Interpretação crítica e científica das instituições e do comportamento político

Opinião|Treino é treino, jogo é jogo?


Composição do gabinete de transição de Lula indica que o jogo da coalizão já começou reproduzindo erros do passado

Por Carlos Pereira
Atualização:

É atribuída a Didi, o “Folha Seca”, jogador da seleção brasileira de futebol bicampeã dos mundiais de 1958 e de 1962, a célebre frase: “treino é treino, jogo é jogo”. Essa foi a resposta dada por ele para lidar com as pressões da imprensa para a escalação em seu lugar do meia do Flamengo, “Moacir Canivete”, que arrebentava nos treinos enquanto Didi supostamente nada fazia.

Lula acaba de finalizar a montagem do seu time de transição. Dos mais de 300 “convocados”, 172 possuem filiação partidária. O PT emplacou a grande maioria do time, com 100 escalados, quase 60%. Entretanto, a bancada do PT ocupa apenas 23,53% da soma de cadeiras de todos os partidos que tiveram pelo menos um convocado para o time de transição.

Mesmo extremamente desproporcional em favor do PT, a distribuição das posições no governo de transição obedeceu a uma lógica de premiação dos partidos que estavam com Lula desde o primeiro turno. Os partidos que só apoiaram Lula no segundo turno ou que apoiaram Bolsonaro foram menos contemplados. Números positivos indicam que o partido foi sobre recompensado (PT, PSB e Rede, por exemplo) e números negativos que o partido foi sub recompensado (PSD e MDB, por exemplo).

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Equipe de transição é formada majoritariamente por quadros do PT.  Foto: Wilton Junior/Estadão

Esse resultado é consistente com os achados de Royce Carroll e Gary Cox no artigo “The Logic of Gamson’s Law: Pre-Election Coalitions and Portfolio Allocations”. Os autores mostram que partidos que mais investem energia e recursos ainda na campanha de um candidato que eventualmente venha a ser o vencedor, tendem a alcançar maiores bônus em um potencial governo de coalizão.

Mas se observarmos o grande número de partidos, a imensa diversidade ideológica entre eles e a enorme desproporcionalidade na alocação de cargos, mesmo entre os parceiros de primeira hora, no time de transição em relação ao peso político de cada parceiro no legislativo, percebe-se que Lula comete equívocos de montagem do gabinete de transição ainda maiores do que os cometidos nos seus governos de coalizão anteriores.

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Durante os governos Lula1 e Lula2, a média do número de partidos na coalizão foi de 8 e 9, respectivamente. Já no time de transição, Lula escalou nada menos do que 17 partidos. Assim como no passado, os parceiros do governo de transição são também ideologicamente muito diversos e a alocação de cargos é monopolizada pelo PT. Essas escolhas devem gerar crescentes animosidades, problemas de coordenação, maiores custos de gerência da coalizão e menor sucesso legislativo.

Muitos podem se valer da máxima do craque Didi e argumentar que o gabinete de transição é apenas treino, mas ainda não o jogo de fato da coalizão. Mas o histórico de fracassos de Lula na gerência de coalizões de seus governos anteriores nos leva a crer que não se trata de simples treino, mas de decisões preliminares do jogo que já se iniciou.

É atribuída a Didi, o “Folha Seca”, jogador da seleção brasileira de futebol bicampeã dos mundiais de 1958 e de 1962, a célebre frase: “treino é treino, jogo é jogo”. Essa foi a resposta dada por ele para lidar com as pressões da imprensa para a escalação em seu lugar do meia do Flamengo, “Moacir Canivete”, que arrebentava nos treinos enquanto Didi supostamente nada fazia.

Lula acaba de finalizar a montagem do seu time de transição. Dos mais de 300 “convocados”, 172 possuem filiação partidária. O PT emplacou a grande maioria do time, com 100 escalados, quase 60%. Entretanto, a bancada do PT ocupa apenas 23,53% da soma de cadeiras de todos os partidos que tiveram pelo menos um convocado para o time de transição.

Mesmo extremamente desproporcional em favor do PT, a distribuição das posições no governo de transição obedeceu a uma lógica de premiação dos partidos que estavam com Lula desde o primeiro turno. Os partidos que só apoiaram Lula no segundo turno ou que apoiaram Bolsonaro foram menos contemplados. Números positivos indicam que o partido foi sobre recompensado (PT, PSB e Rede, por exemplo) e números negativos que o partido foi sub recompensado (PSD e MDB, por exemplo).

Equipe de transição é formada majoritariamente por quadros do PT.  Foto: Wilton Junior/Estadão

Esse resultado é consistente com os achados de Royce Carroll e Gary Cox no artigo “The Logic of Gamson’s Law: Pre-Election Coalitions and Portfolio Allocations”. Os autores mostram que partidos que mais investem energia e recursos ainda na campanha de um candidato que eventualmente venha a ser o vencedor, tendem a alcançar maiores bônus em um potencial governo de coalizão.

Mas se observarmos o grande número de partidos, a imensa diversidade ideológica entre eles e a enorme desproporcionalidade na alocação de cargos, mesmo entre os parceiros de primeira hora, no time de transição em relação ao peso político de cada parceiro no legislativo, percebe-se que Lula comete equívocos de montagem do gabinete de transição ainda maiores do que os cometidos nos seus governos de coalizão anteriores.

Durante os governos Lula1 e Lula2, a média do número de partidos na coalizão foi de 8 e 9, respectivamente. Já no time de transição, Lula escalou nada menos do que 17 partidos. Assim como no passado, os parceiros do governo de transição são também ideologicamente muito diversos e a alocação de cargos é monopolizada pelo PT. Essas escolhas devem gerar crescentes animosidades, problemas de coordenação, maiores custos de gerência da coalizão e menor sucesso legislativo.

Muitos podem se valer da máxima do craque Didi e argumentar que o gabinete de transição é apenas treino, mas ainda não o jogo de fato da coalizão. Mas o histórico de fracassos de Lula na gerência de coalizões de seus governos anteriores nos leva a crer que não se trata de simples treino, mas de decisões preliminares do jogo que já se iniciou.

É atribuída a Didi, o “Folha Seca”, jogador da seleção brasileira de futebol bicampeã dos mundiais de 1958 e de 1962, a célebre frase: “treino é treino, jogo é jogo”. Essa foi a resposta dada por ele para lidar com as pressões da imprensa para a escalação em seu lugar do meia do Flamengo, “Moacir Canivete”, que arrebentava nos treinos enquanto Didi supostamente nada fazia.

Lula acaba de finalizar a montagem do seu time de transição. Dos mais de 300 “convocados”, 172 possuem filiação partidária. O PT emplacou a grande maioria do time, com 100 escalados, quase 60%. Entretanto, a bancada do PT ocupa apenas 23,53% da soma de cadeiras de todos os partidos que tiveram pelo menos um convocado para o time de transição.

Mesmo extremamente desproporcional em favor do PT, a distribuição das posições no governo de transição obedeceu a uma lógica de premiação dos partidos que estavam com Lula desde o primeiro turno. Os partidos que só apoiaram Lula no segundo turno ou que apoiaram Bolsonaro foram menos contemplados. Números positivos indicam que o partido foi sobre recompensado (PT, PSB e Rede, por exemplo) e números negativos que o partido foi sub recompensado (PSD e MDB, por exemplo).

Equipe de transição é formada majoritariamente por quadros do PT.  Foto: Wilton Junior/Estadão

Esse resultado é consistente com os achados de Royce Carroll e Gary Cox no artigo “The Logic of Gamson’s Law: Pre-Election Coalitions and Portfolio Allocations”. Os autores mostram que partidos que mais investem energia e recursos ainda na campanha de um candidato que eventualmente venha a ser o vencedor, tendem a alcançar maiores bônus em um potencial governo de coalizão.

Mas se observarmos o grande número de partidos, a imensa diversidade ideológica entre eles e a enorme desproporcionalidade na alocação de cargos, mesmo entre os parceiros de primeira hora, no time de transição em relação ao peso político de cada parceiro no legislativo, percebe-se que Lula comete equívocos de montagem do gabinete de transição ainda maiores do que os cometidos nos seus governos de coalizão anteriores.

Durante os governos Lula1 e Lula2, a média do número de partidos na coalizão foi de 8 e 9, respectivamente. Já no time de transição, Lula escalou nada menos do que 17 partidos. Assim como no passado, os parceiros do governo de transição são também ideologicamente muito diversos e a alocação de cargos é monopolizada pelo PT. Essas escolhas devem gerar crescentes animosidades, problemas de coordenação, maiores custos de gerência da coalizão e menor sucesso legislativo.

Muitos podem se valer da máxima do craque Didi e argumentar que o gabinete de transição é apenas treino, mas ainda não o jogo de fato da coalizão. Mas o histórico de fracassos de Lula na gerência de coalizões de seus governos anteriores nos leva a crer que não se trata de simples treino, mas de decisões preliminares do jogo que já se iniciou.

Opinião por Carlos Pereira

Cientista político e professor titular da Escola Brasileira de Administração Pública e de Empresas (FGV EBAPE) e sênior fellow do CEBRI.

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