O primeiro debate entre os candidatos à Prefeitura de São Paulo, organizado pela Band, foi marcado por trocas de farpas, ataques de baixo calão e tom pouco propositivo. Como esperado, o atual prefeito da cidade, Ricardo Nunes (MDB), foi o principal alvo dos adversários, enquanto Pablo Marçal (PRTB) assumiu o papel de “franco-atirador”, disparando críticas e até palavrões contra Nunes, José Luiz Datena (PSDB), Guilherme Boulos (PSOL) e Tabata Amaral (PSB).
O debate já começou em clima acalorado, com o primeiro bloco dominado por ataques pouco republicanos, com destaque para as declarações do ex-coach Pablo Marçal, que chamou Boulos de comedor de açúcar e apoiador do grupo terrorista Hamas. Marçal elegeu Boulos e Nunes como seus principais alvos, mas seu embate mais intenso foi com Tabata Amaral.
A deputada expôs a falta de conhecimento do goiano sobre a cidade ao questioná-lo sobre a Operação Água Branca, uma tentativa de revitalização da região na Zona Oeste da capital. Sem saber do que se tratava, Marçal respondeu à deputada com agressividade, chamando-a de “para-choque de comunista”, “candidata fantoche” e a comparando a uma “jornalistazinha militante”.
Tabata e Marçal protagonizaram outros embates. Em dado momento, a deputada afirmou que São Paulo não precisa de “carro voador” nem de um “candidato que diz que dá murro em tubarão,” chamando Marçal de “0071 goiano” que veio a São Paulo oferecer soluções inexistentes.
Alvo preferencial
Sentado hoje na cadeira de prefeito, Nunes foi, de longe, o principal alvo dos demais candidatos. Seus adversários exploraram temas sensíveis à gestão municipal, como as obras sem licitação e as investigações que apontam para uma suposta ligação entre empresas de ônibus e o Primeiro Comando da Capital (PCC). O boletim de ocorrência por violência doméstica registrado por sua esposa voltou a assombrar o prefeito, que se manteve calmo e dedicou boa parte de seus discursos a citar entregas de sua administração e atacar a Boulos.
Em várias ocasiões, o prefeito insinuou que Boulos não trabalha, relembrou episódios polêmicos da trajetória do psolista, como a participação na invasão do Ministério da Fazenda pelo Movimento dos Trabalhadores Sem-Teto (MTST), e explorou as falas controversas do adversário sobre o ditador venezuelano Nicolás Maduro.
Além de transformar o debate em um verdadeiro ringue, Pablo Marçal focou em se posicionar como o candidato da direita na eleição paulistana. Logo no início, o ex-coach chamou Nunes de “falsa direita”, disse que o partido do prefeito, o MDB, tem ministérios no governo Lula (PT) e ressaltou que a petista Marta Suplicy, vice de Boulos, foi secretária de Nunes até janeiro.
Lula e Bolsonaro ficam praticamente fora do debate
Contrariando as expectativas, a polarização passou longe do debate, com raras menções a Lula e ao ex-presidente Jair Bolsonaro (PL). Datena tentou lançar a ideia de que Boulos e Nunes seriam marionetes de Lula e Bolsonaro, enquanto Boulos, que afirmou ter orgulho do apoio de Lula, chamou o prefeito de “bolsonarista envergonhado” e Marçal de “bolsonarista rejeitado”.
O apresentador José Luiz Datena tentou manter a estratégia de se apresentar como alternativa à polarização, embora tenha direcionado críticas mais duras a Nunes. No primeiro bloco, o apresentador ensaiou uma dobradinha com Boulos ao chamá-lo para fazer uma pergunta que tivesse como alvo o prefeito. Mas logo depois o apresentador se voltou contra o líder sem-teto. “Depois, quero saber se você é democrata, porque parece que não é, apoia Maduro e a ditadura na Venezuela. Você deveria ser prefeito lá em Caracas”, disparou o tucano.
Tabata Amaral, além de protagonizar confrontos diretos com Nunes e Marçal, usou o debate para se apresentar à cidade. Ela se posicionou como a única candidata que já conversou com todos os ex-prefeitos e que tem a capacidade de dialogar tanto com Tarcísio quanto com Lula.
Janones e Venezuela viram vidraça de Boulos
O parecer de Boulos que absolveu Janones da acusação de rachadinha no Conselho de Ética, junto com seu posicionamento em relação à ditadura de Nicolás Maduro na Venezuela, atraiu críticas dos adversários.
“Você anda de braços dados na Comissão de Ética com o Janones da rachadinha” atacou Datena. “Depois, quero saber se você é democrata, porque parece que não é, apoia Maduro e a ditadura na Venezuela. Você deveria ser prefeito em Caracas,” completou. O líder sem-teto respondeu: “Ô, Datena. Até tu com fake news? Te conheço, sei que você é uma pessoa correta”.
Nunes também explorou os dois temas. “Olha, Boulos, acho que você tem que responder quem é Janones. Você instituiu a legalização da rachadinha. Você precisa responder quem é Nicolás Maduro”, disse o prefeito.
Tabata e Marçal travam confrontos
Tabata e Marçal protagonizaram várias trocas de farpas durante o debate. No primeiro bloco, Tabata desconcertou Marçal ao questioná-lo sobre a Operação Água Branca, sobre a qual ele não tinha conhecimento. “Você pode esclarecer o que é a Operação Água Branca? Deve ser algum bandido de esquerda envolvido,” respondeu Marçal, provocando risos na plateia. Tabata retrucou: “Para ser prefeito de São Paulo, é preciso estudar.”
Em outro momento, Tabata citou as acusações de fraude bancária envolvendo Marçal e perguntou se ele planejava usar sua “experiência no mundo do crime” para desenvolver políticas públicas de segurança. O ex-coach respondeu dizendo que a deputada estava o confundindo com “sua heroína, Dilma Rousseff” e chamou Tabata de “adolescente”.
Datena e Boulos direcionam ataques a Nunes
Datena e Boulos, que chegaram a esboçar uma dobradinha no primeiro bloco, direcionaram seus ataques ao prefeito Ricardo Nunes. Datena, em várias ocasiões, mencionou as investigações que apuram a ligação do PCC com empresas de ônibus que operam na capital. Ele também acusou Nunes de não ter concluído “vários projetos” iniciados por seu antecessor, Bruno Covas, e afirmou que o prefeito não está preparado para enfrentar as enchentes. Datena declarou que, se chover em outubro, Nunes é “eleito prefeito nem do fim do mundo”.
Boulos seguiu o mesmo caminho que Datena, destacando investigações que atingem o prefeito, como a da Máfia das Creches. O psolista tratou de associar Nunes ao ex-presidente Jair Bolsonaro (PL), referindo-se a ele como “bolsonarista envergonhado” e a Marçal como “bolsonarista rejeitado” que tentou se alinhar com Bolsonaro, mas acabou “órfão”.
Mulher de Nunes reage a pergunta de Tabata
Tabata Amaral questionou Nunes sobre a veracidade do boletim de ocorrência por violência doméstica registrado por sua mulher, Regina Nunes, sugerindo que ele teria mentido ao afirmar, em sabatina ao site Uol e ao jornal Folha de S.Paulo, que o documento era “forjado.” Nunes respondeu dizendo que nunca “levantou um dedo” para sua mulher e criticou Tabata por trazer o assunto à tona. “Não esperava esse nível de você”, afirmou Nunes, defendendo que a campanha não pode ser um “vale tudo”. Ele ainda acrescentou: “No período eleitoral, infelizmente, forjam essas histórias. Eu realmente tive com a minha esposa, há 14 anos, um período de quatro ou cinco meses em que a gente realmente se separou, tivemos um desentendimento, mas nada de agressão”. Quando Tabata trouxe o assunto à tona, Regina, que estava na plateia, reagiu imediatamente, pedindo respeito à sua família.
Candidata do Novo faz protesto em chegada à emissora
Marina Helena, candidata do Novo, ficou de fora do debate, mesmo após a filiação do deputado federal Ricardo Salles (Novo), que se tornou o quinto parlamentar de seu partido na última sexta-feira, 2. A Band argumentou à Justiça que levou em consideração o tamanho da bancada no dia 20 de julho.
Em resposta, a economista organizou um protesto com militantes do partido contra a decisão da emissora. “Hoje é uma chance de todos os candidatos levarem as suas propostas para a cidade. Por que não querem me escutar? Nós temos cinco parlamentares no Congresso Nacional, há candidatos aqui que não têm nenhum”, disse Marina Helena.
Boulos chegou à Band acompanhado de sua vice, a ex-prefeita Marta Suplicy (PT), e afirmou que seu foco seria discutir propostas para a cidade. “Candidatos que vão baixar o nível, não contem comigo. Estou aqui para este debate com respeito e compromisso.”
O ex-coach Pablo Marçal deixou claro que seu alvo seria Boulos e o atual prefeito. “Vou fazer perguntas para ver até onde eles vão tentar enrolar o povo. E para quem vou perguntar? Para quem diz que está querendo ganhar essa eleição: Boulos e Nunes. Eles vão tomar um atropelo aqui hoje.”
Datena, estreante na eleição, também comentou suas expectativas na chegada, afirmando que esperava um debate de “bom nível”. O apresentador, que busca se posicionar como uma terceira via na disputa municipal, criticou a polarização no país: “Essa polarização está destruindo o Brasil e quase provocou um golpe de Estado. Chega de Lula e Bolsonaro. Parece que os candidatos são Lula e Bolsonaro, mas, na verdade, são Boulos e Ricardo”, disse o apresentador, que está de férias da Band e afirmou ser “estranho” estar na emissora e não apresentar o seu programa.
Tabata Amaral, que chegou acompanhada de sua vice, Lúcia França (PSB), destacou a importância do debate como o momento mais crucial antes do início oficial da campanha. Ela enfatizou que muitos eleitores ainda não conhecem os candidatos ou não decidiram em quem votar. “A gente tem chão pela frente.”
Por fim, o prefeito Ricardo Nunes, último a chegar, ressaltou as conquistas de sua gestão e afirmou que espera um “debate de alto nível” para discutir a cidade. “Estou bastante tranquilo. Não há tema que eles comentem que eu não possa responder de forma objetiva e concreta, com base nas ações realizadas para a nossa cidade.”
Pesquisa Datafolha divulgada nesta quinta aponta um cenário estável na corrida eleitoral paulistana, com Nunes e Boulos empatados tecnicamente com 23% e 22% de intenção de voto, respectivamente. Datena e Marçal têm 14% cada, e Tabata aparece em seguida, com 7%. A economista Marina Helena (Novo), que não participa do debate da Band, registrou 4%. João Pimenta, do PCO, marcou 2%, e Altino (PSTU), 1%. Os demais candidatos não pontuaram. Eleitores que dizem votar branco ou nulo somam 11%, e 3% dos entrevistados não responderam.