Bruno Soller analisa o comportamento do eleitor brasileiro com base em big data e pesquisa

Opinião|Belém e Macapá, com sinais opostos, apontam que prioridade em eleger prefeito é qualidade da gestão


Enquanto Dr. Furlan conseguiu a maior votação de um prefeito de capital, Edmilson Rodrigues, que buscava seu quarto mandato como prefeito da cidade, amargou menos de 10% dos votos

Por Bruno Soller

Duas capitais do Norte do País, que têm entre si muitas semelhanças e formação cultural parecidas. Separadas pela Ilha do Marajó, Belém e Macapá mostraram para o Brasil o que é o mais importante para o eleitor na hora da decisão de seu voto para prefeito: a gestão local. Na capital amapaense, Dr. Furlan (MDB) conseguiu a maior votação de um prefeito de capital, com 85% dos votos, 204.291 votos de um universo de 238.282 votantes que compareceram às urnas, mesmo tendo mais sete adversários na disputa. Já, na terra do Círio de Nazaré, Edmilson Rodrigues (PSOL), que buscava seu quarto mandato como prefeito da cidade, amargou menos de 10% dos votos, sendo escorraçado de sua tentativa de reeleição, em uma disputa que seguiu para uma segunda volta.

Os sinais opostos passados por ambos os exemplos apenas reforçam que, para o eleitor brasileiro, a primeira avaliação que é feita durante o processo eleitoral para os poderes locais é a qualidade da gestão vigente. A partir desse pontapé inicial, vêm as demais variáveis que vão dando complexidade ao voto. O prefeito macapaense enfrentou nada mais e nada menos do que a máquina estadual, comandada pelo governador Clécio Luís, hoje no Solidariedade, o líder do governo Lula, senador Randolfe Rodrigues (PT) e o mais forte de seus adversários Davi Alcolumbre (União), virtual próximo presidente do Senado Federal, cargo que deverá ocupar pela terceira vez. Vale dizer que Furlan não declarou estar nem com Lula, nem com Bolsonaro, varrendo as discussões sobre polarização nacional na disputa.

O prefeito de Macapá, dr. Furlan, enfrentou a máquina estadual do governador Clécio Luís, o líder do governo Lula, senador Randolfe Rodrigues, e o mais forte de seus adversários, o senador Davi Alcolumbre Foto: @DoutorFurlan via Facebook
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Edmilson Rodrigues, pelo contrário, fez uma campanha inteira com a cara de Lula, que venceu na cidade há exatos dois anos. O prefeito teve o apoio, em sua eleição anterior, do altíssimo bem avaliado governador do Estado, Helder Barbalho (MDB), que poderia naturalmente ter sido seu cabo eleitoral nesse processo vigente. Sua administração terrivelmente reprovada, no entanto, fez com que o governador recuasse na relação e lançasse um candidato próprio, Igor Normando (MDB), bastante favorito a vencer o pleito. O município que receberá o mais importante fórum mundial sobre o clima, no próximo ano, tem todas as suas áreas de avaliação reprovadas, sendo que chamam a atenção os problemas de zeladoria urbana, principalmente o acúmulo de lixo nas ruas, e cuidados infraestruturais. Segundo uma pesquisa feita por um instituto local, o Doxa, 42,7% dos munícipes consideram o trabalho de Edmilson péssimo e 17,4% ruim. Apenas, 1,6% avaliaram como excelente.

Chamado de prefeitão, Furlan é um fenômeno nas redes sociais. Sua forma descontraída e mais despojada de mostrar seus feitos, criaram uma relação de intimidade do eleitor com seu prefeito. Mesmo sendo alvo de operações da Polícia Federal durante a eleição e com uma campanha de tentativa de assassinato de reputação feita pelos oponentes, nada parece ter atingido sua popularidade. Pesquisa da Quaest, mostrou que a gestão Furlan é aprovada por 94% dos cidadãos macapaenses. A revitalização da orla da cidade, um programa de asfaltamento em diversos bairros, a atração de shows e de uma agenda cultural para o município mais isolado do Brasil, a construção de um complexo de praças, a reforma do marco zero, além de uma série de entregas na saúde, educação e novas frotas de ônibus, garantiram a ele essa votação extraordinária, sendo a maior reeleição de um prefeito de capital de todos os tempos. Sua força foi tamanha, que nem mesmo, Josiel Alcolumbre, irmão do poderoso senador Davi Alcolumbre, algoz de Furlan, conseguiu se eleger vereador na chapa oposicionista.

As eleições de 2024 tiveram a maior taxa de reeleição de prefeitos da história democrática brasileira. Foram raríssimas as situações em que um prefeito que tivesse ao menos 50% de aprovação, não conseguisse se reeleger ou eleger um sucessor direto. Isso demonstra que para o eleitor, o primeiro exame de consciência feito na hora de decidir em quem votar é a avaliação do cenário em que se está vivendo. Cada vez menos crente em grandes promessas, o eleitor quer terra firme pra pisar e não imagina trocar o certo pelo incerto. Depois dessa primeira avaliação, começam a impactar demais questões, como histórico do candidato, posições políticas, denúncias e por aí vai. Uma das cidades mais importantes vencidas pelo PT, a mineira Contagem, foi bolsonarista na eleição presidencial, mas garantiu 61% dos votos à atual prefeita, Marília Campos, reelegendo-a em primeiro turno.

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A propaganda eleitoral é uma arma fundamental para trazer mais conhecimento e dar paternidade a projetos, que por vezes são bem avaliados, mas que não são reconhecidos pelo público como obra de algum gestor. Em São Paulo e Belo Horizonte, por exemplo, os dois prefeitos que tentam reeleição, assumiram as cadeiras após a saída dos titulares: Ricardo Nunes, em função do falecimento de Bruno Covas, e Fuad Noman, pela renúncia de Alexandre Kalil, que tentou o governo do Estado, em 2022. Obras que foram idealizadas pelos seus antecessores começaram a ganhar autoria pelos concorrentes, após a propagação de informação durante a campanha. O fim das filas de creche em São Paulo e as melhorias das enchentes em Belo Horizonte, são alguns dessas conquistas incorporadas e que foram fundamentais para a alavancagem da percepção popular sobre os candidatos. Nunes e Fuad iniciaram o ano, com gestões mais reprovadas do que aprovadas e agora caminham a passos largos para saírem vitoriosos em suas disputas, aumentando a aprovação da gestão. Pesquisa RealTime Big Data para a Record, na véspera do primeiro turno, mostrou que Nunes tem 55% de aprovação, assim como Fuad.

As eleições que caminharam para debates polarizados entre lulismo e bolsonarismo, principalmente, têm em comum uma situação: prefeitos muito mal avaliados. Em Goiânia, Rogério Cruz (MDB), reprovado por quase 80% da população, que herdou o mandato com a morte de Maguito Vilela, terminou em sexto lugar, com apenas 3% dos votos. A disputa ficou entre três concorrentes, cada um representando um espectro político. Fred Rodrigues (PL), bolsonarista, e Sandro Mabel (União), candidato do governador Caiado, fazem o segundo turno, mas Adriana Accorsi (PT), lulista, ficou perto de conseguir essa vaga. Em Teresina, Piauí, o reprovadíssimo Dr. Pessoa (PRD), fez apenas 2% dos votos, deixando a eleição entre Silvio Mendes (União), apoiado por Ciro Nogueira (PP) e o bolsonarismo, que conseguiu a eleição com 52% dos votos e o petista Fábio Novo, apoiado por Lula e pelo governador Rafael Fonteles (PT). Em Cuiabá, onde Abílio Brunini (PL) e Lúdio Cabral (PT), bolsonarista e lulista, respectivamente, enfrentam-se em segundo turno, o candidato do prefeito Emanuel Pinheiro, Kennedy (MDB), fez 4% dos votos,

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Uma das poucas exceções de uma gestão bem avaliada em que o mandatário está com dificuldades na reeleição é Manaus. De acordo com a pesquisa Quaest, David Almeida (Avante) tem 82% de aprovação da gestão, mas encontra-se em empate técnico no segundo turno com Capitão Alberto Neto (PL). Chamado de “Pinóquio Manauara” pelo ex-presidente Jair Bolsonaro (PL), Almeida amarga uma rejeição pessoal forte, que contrasta com a percepção de melhora da cidade. É a ressalva que confirma a regra. Os apoios de Omar Aziz (PSD) e Eduardo Braga (MDB) parecem ter trazido o prefeito para um jogo da política mais antiga do Estado e uma certa traição ao bolsonarismo, forte no município, onde recebeu 61% dos votos em 2022. Mesmo assim, o cenário é de empate nesse segundo turno, podendo ainda o prefeito conseguir seu segundo mandato.

O fato é que o eleitor quer segurança na hora de eleger seu prefeito. A máxima do futebol que diz: “em time que está ganhando não se mexe”, vale cada vez mais para a política. Cansado de esperar o que nunca chega, o eleitor quer um governo que olhe por ele. Entregas, satisfações e presença do político são fundamentais para a composição de avaliação feita pelo eleitor sobre seu gestor. Mesmo em dificuldades, o cidadão espera de seu representante, alguém em que possa confiar. No frigir dos ovos, a célebre mensagem de Abraham Lincoln, continua absolutamente em voga, mesmo séculos depois. Um governo deve ser do povo, pelo povo e para o povo. Entender os anseios do eleitorado e não cessar esforços para atingir as demandas é a receita de sucesso para qualquer político. Mais importante que qualquer discurso é a ação. Walt Disney com sua sagacidade empresarial já disse uma vez: “A melhor maneira de iniciar é parar de falar e começar a fazer.”

Duas capitais do Norte do País, que têm entre si muitas semelhanças e formação cultural parecidas. Separadas pela Ilha do Marajó, Belém e Macapá mostraram para o Brasil o que é o mais importante para o eleitor na hora da decisão de seu voto para prefeito: a gestão local. Na capital amapaense, Dr. Furlan (MDB) conseguiu a maior votação de um prefeito de capital, com 85% dos votos, 204.291 votos de um universo de 238.282 votantes que compareceram às urnas, mesmo tendo mais sete adversários na disputa. Já, na terra do Círio de Nazaré, Edmilson Rodrigues (PSOL), que buscava seu quarto mandato como prefeito da cidade, amargou menos de 10% dos votos, sendo escorraçado de sua tentativa de reeleição, em uma disputa que seguiu para uma segunda volta.

Os sinais opostos passados por ambos os exemplos apenas reforçam que, para o eleitor brasileiro, a primeira avaliação que é feita durante o processo eleitoral para os poderes locais é a qualidade da gestão vigente. A partir desse pontapé inicial, vêm as demais variáveis que vão dando complexidade ao voto. O prefeito macapaense enfrentou nada mais e nada menos do que a máquina estadual, comandada pelo governador Clécio Luís, hoje no Solidariedade, o líder do governo Lula, senador Randolfe Rodrigues (PT) e o mais forte de seus adversários Davi Alcolumbre (União), virtual próximo presidente do Senado Federal, cargo que deverá ocupar pela terceira vez. Vale dizer que Furlan não declarou estar nem com Lula, nem com Bolsonaro, varrendo as discussões sobre polarização nacional na disputa.

O prefeito de Macapá, dr. Furlan, enfrentou a máquina estadual do governador Clécio Luís, o líder do governo Lula, senador Randolfe Rodrigues, e o mais forte de seus adversários, o senador Davi Alcolumbre Foto: @DoutorFurlan via Facebook

Edmilson Rodrigues, pelo contrário, fez uma campanha inteira com a cara de Lula, que venceu na cidade há exatos dois anos. O prefeito teve o apoio, em sua eleição anterior, do altíssimo bem avaliado governador do Estado, Helder Barbalho (MDB), que poderia naturalmente ter sido seu cabo eleitoral nesse processo vigente. Sua administração terrivelmente reprovada, no entanto, fez com que o governador recuasse na relação e lançasse um candidato próprio, Igor Normando (MDB), bastante favorito a vencer o pleito. O município que receberá o mais importante fórum mundial sobre o clima, no próximo ano, tem todas as suas áreas de avaliação reprovadas, sendo que chamam a atenção os problemas de zeladoria urbana, principalmente o acúmulo de lixo nas ruas, e cuidados infraestruturais. Segundo uma pesquisa feita por um instituto local, o Doxa, 42,7% dos munícipes consideram o trabalho de Edmilson péssimo e 17,4% ruim. Apenas, 1,6% avaliaram como excelente.

Chamado de prefeitão, Furlan é um fenômeno nas redes sociais. Sua forma descontraída e mais despojada de mostrar seus feitos, criaram uma relação de intimidade do eleitor com seu prefeito. Mesmo sendo alvo de operações da Polícia Federal durante a eleição e com uma campanha de tentativa de assassinato de reputação feita pelos oponentes, nada parece ter atingido sua popularidade. Pesquisa da Quaest, mostrou que a gestão Furlan é aprovada por 94% dos cidadãos macapaenses. A revitalização da orla da cidade, um programa de asfaltamento em diversos bairros, a atração de shows e de uma agenda cultural para o município mais isolado do Brasil, a construção de um complexo de praças, a reforma do marco zero, além de uma série de entregas na saúde, educação e novas frotas de ônibus, garantiram a ele essa votação extraordinária, sendo a maior reeleição de um prefeito de capital de todos os tempos. Sua força foi tamanha, que nem mesmo, Josiel Alcolumbre, irmão do poderoso senador Davi Alcolumbre, algoz de Furlan, conseguiu se eleger vereador na chapa oposicionista.

As eleições de 2024 tiveram a maior taxa de reeleição de prefeitos da história democrática brasileira. Foram raríssimas as situações em que um prefeito que tivesse ao menos 50% de aprovação, não conseguisse se reeleger ou eleger um sucessor direto. Isso demonstra que para o eleitor, o primeiro exame de consciência feito na hora de decidir em quem votar é a avaliação do cenário em que se está vivendo. Cada vez menos crente em grandes promessas, o eleitor quer terra firme pra pisar e não imagina trocar o certo pelo incerto. Depois dessa primeira avaliação, começam a impactar demais questões, como histórico do candidato, posições políticas, denúncias e por aí vai. Uma das cidades mais importantes vencidas pelo PT, a mineira Contagem, foi bolsonarista na eleição presidencial, mas garantiu 61% dos votos à atual prefeita, Marília Campos, reelegendo-a em primeiro turno.

A propaganda eleitoral é uma arma fundamental para trazer mais conhecimento e dar paternidade a projetos, que por vezes são bem avaliados, mas que não são reconhecidos pelo público como obra de algum gestor. Em São Paulo e Belo Horizonte, por exemplo, os dois prefeitos que tentam reeleição, assumiram as cadeiras após a saída dos titulares: Ricardo Nunes, em função do falecimento de Bruno Covas, e Fuad Noman, pela renúncia de Alexandre Kalil, que tentou o governo do Estado, em 2022. Obras que foram idealizadas pelos seus antecessores começaram a ganhar autoria pelos concorrentes, após a propagação de informação durante a campanha. O fim das filas de creche em São Paulo e as melhorias das enchentes em Belo Horizonte, são alguns dessas conquistas incorporadas e que foram fundamentais para a alavancagem da percepção popular sobre os candidatos. Nunes e Fuad iniciaram o ano, com gestões mais reprovadas do que aprovadas e agora caminham a passos largos para saírem vitoriosos em suas disputas, aumentando a aprovação da gestão. Pesquisa RealTime Big Data para a Record, na véspera do primeiro turno, mostrou que Nunes tem 55% de aprovação, assim como Fuad.

As eleições que caminharam para debates polarizados entre lulismo e bolsonarismo, principalmente, têm em comum uma situação: prefeitos muito mal avaliados. Em Goiânia, Rogério Cruz (MDB), reprovado por quase 80% da população, que herdou o mandato com a morte de Maguito Vilela, terminou em sexto lugar, com apenas 3% dos votos. A disputa ficou entre três concorrentes, cada um representando um espectro político. Fred Rodrigues (PL), bolsonarista, e Sandro Mabel (União), candidato do governador Caiado, fazem o segundo turno, mas Adriana Accorsi (PT), lulista, ficou perto de conseguir essa vaga. Em Teresina, Piauí, o reprovadíssimo Dr. Pessoa (PRD), fez apenas 2% dos votos, deixando a eleição entre Silvio Mendes (União), apoiado por Ciro Nogueira (PP) e o bolsonarismo, que conseguiu a eleição com 52% dos votos e o petista Fábio Novo, apoiado por Lula e pelo governador Rafael Fonteles (PT). Em Cuiabá, onde Abílio Brunini (PL) e Lúdio Cabral (PT), bolsonarista e lulista, respectivamente, enfrentam-se em segundo turno, o candidato do prefeito Emanuel Pinheiro, Kennedy (MDB), fez 4% dos votos,

Uma das poucas exceções de uma gestão bem avaliada em que o mandatário está com dificuldades na reeleição é Manaus. De acordo com a pesquisa Quaest, David Almeida (Avante) tem 82% de aprovação da gestão, mas encontra-se em empate técnico no segundo turno com Capitão Alberto Neto (PL). Chamado de “Pinóquio Manauara” pelo ex-presidente Jair Bolsonaro (PL), Almeida amarga uma rejeição pessoal forte, que contrasta com a percepção de melhora da cidade. É a ressalva que confirma a regra. Os apoios de Omar Aziz (PSD) e Eduardo Braga (MDB) parecem ter trazido o prefeito para um jogo da política mais antiga do Estado e uma certa traição ao bolsonarismo, forte no município, onde recebeu 61% dos votos em 2022. Mesmo assim, o cenário é de empate nesse segundo turno, podendo ainda o prefeito conseguir seu segundo mandato.

O fato é que o eleitor quer segurança na hora de eleger seu prefeito. A máxima do futebol que diz: “em time que está ganhando não se mexe”, vale cada vez mais para a política. Cansado de esperar o que nunca chega, o eleitor quer um governo que olhe por ele. Entregas, satisfações e presença do político são fundamentais para a composição de avaliação feita pelo eleitor sobre seu gestor. Mesmo em dificuldades, o cidadão espera de seu representante, alguém em que possa confiar. No frigir dos ovos, a célebre mensagem de Abraham Lincoln, continua absolutamente em voga, mesmo séculos depois. Um governo deve ser do povo, pelo povo e para o povo. Entender os anseios do eleitorado e não cessar esforços para atingir as demandas é a receita de sucesso para qualquer político. Mais importante que qualquer discurso é a ação. Walt Disney com sua sagacidade empresarial já disse uma vez: “A melhor maneira de iniciar é parar de falar e começar a fazer.”

Duas capitais do Norte do País, que têm entre si muitas semelhanças e formação cultural parecidas. Separadas pela Ilha do Marajó, Belém e Macapá mostraram para o Brasil o que é o mais importante para o eleitor na hora da decisão de seu voto para prefeito: a gestão local. Na capital amapaense, Dr. Furlan (MDB) conseguiu a maior votação de um prefeito de capital, com 85% dos votos, 204.291 votos de um universo de 238.282 votantes que compareceram às urnas, mesmo tendo mais sete adversários na disputa. Já, na terra do Círio de Nazaré, Edmilson Rodrigues (PSOL), que buscava seu quarto mandato como prefeito da cidade, amargou menos de 10% dos votos, sendo escorraçado de sua tentativa de reeleição, em uma disputa que seguiu para uma segunda volta.

Os sinais opostos passados por ambos os exemplos apenas reforçam que, para o eleitor brasileiro, a primeira avaliação que é feita durante o processo eleitoral para os poderes locais é a qualidade da gestão vigente. A partir desse pontapé inicial, vêm as demais variáveis que vão dando complexidade ao voto. O prefeito macapaense enfrentou nada mais e nada menos do que a máquina estadual, comandada pelo governador Clécio Luís, hoje no Solidariedade, o líder do governo Lula, senador Randolfe Rodrigues (PT) e o mais forte de seus adversários Davi Alcolumbre (União), virtual próximo presidente do Senado Federal, cargo que deverá ocupar pela terceira vez. Vale dizer que Furlan não declarou estar nem com Lula, nem com Bolsonaro, varrendo as discussões sobre polarização nacional na disputa.

O prefeito de Macapá, dr. Furlan, enfrentou a máquina estadual do governador Clécio Luís, o líder do governo Lula, senador Randolfe Rodrigues, e o mais forte de seus adversários, o senador Davi Alcolumbre Foto: @DoutorFurlan via Facebook

Edmilson Rodrigues, pelo contrário, fez uma campanha inteira com a cara de Lula, que venceu na cidade há exatos dois anos. O prefeito teve o apoio, em sua eleição anterior, do altíssimo bem avaliado governador do Estado, Helder Barbalho (MDB), que poderia naturalmente ter sido seu cabo eleitoral nesse processo vigente. Sua administração terrivelmente reprovada, no entanto, fez com que o governador recuasse na relação e lançasse um candidato próprio, Igor Normando (MDB), bastante favorito a vencer o pleito. O município que receberá o mais importante fórum mundial sobre o clima, no próximo ano, tem todas as suas áreas de avaliação reprovadas, sendo que chamam a atenção os problemas de zeladoria urbana, principalmente o acúmulo de lixo nas ruas, e cuidados infraestruturais. Segundo uma pesquisa feita por um instituto local, o Doxa, 42,7% dos munícipes consideram o trabalho de Edmilson péssimo e 17,4% ruim. Apenas, 1,6% avaliaram como excelente.

Chamado de prefeitão, Furlan é um fenômeno nas redes sociais. Sua forma descontraída e mais despojada de mostrar seus feitos, criaram uma relação de intimidade do eleitor com seu prefeito. Mesmo sendo alvo de operações da Polícia Federal durante a eleição e com uma campanha de tentativa de assassinato de reputação feita pelos oponentes, nada parece ter atingido sua popularidade. Pesquisa da Quaest, mostrou que a gestão Furlan é aprovada por 94% dos cidadãos macapaenses. A revitalização da orla da cidade, um programa de asfaltamento em diversos bairros, a atração de shows e de uma agenda cultural para o município mais isolado do Brasil, a construção de um complexo de praças, a reforma do marco zero, além de uma série de entregas na saúde, educação e novas frotas de ônibus, garantiram a ele essa votação extraordinária, sendo a maior reeleição de um prefeito de capital de todos os tempos. Sua força foi tamanha, que nem mesmo, Josiel Alcolumbre, irmão do poderoso senador Davi Alcolumbre, algoz de Furlan, conseguiu se eleger vereador na chapa oposicionista.

As eleições de 2024 tiveram a maior taxa de reeleição de prefeitos da história democrática brasileira. Foram raríssimas as situações em que um prefeito que tivesse ao menos 50% de aprovação, não conseguisse se reeleger ou eleger um sucessor direto. Isso demonstra que para o eleitor, o primeiro exame de consciência feito na hora de decidir em quem votar é a avaliação do cenário em que se está vivendo. Cada vez menos crente em grandes promessas, o eleitor quer terra firme pra pisar e não imagina trocar o certo pelo incerto. Depois dessa primeira avaliação, começam a impactar demais questões, como histórico do candidato, posições políticas, denúncias e por aí vai. Uma das cidades mais importantes vencidas pelo PT, a mineira Contagem, foi bolsonarista na eleição presidencial, mas garantiu 61% dos votos à atual prefeita, Marília Campos, reelegendo-a em primeiro turno.

A propaganda eleitoral é uma arma fundamental para trazer mais conhecimento e dar paternidade a projetos, que por vezes são bem avaliados, mas que não são reconhecidos pelo público como obra de algum gestor. Em São Paulo e Belo Horizonte, por exemplo, os dois prefeitos que tentam reeleição, assumiram as cadeiras após a saída dos titulares: Ricardo Nunes, em função do falecimento de Bruno Covas, e Fuad Noman, pela renúncia de Alexandre Kalil, que tentou o governo do Estado, em 2022. Obras que foram idealizadas pelos seus antecessores começaram a ganhar autoria pelos concorrentes, após a propagação de informação durante a campanha. O fim das filas de creche em São Paulo e as melhorias das enchentes em Belo Horizonte, são alguns dessas conquistas incorporadas e que foram fundamentais para a alavancagem da percepção popular sobre os candidatos. Nunes e Fuad iniciaram o ano, com gestões mais reprovadas do que aprovadas e agora caminham a passos largos para saírem vitoriosos em suas disputas, aumentando a aprovação da gestão. Pesquisa RealTime Big Data para a Record, na véspera do primeiro turno, mostrou que Nunes tem 55% de aprovação, assim como Fuad.

As eleições que caminharam para debates polarizados entre lulismo e bolsonarismo, principalmente, têm em comum uma situação: prefeitos muito mal avaliados. Em Goiânia, Rogério Cruz (MDB), reprovado por quase 80% da população, que herdou o mandato com a morte de Maguito Vilela, terminou em sexto lugar, com apenas 3% dos votos. A disputa ficou entre três concorrentes, cada um representando um espectro político. Fred Rodrigues (PL), bolsonarista, e Sandro Mabel (União), candidato do governador Caiado, fazem o segundo turno, mas Adriana Accorsi (PT), lulista, ficou perto de conseguir essa vaga. Em Teresina, Piauí, o reprovadíssimo Dr. Pessoa (PRD), fez apenas 2% dos votos, deixando a eleição entre Silvio Mendes (União), apoiado por Ciro Nogueira (PP) e o bolsonarismo, que conseguiu a eleição com 52% dos votos e o petista Fábio Novo, apoiado por Lula e pelo governador Rafael Fonteles (PT). Em Cuiabá, onde Abílio Brunini (PL) e Lúdio Cabral (PT), bolsonarista e lulista, respectivamente, enfrentam-se em segundo turno, o candidato do prefeito Emanuel Pinheiro, Kennedy (MDB), fez 4% dos votos,

Uma das poucas exceções de uma gestão bem avaliada em que o mandatário está com dificuldades na reeleição é Manaus. De acordo com a pesquisa Quaest, David Almeida (Avante) tem 82% de aprovação da gestão, mas encontra-se em empate técnico no segundo turno com Capitão Alberto Neto (PL). Chamado de “Pinóquio Manauara” pelo ex-presidente Jair Bolsonaro (PL), Almeida amarga uma rejeição pessoal forte, que contrasta com a percepção de melhora da cidade. É a ressalva que confirma a regra. Os apoios de Omar Aziz (PSD) e Eduardo Braga (MDB) parecem ter trazido o prefeito para um jogo da política mais antiga do Estado e uma certa traição ao bolsonarismo, forte no município, onde recebeu 61% dos votos em 2022. Mesmo assim, o cenário é de empate nesse segundo turno, podendo ainda o prefeito conseguir seu segundo mandato.

O fato é que o eleitor quer segurança na hora de eleger seu prefeito. A máxima do futebol que diz: “em time que está ganhando não se mexe”, vale cada vez mais para a política. Cansado de esperar o que nunca chega, o eleitor quer um governo que olhe por ele. Entregas, satisfações e presença do político são fundamentais para a composição de avaliação feita pelo eleitor sobre seu gestor. Mesmo em dificuldades, o cidadão espera de seu representante, alguém em que possa confiar. No frigir dos ovos, a célebre mensagem de Abraham Lincoln, continua absolutamente em voga, mesmo séculos depois. Um governo deve ser do povo, pelo povo e para o povo. Entender os anseios do eleitorado e não cessar esforços para atingir as demandas é a receita de sucesso para qualquer político. Mais importante que qualquer discurso é a ação. Walt Disney com sua sagacidade empresarial já disse uma vez: “A melhor maneira de iniciar é parar de falar e começar a fazer.”

Opinião por Bruno Soller

Bruno Soller é estrategista eleitoral. Especializado em pesquisas de opinião pública, é graduado em Relações Internacionais pela PUC-SP, com especialização em Comunicação Política pela George Washington University. Trabalhou no governo federal, Câmara dos Deputados e Comissão Europeia.

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