BRASÍLIA - Depois de mais de 44 horas de silêncio, o presidente Jair Bolsonaro (PL) fez nesta terça-feira, 1º, um pronunciamento no qual não contestou a derrota nas urnas para Luiz Inácio Lula da Silva (PT). Dentro do Palácio da Alvorada, residência oficial que terá deixar até 31 de dezembro, Bolsonaro falou por 2 minutos e 21 segundos e afirmou que as ruas expõem o “sentimento de injustiça” do povo brasileiro.
O presidente afirmou também que o País não pode ser tomado pela esquerda “que sempre prejudicou a Nação”. Bolsonaro disse ainda que sempre respeitou o direito à propriedade privada e que nunca cerceou a democracia e o direito de ir e vir.
O pronunciamento de Bolsonaro foi realizado enquanto manifestações antidemocráticas iniciadas na noite de domingo, 30, fecham estradas pelo País. Dezenas de lideranças mundiais já reconheceram a lisura do processo eleitoral e a vitória de Lula.
“Sempre fui rotulado como antidemocrático e, ao contrário dos meus acusadores, sempre joguei dentro das quatro linhas da Constituição”, disse Bolsonaro.
Após o rápido pronunciamento de Bolsonaro, o ministro-chefe da Casa Civil, Ciro Nogueira, confirmou que o governo irá cumprir a lei de transição. Segundo ele, a presidente do PT, Gleisi Hoffmann, “em nome do presidente Lula”, afirmou que a transição será comandada pelo vice-presidente eleito Geraldo Alckmin (PSB). “Aguardaremos que isso seja formalizado para cumprir a da lei no nosso País”, completou Nogueira.
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Acompanharam o pronunciamento o ministro da Casa Civil, Ciro Nogueira, da Economia, Paulo Guedes, Cidadania, Ronaldo Bento, Meio Ambiente, Joaquim Leite, da Ciência e Tecnologia, Paulo Alvim, do Trabalho, José Carlos Oliveira, da Mulher, Família e Direitos Humanos, Cristiane Britto, da Educação, Victor Godoy, da Saúde, Marcelo Queiroga, da Justiça, Anderson Torres, das Relações Exteriores, Carlos França, da Agricultura, Marcos Montes, da Infraestrutura, Marcelo Sampaio.
O ministro das Comunicações, Fábio Farias, que não estavam presente, destacou que o presidente assegurou o respeito ao texto constitucional e assegurou a transição.
Desde às 19h57 de domingo, 30, quando o Tribunal Superior Eleitoral anunciou formalmente a vitória do petista Lula, Bolsonaro vinha se mantendo em silêncio. Não ligou para o adversário e nem mesmo usou suas redes sociais para falar o resultado das eleições.
O líder do Governo na Câmara, Ricardo Barros (PP-PR), afirmou que diversos aliados participaram da construção da nota lida por Bolsonaro. O deputado relatou que o texto estava sendo trabalhado desde ontem e que os ministros Ciro Nogueira (Casa Civil), Fábio Faria (Comunicações) e Célio Faria Júnior (Secretaria de Governo da Presidência) participaram das reuniões.
“O Bolsonaro ouve todo mundo e faz o que ele acha”, disse. “Ele concordou com esse texto, que é muito sucinto. Imagina que sugeriram muitas outras coisas para ele falar. Ele fez esse texto. Acho que está o suficiente para acalmar aqueles que estavam ansiosos pelo seu silêncio. O grande objetivo é esse. O presidente falou, autorizou a transição, vida que segue. Daqui a 4 anos tem eleição de novo.”
Pressão de aliados
O pronunciamento do presidente ocorre após ele ser pressionado pelos próprios aliados a reconhecer o resultado das urnas e desmobilizar a base radical que bloqueia estradas e ameaça instalações federais em Brasília. Na segunda-feira, 31, militares e ministros conversaram com Bolsonaro tentando convencê-lo a reconhecer logo a derrota. Uma minuta de discurso chegou a ser redigida por um grupo de ministros e foi levada ao presidente.
A pressão partiu também de integrantes de segmentos que foram fiadores do governo, como evangélicos, ruralistas e governadores da direita. O governador eleito de Santa Catarina, Jorginho Mello (PL), chegou a dizer que “quebradeira não constrói nada”.
A Frente Parlamentar Agropecuária (FPA) publicou nota por meio da qual fez um apelo para que as rodovias fossem liberadas e não houvesse mais prejuízos aos consumidores brasileiros. O grupo é prioritariamente bolsonarista e, em sua maioria, apoiou a recondução do presidente.
Segundo parlamentares que estiveram com Bolsonaro na segunda-feira, 31, no Palácio do Planalto, o presidente vinha sendo estimulado a assumir seu protagonismo na oposição ao governo Lula (PT). O silêncio de Bolsonaro serviu para que extremistas se mobilizassem. Nos grupos de conversas e nas redes sociais, a falta de posicionamento foi interpretada como um um incentivo tácito do presidente para os protestos. A ausência de declarações seria uma forma de concordar com o crescimento do mobilização golpista.
Os manifestantes foram às ruas com pautas inconstitucionais e falam, por exemplo, de intervenção militar e ação urgente contra fraude nas urnas eletrônicas. Na internet, convocaram concentrações na Esplanada dos Ministérios, em Brasília, e em frente a instalações militares.
Na noite de segunda, o presidente do TSE, ministro Alexandre de Moraes, assinou decisão determinando a desobstrução das vias. Moraes determinou que as Polícias Militares fossem acionadas para o desbloqueio diante de denúncias de que a Polícia Rodoviária Federal não estava agindo. Governadores de São Paulo, Minas Gerais e Rio de Janeiro declaram declarações públicas em defesa da liberação das rodovias. Circularam nas redes sociais vídeos de alguns agentes da PRF dando apoio aos bloqueios e se recusando a multar caminhoneiros que travaram as estradas.