Durante sabatina do Estadão e da Rádio Eldorado e um pool de veículos de imprensa, na noite desta sexta-feira, 21, o presidente Jair Bolsonaro, candidato à reeleição pelo PL, justificou o orçamento secreto como instrumento criado em razão de seu governo não ter entregue ao Congresso ministérios, estatais e bancos. O chefe do Executivo admitiu ainda que teve de “se curvar” aos interesses do Legislativo.
O orçamento secreto é usado pelo governo para a distribuição de recursos em troca de apoio a projetos de interesse do Palácio do Planalto, como revelou o Estadão. De acordo com o presidente, “o orçamento não é secreto, secreto é o nome dos parlamentares”.
A sabatina de uma hora foi realizada também com a participação de jornalistas do SBT, da CNN Brasil, da revista Veja, do portal Terra e da Rádio NovaBrasil. O presidente adotou ao longo do programa um tom moderado e confiante.
Veja como foi a sabatina
Inicialmente estava previsto um debate, mas o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) faltou ao encontro. O petista alegou incompatibilidade de agenda, mas, pouco antes de o programa ir ao ar diretamente dos estúdios do SBT em Osasco, na Grande São Paulo, ele participou de uma live com o aliado e deputado federal André Janones (Avante-MG).
Leia Também:
Bolsonaro critica ausência de Lula em debate
Antes do início do programa, Bolsonaro criticou a ausência do adversário, a quem chamou de “outro lado”. “Se a esquerda não se apoiar em mentiras, o que eles têm para apresentar?”, questionou Bolsonaro.
Durante o primeiro bloco, a série de reportagens Agenda Estadão fundamentou uma pergunta sobre governabilidade, que hoje sofre com a transferência excessiva do controle de gastos ao Congresso. O presidente foi questionado, então, como articular a governabilidade em eventual segundo mandato sem submeter o Orçamento a interesses dos parlamentares.
“O que houve nessa época (da criação do orçamento secreto)? O Congresso querer poder. Perderam poderes comigo porque eu não entreguei ministérios. Também não entreguei estatais, como se viu, nós vimos absurdos que aconteceram por exemplos na Petrobras, nos Correios, na Caixa Econômica, no Banco do Brasil. Também, além das estatais, bancos oficiais, (os parlamentares) não tiveram isso”, disse.
Bolsonaro afirmou que o Congresso buscou uma forma de participar do Orçamento e admitiu que a emenda de relator foi discutida com os ministros Luiz Eduardo Ramos (à época na Secretaria de Governo) e Paulo Guedes (Economia). No entanto, ele negou que a iniciativa tenha partido do Planalto. “Tanto é que, se houvesse participação do Executivo, eu não teria vetado a proposta da criação deste orçamento, que, na verdade, não é secreto, secreto é o nome dos parlamentares, que, junto ao relator do orçamento, é enviado, então, o pedido de liberação do recurso para Estados e municípios”, afirmou.
Como mostrou o Estadão, a primeira tentativa de viabilizar o orçamento secreto foi realmente do Congresso e Bolsonaro a vetou. O presidente, porém, recuou do próprio veto logo depois e encaminhou para análise dos parlamentares, em dezembro de 2019, o texto que criou o mecanismo. O projeto é assinado por Bolsonaro e a exposição de motivos que o justifica leva a assinatura de Ramos.
“Eu gostaria que esse recurso, mais de R$ 19 bilhões, estivesse em minhas mãos. Se o (ex-ministro e atual candidato ao governo de São Paulo) Tarcísio (de Freitas) com R$ 6 bilhões fez muita coisa, imagine ele com três vezes mais recursos no tocante a isso. Então isso aí é uma questão que, por vezes, você é obrigado a se curvar ao Legislativo”, disse o presidente.
Leia Também:
Promessas
Questionado sobre como vai custear as promessas de campanha cujos gastos não estão previstos para 2023, Bolsonaro afirmou que “quem faz o Orçamento é o Legislativo, não um decreto presidencial”. Segundo ele, críticas sobre cortes de recursos para programas sociais como a Farmácia Popular seriam infundadas porque a lei orçamentária ainda não está definida. De acordo com o presidente, o Congresso vai buscar alternativas.
Bolsonaro defendeu ainda proposta de Guedes de que a taxação de lucros e dividendos traria recursos suficientes para financiar o Auxílio Brasil em R$ 600. “Confio no Paulo Guedes, e ele tem achado alternativa para tudo aquilo que ele promete”, afirmou. “Com a taxação de lucros e dividendos, será o suficiente para suprirmos essa parte. Caso não seja possível, com toda a certeza, com o Parlamento, faremos o mesmo para prorrogar esse benefício no ano que vem.”
Inchaço
Questionado ainda sobre os mais de 6 mil militares em cargos comissionados e sobre a proposta de reforma administrativa, Bolsonaro afirmou que chamou o governo quadros alinhados. “Eu tive seis ou sete ministros militares. Eu chamei pessoas que estavam alinhadas a mim. Se é outro candidato, botaria gente alinhada a eles. Tanto é que o outro governo mergulhou em corrupção, o nosso foi diferente”, disse.
Bolsonaro defendeu que o governo cortou o “inchaço” da máquina pública, que melhorou a gestão das estatais e que fez concurso apenas para postos “essenciais”, como a Polícia Federal e a Polícia Rodoviária Federal. Segundo o chefe do Executivo, ele não pretende alterar a estabilidade dos atuais servidores públicos, mas que pode discutir a situação para os futuros. A própria reforma administrativa apresentada por Guedes, no entanto, previa o fim da estabilidade para novos servidores.
Judiciário
Aos responder a uma pergunta sobre eventual pedido de impeachment de ministros do Supremo Tribunal Federal (STF), Bolsonaro criticou decisões do Tribunal Superior Eleitoral (TSE) em relação a emissora Jovem Pan. “A preocupação deveria estar sobre Luiz Inácio Lula da Silva. Nunca tomei nenhuma medida de força contra qualquer repórter no Brasil, tentar desmonetizar a página de quem quer que seja, mesmo quando prejudicado, não busquei atingir o que é a alma da democracia, que é a liberdade de imprensa”, afirmou.
“Já entrei com pedido de impeachment contra Alexandre de Moraes, mas o Senado não aprovou. Agora, temos um Senado mais centro-direita, mas não tenho intenção de pedir o impeachment e não tenho intenção de aumentar ministros”, afirmou Bolsonaro.
O presidente ainda se posicionou contra medidas legais de combate às fake news. “Quem seria o censor do que é ou não fake news? Entendo que o melhor controle da mídia é deixar a mídia livre, para que a população decida”, disse. Nas considerações finais, Bolsonaro deu destaque à pauta de costumes ao se posicionar contra a legalização das drogas e a ideologia de gênero. /GUSTAVO QUEIROZ, JOÃO SCHELLER, LAÍS ADRIANA, LEVY TELES E MARCELA VILLAR
Agenda Estadão
Desde julho, o Estadão propõe, em uma série de reportagens, a discussão de soluções para 15 temas que considera fundamentais para a construção de um país mais justo, eficiente e igualitário. Direcionadas aos candidatos à Presidência, as perguntas abrangem temas como saúde, educação, sustentabilidade e livre-iniciativa.