Curiosidades do mundo da Política

Debates eleitorais foram proibidos por mais de uma década no Brasil


Primeiro embate eleitoral televisionado no País ocorreu no Rio Grande do Sul em 1974, durante a ditadura militar, e envolveu os concorrentes ao Senado Nestor Jost (Arena) e Paulo Brossard (MDB); o emedebista acabou eleito

Por Elton Félix

O mês de agosto marcou o início dos debates eleitorais para as eleições municipais de 2024. Mas, para chegar ao atual formato e às regras para condução dos programas televisionados, os encontros entre candidatos passaram por uma longa evolução histórica.

Candidatos à Prefeitura de São Paulo no debate promovido por Estadão, portal Terra e Faap no último dia 14 de agosto Foto: Werther Santana/Estadão
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Na Antiguidade, as discussões públicas tinham um significado valioso para o desenvolvimento da sociedade e qualificação dos cidadãos. Na Grécia Antiga, os debates ocorriam nas ágoras, nome que pode ser traduzido como “espaço para deliberações ou tomada de decisões”. O local costumava ser o eixo entre a vida social, artística, atlética, espiritual, militar e política das comunidades.

Também foi na Grécia, especificamente em Atenas, entre os séculos V e VI a.C., que foram fundados os primeiros pilares da democracia, com a participação direta dos cidadãos. Ali surgiram as assembleias populares, conselhos e tribunais que debatiam assuntos ligados à pólis (cidade-estado). Ou seja, os debates políticos nasceram com os primórdios das instituições democráticas.

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Debates chegam à TV dos EUA

No mundo, o primeiro embate eleitoral público televisionado ocorreu entre o então senador norte-americano John Fitzgerald Kennedy (democrata) e o vice-presidente Richard Nixon (republicano), no dia 26 de setembro de 1960, com transmissão pela CBS (Columbia Broadcasting System) a partir dos estúdios de Chicago, em Illinois, Estados Unidos.

Com moderação do jornalista Howard K. Smith, a dinâmica contou com uma declaração de abertura de oito minutos e uma de encerramento de três minutos para cada candidato, além das indagações dos demais jornalistas presentes. Entre as pautas, estavam política interna, segurança nacional e Guerra Fria.

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Atraindo a atenção de mais de 80 milhões de telespectadores, a discussão foi considerada áspera por conta das divergências entre os debatedores. Apesar de os dois candidatos já terem se enfrentado anteriormente de forma remota, o embate frente a frente foi visto como decisivo para a vitória de Kennedy.

Por outro lado, a performance de Nixon, que havia sido hospitalizado alguns dias antes do encontro, dividiu opiniões; aqueles que acompanharam a transmissão pelo rádio, sem as imagens, julgaram que o vice-presidente apresentou uma performance melhor do que o oponente.

Debate presidencial em 1960, o 1º a ser transmitido pela TV dos EUA, entre Richard Nixon (à esq.) e John F. Kennedy Foto: AP
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Há quase 50 anos, o 1º debate no Brasil

Por aqui, as discussões públicas entre candidatos a cargos eleitorais nem sempre foram bem vistas. O primeiro debate do qual se tem registro ocorreu no Rio Grande do Sul em 1974 e envolveu os concorrentes ao Senado pelo Estado, Nestor Jost (Arena) e Paulo Brossard (MDB). Realizado no dia 9 de setembro daquele ano, durante a ditadura militar, o encontro foi transmitido pela TV Gaúcha, atual RBS, a partir de Porto Alegre.

A realização do programa preocupava aliados do regime militar. Alguns políticos da situação tentaram impedir a realização do programa, temendo que ele fortalecesse a oposição e expusesse fragilidades do governo.

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Na ocasião, o presidente da Arena, senador Petrônio Portela, chegou a se encontrar com o então ministro da Justiça, Armando Falcão, para manifestar seu descontentamento. Para Portela, além de restringir a participação dos demais candidatos, o embate televisionado poderia favorecer aqueles com mais facilidade na oratória.

Em agosto de 1974, porém, o Tribunal Regional Eleitoral autorizou a realização do encontro entre Jost e Brossard. Além disso, o Ministério das Comunicações declarou não ter restrições para o evento.

O primeiro debate eleitoral no Brasil é considerado emblemático porque ocorreu em um contexto de forte repressão política durante o regime militar, no qual a oposição tinha poucas oportunidades de se manifestar publicamente, como explica Juliana Oliveira, cientista política pela USP e pesquisadora do Centro Brasileiro de Análise e Planejamento (Cebrap).

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Após o encontro, o desempenho de Brossard foi considerado melhor e ele acabou eleito senador, consolidando a imagem do MDB como uma oposição viável ao regime. O encontro televisionado foi considerado decisivo para a vitória. Dois anos depois da transmissão realizada pela TV Gaúcha, os debates em meios de comunicação foram reprimidas pela ditadura.

A proibição dos debates no País

A Lei Falcão, instituída em 1976 pelo ministro Armando Falcão, limitava a divulgação das candidaturas no rádio e na TV: no modelo então obrigatório, uma locução em off apresentava os políticos, seguida por fotos dos candidatos, nomes, número, partido e um breve currículo (veja no vídeo abaixo).

“A lei foi uma reação ao resultado das eleições de 1974, quando o MDB, partido oposicionista, conquistou 16 das 22 cadeiras em disputa no Senado, aumentou os assentos na Câmara dos Deputados e, nas assembleias estaduais e obteve a maioria em vários Estados”, explica o professor e historiador Marcos Asturian, do Instituto Federal Farroupilha.

Ao limitar drasticamente o tempo e o conteúdo das propagandas eleitorais, impedindo os candidatos de discursarem e expressarem diretamente suas opiniões políticas, a Lei Falcão reduziu a capacidade da oposição de se comunicar com o eleitorado.

A lei não apenas impediu a publicização do posicionamento da oposição, mas também enfraqueceu o processo democrático em si, que depende da livre circulação de informações e do debate público para funcionar de maneira saudável e justa

Juliana Oliveira, cientista política pela USP e pesquisadora do Cebrap

A Lei Falcão permaneceu em vigor durante as eleições municipais de 1976, estaduais de 1978 e municipais e estaduais de 1982. As restrições aos programas eleitorais no Brasil só caíram com o processo de redemocratização, a partir de 1985, quando os debates também voltaram; dali a quatro anos, em 1989, o País faria a primeira eleição presidencial com voto direto após o golpe de 1964.

Para a pesquisadora, a partir da abertura política e da gradual restauração das instituições democráticas, os debates foram restabelecidos como parte essencial do processo eleitoral, permitindo novamente o confronto de ideias e a livre escolha dos eleitores.

Regulamentação

Segundo o TRE-SP, os debates passaram a ser regulamentados pelo menos desde a redemocratização. A Lei 7.773, de 8 de junho de 1989, por exemplo, já previa a realização dos programas. Para o professor de Direito Eleitoral pela FGV Fernando Neisser, as regras brasileiras em torno da discussão entre candidatos e candidatas são bem claras e amarradas, mas podem sofrer alterações de acordo com as articulações políticas.

Neisser explica que desde a Lei Geral das Eleições, instituída em 1997, as regras sofreram variações por meio de minirreformas eleitorais. Já houve momentos em que, por exemplo, os partidos pequenos estavam mais fortes no Congresso Nacional e faziam pressão para que seus candidatos tivessem o direito de participar dos debates.

“A lei já chegou a prever que candidatos de partidos com pelo menos um deputado ou senador tinham o direito de serem convidados para as discussões. Em outros momentos, o mínimo era de dez parlamentares, ou seja, reduzia-se o número de participantes”, diz Neisser.

Atualmente, a lei prevê que todos aqueles cujos partidos ou coligações tenham pelo menos cinco parlamentares no Congresso Nacional, somando deputados e senadores, têm o direito de serem convidados pelos veículos de comunicação.

Debate na Band entre candidatos a Prefeitura do Rio, no dia 8 de agosto Foto: @tvbandrio via Youtube

Ter o direito não significa que a pessoa não possa abrir mão do convite. Por outro lado, as emissoras também podem chamar aqueles que possuem mais apelo midiático no momento, mesmo que não tenham o mínimo de parlamentares estabelecido pela legislação. A estrutura e as regras do debate também precisam ser aceitas por no mínimo dois terços dos convidados. Caso contrário, as normas precisam ser alteradas ou o encontro não poderá acontecer. Após assinatura, o pedido de realização do encontro é protocolado por petição à Justiça Eleitoral.

Para Neisser, esses embates são vistos como um momento de risco pela maioria dos candidatos. “Sempre existe uma chance maior de algum escorregão, alguma frase descarada, que vai ser explorada. É natural que as campanhas queiram regras que trazem mais previsibilidade para o debate”, explica o professor.

Em 2024, os embates entre candidatos às prefeituras podem ocorrer até a quinta-feira anterior à eleição, ou seja 3 de outubro, e no caso de um segundo turno, até a sexta-feira anterior ao pleito, 25 do mesmo mês.

O mês de agosto marcou o início dos debates eleitorais para as eleições municipais de 2024. Mas, para chegar ao atual formato e às regras para condução dos programas televisionados, os encontros entre candidatos passaram por uma longa evolução histórica.

Candidatos à Prefeitura de São Paulo no debate promovido por Estadão, portal Terra e Faap no último dia 14 de agosto Foto: Werther Santana/Estadão

Na Antiguidade, as discussões públicas tinham um significado valioso para o desenvolvimento da sociedade e qualificação dos cidadãos. Na Grécia Antiga, os debates ocorriam nas ágoras, nome que pode ser traduzido como “espaço para deliberações ou tomada de decisões”. O local costumava ser o eixo entre a vida social, artística, atlética, espiritual, militar e política das comunidades.

Também foi na Grécia, especificamente em Atenas, entre os séculos V e VI a.C., que foram fundados os primeiros pilares da democracia, com a participação direta dos cidadãos. Ali surgiram as assembleias populares, conselhos e tribunais que debatiam assuntos ligados à pólis (cidade-estado). Ou seja, os debates políticos nasceram com os primórdios das instituições democráticas.

Debates chegam à TV dos EUA

No mundo, o primeiro embate eleitoral público televisionado ocorreu entre o então senador norte-americano John Fitzgerald Kennedy (democrata) e o vice-presidente Richard Nixon (republicano), no dia 26 de setembro de 1960, com transmissão pela CBS (Columbia Broadcasting System) a partir dos estúdios de Chicago, em Illinois, Estados Unidos.

Com moderação do jornalista Howard K. Smith, a dinâmica contou com uma declaração de abertura de oito minutos e uma de encerramento de três minutos para cada candidato, além das indagações dos demais jornalistas presentes. Entre as pautas, estavam política interna, segurança nacional e Guerra Fria.

Atraindo a atenção de mais de 80 milhões de telespectadores, a discussão foi considerada áspera por conta das divergências entre os debatedores. Apesar de os dois candidatos já terem se enfrentado anteriormente de forma remota, o embate frente a frente foi visto como decisivo para a vitória de Kennedy.

Por outro lado, a performance de Nixon, que havia sido hospitalizado alguns dias antes do encontro, dividiu opiniões; aqueles que acompanharam a transmissão pelo rádio, sem as imagens, julgaram que o vice-presidente apresentou uma performance melhor do que o oponente.

Debate presidencial em 1960, o 1º a ser transmitido pela TV dos EUA, entre Richard Nixon (à esq.) e John F. Kennedy Foto: AP

Há quase 50 anos, o 1º debate no Brasil

Por aqui, as discussões públicas entre candidatos a cargos eleitorais nem sempre foram bem vistas. O primeiro debate do qual se tem registro ocorreu no Rio Grande do Sul em 1974 e envolveu os concorrentes ao Senado pelo Estado, Nestor Jost (Arena) e Paulo Brossard (MDB). Realizado no dia 9 de setembro daquele ano, durante a ditadura militar, o encontro foi transmitido pela TV Gaúcha, atual RBS, a partir de Porto Alegre.

A realização do programa preocupava aliados do regime militar. Alguns políticos da situação tentaram impedir a realização do programa, temendo que ele fortalecesse a oposição e expusesse fragilidades do governo.

Na ocasião, o presidente da Arena, senador Petrônio Portela, chegou a se encontrar com o então ministro da Justiça, Armando Falcão, para manifestar seu descontentamento. Para Portela, além de restringir a participação dos demais candidatos, o embate televisionado poderia favorecer aqueles com mais facilidade na oratória.

Em agosto de 1974, porém, o Tribunal Regional Eleitoral autorizou a realização do encontro entre Jost e Brossard. Além disso, o Ministério das Comunicações declarou não ter restrições para o evento.

O primeiro debate eleitoral no Brasil é considerado emblemático porque ocorreu em um contexto de forte repressão política durante o regime militar, no qual a oposição tinha poucas oportunidades de se manifestar publicamente, como explica Juliana Oliveira, cientista política pela USP e pesquisadora do Centro Brasileiro de Análise e Planejamento (Cebrap).

Após o encontro, o desempenho de Brossard foi considerado melhor e ele acabou eleito senador, consolidando a imagem do MDB como uma oposição viável ao regime. O encontro televisionado foi considerado decisivo para a vitória. Dois anos depois da transmissão realizada pela TV Gaúcha, os debates em meios de comunicação foram reprimidas pela ditadura.

A proibição dos debates no País

A Lei Falcão, instituída em 1976 pelo ministro Armando Falcão, limitava a divulgação das candidaturas no rádio e na TV: no modelo então obrigatório, uma locução em off apresentava os políticos, seguida por fotos dos candidatos, nomes, número, partido e um breve currículo (veja no vídeo abaixo).

“A lei foi uma reação ao resultado das eleições de 1974, quando o MDB, partido oposicionista, conquistou 16 das 22 cadeiras em disputa no Senado, aumentou os assentos na Câmara dos Deputados e, nas assembleias estaduais e obteve a maioria em vários Estados”, explica o professor e historiador Marcos Asturian, do Instituto Federal Farroupilha.

Ao limitar drasticamente o tempo e o conteúdo das propagandas eleitorais, impedindo os candidatos de discursarem e expressarem diretamente suas opiniões políticas, a Lei Falcão reduziu a capacidade da oposição de se comunicar com o eleitorado.

A lei não apenas impediu a publicização do posicionamento da oposição, mas também enfraqueceu o processo democrático em si, que depende da livre circulação de informações e do debate público para funcionar de maneira saudável e justa

Juliana Oliveira, cientista política pela USP e pesquisadora do Cebrap

A Lei Falcão permaneceu em vigor durante as eleições municipais de 1976, estaduais de 1978 e municipais e estaduais de 1982. As restrições aos programas eleitorais no Brasil só caíram com o processo de redemocratização, a partir de 1985, quando os debates também voltaram; dali a quatro anos, em 1989, o País faria a primeira eleição presidencial com voto direto após o golpe de 1964.

Para a pesquisadora, a partir da abertura política e da gradual restauração das instituições democráticas, os debates foram restabelecidos como parte essencial do processo eleitoral, permitindo novamente o confronto de ideias e a livre escolha dos eleitores.

Regulamentação

Segundo o TRE-SP, os debates passaram a ser regulamentados pelo menos desde a redemocratização. A Lei 7.773, de 8 de junho de 1989, por exemplo, já previa a realização dos programas. Para o professor de Direito Eleitoral pela FGV Fernando Neisser, as regras brasileiras em torno da discussão entre candidatos e candidatas são bem claras e amarradas, mas podem sofrer alterações de acordo com as articulações políticas.

Neisser explica que desde a Lei Geral das Eleições, instituída em 1997, as regras sofreram variações por meio de minirreformas eleitorais. Já houve momentos em que, por exemplo, os partidos pequenos estavam mais fortes no Congresso Nacional e faziam pressão para que seus candidatos tivessem o direito de participar dos debates.

“A lei já chegou a prever que candidatos de partidos com pelo menos um deputado ou senador tinham o direito de serem convidados para as discussões. Em outros momentos, o mínimo era de dez parlamentares, ou seja, reduzia-se o número de participantes”, diz Neisser.

Atualmente, a lei prevê que todos aqueles cujos partidos ou coligações tenham pelo menos cinco parlamentares no Congresso Nacional, somando deputados e senadores, têm o direito de serem convidados pelos veículos de comunicação.

Debate na Band entre candidatos a Prefeitura do Rio, no dia 8 de agosto Foto: @tvbandrio via Youtube

Ter o direito não significa que a pessoa não possa abrir mão do convite. Por outro lado, as emissoras também podem chamar aqueles que possuem mais apelo midiático no momento, mesmo que não tenham o mínimo de parlamentares estabelecido pela legislação. A estrutura e as regras do debate também precisam ser aceitas por no mínimo dois terços dos convidados. Caso contrário, as normas precisam ser alteradas ou o encontro não poderá acontecer. Após assinatura, o pedido de realização do encontro é protocolado por petição à Justiça Eleitoral.

Para Neisser, esses embates são vistos como um momento de risco pela maioria dos candidatos. “Sempre existe uma chance maior de algum escorregão, alguma frase descarada, que vai ser explorada. É natural que as campanhas queiram regras que trazem mais previsibilidade para o debate”, explica o professor.

Em 2024, os embates entre candidatos às prefeituras podem ocorrer até a quinta-feira anterior à eleição, ou seja 3 de outubro, e no caso de um segundo turno, até a sexta-feira anterior ao pleito, 25 do mesmo mês.

O mês de agosto marcou o início dos debates eleitorais para as eleições municipais de 2024. Mas, para chegar ao atual formato e às regras para condução dos programas televisionados, os encontros entre candidatos passaram por uma longa evolução histórica.

Candidatos à Prefeitura de São Paulo no debate promovido por Estadão, portal Terra e Faap no último dia 14 de agosto Foto: Werther Santana/Estadão

Na Antiguidade, as discussões públicas tinham um significado valioso para o desenvolvimento da sociedade e qualificação dos cidadãos. Na Grécia Antiga, os debates ocorriam nas ágoras, nome que pode ser traduzido como “espaço para deliberações ou tomada de decisões”. O local costumava ser o eixo entre a vida social, artística, atlética, espiritual, militar e política das comunidades.

Também foi na Grécia, especificamente em Atenas, entre os séculos V e VI a.C., que foram fundados os primeiros pilares da democracia, com a participação direta dos cidadãos. Ali surgiram as assembleias populares, conselhos e tribunais que debatiam assuntos ligados à pólis (cidade-estado). Ou seja, os debates políticos nasceram com os primórdios das instituições democráticas.

Debates chegam à TV dos EUA

No mundo, o primeiro embate eleitoral público televisionado ocorreu entre o então senador norte-americano John Fitzgerald Kennedy (democrata) e o vice-presidente Richard Nixon (republicano), no dia 26 de setembro de 1960, com transmissão pela CBS (Columbia Broadcasting System) a partir dos estúdios de Chicago, em Illinois, Estados Unidos.

Com moderação do jornalista Howard K. Smith, a dinâmica contou com uma declaração de abertura de oito minutos e uma de encerramento de três minutos para cada candidato, além das indagações dos demais jornalistas presentes. Entre as pautas, estavam política interna, segurança nacional e Guerra Fria.

Atraindo a atenção de mais de 80 milhões de telespectadores, a discussão foi considerada áspera por conta das divergências entre os debatedores. Apesar de os dois candidatos já terem se enfrentado anteriormente de forma remota, o embate frente a frente foi visto como decisivo para a vitória de Kennedy.

Por outro lado, a performance de Nixon, que havia sido hospitalizado alguns dias antes do encontro, dividiu opiniões; aqueles que acompanharam a transmissão pelo rádio, sem as imagens, julgaram que o vice-presidente apresentou uma performance melhor do que o oponente.

Debate presidencial em 1960, o 1º a ser transmitido pela TV dos EUA, entre Richard Nixon (à esq.) e John F. Kennedy Foto: AP

Há quase 50 anos, o 1º debate no Brasil

Por aqui, as discussões públicas entre candidatos a cargos eleitorais nem sempre foram bem vistas. O primeiro debate do qual se tem registro ocorreu no Rio Grande do Sul em 1974 e envolveu os concorrentes ao Senado pelo Estado, Nestor Jost (Arena) e Paulo Brossard (MDB). Realizado no dia 9 de setembro daquele ano, durante a ditadura militar, o encontro foi transmitido pela TV Gaúcha, atual RBS, a partir de Porto Alegre.

A realização do programa preocupava aliados do regime militar. Alguns políticos da situação tentaram impedir a realização do programa, temendo que ele fortalecesse a oposição e expusesse fragilidades do governo.

Na ocasião, o presidente da Arena, senador Petrônio Portela, chegou a se encontrar com o então ministro da Justiça, Armando Falcão, para manifestar seu descontentamento. Para Portela, além de restringir a participação dos demais candidatos, o embate televisionado poderia favorecer aqueles com mais facilidade na oratória.

Em agosto de 1974, porém, o Tribunal Regional Eleitoral autorizou a realização do encontro entre Jost e Brossard. Além disso, o Ministério das Comunicações declarou não ter restrições para o evento.

O primeiro debate eleitoral no Brasil é considerado emblemático porque ocorreu em um contexto de forte repressão política durante o regime militar, no qual a oposição tinha poucas oportunidades de se manifestar publicamente, como explica Juliana Oliveira, cientista política pela USP e pesquisadora do Centro Brasileiro de Análise e Planejamento (Cebrap).

Após o encontro, o desempenho de Brossard foi considerado melhor e ele acabou eleito senador, consolidando a imagem do MDB como uma oposição viável ao regime. O encontro televisionado foi considerado decisivo para a vitória. Dois anos depois da transmissão realizada pela TV Gaúcha, os debates em meios de comunicação foram reprimidas pela ditadura.

A proibição dos debates no País

A Lei Falcão, instituída em 1976 pelo ministro Armando Falcão, limitava a divulgação das candidaturas no rádio e na TV: no modelo então obrigatório, uma locução em off apresentava os políticos, seguida por fotos dos candidatos, nomes, número, partido e um breve currículo (veja no vídeo abaixo).

“A lei foi uma reação ao resultado das eleições de 1974, quando o MDB, partido oposicionista, conquistou 16 das 22 cadeiras em disputa no Senado, aumentou os assentos na Câmara dos Deputados e, nas assembleias estaduais e obteve a maioria em vários Estados”, explica o professor e historiador Marcos Asturian, do Instituto Federal Farroupilha.

Ao limitar drasticamente o tempo e o conteúdo das propagandas eleitorais, impedindo os candidatos de discursarem e expressarem diretamente suas opiniões políticas, a Lei Falcão reduziu a capacidade da oposição de se comunicar com o eleitorado.

A lei não apenas impediu a publicização do posicionamento da oposição, mas também enfraqueceu o processo democrático em si, que depende da livre circulação de informações e do debate público para funcionar de maneira saudável e justa

Juliana Oliveira, cientista política pela USP e pesquisadora do Cebrap

A Lei Falcão permaneceu em vigor durante as eleições municipais de 1976, estaduais de 1978 e municipais e estaduais de 1982. As restrições aos programas eleitorais no Brasil só caíram com o processo de redemocratização, a partir de 1985, quando os debates também voltaram; dali a quatro anos, em 1989, o País faria a primeira eleição presidencial com voto direto após o golpe de 1964.

Para a pesquisadora, a partir da abertura política e da gradual restauração das instituições democráticas, os debates foram restabelecidos como parte essencial do processo eleitoral, permitindo novamente o confronto de ideias e a livre escolha dos eleitores.

Regulamentação

Segundo o TRE-SP, os debates passaram a ser regulamentados pelo menos desde a redemocratização. A Lei 7.773, de 8 de junho de 1989, por exemplo, já previa a realização dos programas. Para o professor de Direito Eleitoral pela FGV Fernando Neisser, as regras brasileiras em torno da discussão entre candidatos e candidatas são bem claras e amarradas, mas podem sofrer alterações de acordo com as articulações políticas.

Neisser explica que desde a Lei Geral das Eleições, instituída em 1997, as regras sofreram variações por meio de minirreformas eleitorais. Já houve momentos em que, por exemplo, os partidos pequenos estavam mais fortes no Congresso Nacional e faziam pressão para que seus candidatos tivessem o direito de participar dos debates.

“A lei já chegou a prever que candidatos de partidos com pelo menos um deputado ou senador tinham o direito de serem convidados para as discussões. Em outros momentos, o mínimo era de dez parlamentares, ou seja, reduzia-se o número de participantes”, diz Neisser.

Atualmente, a lei prevê que todos aqueles cujos partidos ou coligações tenham pelo menos cinco parlamentares no Congresso Nacional, somando deputados e senadores, têm o direito de serem convidados pelos veículos de comunicação.

Debate na Band entre candidatos a Prefeitura do Rio, no dia 8 de agosto Foto: @tvbandrio via Youtube

Ter o direito não significa que a pessoa não possa abrir mão do convite. Por outro lado, as emissoras também podem chamar aqueles que possuem mais apelo midiático no momento, mesmo que não tenham o mínimo de parlamentares estabelecido pela legislação. A estrutura e as regras do debate também precisam ser aceitas por no mínimo dois terços dos convidados. Caso contrário, as normas precisam ser alteradas ou o encontro não poderá acontecer. Após assinatura, o pedido de realização do encontro é protocolado por petição à Justiça Eleitoral.

Para Neisser, esses embates são vistos como um momento de risco pela maioria dos candidatos. “Sempre existe uma chance maior de algum escorregão, alguma frase descarada, que vai ser explorada. É natural que as campanhas queiram regras que trazem mais previsibilidade para o debate”, explica o professor.

Em 2024, os embates entre candidatos às prefeituras podem ocorrer até a quinta-feira anterior à eleição, ou seja 3 de outubro, e no caso de um segundo turno, até a sexta-feira anterior ao pleito, 25 do mesmo mês.

O mês de agosto marcou o início dos debates eleitorais para as eleições municipais de 2024. Mas, para chegar ao atual formato e às regras para condução dos programas televisionados, os encontros entre candidatos passaram por uma longa evolução histórica.

Candidatos à Prefeitura de São Paulo no debate promovido por Estadão, portal Terra e Faap no último dia 14 de agosto Foto: Werther Santana/Estadão

Na Antiguidade, as discussões públicas tinham um significado valioso para o desenvolvimento da sociedade e qualificação dos cidadãos. Na Grécia Antiga, os debates ocorriam nas ágoras, nome que pode ser traduzido como “espaço para deliberações ou tomada de decisões”. O local costumava ser o eixo entre a vida social, artística, atlética, espiritual, militar e política das comunidades.

Também foi na Grécia, especificamente em Atenas, entre os séculos V e VI a.C., que foram fundados os primeiros pilares da democracia, com a participação direta dos cidadãos. Ali surgiram as assembleias populares, conselhos e tribunais que debatiam assuntos ligados à pólis (cidade-estado). Ou seja, os debates políticos nasceram com os primórdios das instituições democráticas.

Debates chegam à TV dos EUA

No mundo, o primeiro embate eleitoral público televisionado ocorreu entre o então senador norte-americano John Fitzgerald Kennedy (democrata) e o vice-presidente Richard Nixon (republicano), no dia 26 de setembro de 1960, com transmissão pela CBS (Columbia Broadcasting System) a partir dos estúdios de Chicago, em Illinois, Estados Unidos.

Com moderação do jornalista Howard K. Smith, a dinâmica contou com uma declaração de abertura de oito minutos e uma de encerramento de três minutos para cada candidato, além das indagações dos demais jornalistas presentes. Entre as pautas, estavam política interna, segurança nacional e Guerra Fria.

Atraindo a atenção de mais de 80 milhões de telespectadores, a discussão foi considerada áspera por conta das divergências entre os debatedores. Apesar de os dois candidatos já terem se enfrentado anteriormente de forma remota, o embate frente a frente foi visto como decisivo para a vitória de Kennedy.

Por outro lado, a performance de Nixon, que havia sido hospitalizado alguns dias antes do encontro, dividiu opiniões; aqueles que acompanharam a transmissão pelo rádio, sem as imagens, julgaram que o vice-presidente apresentou uma performance melhor do que o oponente.

Debate presidencial em 1960, o 1º a ser transmitido pela TV dos EUA, entre Richard Nixon (à esq.) e John F. Kennedy Foto: AP

Há quase 50 anos, o 1º debate no Brasil

Por aqui, as discussões públicas entre candidatos a cargos eleitorais nem sempre foram bem vistas. O primeiro debate do qual se tem registro ocorreu no Rio Grande do Sul em 1974 e envolveu os concorrentes ao Senado pelo Estado, Nestor Jost (Arena) e Paulo Brossard (MDB). Realizado no dia 9 de setembro daquele ano, durante a ditadura militar, o encontro foi transmitido pela TV Gaúcha, atual RBS, a partir de Porto Alegre.

A realização do programa preocupava aliados do regime militar. Alguns políticos da situação tentaram impedir a realização do programa, temendo que ele fortalecesse a oposição e expusesse fragilidades do governo.

Na ocasião, o presidente da Arena, senador Petrônio Portela, chegou a se encontrar com o então ministro da Justiça, Armando Falcão, para manifestar seu descontentamento. Para Portela, além de restringir a participação dos demais candidatos, o embate televisionado poderia favorecer aqueles com mais facilidade na oratória.

Em agosto de 1974, porém, o Tribunal Regional Eleitoral autorizou a realização do encontro entre Jost e Brossard. Além disso, o Ministério das Comunicações declarou não ter restrições para o evento.

O primeiro debate eleitoral no Brasil é considerado emblemático porque ocorreu em um contexto de forte repressão política durante o regime militar, no qual a oposição tinha poucas oportunidades de se manifestar publicamente, como explica Juliana Oliveira, cientista política pela USP e pesquisadora do Centro Brasileiro de Análise e Planejamento (Cebrap).

Após o encontro, o desempenho de Brossard foi considerado melhor e ele acabou eleito senador, consolidando a imagem do MDB como uma oposição viável ao regime. O encontro televisionado foi considerado decisivo para a vitória. Dois anos depois da transmissão realizada pela TV Gaúcha, os debates em meios de comunicação foram reprimidas pela ditadura.

A proibição dos debates no País

A Lei Falcão, instituída em 1976 pelo ministro Armando Falcão, limitava a divulgação das candidaturas no rádio e na TV: no modelo então obrigatório, uma locução em off apresentava os políticos, seguida por fotos dos candidatos, nomes, número, partido e um breve currículo (veja no vídeo abaixo).

“A lei foi uma reação ao resultado das eleições de 1974, quando o MDB, partido oposicionista, conquistou 16 das 22 cadeiras em disputa no Senado, aumentou os assentos na Câmara dos Deputados e, nas assembleias estaduais e obteve a maioria em vários Estados”, explica o professor e historiador Marcos Asturian, do Instituto Federal Farroupilha.

Ao limitar drasticamente o tempo e o conteúdo das propagandas eleitorais, impedindo os candidatos de discursarem e expressarem diretamente suas opiniões políticas, a Lei Falcão reduziu a capacidade da oposição de se comunicar com o eleitorado.

A lei não apenas impediu a publicização do posicionamento da oposição, mas também enfraqueceu o processo democrático em si, que depende da livre circulação de informações e do debate público para funcionar de maneira saudável e justa

Juliana Oliveira, cientista política pela USP e pesquisadora do Cebrap

A Lei Falcão permaneceu em vigor durante as eleições municipais de 1976, estaduais de 1978 e municipais e estaduais de 1982. As restrições aos programas eleitorais no Brasil só caíram com o processo de redemocratização, a partir de 1985, quando os debates também voltaram; dali a quatro anos, em 1989, o País faria a primeira eleição presidencial com voto direto após o golpe de 1964.

Para a pesquisadora, a partir da abertura política e da gradual restauração das instituições democráticas, os debates foram restabelecidos como parte essencial do processo eleitoral, permitindo novamente o confronto de ideias e a livre escolha dos eleitores.

Regulamentação

Segundo o TRE-SP, os debates passaram a ser regulamentados pelo menos desde a redemocratização. A Lei 7.773, de 8 de junho de 1989, por exemplo, já previa a realização dos programas. Para o professor de Direito Eleitoral pela FGV Fernando Neisser, as regras brasileiras em torno da discussão entre candidatos e candidatas são bem claras e amarradas, mas podem sofrer alterações de acordo com as articulações políticas.

Neisser explica que desde a Lei Geral das Eleições, instituída em 1997, as regras sofreram variações por meio de minirreformas eleitorais. Já houve momentos em que, por exemplo, os partidos pequenos estavam mais fortes no Congresso Nacional e faziam pressão para que seus candidatos tivessem o direito de participar dos debates.

“A lei já chegou a prever que candidatos de partidos com pelo menos um deputado ou senador tinham o direito de serem convidados para as discussões. Em outros momentos, o mínimo era de dez parlamentares, ou seja, reduzia-se o número de participantes”, diz Neisser.

Atualmente, a lei prevê que todos aqueles cujos partidos ou coligações tenham pelo menos cinco parlamentares no Congresso Nacional, somando deputados e senadores, têm o direito de serem convidados pelos veículos de comunicação.

Debate na Band entre candidatos a Prefeitura do Rio, no dia 8 de agosto Foto: @tvbandrio via Youtube

Ter o direito não significa que a pessoa não possa abrir mão do convite. Por outro lado, as emissoras também podem chamar aqueles que possuem mais apelo midiático no momento, mesmo que não tenham o mínimo de parlamentares estabelecido pela legislação. A estrutura e as regras do debate também precisam ser aceitas por no mínimo dois terços dos convidados. Caso contrário, as normas precisam ser alteradas ou o encontro não poderá acontecer. Após assinatura, o pedido de realização do encontro é protocolado por petição à Justiça Eleitoral.

Para Neisser, esses embates são vistos como um momento de risco pela maioria dos candidatos. “Sempre existe uma chance maior de algum escorregão, alguma frase descarada, que vai ser explorada. É natural que as campanhas queiram regras que trazem mais previsibilidade para o debate”, explica o professor.

Em 2024, os embates entre candidatos às prefeituras podem ocorrer até a quinta-feira anterior à eleição, ou seja 3 de outubro, e no caso de um segundo turno, até a sexta-feira anterior ao pleito, 25 do mesmo mês.

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