem. Quem acreditou que, desta vez, seria diferente, em razão da amplia aliança política que apoiou sua candidatura, já começa a se dar conta, em ritmo acelerado, de que pode ter sido vítima - voluntária - de (mais) um estelionato eleitoral.
Em vez de adotar uma postura política mais ecumênica, Lula está mostrando que continua apegado às velhas teses e práticas hegemônicas do PT. Com suas declarações carregadas de velhos clichês da esquerda, ele parece dominado pelo sentimento de revanchismo, frustrando as forças de chamado "centro democrático" que lhe deram sustentação no pleito de outubro.
Talvez o caso mais emblemático até agora tenha sido a declaração que ele fez durante viagem oficial à Argentina, na qual classificou o impeachment de Dilma, realizado dentro das regras constitucionais e avalizado pelo Supremo Tribunal Federal, de "golpe de Estado".
Considerando que o impeachment teve o apoio tanto do vice-presidente, Geraldo Alckmin, quanto da ex-senadora Simone Tebet, ministra do Planejamento - duas figuras que tiveram um papel fundamental para atrair o eleitorado de centro para a órbita de Lula nas eleições - não se trata propriamente de uma postura que contribui para serenar os ânimos no País.
Aliás, há vários outros exemplos do gênero, inclusive no campo da economia, que sinalizam exatamente o contrário, como aconteceu quando Lula falou que os empresários ficam ricos não por causa do próprio trabalho, mas às custas de seus trabalhadores. Ou então quando ele defendeu a volta dos financiamentos do BNDES para "regimes amigos", com apoio do Banco do Brasil e de um fundo soberano a ser formado com recursos públicos.
Confira a seguir uma lista com 13 posições adotadas até agora por Lula e seu governo que colocam em xeque o desarmamento dos espíritos que ele diz buscar.
1. Impeachment de Dilma, avalizado pelo STF, foi "golpe de Estado";
2. BNDES deve voltar a financiar "regimes amigos";
3. "Passada de pano" para regimes autoritários de esquerda na América Latina;
4. Criação da Procuradoria de Defesa da Democracia, para atuar contra postagens consideradas como "desinformação";
5. Autonomia do Banco Central é "bobagem";
6. Meta de inflação tem de ser mais alta;
7.A "tal da responsabilidade fiscal" leva população a "sofrer";
8. "Gasto" público a partir de agora deve ser considerado "investimento";
9. Volta do chamado "voto de qualidade" no Carf (Conselho Administrativo de Recursos Fiscais), em prejuízo dos pagadores de impostos;
10. Defesa da criação de "moeda comum" com a Argentina, que tem inflação de 100% ao ano e uma moeda - o peso - que nem os argentinos querem;
11. Reafirmação da ideia de que empresários não trabalham e só ganham dinheiro com suor dos trabalhadores;
12. Defesa da revisão das reformas trabalhista e da Previdência e dos marcos regulatórios das ferrovias e do saneamento por ministros e auxiliares;
13. Criação de 14 novos ministérios, elevando total a 37.