RIO - Desde o professor Darcy Ribeiro, eleito em 1982 na chapa de Leonel Brizola, o Rio vinha tendo vice-governadores com histórico político conhecido. Francisco Dornelles, Luiz Fernando Pezão, Luiz Paulo Conde e Benedita da Silva, os mais recentes, já eram figuras atuantes na política fluminense quando foram eleitos. Com Cláudio Castro, o vice de Wilson Witzel que pode se tornar governador caso o impeachment do mandatário avance, a história é diferente. Sua atuação se deu mais nos bastidores do que sob os holofotes.
De semblante fechado nos compromissos públicos, mas simpático ao conversar, Castro tem trajetória longa em outro meio: o católico. Cantor, o ‘02’ do Palácio Guanabara já lançou dois discos solo e, antes, integrava a banda Em Nome do Pai. É fácil achar vídeos – que até hoje são postados em seu canal no YouTube – nos quais o vice exibe a cantoria. Num dos clipes mais recentes, ajoelha-se diante do Cristo Redentor.
Na política, antes de compor a chapa do ex-juiz azarão, Castro era vereador de primeiro mandato no Rio e tinha trabalhado como chefe de gabinete na Assembleia Legislativa, a Alerj, que abriu, anteontem, o processo de impeachment de Witzel. Chegou à parceria com o atual governador meio por acaso. O PSC, partido de ambos, não conseguiu compor aliança com outras legendas para a eleição, o que acabou levando à indicação de um nome interno para a vice. Sobrou para Castro. Assim como a maioria dos moradores do Estado, naquele momento o vereador não tinha ideia de que eles poderiam ser eleitos.
O cantor católico assumiu como missão, no início do governo, de lidar com órgãos como o Detran, um dos mais conhecidos pelos esquemas de corrupção dos anos anteriores no Rio. O departamento é um dos que têm, hoje, influência do Pastor Everaldo, presidente nacional do PSC.
Durante a pandemia do coronavírus, Castro vinha coordenando um mutirão de distribuição de cestas básicas, e foi escalado recentemente para correr atrás do prejuízo político de Witzel na Alerj – o governador exonerou, há duas semanas, o secretário de Casa Civil, André Moura, responsável pela interlocução com os deputados.
Ou seja, está nas mãos do primeiro beneficiado por um eventual impeachment articular contra o impedimento. E a situação é complicada. Todos os 69 deputados presentes na sessão concordaram com a abertura do processo. Apesar de os pedidos de afastamento terem como base jurídica a Operação Placebo, que atingiu o governador após indícios de corrupção na Saúde em plena pandemia, a tentativa de tirar Witzel do cargo também carrega forte contexto político.
A relação do governador com a Assembleia já vinha esgarçada. Ex-secretário de Desenvolvimento Econômico e homem-forte do governador, o advogado Lucas Tristão simbolizava o que os deputados consideram o modo desrespeitoso com o qual o Executivo lidava com o Legislativo. Ele foi exonerado na semana passada numa tentativa de aceno à Alerj, mas a iniciativa pode ter sido tomada tarde demais.
Castro foi chefe de gabinete de Márcio Pacheco (PSC), com quem também já dividiu os palcos de shows católicos. Líder do governo na Casa até pouco depois da Operação Placebo, o deputado entregou a função após a exoneração de André Moura. Até agora não há um novo líder estabelecido, e o que sobrou foi a aposta na capacidade de diálogo do vice.
Assim como Witzel, Castro não nasceu em terras fluminenses. É de Santos, no litoral paulista, e foi para o Rio ainda criança. Entre os que o acompanham no trabalho, é tido como conciliador. Nas agendas públicas do governador, está sempre lá, mas pouco fala.
Há uma grande preocupação, entre aliados, em evitar que ele seja acusado de traição – algo comum num País que tem história conturbada de vices. O vice, dizem interlocutores, jamais imaginava que poderia assumir tão cedo o governo. O horizonte mais próximo, na sua avaliação, seria a eleição de 2022, caso Witzel de fato concretizasse o desejo de concorrer à Presidência.
Aliados elogiam abertura ao diálogo
A abertura ao diálogo é um elogio feito por aliados de diferentes esferas, como prefeitos do interior que precisam de interlocução com o governo e também parlamentares. Ambos os grupos reclamam da dificuldade de conversar com Witzel e classificam Castro como uma espécie de antítese dele. “Sabe conversar e aprimorar ideias, sabe o lugar que ocupa”, comenta um prefeito, referindo-se ao fato de o governador ter se perdido no cargo. “Witzel está sendo vítima de si mesmo.”
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O governador do Rio de Janeiro, Wilson Witzel, encara um dos seus maiores desafios desde que assumiu o Palácio Laranjeiras. A Assembleia Legislativa decidiu abrir um processo de impeachment contra ele.
Nessa tentativa de não parecer um traidor, há quem esteja aconselhando o vice a moderar no nível de defesa que faz do governador. Isso porque, caso os supostos crimes cometidos pelo mandatário sejam provados no futuro, Castro pode acabar sendo pintado como alguém que defendeu um condenado pela Justiça.
No curto período como vereador, o vice tinha bom trânsito entre políticos de diferentes visões ideológicas. Entre os projetos apresentados, orgulha-se do que destina 10% da arrecadação das multas de trânsito para pessoas com deficiência.
Convicto de que ele e Witzel não seriam eleitos para o governo, Castro caiu na gargalhada quando o resultado da apuração do pleito de 2018 começou a aparecer na televisão.