Roseann Kennedy traz os bastidores da política e da economia. Com Eduardo Barretto e Iander Porcella

Lula nunca ligou para apoiador que quase levou tiro de Zambelli; ataque completa um ano


Em entrevista exclusiva à Coluna, Luan Araújo disse que o episódio o transformou. Ele foi perseguido pelas ruas dos Jardins após bater boca com a deputada bolsonarista. Em nota, Carla Zambelli diz que se viu ‘obrigada’ a sacar a arma e que o ‘disparo acidental’ não foi da sua arma

Por Roseann Kennedy
Atualização:

Um ano depois de virar protagonista de um episódio que na avaliação do ex-presidente Jair Bolsonaro (PL) definiu o resultado da eleição presidencial de 2022, o jornalista Luan Araújo avalia que o momento foi provocado pelo afloramento do debate político no País e diz que mudou sua forma de pensar e seu comportamento.

Numa eleição em que muitas famílias e amizades romperam, Luan se viu diante de uma deputada armada correndo atrás dele pelas ruas de São Paulo. Era Carla Zambelli (PL), uma das principais apoiadoras de Bolsonaro, até então. E, de repente, ele ouviu um tiro. “O som do tiro foi o mais assustador. Eu pensei mesmo que minha vida ia acabar ali”.

Zambelli perseguiu Luan Araujo na véspera da eleição de 2022 Foto: Reprodução (frame do vídeo de Zambelli)/Roseann Kennedy (foto de Luan Araújo)
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A cena, que ocorreu no dia 29 de outubro, véspera do segundo turno, foi filmada e correu o mundo. “Se não houvesse as imagens, possivelmente eu estaria preso ou morto”, diz considerando que muitos não acreditariam na sua versão.

Ao longo de todo o ano, Luan evitou conceder entrevistas, mas aceitou conversar com a Coluna do Estadão. O jornalista garante que hoje não agiria da mesma forma e relevaria as provocações. Se encontrasse Carla Zambelli, não tem dúvidas: “Não falaria nada, passaria reto. Não vale a pena”. Luan diz que nunca recebeu um telefonema de Lula ou do PT depois do episódio. Considera que o petista está fazendo um governo para defender sua biografia.

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Quem é o Luan?

Sou um jornalista. Hoje com 33 anos. Moro na periferia de São Paulo, na Zona Leste, Cidade Tiradentes. Moro até hoje com a minha mãe, sou só eu e ela basicamente. O meu pai faleceu de câncer quando eu tinha 11 anos. Eu sempre gostei de pesquisar, de ler, de apurar, essas coisas todas. Sou fã de futebol, sou torcedor do Corinthians. Um negro periférico, filho de uma mãe que me criou sozinha.

Quando você lembra daquele dia, qual é a primeira imagem que vem à cabeça?

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Primeiro o som, o som da arma. O som do tiro. Eu acho que aquilo me assustou mais do que tudo. O som do tiro vindo do policial, possivelmente. E também a sensação dentro da lanchonete: do povo, do pessoal dela (da deputada Carla Zambelli) – não sei do que eu posso chamar, de capanga, de segurança, não sei do que eu posso chamar — me pressionando e apontando a arma. Apontando a arma para cima de mim. Foi assustador. Eu pensei mesmo que tudo ia acabar ali, tipo, minha vida ia acabar ali.

A sensação era de estar vendo a morte de frente?

Sim, sim, talvez fosse só para intimidar. Não sei qual a intenção deles, mas pra mim, na hora, eu pensava só isso: eu vou morrer e já era.

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Logo após o episódio qual foi a sensação?

Quando a gente saiu daquele lugar peguei o celular. Já fui vendo pessoas olhando e aí foi batendo um susto. Aí foi aumentando o susto, a angústia, porque eu vi que tinha acontecido uma coisa na véspera da eleição. Foi aí que eu percebi: ‘nossa, amanhã tem eleição!’. Então foi um negócio muito assustador, foi um turbilhão muito grande.

O núcleo de Bolsonaro e o próprio ex-presidente credita ao episódio a vitória de Lula...

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Eu ainda não tenho essa noção de que o fato que aconteceu comigo me faz ter entrado num ponto da história mais recente do País. Quando eu vi no Twitter, eu falei: “Ah, vai passar isso nos 15 minutos subsequentes. Amanhã tem eleição, vai ter outra polêmica”. Mas não. Foi uma coisa muito grave o que aconteceu. É algo que realmente mudou a minha vida. Não para melhor, não para pior, mas mudou a minha vida de certa forma, o meu jeito de pensar e tudo mais.

Qual foi a principal mudança?

Eu acho que valorizar mais as pessoas que realmente estão comigo. As pessoas que estiveram comigo naquele momento. Eu sei que também posso ter errado em algum momento ali, na forma como eu falei com ela (Carla Zambelli), alguma coisa do tipo.

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Eu falo muito que a gente – não só pelo governo de Bolsonaro – nesses últimos quatro anos passou por um momento muito difícil. Na pandemia e tudo mais. A gente praticamente não viveu nos últimos três anos. Então, naquele momento, eu não estava, acho que ninguém está ainda, decididamente bem. Era um momento de muita emoção aflorada. Eu falo muito que era um balde que foi enchendo e acabou, para mim, infelizmente, transbordando naquele dia. Depois disso, eu consegui ponderar mais as coisas. Tratar a vida com mais seriedade também, porque eu senti que podia perder a minha naquele dia.

O que você não levava tão a sério e passou a levar?

Eu comecei a focar mais no trabalho, a focar mais em relações que me fazem bem. … A minha mãe sempre me protegeu bastante, então aprendi também que eu tenho que cuidar mais de mim. Para me proteger mais. Cuidar do meu bem-estar, das minhas coisas.

O que você acha que teria acontecido se não houvesse aquelas gravações de pessoas da rua?

Possivelmente eu estaria preso ou morto. A internet, o local, a sorte, entre aspas, de ter acontecido isso num lugar que tinha muita gente. Porque se fosse, por exemplo, no meu bairro à noite, aí era outra história. Ou em outro lugar à noite mesmo, mas eu acho que possivelmente eu não estaria aqui, de uma forma ou outra.

O fato de ter ocorrido num bairro nobre, inclusive, foi um dos pontos de muitas narrativas na internet (entre elas a de que teria sido tudo programado) …

Sempre surge isso. Eu estava num chá de bebê de um amigo numa hamburgueria. E foi até engraçado porque nesse dia, de manhã, eu estava jogando futebol no Centro Amarino. Depois que a gente jogou, tomou banho, conversou um pouco, eu, sem querer, peguei o celular de um companheiro de time mesmo, e coloquei na minha bolsa. Aí quando eu e meu amigo que estava com o carro, o Reinaldo, estávamos indo para o chá de bebê, começou um telefone a vibrar na minha bolsa. Eu falei: “mano, o celular do Alisson”. Aí a gente voltou para o campo, devolveu o celular para ele. E, nesse meio tempo, se eu não tivesse voltado, nada disso teria acontecido, porque a gente não teria estacionado o carro ali. Teria estacionado em outro lugar e talvez não aconteceria isso, e aí nisso tudo, eu fui para o chá de bebê e aconteceu tudo aquilo.

O que é que você faria diferente, se fosse hoje?

Hoje, possivelmente, eu relevaria. Ao ouvir ela (Carla Zambelli) falando, possivelmente eu viraria o rosto e seguiria. Porque eu sinto que aquele dia - eu converso isso muito com a minha mãe - foi o pior dia da minha vida depois da morte do meu pai. Então, foi muito difícil, e ainda tá sendo muito difícil digerir tudo isso ainda. Eu faço acompanhamento psicológico, eu tomo remédios. Então, eu acho que eu viraria o rosto, mas eu também não posso mudar o que aconteceu. Ali, entrar na discussão também foi uma escolha minha. Ao mesmo tempo que hoje eu faria diferente, eu não posso negar que foi uma escolha minha entrar na discussão.

Depois do episódio, o presidente Lula, alguém da campanha dele ou do PT mandou alguma mensagem ou fez algum contato?

Não. O que aconteceu comigo naquele dia, lógico, eu era um eleitor do Lula, eu era um eleitor do PT e tudo mais, mas eu sinceramente não precisava disso também. Pra mim foi mais ou menos isto: se vierem que bom, se não vier também.

Não causou uma decepção?

Não, eu estava mais preocupado mesmo em como eu sairia disso, mais preocupado comigo mesmo.

Se você pudesse encontrar o presidente Lula, o que você diria para ele?

Eu agradeceria, primeiramente, por ter me proporcionado ter um diploma, fazer faculdade.

Está satisfeito com o que está sendo feito pelo governo Lula até agora?

Eu falo muito que esse terceiro governo do Lula é mais um governo de biografia dele do que propriamente um governo dele. Politicamente ele está fazendo o que ele acha necessário, na reforma tributária e tudo mais. Não concordo muito com as escolhas dele, por exemplo, no STF, acho que poderia mesmo aumentar a representatividade. Mas eu acho que é um governo de biografia. É um governo para tentar começar uma reconstrução. Então é um governo que já nesses dez meses está conseguindo trazer alguma normalidade institucional. Eu acho que isso é o mais importante hoje. Trazer um ar de normalidade.

E se você encontrasse a Carla Zambelli frente a frente?

Eu passaria reto.

Falaria nada?

Não falaria nada, passaria reto. Não vale a pena.

A deputada está enfrentando processo, o que você espera de desfecho?

Eu acho que politicamente está muito difícil pra ela. Mas eu espero que a justiça seja feita, do meu lado e de todos os lados.

Outro lado: Carla Zambelli diz que se viu “obrigada” a sacar a arma

Em nota ao Estadão, a deputada disse que se viu “obrigada” a sacar a arma e correu atrás de Luan - que estava desarmado - para “se defender”. Afirmou que o disparo foi acidental e não partiu da arma dela. Alega, ainda, que Luan “cuspiu na sua cara” e a xingou, situações que os vídeos não mostram. Segunda a parlamentar, Luan “distorce a situação quando diz que quase levou um tiro”.

Confira a íntegra da nota No texto *Lula nunca ligou para apoiador que quase levou tiro de Zambelli; ataque completa um ano*, quero afirmar que a democracia não é amizade: é uma maneira inteligente de organizar e administrar a discórdia. Na véspera da eleição, o sr. Luan Araújo viu uma parlamentar, mulher, assumidamente de direita, saindo de um restaurante com seu filho, menor de idade. Ele se aproveitou da minha vulnerabilidade e veio até mim, me ofendeu, cuspiu em meu rosto e falou palavras de baixo calão, como provam os vídeos que EU mesmo divulguei naquele dia. Na entrevista ao Estadão, a repórter se refere as gravações duvulgadas como tendo sido feitas por “pessoas da rua”. Na verdade, quem gravou as ofensas foram pessoas da minha própria equipe, que as divulgaram no mesmo instante. Há um ano, os veículos de comunicação vêm explorando de maneira obsessiva a recordação daquele trágico dia, sempre me imputando culpa, sem mencionar o disparo acidental (que não partiu de mim), situação que me obrigou a sacar a arma para me defender de 5 homens que corriam da polícia, em flagrante delito. Quando o sr. Luan afirma que quase levou um tiro, distorce os eventos e ignora a situação à qual ele havia me submetido. Eu jamais haveria sacado a arma naquele instante se não estivesse temendo pela minha vida e pela vida de MEU filho. No entanto, todas as vezes que tentei organizar os fatos daquele dia e mostrar o outro lado da história, com as devidas proporções, fui vista como uma suposta causadora, quando fui vítima de VIOLÊNCIA POLÍTICA. A História do Brasil mostra que a demonização da direita é uma norma obrigatória na cobertura jornalística que empodera ativistas, intelectuais e jornalistas de esquerda, enquanto desumaniza quem pensa de forma independente, retratando-os como monstros com indícios de alta periculosidade. Não há nada de novo sob o sol. Me espanta o sr. Araújo ser grato ao PT por ter se formado numa faculdade pública no mesmo período em que a ex-presidente Dilma deixou o governo com cerca de 14 milhões de desempregados no Brasil. Em contrapartida, admiro o governo Bolsonaro por ter desnudado ao Brasil toda a hipocrisia da nossa tão educada e democrática esquerda. As publicações mentirosas, que tentam imputar a mim uma culpa que não carrego, não me farão desistir, pelo contrário. Continuo com o apoio dos meus eleitores e minha família, os únicos que me importam. *Carla Zambelli*

Um ano depois de virar protagonista de um episódio que na avaliação do ex-presidente Jair Bolsonaro (PL) definiu o resultado da eleição presidencial de 2022, o jornalista Luan Araújo avalia que o momento foi provocado pelo afloramento do debate político no País e diz que mudou sua forma de pensar e seu comportamento.

Numa eleição em que muitas famílias e amizades romperam, Luan se viu diante de uma deputada armada correndo atrás dele pelas ruas de São Paulo. Era Carla Zambelli (PL), uma das principais apoiadoras de Bolsonaro, até então. E, de repente, ele ouviu um tiro. “O som do tiro foi o mais assustador. Eu pensei mesmo que minha vida ia acabar ali”.

Zambelli perseguiu Luan Araujo na véspera da eleição de 2022 Foto: Reprodução (frame do vídeo de Zambelli)/Roseann Kennedy (foto de Luan Araújo)

A cena, que ocorreu no dia 29 de outubro, véspera do segundo turno, foi filmada e correu o mundo. “Se não houvesse as imagens, possivelmente eu estaria preso ou morto”, diz considerando que muitos não acreditariam na sua versão.

Ao longo de todo o ano, Luan evitou conceder entrevistas, mas aceitou conversar com a Coluna do Estadão. O jornalista garante que hoje não agiria da mesma forma e relevaria as provocações. Se encontrasse Carla Zambelli, não tem dúvidas: “Não falaria nada, passaria reto. Não vale a pena”. Luan diz que nunca recebeu um telefonema de Lula ou do PT depois do episódio. Considera que o petista está fazendo um governo para defender sua biografia.

Quem é o Luan?

Sou um jornalista. Hoje com 33 anos. Moro na periferia de São Paulo, na Zona Leste, Cidade Tiradentes. Moro até hoje com a minha mãe, sou só eu e ela basicamente. O meu pai faleceu de câncer quando eu tinha 11 anos. Eu sempre gostei de pesquisar, de ler, de apurar, essas coisas todas. Sou fã de futebol, sou torcedor do Corinthians. Um negro periférico, filho de uma mãe que me criou sozinha.

Quando você lembra daquele dia, qual é a primeira imagem que vem à cabeça?

Primeiro o som, o som da arma. O som do tiro. Eu acho que aquilo me assustou mais do que tudo. O som do tiro vindo do policial, possivelmente. E também a sensação dentro da lanchonete: do povo, do pessoal dela (da deputada Carla Zambelli) – não sei do que eu posso chamar, de capanga, de segurança, não sei do que eu posso chamar — me pressionando e apontando a arma. Apontando a arma para cima de mim. Foi assustador. Eu pensei mesmo que tudo ia acabar ali, tipo, minha vida ia acabar ali.

A sensação era de estar vendo a morte de frente?

Sim, sim, talvez fosse só para intimidar. Não sei qual a intenção deles, mas pra mim, na hora, eu pensava só isso: eu vou morrer e já era.

Logo após o episódio qual foi a sensação?

Quando a gente saiu daquele lugar peguei o celular. Já fui vendo pessoas olhando e aí foi batendo um susto. Aí foi aumentando o susto, a angústia, porque eu vi que tinha acontecido uma coisa na véspera da eleição. Foi aí que eu percebi: ‘nossa, amanhã tem eleição!’. Então foi um negócio muito assustador, foi um turbilhão muito grande.

O núcleo de Bolsonaro e o próprio ex-presidente credita ao episódio a vitória de Lula...

Eu ainda não tenho essa noção de que o fato que aconteceu comigo me faz ter entrado num ponto da história mais recente do País. Quando eu vi no Twitter, eu falei: “Ah, vai passar isso nos 15 minutos subsequentes. Amanhã tem eleição, vai ter outra polêmica”. Mas não. Foi uma coisa muito grave o que aconteceu. É algo que realmente mudou a minha vida. Não para melhor, não para pior, mas mudou a minha vida de certa forma, o meu jeito de pensar e tudo mais.

Qual foi a principal mudança?

Eu acho que valorizar mais as pessoas que realmente estão comigo. As pessoas que estiveram comigo naquele momento. Eu sei que também posso ter errado em algum momento ali, na forma como eu falei com ela (Carla Zambelli), alguma coisa do tipo.

Eu falo muito que a gente – não só pelo governo de Bolsonaro – nesses últimos quatro anos passou por um momento muito difícil. Na pandemia e tudo mais. A gente praticamente não viveu nos últimos três anos. Então, naquele momento, eu não estava, acho que ninguém está ainda, decididamente bem. Era um momento de muita emoção aflorada. Eu falo muito que era um balde que foi enchendo e acabou, para mim, infelizmente, transbordando naquele dia. Depois disso, eu consegui ponderar mais as coisas. Tratar a vida com mais seriedade também, porque eu senti que podia perder a minha naquele dia.

O que você não levava tão a sério e passou a levar?

Eu comecei a focar mais no trabalho, a focar mais em relações que me fazem bem. … A minha mãe sempre me protegeu bastante, então aprendi também que eu tenho que cuidar mais de mim. Para me proteger mais. Cuidar do meu bem-estar, das minhas coisas.

O que você acha que teria acontecido se não houvesse aquelas gravações de pessoas da rua?

Possivelmente eu estaria preso ou morto. A internet, o local, a sorte, entre aspas, de ter acontecido isso num lugar que tinha muita gente. Porque se fosse, por exemplo, no meu bairro à noite, aí era outra história. Ou em outro lugar à noite mesmo, mas eu acho que possivelmente eu não estaria aqui, de uma forma ou outra.

O fato de ter ocorrido num bairro nobre, inclusive, foi um dos pontos de muitas narrativas na internet (entre elas a de que teria sido tudo programado) …

Sempre surge isso. Eu estava num chá de bebê de um amigo numa hamburgueria. E foi até engraçado porque nesse dia, de manhã, eu estava jogando futebol no Centro Amarino. Depois que a gente jogou, tomou banho, conversou um pouco, eu, sem querer, peguei o celular de um companheiro de time mesmo, e coloquei na minha bolsa. Aí quando eu e meu amigo que estava com o carro, o Reinaldo, estávamos indo para o chá de bebê, começou um telefone a vibrar na minha bolsa. Eu falei: “mano, o celular do Alisson”. Aí a gente voltou para o campo, devolveu o celular para ele. E, nesse meio tempo, se eu não tivesse voltado, nada disso teria acontecido, porque a gente não teria estacionado o carro ali. Teria estacionado em outro lugar e talvez não aconteceria isso, e aí nisso tudo, eu fui para o chá de bebê e aconteceu tudo aquilo.

O que é que você faria diferente, se fosse hoje?

Hoje, possivelmente, eu relevaria. Ao ouvir ela (Carla Zambelli) falando, possivelmente eu viraria o rosto e seguiria. Porque eu sinto que aquele dia - eu converso isso muito com a minha mãe - foi o pior dia da minha vida depois da morte do meu pai. Então, foi muito difícil, e ainda tá sendo muito difícil digerir tudo isso ainda. Eu faço acompanhamento psicológico, eu tomo remédios. Então, eu acho que eu viraria o rosto, mas eu também não posso mudar o que aconteceu. Ali, entrar na discussão também foi uma escolha minha. Ao mesmo tempo que hoje eu faria diferente, eu não posso negar que foi uma escolha minha entrar na discussão.

Depois do episódio, o presidente Lula, alguém da campanha dele ou do PT mandou alguma mensagem ou fez algum contato?

Não. O que aconteceu comigo naquele dia, lógico, eu era um eleitor do Lula, eu era um eleitor do PT e tudo mais, mas eu sinceramente não precisava disso também. Pra mim foi mais ou menos isto: se vierem que bom, se não vier também.

Não causou uma decepção?

Não, eu estava mais preocupado mesmo em como eu sairia disso, mais preocupado comigo mesmo.

Se você pudesse encontrar o presidente Lula, o que você diria para ele?

Eu agradeceria, primeiramente, por ter me proporcionado ter um diploma, fazer faculdade.

Está satisfeito com o que está sendo feito pelo governo Lula até agora?

Eu falo muito que esse terceiro governo do Lula é mais um governo de biografia dele do que propriamente um governo dele. Politicamente ele está fazendo o que ele acha necessário, na reforma tributária e tudo mais. Não concordo muito com as escolhas dele, por exemplo, no STF, acho que poderia mesmo aumentar a representatividade. Mas eu acho que é um governo de biografia. É um governo para tentar começar uma reconstrução. Então é um governo que já nesses dez meses está conseguindo trazer alguma normalidade institucional. Eu acho que isso é o mais importante hoje. Trazer um ar de normalidade.

E se você encontrasse a Carla Zambelli frente a frente?

Eu passaria reto.

Falaria nada?

Não falaria nada, passaria reto. Não vale a pena.

A deputada está enfrentando processo, o que você espera de desfecho?

Eu acho que politicamente está muito difícil pra ela. Mas eu espero que a justiça seja feita, do meu lado e de todos os lados.

Outro lado: Carla Zambelli diz que se viu “obrigada” a sacar a arma

Em nota ao Estadão, a deputada disse que se viu “obrigada” a sacar a arma e correu atrás de Luan - que estava desarmado - para “se defender”. Afirmou que o disparo foi acidental e não partiu da arma dela. Alega, ainda, que Luan “cuspiu na sua cara” e a xingou, situações que os vídeos não mostram. Segunda a parlamentar, Luan “distorce a situação quando diz que quase levou um tiro”.

Confira a íntegra da nota No texto *Lula nunca ligou para apoiador que quase levou tiro de Zambelli; ataque completa um ano*, quero afirmar que a democracia não é amizade: é uma maneira inteligente de organizar e administrar a discórdia. Na véspera da eleição, o sr. Luan Araújo viu uma parlamentar, mulher, assumidamente de direita, saindo de um restaurante com seu filho, menor de idade. Ele se aproveitou da minha vulnerabilidade e veio até mim, me ofendeu, cuspiu em meu rosto e falou palavras de baixo calão, como provam os vídeos que EU mesmo divulguei naquele dia. Na entrevista ao Estadão, a repórter se refere as gravações duvulgadas como tendo sido feitas por “pessoas da rua”. Na verdade, quem gravou as ofensas foram pessoas da minha própria equipe, que as divulgaram no mesmo instante. Há um ano, os veículos de comunicação vêm explorando de maneira obsessiva a recordação daquele trágico dia, sempre me imputando culpa, sem mencionar o disparo acidental (que não partiu de mim), situação que me obrigou a sacar a arma para me defender de 5 homens que corriam da polícia, em flagrante delito. Quando o sr. Luan afirma que quase levou um tiro, distorce os eventos e ignora a situação à qual ele havia me submetido. Eu jamais haveria sacado a arma naquele instante se não estivesse temendo pela minha vida e pela vida de MEU filho. No entanto, todas as vezes que tentei organizar os fatos daquele dia e mostrar o outro lado da história, com as devidas proporções, fui vista como uma suposta causadora, quando fui vítima de VIOLÊNCIA POLÍTICA. A História do Brasil mostra que a demonização da direita é uma norma obrigatória na cobertura jornalística que empodera ativistas, intelectuais e jornalistas de esquerda, enquanto desumaniza quem pensa de forma independente, retratando-os como monstros com indícios de alta periculosidade. Não há nada de novo sob o sol. Me espanta o sr. Araújo ser grato ao PT por ter se formado numa faculdade pública no mesmo período em que a ex-presidente Dilma deixou o governo com cerca de 14 milhões de desempregados no Brasil. Em contrapartida, admiro o governo Bolsonaro por ter desnudado ao Brasil toda a hipocrisia da nossa tão educada e democrática esquerda. As publicações mentirosas, que tentam imputar a mim uma culpa que não carrego, não me farão desistir, pelo contrário. Continuo com o apoio dos meus eleitores e minha família, os únicos que me importam. *Carla Zambelli*

Um ano depois de virar protagonista de um episódio que na avaliação do ex-presidente Jair Bolsonaro (PL) definiu o resultado da eleição presidencial de 2022, o jornalista Luan Araújo avalia que o momento foi provocado pelo afloramento do debate político no País e diz que mudou sua forma de pensar e seu comportamento.

Numa eleição em que muitas famílias e amizades romperam, Luan se viu diante de uma deputada armada correndo atrás dele pelas ruas de São Paulo. Era Carla Zambelli (PL), uma das principais apoiadoras de Bolsonaro, até então. E, de repente, ele ouviu um tiro. “O som do tiro foi o mais assustador. Eu pensei mesmo que minha vida ia acabar ali”.

Zambelli perseguiu Luan Araujo na véspera da eleição de 2022 Foto: Reprodução (frame do vídeo de Zambelli)/Roseann Kennedy (foto de Luan Araújo)

A cena, que ocorreu no dia 29 de outubro, véspera do segundo turno, foi filmada e correu o mundo. “Se não houvesse as imagens, possivelmente eu estaria preso ou morto”, diz considerando que muitos não acreditariam na sua versão.

Ao longo de todo o ano, Luan evitou conceder entrevistas, mas aceitou conversar com a Coluna do Estadão. O jornalista garante que hoje não agiria da mesma forma e relevaria as provocações. Se encontrasse Carla Zambelli, não tem dúvidas: “Não falaria nada, passaria reto. Não vale a pena”. Luan diz que nunca recebeu um telefonema de Lula ou do PT depois do episódio. Considera que o petista está fazendo um governo para defender sua biografia.

Quem é o Luan?

Sou um jornalista. Hoje com 33 anos. Moro na periferia de São Paulo, na Zona Leste, Cidade Tiradentes. Moro até hoje com a minha mãe, sou só eu e ela basicamente. O meu pai faleceu de câncer quando eu tinha 11 anos. Eu sempre gostei de pesquisar, de ler, de apurar, essas coisas todas. Sou fã de futebol, sou torcedor do Corinthians. Um negro periférico, filho de uma mãe que me criou sozinha.

Quando você lembra daquele dia, qual é a primeira imagem que vem à cabeça?

Primeiro o som, o som da arma. O som do tiro. Eu acho que aquilo me assustou mais do que tudo. O som do tiro vindo do policial, possivelmente. E também a sensação dentro da lanchonete: do povo, do pessoal dela (da deputada Carla Zambelli) – não sei do que eu posso chamar, de capanga, de segurança, não sei do que eu posso chamar — me pressionando e apontando a arma. Apontando a arma para cima de mim. Foi assustador. Eu pensei mesmo que tudo ia acabar ali, tipo, minha vida ia acabar ali.

A sensação era de estar vendo a morte de frente?

Sim, sim, talvez fosse só para intimidar. Não sei qual a intenção deles, mas pra mim, na hora, eu pensava só isso: eu vou morrer e já era.

Logo após o episódio qual foi a sensação?

Quando a gente saiu daquele lugar peguei o celular. Já fui vendo pessoas olhando e aí foi batendo um susto. Aí foi aumentando o susto, a angústia, porque eu vi que tinha acontecido uma coisa na véspera da eleição. Foi aí que eu percebi: ‘nossa, amanhã tem eleição!’. Então foi um negócio muito assustador, foi um turbilhão muito grande.

O núcleo de Bolsonaro e o próprio ex-presidente credita ao episódio a vitória de Lula...

Eu ainda não tenho essa noção de que o fato que aconteceu comigo me faz ter entrado num ponto da história mais recente do País. Quando eu vi no Twitter, eu falei: “Ah, vai passar isso nos 15 minutos subsequentes. Amanhã tem eleição, vai ter outra polêmica”. Mas não. Foi uma coisa muito grave o que aconteceu. É algo que realmente mudou a minha vida. Não para melhor, não para pior, mas mudou a minha vida de certa forma, o meu jeito de pensar e tudo mais.

Qual foi a principal mudança?

Eu acho que valorizar mais as pessoas que realmente estão comigo. As pessoas que estiveram comigo naquele momento. Eu sei que também posso ter errado em algum momento ali, na forma como eu falei com ela (Carla Zambelli), alguma coisa do tipo.

Eu falo muito que a gente – não só pelo governo de Bolsonaro – nesses últimos quatro anos passou por um momento muito difícil. Na pandemia e tudo mais. A gente praticamente não viveu nos últimos três anos. Então, naquele momento, eu não estava, acho que ninguém está ainda, decididamente bem. Era um momento de muita emoção aflorada. Eu falo muito que era um balde que foi enchendo e acabou, para mim, infelizmente, transbordando naquele dia. Depois disso, eu consegui ponderar mais as coisas. Tratar a vida com mais seriedade também, porque eu senti que podia perder a minha naquele dia.

O que você não levava tão a sério e passou a levar?

Eu comecei a focar mais no trabalho, a focar mais em relações que me fazem bem. … A minha mãe sempre me protegeu bastante, então aprendi também que eu tenho que cuidar mais de mim. Para me proteger mais. Cuidar do meu bem-estar, das minhas coisas.

O que você acha que teria acontecido se não houvesse aquelas gravações de pessoas da rua?

Possivelmente eu estaria preso ou morto. A internet, o local, a sorte, entre aspas, de ter acontecido isso num lugar que tinha muita gente. Porque se fosse, por exemplo, no meu bairro à noite, aí era outra história. Ou em outro lugar à noite mesmo, mas eu acho que possivelmente eu não estaria aqui, de uma forma ou outra.

O fato de ter ocorrido num bairro nobre, inclusive, foi um dos pontos de muitas narrativas na internet (entre elas a de que teria sido tudo programado) …

Sempre surge isso. Eu estava num chá de bebê de um amigo numa hamburgueria. E foi até engraçado porque nesse dia, de manhã, eu estava jogando futebol no Centro Amarino. Depois que a gente jogou, tomou banho, conversou um pouco, eu, sem querer, peguei o celular de um companheiro de time mesmo, e coloquei na minha bolsa. Aí quando eu e meu amigo que estava com o carro, o Reinaldo, estávamos indo para o chá de bebê, começou um telefone a vibrar na minha bolsa. Eu falei: “mano, o celular do Alisson”. Aí a gente voltou para o campo, devolveu o celular para ele. E, nesse meio tempo, se eu não tivesse voltado, nada disso teria acontecido, porque a gente não teria estacionado o carro ali. Teria estacionado em outro lugar e talvez não aconteceria isso, e aí nisso tudo, eu fui para o chá de bebê e aconteceu tudo aquilo.

O que é que você faria diferente, se fosse hoje?

Hoje, possivelmente, eu relevaria. Ao ouvir ela (Carla Zambelli) falando, possivelmente eu viraria o rosto e seguiria. Porque eu sinto que aquele dia - eu converso isso muito com a minha mãe - foi o pior dia da minha vida depois da morte do meu pai. Então, foi muito difícil, e ainda tá sendo muito difícil digerir tudo isso ainda. Eu faço acompanhamento psicológico, eu tomo remédios. Então, eu acho que eu viraria o rosto, mas eu também não posso mudar o que aconteceu. Ali, entrar na discussão também foi uma escolha minha. Ao mesmo tempo que hoje eu faria diferente, eu não posso negar que foi uma escolha minha entrar na discussão.

Depois do episódio, o presidente Lula, alguém da campanha dele ou do PT mandou alguma mensagem ou fez algum contato?

Não. O que aconteceu comigo naquele dia, lógico, eu era um eleitor do Lula, eu era um eleitor do PT e tudo mais, mas eu sinceramente não precisava disso também. Pra mim foi mais ou menos isto: se vierem que bom, se não vier também.

Não causou uma decepção?

Não, eu estava mais preocupado mesmo em como eu sairia disso, mais preocupado comigo mesmo.

Se você pudesse encontrar o presidente Lula, o que você diria para ele?

Eu agradeceria, primeiramente, por ter me proporcionado ter um diploma, fazer faculdade.

Está satisfeito com o que está sendo feito pelo governo Lula até agora?

Eu falo muito que esse terceiro governo do Lula é mais um governo de biografia dele do que propriamente um governo dele. Politicamente ele está fazendo o que ele acha necessário, na reforma tributária e tudo mais. Não concordo muito com as escolhas dele, por exemplo, no STF, acho que poderia mesmo aumentar a representatividade. Mas eu acho que é um governo de biografia. É um governo para tentar começar uma reconstrução. Então é um governo que já nesses dez meses está conseguindo trazer alguma normalidade institucional. Eu acho que isso é o mais importante hoje. Trazer um ar de normalidade.

E se você encontrasse a Carla Zambelli frente a frente?

Eu passaria reto.

Falaria nada?

Não falaria nada, passaria reto. Não vale a pena.

A deputada está enfrentando processo, o que você espera de desfecho?

Eu acho que politicamente está muito difícil pra ela. Mas eu espero que a justiça seja feita, do meu lado e de todos os lados.

Outro lado: Carla Zambelli diz que se viu “obrigada” a sacar a arma

Em nota ao Estadão, a deputada disse que se viu “obrigada” a sacar a arma e correu atrás de Luan - que estava desarmado - para “se defender”. Afirmou que o disparo foi acidental e não partiu da arma dela. Alega, ainda, que Luan “cuspiu na sua cara” e a xingou, situações que os vídeos não mostram. Segunda a parlamentar, Luan “distorce a situação quando diz que quase levou um tiro”.

Confira a íntegra da nota No texto *Lula nunca ligou para apoiador que quase levou tiro de Zambelli; ataque completa um ano*, quero afirmar que a democracia não é amizade: é uma maneira inteligente de organizar e administrar a discórdia. Na véspera da eleição, o sr. Luan Araújo viu uma parlamentar, mulher, assumidamente de direita, saindo de um restaurante com seu filho, menor de idade. Ele se aproveitou da minha vulnerabilidade e veio até mim, me ofendeu, cuspiu em meu rosto e falou palavras de baixo calão, como provam os vídeos que EU mesmo divulguei naquele dia. Na entrevista ao Estadão, a repórter se refere as gravações duvulgadas como tendo sido feitas por “pessoas da rua”. Na verdade, quem gravou as ofensas foram pessoas da minha própria equipe, que as divulgaram no mesmo instante. Há um ano, os veículos de comunicação vêm explorando de maneira obsessiva a recordação daquele trágico dia, sempre me imputando culpa, sem mencionar o disparo acidental (que não partiu de mim), situação que me obrigou a sacar a arma para me defender de 5 homens que corriam da polícia, em flagrante delito. Quando o sr. Luan afirma que quase levou um tiro, distorce os eventos e ignora a situação à qual ele havia me submetido. Eu jamais haveria sacado a arma naquele instante se não estivesse temendo pela minha vida e pela vida de MEU filho. No entanto, todas as vezes que tentei organizar os fatos daquele dia e mostrar o outro lado da história, com as devidas proporções, fui vista como uma suposta causadora, quando fui vítima de VIOLÊNCIA POLÍTICA. A História do Brasil mostra que a demonização da direita é uma norma obrigatória na cobertura jornalística que empodera ativistas, intelectuais e jornalistas de esquerda, enquanto desumaniza quem pensa de forma independente, retratando-os como monstros com indícios de alta periculosidade. Não há nada de novo sob o sol. Me espanta o sr. Araújo ser grato ao PT por ter se formado numa faculdade pública no mesmo período em que a ex-presidente Dilma deixou o governo com cerca de 14 milhões de desempregados no Brasil. Em contrapartida, admiro o governo Bolsonaro por ter desnudado ao Brasil toda a hipocrisia da nossa tão educada e democrática esquerda. As publicações mentirosas, que tentam imputar a mim uma culpa que não carrego, não me farão desistir, pelo contrário. Continuo com o apoio dos meus eleitores e minha família, os únicos que me importam. *Carla Zambelli*

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