O Centrão e a base do presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) tentam empurrar a votação do projeto que equipara aborto a homicídio para depois das eleições municipais. A urgência do texto, que dispensa a tramitação nas comissões, foi aprovada na Câmara de maneira simbólica. A estratégia livrou os parlamentares de deixarem suas “digitais” no apoio à ofensiva da bancada evangélica. O mérito da proposta, porém, deve ir a votação nominal, e tem o potencial de prejudicar os parlamentares às vésperas das eleições.
Para esses deputados, com trânsito entre conservadores e progressistas, a votação traz um impasse. Quem votar contra pode ficar inviabilizado entre religiosos e eleitores de direita, em sua maioria favoráveis à pauta. Por outro lado, um voto favorável abre espaço para críticas de outros setores, já que o projeto torna a pena imposta a quem faz aborto em caso de estupro superior à aplicada aos estupradores.
Nos bastidores, líderes ressaltam que o compromisso do presidente da Casa, Arthur Lira (PP-AL), com a bancada evangélica previa apenas a votação do regime de urgência do projeto do aborto. Os conservadores, porém, não abrem mão de aprovar o texto já na próxima semana.
A ofensiva para votar o projeto, revelada pela Coluna do Estadão, aconteceu em reação a uma decisão do Supremo Tribunal Federal (STF), que suspendeu resolução que proibia a assistolia fetal. Trata-se de procedimento médico utilizado em casos de aborto autorizados pela lei, como em gestações decorrentes de estupro.
Oficialmente, o Palácio do Planalto não se envolveu diretamente nas negociações. A articulação política do governo quer distância da pauta de costumes após a derrota na lei das saidinhas, que teve um veto presidencial derrubado pelo Congresso.
Também não há acordo sobre a relatoria da proposta. A bancada evangélica quer a bolsonarista Chris Tonietto (PL-RJ), enquanto partidos ligados ao governo Lula querem um nome moderado, para abrandar o projeto apresentado pelo deputado Sóstenes Cavalvante (PL).