Aliados da senadora Simone Tebet (MDB-MS) e do ex-ministro Ciro Gomes (PDT-CE) tentam promover uma aproximação dos dois pré-candidatos à Presidência. A iniciativa visa estabelecer uma convivência pacífica – espécie de pacto de não agressão –, em meio à polarização entre o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) e o presidente Jair Bolsonaro (PL). Eles podem construir uma agenda mínima.
Entre as pautas convergentes estão os desafios da economia – a inflação, o desemprego e a pobreza –, a defesa da democracia e a crítica à radicalização imposta no atual ciclo pré-eleitoral. Simone e Ciro se colocam como pré-candidaturas do centro democrático, mas, enquanto ela se situa na chamada terceira via, ele se posiciona mais à esquerda no espectro político.
Em outra frente, o MDB abriu um canal de diálogo com o Podemos para tentar ampliar a coligação da senadora. O partido chegou até a lançar a pré-candidatura do ex-ministro da Justiça de Bolsonaro Sérgio Moro, mas a iniciativa foi frustrada com a migração do ex-juiz da Lava Jato para o União Brasil. Atualmente, após a chancela da cúpula emedebista para representar a terceira via, Simone conta apenas com o apoio do Cidadania e espera pela palavra final do PSDB.
‘Grandeza’
O primeiro sinal do movimento entre Ciro e Simone se deu na participação, na quarta-feira passada, do ex-senador gaúcho Pedro Simon, decano do MDB, em um programa apresentado pelo pedetista nas redes sociais. Na ocasião, Simon classificou como um desastre a “dobradinha” Lula e Bolsonaro e disse que os pré-candidatos do MDB e do PDT precisam “caminhar, discutir e debater com grandeza”.
Ciro concordou, elogiou Simone e o pai dela, o ex-senador Ramez Tebet, e se colocou à disposição para o diálogo. “Em qualquer mesa em que o senhor estiver, eu estarei na cabeceira. Me convoque que eu estarei”, afirmou ele.
Os presidentes do PDT, Carlos Lupi, e do MDB, Baleia Rossi, reforçaram a ideia. “Estamos abertos para o diálogo com a Simone. Esse é o caminho natural”, disse Lupi. “Temos de conversar com todos aqueles que são alternativas à polarização. O diálogo está no DNA do MDB. Não se faz política com veto. Temos de buscar os pontos de convergência”, afirmou Baleia Rossi.
A articulação no centro político esbarra, porém, em questões regionais, especialmente no Ceará. No Estado, o MDB e o PDT são rivais históricos. Uma reunião entre Ciro e Simone neste momento, dizem aliados, acirraria os ânimos com o grupo do ex-senador Eunício Oliveira, que é próximo de Lula e se opõe à pré-candidatura da emedebista.
Palanque
Do lado da senadora, enquanto os tucanos caminham para um acordo na disputa presidencial, o MDB abriu um canal de diálogo com o Podemos, que ficou sem candidato próprio. As conversas ainda são preliminares, mas integrantes do MDB avaliam que a chapa de Simone com o senador Tasso Jereissati (PSDB-CE) na vice, que já indicou que pode aceitar o posto, tem o que chamam de afinidades históricas com o Podemos.
Há resistências. Segundo o senador Álvaro Dias (Podemos-PR), a sigla estaria dividida entre lançar candidatura própria ou liberar os filiados.
Fator Leite
A solução do impasse entre o PSDB e o MDB teve de ser adiada porque a senadora cancelou uma viagem ao Rio Grande Sul, que estava prevista para ontem e hoje, em razão da morte de seu sogro, Agostinho Rocha Segura, de 80 anos, em Três Lagoas (MS). Ele morreu em consequência de um AVC que sofreu na quinta-feira passada.
Simone deve ir próxima semana a Porto Alegre para uma rodada de conversas com líderes locais do MDB e com o ex-governador Eduardo Leite (PSDB). O acordo local passa pela desistência do deputado estadual Gabriel Souza (MDB) de disputar o Palácio Piratini para apoiar o candidato tucano, que deve ser Leite.
Após a desistência de João Doria de disputar o Palácio do Planalto, o PSDB estabeleceu como contrapartida ao apoio a Simone que o MDB abrisse mão de lançar candidatos próprios em três Estados para apoiar tucanos: Rio Grande do Sul, Pernambuco e Mato Grosso do Sul. Nos dois últimos, já está certo que a pré-candidata terá dois palanques.
‘Se um bater no outro, os dois caem fora’
O pacto de não agressão entre os pré-candidatos ao Palácio do Planalto Ciro Gomes (PDT) e Simone Tebet (MDB) deve se refletir em campanhas distintas, que devem ser reavaliadas, diz o cientista político Carlos Melo. Leia a entrevista:
O centro político, caracterizado nas pré-candidaturas de Simone Tebet e Ciro Gomes, indica que pretende evitar ataques mútuos na campanha. Como o sr. avalia essa disposição?
Ninguém disputa o terceiro lugar. Se um bater no outro, os dois caem fora. Bolsonaro quer Lula como adversário e vice-versa. Portanto, os outros ficam falando sozinhos. Eles vão ter de romper essa barreira. A primeira pergunta é: por que são centro? Não ser nem Lula nem Bolsonaro não qualifica ninguém. Ciro tentou se posicionar como algo mais propositivo, mas encontrou o teto e agora a estratégia é esperar que o Bolsonaro se inviabilize para que o antipetismo o avalie como um anti-Lula não bolsonarista. Já Simone se coloca de duas formas genéricas: nem Lula nem Bolsonaro e, depois, se diz candidata das mulheres, o que parece pouco. Basta o bolsonarismo dizer que esse argumento serviu para Dilma (Rousseff, presidente cassada).
Isso leva a campanhas mais propositivas?
Ciro não tem expressado proposições ultimamente. Vejo ele insistindo pouco. Não adianta ficar falando em projeto se isso não trouxer mais votos. Claro que em alguns momentos vai ter (propostas), mas não vejo espaço para uma campanha mais propositiva dele. Já a identidade que Simone vai buscar com as mulheres tende a passar pela questão econômica e como resolver o problema do aumento de preços, porque há uma intersecção entre economia e voto feminino. Quando ela fala que mulher vota em mulher, vai ter de diferenciar propostas feministas das sobre a condição feminina. Não adianta falar só sobre antipetismo.
Como o centro deve influenciar um eventual segundo turno?
Ciro e Simone vão ser pressionados em relação à questão democrática. Se é um centro democrático, a tendência é se posicionar a favor da democracia, e nesse sentido o Bolsonaro tem sido bastante controverso. Se é um centro fisiológico, vai acabar se definindo por aquele que tem mais chances de ganhar a eleição. Há casos no centro que vão assumir um papel ideológico e não vão apoiar nem um nem outro/COLABOROU GUSTAVO QUEIROZ