BRASÍLIA — Congressistas apoiadores do ex-presidente Jair Bolsonaro (PL), que agora comandam a Comissão de Educação da Câmara dos Deputados, tiveram a primeira derrota em sessão realizada nesta quara-feira, 27. O presidente do colegiado, Nikolas Ferreira (PL-MG), reconheceu que precisará dialogar com o Centrão para garantir maioria bolsonarista e virar o resultado em reuniões futuras, enquanto demais membros reclamam da condução dos trabalhos dele.
Por 20 votos a 13, o governo conseguiu derrubar um requerimento que pedia moção de repúdio contra um professor de escola estadual da cidade de São Bonifácio (SC). Assim como na reunião anterior, houve provocações e tumultos entre parlamentares.
O requerimento, de autoria do deputado Gustavo Gayer (PL-GO), afirma que o professor da escola catarinense acusou Bolsonaro de ser “nazista e ladrão” em sala de aula. Esse mesmo docente disse, segundo o texto, que se os alunos chamassem o presidente Luiz Inácio Lula da Silva de “ladrão”, poderiam ser condenados por difamação.
O requerimento de Gayer diz que as falas demonstram “um claro viés ideológico que não condiz com a neutralidade exigida pela profissão” e pede também uma retratação pública do professor, “reconhecendo o erro de sua conduta e reafirmando o compromisso com a imparcialidade e o respeito no ambiente educacional”.
“Se tem uma pauta aqui nessa comissão que é de assunto nacional é a frequência com que militantes travestidos de professores contribuem para a corrosão do sistema de educação brasileiro”, argumentou Gayer.
Governistas acreditam que a moção visa jogar pais contra professores e, se cada caso for analisado individualmente, poderia lotar a pauta da Comissão de Educação.
“Há espaço de supervisão e coordenação (nas escolas) que devem olhar, inclusive, e discutir os limites éticos de uma fala de um professor”, afirma Tarcísio Motta (PSOL-RJ). “Essa moção não discute nada disso. Ela é um instrumento para jogar as famílias brasileiras contra os profissionais da Educação.”
Após o triunfo, petistas comemoraram o resultado. “Nós queremos que os temas da Educação sejam votados. Ele quer apenas lacrar. Perdeu. Perdeu, mané”, debochou Rogério Correia (PT-MG).
Do outro lado, Nikolas, presidente da Comissão de Educação, acredita que a composição dos integrantes do colegiado está “desbalanceada”, e que é preciso resolver o cenário negativo com diálogo.
“Acredito que ainda tem de haver uma mudança de composição da comissão para que haja um equilíbrio maior. Mas é tudo uma questão de acordo, questão de comprometimento de deputados para que a gente consiga ter vitórias nas votações”, disse. “É como fazemos aqui no plenário. É conversar.”
O deputado não citou diretamente o Centrão, mas disse que é preciso que “outros partidos” cedam espaço para membros de “ideologia diferente”. “Vejo que existem alguns partidos que poderiam ceder sua vaga para outros que possuem ideologia diferente para poder ter certo equilíbrio. Acredito que a composição atual da comissão não tem o equilíbrio que eles tanto desejam”, afirmou.
Tumultos e provocações
Assim como na primeira sessão, a Comissão de Educação foi novamente palco para provocações e discussões entre os membros.
Gustavo Gayer, autor do requerimento derrotado, chegou a bater na mesa após ser provocado. Um deputado perguntou se o filho dele já teria sido doutrinado ideologicamente ou agredido em sala de aula. “Meus filhos já foram agredidos verbalmente em sala de aula por militantes da esquerda”, contestou, batendo na mesa.
Em outro momento, Otoni de Paula (MDB-RJ) também bateu na mesa, em apoio a Gayer. “Vocês vão ter que aturar o conservadorismo nessa comissão”, disse Otoni.
Governistas devolviam as falas com provocações aos oposicionistas ou a Bolsonaro. O lado contrário agiu de forma similar. A sala da comissão estava repleta de assessores parlamentares de esquerda e de direita e era possível ouvir vaias e aplausos em reação às diferentes falas.
Tarcísio fez reclamações do Delegado Caveira (PL-PA), que estaria na comissão provocando deputados de esquerda. Caveira não é integrante do colegiado e, no dia anterior, foi protagonista de uma discussão no plenário que provocou o fim da sessão.
Deputados de esquerda e de direita reclamam do trabalho de Nikolas
Tanto deputados bolsonaristas como petistas manifestaram queixas em relação à condução dos trabalhos na Comissão de Educação.
Do lado da oposição, há queixas de que Nikolas estaria cedendo muito espaço para a esquerda nos requerimentos. “Há um certo incômodo da nossa parte, mais à direita, que Nikolas atendeu quase todos os requerimentos que o Pedro (Uczai, do PT-SC) estava apresentando. Até a gente está questionando às vezes em algum momento falando o seguinte: ‘uai, presidente, o senhor vai atender todos os pedidos da esquerda?”, questionou Abilio Brunini (PL-MT).
Os petistas dizem que o presidente da comissão precisa definir critérios para a condução dos trabalhos.
“Ele (Nikolas) é presidente da ultradireita e não da comissão. Por isso, espero que mude a conduta ou peça pra sair”, afirma Correia.
Nikolas rebate as críticas dizendo que a comissão teve um saldo positivo nas aprovações de demais requerimentos e que ela não pode “fugir do debate”. Ele já disse, em outras oportunidades, que, como presidente de comissão, se coloca na função de mediador de ambos os lados.
“Acredito que a doutrinação é um ponto importante a ser levantado. Se está havendo moções de repúdio a professores, é porque alguma coisa errada está acontecendo”, afirma. “O saldo foi positivo. Conseguimos contornar todas as divergências e o que era para ser aprovado, conseguimos aprovar e o que era pra ser debatido foi debatido.”
Nesta quarta-feira, a Comissão de Educação aprovou, entre outros, requerimentos de audiência pública para discuir a evasão escolar de pessoas com deficiência, a educação para autistas, as práticas bem-sucedidas de escolas brasileiras premiadas internacionalmente, o Sistema Nacional de Educação.