BRASÍLIA e SÃO PAULO – O presidente Jair Bolsonaro atacou o PSL, partido pelo qual se elegeu, no ano passado, e indicou que poderá mudar de sigla. O motivo da insatisfação é a dificuldade da família Bolsonaro para controlar a legenda e seus diretórios regionais, que não aceitam a imposição dos nomes do grupo. Mesmo rachado, o partido terá na próxima campanha a maior fatia dos fundos públicos usados para financiar candidatos – estimada em R$ 400 milhões –, porque foi o mais votado na disputa de 2018, na esteira da eleição de Bolsonaro.
A saída do presidente, porém, já é dada como certa pela cúpula do PSL, que teme uma debandada. Dirigentes do partido ouvidos pelo Estado afirmam que o presidente pode levar até 15 dos 53 deputados federais, além de dois dos três senadores – Flávio Bolsonaro (RJ) e Soraya Thronicke (MS).
Embora ainda não tenha definido o seu destino, Bolsonaro avalia vários cenários políticos e deseja um partido que possa controlar, para impulsionar sua candidatura à reeleição, em 2022. A União Democrática Nacional (UDN) já pediu registro como partido no Tribunal Superior Eleitoral (TSE) e quer que o presidente se filie à sigla.
“Estamos de braços abertos para a família Bolsonaro”, disse Marcus Alves de Souza, presidente da UDN. O Estado apurou que o dirigente da sigla em formação tem conversado com interlocutores do clã Bolsonaro.
O conflito do presidente com a cúpula do PSL ficou evidente nesta terça-feira, 8, após ele ser abordado, diante do Palácio da Alvorada, por um apoiador que disse ser pré-candidato da legenda no Recife. Bolsonaro pediu a ele para “esquecer” o PSL e afirmou que o deputado Luciano Bivar (PE), presidente do partido, “está queimado para caramba”.
O militante estava gravando um vídeo quando Bolsonaro fez o apelo que escancarou a queda de braço no PSL. “Oh, cara, não divulga isso não. O cara (Bivar) está queimado para caramba lá. Vai queimar o meu filme também. Esquece esse cara, esquece o partido”, afirmou o presidente.
A articulação de Bolsonaro ganha luz no momento em que partidos de centro se articulam em torno da possível candidatura do apresentador de TV Luciano Huck à Presidência.
Em fevereiro, o Estado revelou que o clã Bolsonaro negociava migrar para a UDN, sigla extinta após o golpe militar de 1964. Em abril, o advogado Marco Vicenzo, outro articulador da criação do partido, protocolou no TSE um pedido de refundação da legenda alegando a necessidade de reparar “injustiças históricas praticadas em desfavor” do partido. Se aceito, a legenda pode ser refundada sem o protocolo tradicional de criação de um partido, descartado por pessoas próximas ao clã Bolsonaro que consideram inviável. A legenda também mudaria de nome e passaria a ser chamada de “Conservadores”. Aliados da família dizem que outra opção é o Patriota, partido que chegou a negociar com Bolsonaro antes das eleições.
Bolsonaro exige comando da sigla
Por telefone, Bolsonaro exigiu de Bivar, na segunda, 7, o comando do PSL. Disse que, caso a situação continuasse como está, deixaria o partido. Bivar recusou o ultimato. O deputado controla o PSL desde 1994, quando a sigla ainda era nanica.
Nos bastidores, Bivar acusa o deputado Eduardo Bolsonaro (SP), filho “03” do presidente, de tentar “dar um golpe” para destituí-lo. Chegou a dizer até mesmo que Eduardo incentivou a confecção de uma lista para antecipar a eleição interna no partido.
O grupo político ligado a Bivar divulgou nesta terça um manifesto exaltando a importância do partido nas eleições de 2018. Defendeu, ainda, a redistribuição de postos de comando da legenda nos municípios.
Na prática, a medida pode desfazer arranjos impostos no Rio pelo senador Flávio Bolsonaro, filho primogênito do presidente, e, em São Paulo, por Eduardo. Em São Paulo, dirigentes regionais foram à Justiça para reverter atos de Eduardo. No Rio, Flávio teve de recuar da decisão de expulsar filiados com cargos no governo de Wilson Witzel (PSC) – que tem criticado o governo federal.
No documento divulgado nesta terça, aliados de Bivar afirmaram que ele atendeu a todos os pedidos de Bolsonaro em 2018. Lembraram que o deputado chegou a se afastar da presidência do partido – na época, quem assumiu o comando do PSL foi Gustavo Bebianno, a pedido de Bolsonaro. Bebianno foi empossado ministro da Secretaria-Geral da Presidência, mas caiu após atrito com Carlos Bolsonaro, o filho “02” do presidente.
“Se Bivar não tivesse aberto as portas, o presidente fatalmente não teria tido legenda para concorrer em 2018”, afirmou o deputado Júnior Bozzella (SP), signatário do manifesto em favor de Bivar. Os apoiadores do deputado organizaram um jantar em desagravo a ele ontem, em Brasília.
Bivar tirou das mãos da deputada Bia Kicis (DF), aliada do presidente, o comando da legenda no Distrito Federal, e prepara o rompimento do contrato da advogado eleitoral Karina Kufa, que cuidou da campanha de Bolsonaro e é diretamente ligada a Eduardo.
A possibilidade de uma debanda do PSL está no radar de Bivar desde de agosto, quando a presidente do Podemos, a deputada federal Renata Abreu (SP), tentou aprovar uma emenda para permitir um novo período de janela partidária. Com isso, autorizava parlamentares a trocar de legenda sem punições. Na ocasião, Bivar convocou outros dirigentes de partidos, entre eles Paulinho da Força (Solidariedade) e Marcos Pereira (Republicanos), para discutir a proposta. Mas articulou a derrubada do projeto, evitando a possibilidade da desfiliação em massa.
Líder do PSL no Senado, Major Olimpio (PSL-SP) disse não ver Bolsonaro saindo do partido. “Eu realmente estou perplexo com a manifestação do presidente”, afirmou ele. “É como alguém morar sozinho e fugir de casa. O PSL é o único partido 110% fiel ao presidente, em todas as votações.” / RENATO ONOFRE, CAMILA TURTELLI, MARIANA HAUBERT, PEDRO VENCESLAU e PAULA REVERBEL