Com a definição do segundo turno da eleição presidencial entre Luiz Inácio Lula da Silva (PT) e Jair Bolsonaro (PL), mentiras ou informações fora de contexto sobre a religião de ambos os candidatos começaram a circular com mais força nas redes sociais.
Um vídeo do chefe do Executivo em uma loja da Maçonaria serve de munição para que apoiadores do petista tentem enfraquecer o presidente diante dos eleitores evangélicos. Do outro lado, bolsonaristas compartilham fake news associando Lula a um suposto “pacto com o diabo” e ao satanismo, também tentando intensificar a rejeição ao petista nesse segmento.
Apoiadores de Lula chegaram a se “disfarçar” de defensores de Bolsonaro no Twitter para dizer que não irão mais votar no presidente. “Estou tão triste com Bolsonaro, brincando com a nossa fé cristã. Que decepção”, publicou um usuário que agora usa elementos da iconografia bolsonarista em seu perfil, como o número 22, uma arma disparando e uma bandeira do Brasil, mas publicou que “a volta de Lula era o mundo voltando ao eixo” uma semana antes da eleição.
Na noite da terça-feira, o deputado federal André Janones (Avante-MG), aliado de Lula, publicou uma live na frente do Tempo de Salomão, no Brás, em que diz que Bolsonaro poderia estar ligado a “rituais satânicos”. “A gente não sabe o que Bolsonaro negociou na maçonaria para apoiarem ele. Não posso garantir que ele não negociou em nome dos próprios eleitores. Se no pacto que ele fez, envolveu o nome dos eleitores”, disse. “Quem é cristão de verdade não dá para caminhar junto com a maçonaria. Lamento que Bolsonaro cedido a essas práticas de bode, de sangue, não sei do que, negociado em nome dos seus próprios eleitores para fazer esse pacto pela vitória.”
Em páginas bolsonaristas no Telegram, aplicativo de mensagens russo, usuários também disseram estar “arrependidos” após ver o vídeo do mandatário em uma loja maçônica. Outros membros os acusam de serem petistas infiltrados para manipular a opinião pública.
Desde o primeiro dia oficial de campanha, em agosto, a disputa entre o presidente Jair Bolsonaro (PL) e o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) gira em torno de temas religiosos. Bolsonaro, por exemplo, costuma chamar a eleição de “luta do bem contra o mal” e criticar o que chama de “fechamento de igrejas” na pandemia de covid-19, reforçando a pauta religiosa da sua campanha. Já Lula, acusa Bolsonaro de tentar manipular a boa-fé de evangélicos e chegou a declarar que o presidente é “possuído pelo demônio”.
O Estado brasileiro é laico. A Lei das Eleições (Lei 9.504/97), inclusive, proíbe a veiculação de propaganda eleitoral em templos religiosos.
É comum, também, que bolsonaristas evoquem a situação da Nicarágua, compartilhando relatos sobre a prisão de religiosos naquele país e lembrando que Lula já fez acenos ao governante Daniel Ortega. Pesquisas eleitorais mostram que os evangélicos representam um dos segmentos mais fortes como base eleitoral de Bolsonaro. A primeira-dama Michelle Bolsonaro chegou a dizer que o Palácio do Planalto estava consagrado a “demônios” antes da eleição do marido.
No vídeo que circula nas redes sociais após o primeiro turno das eleições, o presidente faz um discurso sobre pautas de costumes e combate à corrupção em uma loja da Maçonaria. O vídeo que viralizou nos últimos dias aparenta ter sido gravado antes da campanha eleitoral de 2018.
Quanto a Lula, as tentativas de associá-lo ao “diabo” e ao fechamento de igrejas fizeram o PT lançar um esclarecimento público sobre as crenças pessoais do ex-presidente. Intitulado “A verdade sobre Lula e o satanismo”, um artigo no site do candidato reforça que ele não tem relação com “luciferianos ateístas”, como diz uma fake news que circula na internet. “A verdade, como já repetimos antes, é que Lula é cristão, católico, crismado, casado e frequentador da igreja”, diz o texto. “Lula não tem pacto nem jamais conversou com o diabo”, completa.
Nesta terça-feira, o ex-presidente teve um encontro com padres franciscanos para receber uma benção. Hoje é dia de São Francisco de Assis.
O ato com padres franciscanos aconteceu no QG da campanha de Lula, no Pacaembu. Além do petista, participaram também a presidente nacional do PT, Gleisi Hoffmann, o candidato a vice, Geraldo Alckmin (PSB), o candidato do PT ao governo do Estado de São Paulo, Fernando Haddad, a mulher de Lula, Janja da Silva, e a mulher de Haddad, Ana Estela Haddad.
Antes da benção, Lula recebeu imagens de São Francisco de Assis e de São Benedito, um santo negro. Frei Davi discursou no encontro e pediu a Lula, se eleito, compromisso do petista com cotistas negros nas universidades públicas. “Se tem alguém que pode se dizer cristão é você”, afirmou Frei Davi a Lula.
Receberam a benção duas cachorras da Janja, além de um cachorro que fica circulando no QG de Lula e se tornou o “mascote” do local. Uma das cachorras de Janja chama-se “Resistência” e foi adotada em Curitiba, pois circulava na vigília em frente à carceragem da Polícia Federal.
Justiça
O ministro Paulo de Tarso Vieira Sanseverino, do Tribunal Superior Eleitoral (TSE), determinou a remoção de 31 publicações que associam Lula à perseguição de cristãos e à invasão de igrejas. A decisão foi publicada no último domingo e atinge os perfis dos filhos do presidente, o senador Flávio Bolsonaro (Republicanos-RJ) e o deputado Eduardo Bolsonaro (PL-SP), o ex-secretário da Cultura Mário Frias (PL), eleito deputado federal por São Paulo, o assessor do presidente, Filipe Martins, e outros apoiadores de Bolsonaro.
”Atenção evangélicos! Lula continua a dizer asneiras. Diz ele que pastor não acredita em Deus. Acredita em Deus quem apoia ele, por acaso? Ele defende aborto, diz que a família tradicional é coisa atrasada, apoia governos ateístas que perseguem cristãos e etc”, diz uma das publicações impugnadas. O mesmo conteúdo foi publicado pelo pastor Silas Malafaia, conselheiro do presidente, mas o post do evangélico não entrou na lista da decisão.
Sanseverino entendeu que as publicações disseminam “informação sabidamente falsa” e ofensiva à honra do candidato petista. O ministro destacou que o conteúdo “foi divulgado no período crítico do processo eleitoral, em perfil com alto número de seguidores, de forma a gerar elevado número de visualizações, o que possibilita, em tese, a ocorrência de repercussão negativa de difícil reparação na imagem do partido político e do candidato atingidos pela desinformação”. / Colaborou Lavínia Kaucz