Interpretação crítica e científica das instituições e do comportamento político

Opinião|Decisão do STF que suspende emendas impositivas beneficia o Executivo, mas Judiciário paga a conta


Se houve algum “sequestro”, esse foi consentido pelo Executivo; o governo Lula não é uma vítima indefesa de um Legislativo guloso

Por Carlos Pereira

Lula afirmou que “o Congresso sequestrou o orçamento federal (...) o Congresso hoje tem metade do orçamento total do governo. Não é possível, não tem país do mundo em que Congresso tenha sequestrado parte do orçamento em detrimento do Poder Executivo, que tem obrigação de governar.”

Se esquece Lula que, nos EUA, o Executivo é obrigado a executar a totalidade do orçamento como é decidido e aprovado apenas pelo Congresso. Assim como o Executivo, o Legislativo também é eleito e, portanto, desfruta de legitimidade para alocar recursos públicos de acordo com as suas preferências, mesmo que sejam contrárias às do Executivo.

Se houve algum “sequestro”, esse foi consentido pelo Executivo. O governo Lula não é uma vítima indefesa de um Legislativo guloso. O orçamento impositivo foi inicialmente consentido por Dilma nas emendas individuais. Em seguida, a impositividade das emendas coletivas também foi permitida por Bolsonaro. E, finalmente, o próprio Lula aquiesceu e deu continuidade ao orçamento secreto e às emendas Pix.

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Decisão do STF que barrou emendas impositivas até a formulação de regras de transparência beneficiou o Poder Executivo Foto: Wilton Junior/Estadão

Na política de coalizão, o mais grave das emendas impositivas não é a falta de transparência, mas a perda dessa moeda-de-troca na formação e na manutenção de maiorias legislativas estáveis e disciplinadas. Lula preferiu, desde o início de seu terceiro mandato, não enfrentar o Legislativo. Se esquivou de defender o retorno da discricionariedade do executivo na execução das emendas que reequilibraria as relações entre o Executivo e o Legislativo.

A decisão liminar do ministro Flávio Dino de suspender a execução das emendas sem transparência e sem rastreabilidade, referendada por unanimidade pelo plenário do STF, abre uma janela de oportunidade para que o Executivo recupere essa importante ferramenta de montagem e gestão de sua coalizão. Mas, ao invés de “mandar a conta” para o Judiciário, Lula poderia ter sinalizado uma posição contrária à perda desse mecanismo.

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A vantagem dessa estratégia é que o alvo de potenciais retaliações do Legislativo provavelmente não será o Executivo, mas o Judiciário. Como analisado em coluna do dia 04/08/2024, a única hipótese em que as ameaças do Legislativo de retaliar institucionalmente o Judiciário poderiam ser críveis é se o Judiciário contrariasse as preferências do Congresso em relação às emendas dos parlamentares.

Não é coincidência que o deputado Arthur Lira tenha destravado para análise da CCJ duas PECs: uma que limita os poderes do STF em relação a decisões monocráticas dos seus ministros e outra que permite que o legislativo suste decisões da Suprema Corte pelo voto de dois terços da Câmara e do Senado.

Lula afirmou que “o Congresso sequestrou o orçamento federal (...) o Congresso hoje tem metade do orçamento total do governo. Não é possível, não tem país do mundo em que Congresso tenha sequestrado parte do orçamento em detrimento do Poder Executivo, que tem obrigação de governar.”

Se esquece Lula que, nos EUA, o Executivo é obrigado a executar a totalidade do orçamento como é decidido e aprovado apenas pelo Congresso. Assim como o Executivo, o Legislativo também é eleito e, portanto, desfruta de legitimidade para alocar recursos públicos de acordo com as suas preferências, mesmo que sejam contrárias às do Executivo.

Se houve algum “sequestro”, esse foi consentido pelo Executivo. O governo Lula não é uma vítima indefesa de um Legislativo guloso. O orçamento impositivo foi inicialmente consentido por Dilma nas emendas individuais. Em seguida, a impositividade das emendas coletivas também foi permitida por Bolsonaro. E, finalmente, o próprio Lula aquiesceu e deu continuidade ao orçamento secreto e às emendas Pix.

Decisão do STF que barrou emendas impositivas até a formulação de regras de transparência beneficiou o Poder Executivo Foto: Wilton Junior/Estadão

Na política de coalizão, o mais grave das emendas impositivas não é a falta de transparência, mas a perda dessa moeda-de-troca na formação e na manutenção de maiorias legislativas estáveis e disciplinadas. Lula preferiu, desde o início de seu terceiro mandato, não enfrentar o Legislativo. Se esquivou de defender o retorno da discricionariedade do executivo na execução das emendas que reequilibraria as relações entre o Executivo e o Legislativo.

A decisão liminar do ministro Flávio Dino de suspender a execução das emendas sem transparência e sem rastreabilidade, referendada por unanimidade pelo plenário do STF, abre uma janela de oportunidade para que o Executivo recupere essa importante ferramenta de montagem e gestão de sua coalizão. Mas, ao invés de “mandar a conta” para o Judiciário, Lula poderia ter sinalizado uma posição contrária à perda desse mecanismo.

A vantagem dessa estratégia é que o alvo de potenciais retaliações do Legislativo provavelmente não será o Executivo, mas o Judiciário. Como analisado em coluna do dia 04/08/2024, a única hipótese em que as ameaças do Legislativo de retaliar institucionalmente o Judiciário poderiam ser críveis é se o Judiciário contrariasse as preferências do Congresso em relação às emendas dos parlamentares.

Não é coincidência que o deputado Arthur Lira tenha destravado para análise da CCJ duas PECs: uma que limita os poderes do STF em relação a decisões monocráticas dos seus ministros e outra que permite que o legislativo suste decisões da Suprema Corte pelo voto de dois terços da Câmara e do Senado.

Lula afirmou que “o Congresso sequestrou o orçamento federal (...) o Congresso hoje tem metade do orçamento total do governo. Não é possível, não tem país do mundo em que Congresso tenha sequestrado parte do orçamento em detrimento do Poder Executivo, que tem obrigação de governar.”

Se esquece Lula que, nos EUA, o Executivo é obrigado a executar a totalidade do orçamento como é decidido e aprovado apenas pelo Congresso. Assim como o Executivo, o Legislativo também é eleito e, portanto, desfruta de legitimidade para alocar recursos públicos de acordo com as suas preferências, mesmo que sejam contrárias às do Executivo.

Se houve algum “sequestro”, esse foi consentido pelo Executivo. O governo Lula não é uma vítima indefesa de um Legislativo guloso. O orçamento impositivo foi inicialmente consentido por Dilma nas emendas individuais. Em seguida, a impositividade das emendas coletivas também foi permitida por Bolsonaro. E, finalmente, o próprio Lula aquiesceu e deu continuidade ao orçamento secreto e às emendas Pix.

Decisão do STF que barrou emendas impositivas até a formulação de regras de transparência beneficiou o Poder Executivo Foto: Wilton Junior/Estadão

Na política de coalizão, o mais grave das emendas impositivas não é a falta de transparência, mas a perda dessa moeda-de-troca na formação e na manutenção de maiorias legislativas estáveis e disciplinadas. Lula preferiu, desde o início de seu terceiro mandato, não enfrentar o Legislativo. Se esquivou de defender o retorno da discricionariedade do executivo na execução das emendas que reequilibraria as relações entre o Executivo e o Legislativo.

A decisão liminar do ministro Flávio Dino de suspender a execução das emendas sem transparência e sem rastreabilidade, referendada por unanimidade pelo plenário do STF, abre uma janela de oportunidade para que o Executivo recupere essa importante ferramenta de montagem e gestão de sua coalizão. Mas, ao invés de “mandar a conta” para o Judiciário, Lula poderia ter sinalizado uma posição contrária à perda desse mecanismo.

A vantagem dessa estratégia é que o alvo de potenciais retaliações do Legislativo provavelmente não será o Executivo, mas o Judiciário. Como analisado em coluna do dia 04/08/2024, a única hipótese em que as ameaças do Legislativo de retaliar institucionalmente o Judiciário poderiam ser críveis é se o Judiciário contrariasse as preferências do Congresso em relação às emendas dos parlamentares.

Não é coincidência que o deputado Arthur Lira tenha destravado para análise da CCJ duas PECs: uma que limita os poderes do STF em relação a decisões monocráticas dos seus ministros e outra que permite que o legislativo suste decisões da Suprema Corte pelo voto de dois terços da Câmara e do Senado.

Opinião por Carlos Pereira

Cientista político e professor titular da Escola Brasileira de Administração Pública e de Empresas (FGV EBAPE) e sênior fellow do CEBRI.

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