O relatório da Comissão Parlamentar Mista de Inquérito (CPMI) do 8 de Janeiro apresentou em 1.333 páginas os responsáveis pela invasão golpista aos prédios dos Três Poderes no início deste ano. A relatora Eliziane Gama (PSD-MA) foi categórica ao apontar o ex-presidente Jair Bolsonaro (PL) como “mentor intelectual e moral da tentativa de golpe”. Além de indiciá-lo, a senadora usou o relatório final para imputar ao ex-presidente e seus aliados responsabilidade por crimes sem relação direta com os atos golpistas, como o desvio de joias da Presidência e a fraude em cartões de vacinação.
Eliziane escreveu no relatório que Bolsonaro agiu em conluio com de Mauro César Barbosa Cid, Mauro Cesar Lourena Cid, Frederick Wassef, Osmar Crivelatti, Marcelo Costa Câmara e Marcelo da Silva Vieira “para apropriação de bens de alto valor recebidos em razão da função, por agentes públicos em viagens internacionais a serviço da República Federativa do Brasil”. O caso das joias, revelado pelo Estadão, acabou sendo alvo da CPMI por causa da quebra de sigilo do ex-ajudante de ordens da Presidência Mauro Cid.
A relatora, porém, destacou que “maiores investigações ainda são necessárias” para identificar a responsabilidade de cada um nos delitos. “Conquanto a CPMI tenha logrado apurar diversos indícios de autoria e materialidade sobre o esquema criminoso, é certo que não foi o foco primordial da comissão a referida apuração”, ressalvou Eliziane.
Relatório aborda fraudes nos cartões de vacinação
A senadora fez a mesma ressalva ao caso das fraudes nos cartões de vacinação, que levou Mauro Cid à prisão por acessar ilegalmente o sistema do Ministério da Saúde para registrar que Bolsonaro e sua família tomaram a vacina contra a covid. Além do ex-presidente e do ex-ajudante de ordens, a relatora apontou o envolvimento de outras quinze pessoas nessa prática, que já é alvo de investigação da Polícia Federal (PF).
De acordo com Eliziane, os envolvidos nesse esquema devem continuar a ser investigados “por atuarem em associação criminosa com o fim de praticar condutas que almejavam (...) obtenção de vantagem ilícita - possibilitar a saída de beneficiários da fraude do território nacional com a falsa informação de terem sido vacinados contra o coronavírus”.
Nesses dois casos, a relatora ponderou que, apesar de a CPMI ter encontrado novos elementos sobre a autoria desses casos, “é certo que não foi o foco primordial da comissão a referida apuração”. A parlamentar recomendou, portanto, que os órgãos competentes, a exemplo da Procuradoria-Geral da República, continuem a apurar esses esquemas.
Exército foi omisso em desmobilizar acampamentos, diz relatório
Quanto aos acampamentos golpistas, o relatório aponta os atentados de 8 de janeiro como o “resultado da omissão do Exército em desmobilizar” as pessoas reunidas em frente aos quartéis generais. O documento ainda cita que o acampamento de Brasília “serviu de base para a prática de uma tentativa de terrorismo” no aeroporto da capital federal nas vésperas do final do ano.
“A leniência de alguns dos principais generais dentro do Exército com a permanência dos acampamentos em área militar foi essencial para a tentativa de golpe de Estado perpetrada no dia 8 de janeiro, pois interpretada pelos vândalos golpistas como incentivo ao ato”, escreveu a relatora.
Por envolvimento nesse e em outros crimes ligados à organização do 8 de janeiro, a relatora indiciou o ex-ministro da Defesa Paulo Sério Nogueira, o almirante Garnier Santos, o ex-ministro Walter Braga Netto, o ex-ministro Augusto Heleno e o ex-comandante do Exército Marco Freire Gomes. Na mesma linha, o ex-ministro da Justiça Anderson Torres também foi indiciado tentativa de golpe de Estado por causa da minuta golpista encontrada em sua residência. O documento propunha a decretação de Estado de Defesa para que Bolsonaro pudesse intervir no Tribunal Superior Eleitoral (TSE) e convocar novas eleições.