O relatório da CPMI do 8 de janeiro, apresentado pela senadora Eliziane Gama (PSD-AM) aponta o ex-presidente Jair Bolsonaro (PL) como “o verdadeiro autor, seja intelectual, seja moral, dos ataques perpetrados contra as instituições”, naquela data. Ela sugere seu indiciamento por prática dolosa - ou seja, intencional - nos seguintes crimes: associação criminosa, violência política, abolição violenta do Estado Democrático de Direito e golpe de Estado. Juntas, as penas somam 29 anos.
O parecer afirma que Bolsonaro “instrumentalizou não somente órgãos, instituições e agentes públicos, mas também explorou a vulnerabilidade e a esperança de milhares de pessoas”. Diz, ainda, que o ex-presidente se utilizou como pôde do aparato estatal para atingir seu objetivo maior: “cupinizar as instituições republicanas brasileiras até a sua total podridão, de modo a ascender ao poder, pretensamente perene, de modo autoritário”.
“O então presidente foi o responsável direto, o mentor moral, por grande parte – senão todos – dos ataques perpetrados a todas as figuras republicanas que impusessem qualquer tipo de empecilho à sua empreitada golpista”, conclui a relatora.
Participantes do 8 de janeiro não eram ‘ratos solitários’
O relatório da CPMI diz que também não se pode considerar que os participantes do dia 8 de janeiro, criminosos que invadiram a sede dos Três Poderes da República, com claro intuito de golpear o Estado Democrático de Direito, agiram sem vínculo subjetivo.
“Não eram meramente ratos solitários (”lone rats”). Muitas dessas pessoas foram manipuladas por indivíduos que as instrumentalizaram para seus fins criminosos, contrários à convivência pacífica que deve permear as relações sociais e políticas, no Brasil e no mundo”.
No texto, Eliziane diz que “é de conhecimento notório que Jair Messias Bolsonaro nunca nutriu simpatia por princípios republicanos e democráticos”, ressalta que ele alimentou o ódio na população e agiu para descredibilizar o processo eleitoral ao longo de sua gestão. “Como toda investigação complexa, não se pode analisar um indício ou um elemento probatório de forma isolada, desconexa do todo. O objeto desta CPMI, em especial, exige compreensão ampla de todos os elos de uma corrente que foi forjada ao longo de vários anos”.
Considera, ainda, que a construção golpista não se apoiou em apenas um pilar, mas foi resultado de diversos elementos construtivos. “A arquitetura extremista foi projetada com o auxílio de diversos agentes, todos eles subjetivamente unidos para o fim de corroer as instituições republicanas, tão caras à democracia brasileira”.
8 de Janeiro não é um ato isolado, diz relatora
A relatora afirma que não se pode analisar o dia 8 de janeiro como um ato isolado, desvinculado de quaisquer acontecimentos pretéritos. Ela correlaciona, por exemplo, os casos dos dias 12 de dezembro, quando houve um ataque à sede da Polícia Federal em Brasília; e também o dia 24 de dezembro, quando foi colocada uma bomba num caminhão nas proximidades do Aeroporto Internacional de Brasília.
O documento tem 1.333 páginas. A apresentação na Comissão ocorre na manhã desta terça-feira, mas o parecer só deve ser votado nesta quarta. Para ser aprovado, o relatório precisará dos votos da maioria dos membros da CPI mista de deputados e senadores.
Eliziane usa teoria do domínio do fato para pedir indiciamento
O texto diz que não basta ter em mente o conceito de autor do crime adotado pelo Código Penal brasileiro, que o considera como o agente que pratica o núcleo do tipo penal, enquanto os demais indivíduos que concorrem para o crime são considerados partícipes, na linha da teoria objetivo-formal.
“Modernamente, têm sido admitidos outros conceitos de autor, como a teoria do domínio do fato, ou mesmo a denominada “autoria de escritório”. “O interesse da teoria do domínio do fato vem de que abrange diversos tipos de autores: o propriamente dito – aquele que realiza a ação típica; o autor intelectual, ou de escritório, que planeja mentalmente a empreitada criminosa; o autor mediato, que utiliza pessoa sem culpabilidade ou sem dolo e culpa para cometer o delito (ou pessoa fungível, facilmente substituível); e os coautores – quando o núcleo do tipo é realizado por duas ou mais pessoas”.