O avanço do Centrão foi além das cadeiras da Câmara e do Senado. O bloco informal de partidos de centro-direita, que hoje dá sustentação ao governo de Jair Bolsonaro (PL), vai controlar, a partir do próximo ano, mais da metade de todas as cadeiras nas Assembleias Legislativas e da Câmara do Distrito Federal. Na comparação com a disputa de 2018, o primeiro turno das eleições deste ano registrou um aumento de 41% da bancada de deputados estaduais e distritais eleitos pelas legendas que dão as cartas na política nacional.
Dos 1.059 deputados das 26 Assembleias Legislativas e da Câmara do DF, 537 foram eleitos por legendas do Centrão. Levantamento do Estadão mostra que as siglas do bloco que mais cresceram foram as que formam o chamado “núcleo duro” em Brasília: o PL, do presidente Jair Bolsonaro, o PP, comandado pelo ministro da Casa Civil, Ciro Nogueira; e o Republicanos, ligado à Igreja Universal do Reino de Deus, do bispo Edir Macedo.
Impulsionado pelas verbas do orçamento secreto e tendo Bolsonaro como cabo eleitoral, o bloco foi bem até mesmo em Estados onde a esquerda predominou no primeiro turno da disputa presidencial – PL e PP fizeram os deputados estaduais mais votados no Ceará e em Pernambuco, por exemplo. Além dos três partidos, o levantamento do Estadão também considerou como “Centrão” o União Brasil, o PSD, o PSC, o PROS, o PTB, o Patriota e o Avante.
As maiores reduções de bancadas ocorreram no PSDB, Cidadania e Novo. Essas legendas de centro-direita contam hoje com um total de 107 deputados e vão ficar com 76 na próxima legislatura, uma queda de quase 30%. O PSDB teve redução expressiva, de 73 eleitos em 2018 para 55 este ano (24% a menos). A esquerda ficou praticamente igual, passando de 280 eleitos em 2018 para 281 este ano. Mas o PT, maior partido desse campo, e o PSOL cresceram em número de estaduais eleitos (38% e 29%, respectivamente). Por sua vez, PSB, PDT, PV e PCdoB perderam cadeiras nos Legislativos estaduais.
‘Lado’
Em Pernambuco, um reduto do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT), o deputado estadual mais votado no último dia 2 é do Centrão. O pastor evangélico e vereador do Recife Júnior Tércio, de 36 anos, do PP, obteve 183,7 mil votos na sua primeira eleição para a Assembleia. Há 12 anos, ele atua na recuperação de dependentes químicos no Estado, sua maior marca.
Tércio se apresenta como um político conservador e de direita e apoia Bolsonaro. Ele teve como puxadora de votos a mulher, a deputada estadual Clarissa Tércio, eleita agora para a Câmara dos Deputados com 240 mil sufrágios.
Apesar de a maioria dos pernambucanos ter votado em Lula no primeiro turno da disputa, o deputado eleito avalia que há muitos conservadores no Estado. “Grande parte do povo pernambucano se identifica com as pautas conservadoras, com a preservação, o fortalecimento da família e seus valores. Eu defendo tudo isso”, disse ele ao Estadão. “Outro fator que também influenciou muito é o fato de eu ter posicionamento, ter um lado. Porque, na política, você precisa ter um lado. Eu represento a direita em Pernambuco.”
Nos Estados e no Distrito Federal, o Centrão costuma ser conservador em temas da chamada “pauta de costumes”. Nestas eleições, a capital federal elegeu para o Senado a ex-ministra da Mulher, da Família e dos Direitos Humanos Damares Alves (Republicanos).
Mas, ao menos para a Câmara Distrital, a onda conservadora que derrotou o antigo clã Arruda para o Senado elegeu apenas três deputados de pautas religiosas e de costumes. A maior bancada costuma ser a de sempre em Brasília: a dos servidores públicos, que terá oito cadeiras na Câmara Distrital, sendo quatro de partidos do Centrão. O bloco se mostrou diversificado em Brasília. Um deputado eleito pelo PL, por exemplo, defendeu motoristas de aplicativos e outro, pessoas com deficiência física.
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Base
Em uma eleição marcada pela continuidade e não pela renovação, o perfil médio do deputado eleito para a Assembleia Legislativa de São Paulo é semelhante ao de Edmir Chedid (União Brasil). Ele garantiu este ano mais um mandato em sequência – está na Casa desde 1995. Defende pautas de economia e infraestrutura e procura direcionar verbas para seu reduto: região Bragantina e Circuito das Águas. Integrante da base do governador Rodrigo Garcia (PSDB), ele manteria a posição num possível governo Tarcísio de Freitas (Republicanos). Se o resultado for favorável a Fernando Haddad (PT), porém, Chedid evitaria se colocar prontamente na oposição. “Iria analisar cada um dos projetos que vêm à Alesp, como faço atualmente.”
Assim como acontece em Brasília, o Centrão nos Estados costuma ter como marca o apoio ao chefe do Executivo – independentemente da cor ideológica do governante de turno. Em Goiás, Bruno Peixoto (União Brasil) conseguiu um quarto mandato na Assembleia Legislativa. A função de líder do governo Ronaldo Caiado (União Brasil) garantiu que obtivesse o maior número de votos da história da Casa, 73.692. Nas vitórias anteriores, ele estava na oposição. O recorde nas urnas era do tucano Mané de Oliveira, eleito em 2014 com 62.655 votos.
Na Bahia, o PP pode voltar a apoiar o PT, caso o candidato do partido, Jerônimo Rodrigues, saia vencedor contra ACM Neto (União Brasil) no segundo turno. Na semana passada, o ex-governador baiano Rui Costa (PT) admitiu estar negociando com o PP, que é aliado ao governo Bolsonaro no âmbito federal.
Dobradinha
O cientista político Danilo Medeiros observou que há poucas pesquisas sobre quais fatores afetam a eleição dos deputados estaduais, mas a literatura existente sugere que a velha dobradinha entre candidatos a deputado estadual e federal ainda tem um peso grande.
Pesquisador do Centro Brasileiro de Análise e Planejamento (Cebrap), ele afirmou que pesquisas tentam fazer uma inferência no nível da urna. Estudos mostram que “santinhos” conjuntos de um estadual e um federal têm mais impacto, porque na urna em que um determinado federal é bem votado, o estadual ligado a ele costuma ter boa votação.