BRASÍLIA - Uma das acusações mais fortes da Odebrecht à atual cúpula do Congresso Nacional é a de recebimento de vantagens indevidas para a aprovação de medidas provisórias entre 2009 e 2013. O ministro Edson Fachin, relator da Lava Jato no Supremo Tribunal Federal (STF), abriu inquérito para investigar repasses de R$ 7 milhões ao grupo formado pelo atual presidente do Senado, Eunício Oliveira (PMDB-CE); o atual presidente da Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ); os senadores Romero Jucá (PMDB-RR) e Renan Calheiros (PMDB-AL); e o deputado federal Lúcio Vieira Lima (PDMB-BA).
A propina foi liberada em 2013 para garantir a aprovação da MP 613, convertida na Lei 12.859, de 10 de setembro de 2013. A lei disciplinava o Regime Especial da Indústria Química (Reiq), com regras de desoneração fiscal para a aquisição de matérias-primas. O texto da MP 613 beneficiava a produção de etanol e a indústria química. Os acusados negam. Vieira Lima não se pronunciou.
“Eunício Oliveira criou dificuldade para cobrar dinheiro para não obstruir a tramitação”, disse o delator Carlos Fadigas, ex-presidente da Braskem, braço petroquímico da Odebrecht.
Os relatos e documentos apresentados por seis delatores mostram que o Setor de Operações Estruturadas – o departamento da propina – repassou cerca de R$ 4 milhões a Jucá e Renan; R$ 2,1 milhões a Eunício; cerca de R$ 1 milhão a Vieira Lima; e R$ 100 mil a Maia. Os montantes foram pagos em espécie.
De acordo com os delatores, integrantes dos governos Luiz Inácio Lula da Silva e Dilma Rousseff também receberam para ajudar na aprovação das MPs. Formalmente, no entanto, nenhum dos citados – incluindo os ex-ministros petistas Antonio Palocci e Guido Mantega – consta como investigado neste caso.
No pedido de abertura de inquérito, a Procuradoria-Geral da República reproduziu a tabela com os pagamentos aos parlamentares. “No sistema, também, a gente conseguiu identificar que isso foi pago em dinheiro pelo Setor de Operações Estruturadas para o Eunício, para o Lúcio Vieira Lima e o Rodrigo Maia. Todos eles receberam dinheiro em espécie, em valores entregues por doleiros”, disse Fadigas. “Eu acho difícil justificar esses pagamentos como doação de campanha. Estamos falando de 2013, portanto, fora do período eleitoral”, afirmou o delator.
Interlocução. O interlocutor da Odebrecht no Congresso era Cláudio Melo Filho, ex-diretor de Relações Institucionais. Ele narrou uma relação próxima a Jucá desde 2004. Disse que o senador “é muito qualificado tecnicamente” e era excelente para “resolver” interesses da empresa. Ele teria intermediado a distribuição dos recursos em relação à MP 613. Segundo ele, Jucá atuava em favor também de Renan.
De acordo com Melo Filho, Eunício recebeu dois repasses de cerca de R$ 1 milhão. Ele contou ainda que o também delator José de Carvalho Filho, encarregado de viabilizar os pagamentos, recebeu uma reclamação de Ricardo Augusto, sobrinho de Eunício, por causa do atraso em um pagamento de R$ 1 milhão. Augusto, executivo da empresa Confederal Vigilância e Transporte de Valores Ltda., disse que já havia “disponibilizado avião para viabilizar a operação”. Esta informação foi destacada no pedido da PGR para a abertura de inquérito contra os cinco parlamentares.
Melo Filho afirmou que, pelo bom e longo relacionamento que tinha com Jucá, já repassou ao senador entre R$ 15 milhões e R$ 16 milhões. Ele também explicou que outro ex-executivo distribuiu recursos ao senador. “Tem um valor relacionado a Henrique Valadares, que tratou com Romero Jucá de R$ 6 milhões. Diz respeito à obra da (Usina de) Santo Antônio. E isso foi pago. A gente tem um dado específico para olhar isso”, disse Melo Filho.
Defesa. Maia afirmou que todas as doações de campanha que recebeu “foram solicitadas dentro da legislação, contabilizadas e declaradas à Justiça, em cumprimento à lei eleitoral” e o “processo vai comprovar que são falsas as citações dos delatores”.
Eunício afirmou que jamais participou de negociações sobre emendas legislativas para favorecer empresas públicas ou privadas e nem sequer participou da comissão que discutiu o texto da MP 613. “As contribuições da Odebrecht, como as demais, foram recebidas e contabilizadas de acordo com a legislação eleitoral”, afirmou.
Renan disse acreditar que as investigações “serão arquivadas por falta de provas e por total inconsistência da denúncia”. Jucá afirmou que “está à disposição da Justiça para prestar qualquer esclarecimento”.