RIO – O vereador Carlos Bolsonaro (PL) recebeu em seu gabinete na Câmara Municipal do Rio de Janeiro um dos organizadores e financiadores do acampamento golpista instalado em frente ao Quartel-General (QG) do Exército, em Brasília, no fim de novembro de 2022, no dia 24, menos de dois meses antes dos ataques aos prédios dos Três Poderes no 8 de Janeiro.
Registros das visitas ao gabinete do filho “02″ do ex-presidente Jair Bolsonaro (PL) na Câmara, obtidos pelo Estadão, por Lei de Acesso à Informação (LAI), mostram a visita de Tacimar Hoendel, ex-secretário parlamentar do deputado Carlos Jordy (PL-RJ), pouco antes dos atos golpistas. Procurado pela reportagem, Carlos não se manifestou. Hoendel não foi localizado.
Considerado um dos nomes em ascensão do bolsonarismo no Rio de Janeiro – base eleitoral do clã Bolsonaro – Hoendel foi um dos líderes e financiadores do acampamento montado em frente ao QG do Exército em Brasília. O dia a dia do acampamento e a dinâmica de recolhimento de doações via Pix para a manutenção da estrutura na capital federal eram compartilhados nas redes sociais pelo ex-secretário parlamentar nos meses que antecederam os atos antidemocráticos. Ele acumula 348 mil seguidores no Instagram.
Antes de visitar Carlos no gabinete do Palácio Pedro Ernesto, na Cinelândia, no dia 24 de novembro de 2022, Tacimar esteve no Gabinete de Segurança Institucional (GSI), comandado pelo general Augusto Heleno, em Brasília, às 15h23 do dia 17, uma semana antes do encontro com o vereador carioca.
No dia em que a visita de Hoendel foi registrada no GSI, o ex-assessor de Jordy fez um vídeo de dentro do Palácio do Planalto. Em um dos trechos da gravação, ele mostrou a rampa de acesso ao local e disse que ia “continuar lutando”. Luiz Inácio Lula da Silva (PT) havia sido eleito presidente 18 dias antes.
“Infelizmente, não posso falar as coisas que passam na minha cabeça senão vou acabar sendo preso, mas uma coisa vocês podem ter certeza. Essa rampa aqui, bandido nenhum vai subir”, afirmou.
Tacimar Hoendel foi secretário parlamentar do deputado Carlos Jordy, aliado de Bolsonaro, de novembro de 2021 a junho de 2022. Candidato derrotado a deputado estadual pelo Rio em 2022, quando obteve 21.471 votos, Hoendel passou a ser um dos líderes e agitadores do acampamento golpista em Brasília, entre novembro e dezembro daquele ano, após a eleição de Lula.
Em uma das publicações, no dia 11 de dezembro de 2022, nas semanas que antecederam a posse de Lula e o ataques aos Três Poderes, Tacimar Hoendel disse que estava “na hora de separar os homens dos meninos” e postou uma fotografia em frente ao Congresso Nacional, segurando uma bandeira do Brasil.
Carlos Bolsonaro recebeu mais de 500 visitas no atual mandato
Carlos Bolsonaro recebeu 584 visitas entre janeiro de 2021, quando assumiu o sexto mandato como vereador do Rio, e fevereiro deste ano. Entre os nomes estão, além de Tacimar Hoendel, advogados, amigos da família, aliados e políticos, como o deputado federal Nikolas Ferreira (PL-MG), em 5 de abril de 2021 – que ainda era vereador de Belo Horizonte.
Durante o período analisado pelo Estadão, Carlos tirou três meses de licença não remunerada para se dedicar à tentativa de reeleição do pai em 2022. O pedido de licença foi publicado no Diário Oficial da Câmara do Rio no dia 2 de agosto de 2022 e se estendeu até o dia 1º de novembro, após o resultado do segundo turno das eleições presidenciais.
“Sirvo-me do presente para solicitar a Vossa Excelência, na forma regimental, licença sem vencimentos, no período de 02 de agosto a 30 de setembro de 2022. Sem mais para o momento, renovo protestos de estima e consideração”, diz a solicitação do vereador apresentada à Casa.
Entre os dias em que não esteve na Câmara Municipal, uma mulher condenada por homicídio, estelionato e ocultação de cadáver registrou presença no gabinete do “02″. Ela visitou o local no dia 26 de setembro.
Ângela Maria de Sá Mello foi condenada, em primeira instância, a uma pena que chegou a 20 anos de prisão pela morte do ex-marido, o comerciante Jorge Rodriguez Maia, desaparecido aos 61 anos, em 2004, em Cachoeiras de Macacu.
A defesa de Ângela Maria de Sá recorreu ao Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro (TJRJ), mas os desembargadores, por unanimidade, mantiveram a condenação da primeira instância, em 2011.
“Acordam os Desembargadores componentes da Quarta Câmara Criminal do Tribunal de Justiça do Estado do Rio de Janeiro, por unanimidade, em negar provimento ao agravo, nos termos do voto do desembargador relator”, diz a decisão do TJRJ.
Ela foi presa em outubro de 2011. Em 2020, atendendo a um pedido da defesa, a Justiça concedeu a progressão de pena de Ângela para o regime aberto sob a alegação de que a condenada já cumprira um sexto da pena. O TJRJ determinou ainda que ela fosse monitorada por tornozeleira eletrônica.
O inquérito da Delegacia de Homicídios concluiu que Jorge foi assassinado por insistir em cobrar uma dívida de R$ 14,5 mil de um pastor, que seria amante de Ângela Maria. O Estadão não localizou Ângela. Nos autos do processo por homicídio, a defesa trabalhou para atenuar a pena e entrou com pedidos de progressão de regime nos períodos que a lei estabelece.