BRASÍLIA - O presidente do Supremo Tribunal Federal (STF), ministro Luís Roberto Barroso, determinou nesta segunda-feira, 10, que o governador de São Paulo, Tarcísio de Freitas (Republicanos), deve seguir as diretrizes do governo do presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) para a instalação de câmeras corporais na Polícia Militar do Estado. Destoando do entendimento do Ministério da Justiça, que aconselhou o funcionamento automático dos equipamentos, Tarcísio quer que os policiais decidam quando vão querer, ou não, gravar uma ocorrência.
No último dia 22, Tarcísio lançou um edital para substituir e ampliar o número de câmeras corporais portáteis (COPs) para a Polícia Militar. Além de contratar 12 mil novos equipamentos mais modernos, o governo do Estado determinou que os policiais terão a liberdade de iniciar e finalizar as gravações durante as operações policiais.
Cinco dias depois, no dia 27, a Defensoria Pública de São Paulo (DP-SP) cobrou Barroso e disse que Tarcísio “descumpriu compromissos”. A DP-SP também exigiu a anulação do edital feito pelo Governo de São Paulo.
Nesta segunda-feira, 10, Barroso determinou que Tarcísio deve seguir as diretrizes do Ministério da Justiça lançadas no último dia 28. A pasta, chefiada pelo ministro Ricardo Lewandowski, sugeriu que os equipamentos sejam, preferencialmente, ligados automaticamente, mas dá margem para o acionamento remoto por autoridades ou pelo próprio policial.
O que diz o edital do Governo de São Paulo?
O edital do governo Tarcísio indica que as câmeras corporais poderão ter as suas gravações iniciadas e finalizadas pelo próprio agente durante as operações. Atualmente, o modelo do equipamento adotado pela PM paulista funciona com gravação ininterrupta.
A mudança prevista pelo governo paulista prevê que, a gravação intencional feita pelo policial, permitirá que a filmagem passe a ocorrer em maior qualidade e com som. O modelo atual, em que há uma gravação contínua, não garante a captação de áudio e a condição da imagem é prejudicada.
A Secretaria da Segurança Pública de São Paulo disse ao Estadão que o edital levou em consideração estudos técnicos, e avaliações apontaram problemas relativos à autonomia da bateria dos equipamentos e à capacidade de armazenamento no cenário da gravação contínua.
Questionado se a possibilidade de os policiais desligarem a câmera compromete a gravação das ações, o governador Tarcísio de Freitas afirmou, no dia 23 de maio, que o edital “fortalece” as filmagens. “Tem um compliance maior e você sai daquela situação de, no meio de uma operação, acabar a bateria, a câmera não filmar. Você vai passar a ter uma governança muito melhor, uma qualidade de imagem muito melhor e um controle muito melhor das operações que vão estar em campo”, disse o chefe do Executivo paulista.
Quais são as diretrizes definidas pelo Ministério da Justiça?
Lançado no último dia 28, as diretrizes do Ministério da Justiça para orientar o uso de câmeras nas fardas de policiais determina que devem preferencialmente ser acionados automaticamente (de modo ininterrupto durante todo o turno de serviço).
As diretrizes, porém, admitem a possibilidade de acionamento remoto por autoridades ou pelo próprio policial (nesse caso com objetivo de “preservar a intimidade durante as pausas e os intervalos de trabalho”).
Além disso, estão previstas 16 situações onde as câmeras deverão, obrigatoriamente, estar em pleno funcionamento. São elas:
- No atendimento de ocorrências;
- Nas atividades que demandem atuação ostensiva, seja ordinária, extraordinária ou especializada;
- Na identificação e checagem de bens;
- Durante buscas pessoais, veiculares ou domiciliares;
- Ao longo de ações operacionais, inclusive aquelas que envolvam manifestações, controle de distúrbios civis, interdições ou reintegrações de posse;
- No cumprimento de determinações de autoridades policiais ou judiciárias e de mandados judiciais
- Nas perícias externas;
- Nas atividades de fiscalização e vistoria técnica;
- Nas ações de busca, salvamento e resgate;
- Nas escoltas de presos;
- Em todas as interações entre policiais e custodiados, dentro ou fora do ambiente prisional;
- Durante as rotinas carcerárias, inclusive no atendimento aos visitantes e advogados;
- Nas intervenções e resolução de crises, motins e rebeliões no sistema prisional;
- Nas situações de oposição à atuação policial, de potencial confronto ou de uso de força física;
- Nos sinistros de trânsito;
- No patrulhamento preventivo e ostensivo ou na execução de diligências de rotina em que ocorram ou possam ocorrer prisões, atos de violência, lesões corporais ou mortes.
Questionado a respeito da brecha da portaria para admitir a interrupção da gravação, o ministro Ricardo Lewandowski afirmou ao Estadão que o texto garante a integridade do conteúdo ao listar as situações em que é obrigatório o acionamento da câmera. Ele disse ainda que o acionamento pelo próprio policial só poderá ocorrer em casos de necessidade como idas ao banheiro, almoço, entre outras.
Os governadores não são obrigados a seguir as recomendações, mas os que fizerem vão receber recursos federais, do Fundo Nacional de Segurança Pública e do Fundo Penitenciário Nacional, como forma de incentivo.
O que o presidente do STF determinou nesta segunda-feira?
Barroso decidiu manter o edital elaborado pelo governo de Tarcísio de Freitas e declarou que o governador, até o momento, cumpriu os compromissos que assumiu com a política de câmeras.
O presidente do STF afirmou também que, embora as normas do Ministério da Justiça não vinculem diretamente os Estados, elas representam uma “diretriz técnica importante” e devem ser usadas como parâmetro para verificar se a política de câmeras adotada em São Paulo será ou não eficiente.
O magistrado também determinou que o governador apresente, seis meses após o início do contrato que for firmado por meio do edital, um relatório sobre a efetividade das novas câmeras. O objetivo é acompanhar a transição entre os modelos. “Em caso de desempenho insatisfatório, esta presidência voltará a atuar”, alertou.
Barroso também pediu que a DP-SP monitore o caso para “assegurar que não haja retrocesso”. Para isso, o presidente do STF determinou que o governo paulista crie mecanismos de fiscalização.
Em entrevista ao programa Roda Viva, da TV Cultura, nesta segunda-feira, Barroso afirmou que o STF também vai monitorar de perto a adoção do novo modelo de câmeras em São Paulo. “A instalação de câmeras é uma necessidade para a proteção do bom policial e para coibir as ações. Eu acho que o governador se comprometeu a adotar a política de câmeras, cumpriu a palavra”, afirmou.