RIO - Depois de o Superior Tribunal de Justiça (STJ) se debruçar sobre os recursos apresentados pelo senador Flávio Bolsonaro (Republicanos-RJ) e seu ex-assessor Fabrício Queiroz, a investigação passou a ter no Supremo Tribunal Federal (STF) o principal foro que definirá seu futuro. A defesa de ambos já informou que vai recorrer da decisão da Quinta Turma do STJ no STF.
Enquanto o Supremo não retoma a análise do caso, a denúncia contra o parlamentar e seu suposto operador no esquema das “rachadinhas” segue em tramitação no Órgão Especial do Tribunal de Justiça do Rio, onde está sob avaliação desde novembro do ano passado.
Flávio, Queiroz e outras 15 pessoas foram denunciadas pelo Ministério Público do Rio pelos crimes de peculato, lavagem de dinheiro, organização criminosa e apropriação indébita. O ex-assessor, apontado como operador do esquema, conseguiu, nesta terça, 16, reverter sua prisão preventiva. Já o senador obteve uma vitória no STJ, no fim de fevereiro, que anulou a primeira quebra de sigilos bancário e fiscal no âmbito da investigação, autorizada em abril de 2019.
Se o MP precisasse resolver hoje a situação, como se não houvesse recursos pendentes no STF, todo o processo passaria pelo Órgão Especial do TJ fluminense. Primeiro, porque Flávio já havia conseguido tirar o processo do juiz Flávio Itabaiana, da 27ª Vara Criminal. E, agora, também por que o colegiado precisaria validar aquela quebra de sigilos fiscal e bancário autorizada por Itabaiana e derrubada pela Quinta Turma do STJ, que considerou a quebra mal fundamentada.
Etapa-chave da investigação que viria a culminar na denúncia, a quebra de sigilos que atingiu quase 100 pessoas físicas e jurídicas teve seus efeitos suspensos. Ou seja, as provas obtidas ali, essenciais para esmiuçar o esquema das “rachadinhas” a partir de dados bancários, não podem ser usadas. Como tais dados estão citados na denúncia, a peça acusatória perde sua força no atual cenário.
Em meio a esse contexto é que se destaca a importância do STF na história. Antes de tudo, por causa do foro. Uma reclamação apresentada pelo MP contra a decisão da Justiça do Rio que deu a Flávio o direito a ser julgado na segunda instância está nas mãos do ministro Gilmar Mendes, mas ainda não foi analisada. Se a Corte concordar com o argumento da Promotoria, o processo volta para o juiz Itabaiana, amplamente questionado pelas defesas de Flávio e Queiroz.
Outro poder do Supremo diz respeito, agora, à decisão do STJ que anulou a quebra de sigilo. A Procuradoria-Geral da República recorreu pedindo que aquela medida cautelar volte a ser validada, liberando os dados apurados na quebra.
Considerando que o STJ analisou quatro recursos envolvendo o caso - três de Flávio e um de Queiroz -, o resultado foi de empate entre acusação e defesa. Enquanto anulou a quebra de sigilo e revogou a prisão preventiva de Queiroz e sua mulher - acusados de obstruir as investigações -, a Quinta Turma da Corte manteve ativos dois pontos importantes. São eles os relatórios do antigo Coaf que deram início às apurações e a competência legal do juiz Itabaiana para dar decisões nos últimos anos, antes de Flávio conseguir o foro especial.
Se anulasse a validade dos relatórios, considerados pela defesa uma espécie de quebra de sigilo ilegal antes da autorização do juiz, o STJ praticamente mataria todo o trabalho investigativo. Agora, o entendimento é o de que decisões do STF podem fazer o caso voltar ao rumo original, o que também poderia acontecer via Órgão Especial, caso o Supremo discorde do MP e da PGR.
Com vários recursos nas diferentes instâncias, os acusados têm cumprido com sucesso a estratégia de ganhar tempo e embolar a investigação, que tem longo histórico de paralisações. Acredita-se que as supostas falhas processuais são a única esperança de derrotar uma apuração cujo mérito conta com provas robustas, incluindo a confissão de uma ex-assessora de Flávio.
Além da denúncia já apresentada, o MP ainda tem desdobramentos para tocar. O principal versa sobre a suposta lavagem de dinheiro por meio de uma loja de chocolates no Rio. Atualmente, cabe à Procuradoria-Geral de Justiça, a chefia do MP fluminense, investigar o senador. Entenda as principais pendências sobre o caso:
Quem julgará a denúncia?
A peça está no Órgão Especial do TJ do Rio. Há, no entanto, uma reclamação do MP no STF, pedindo o retorno do caso à primeira instância, ao juiz Flávio Itabaiana Nicolau, anteriormente o magistrado natural da causa. O pedido está nas mãos do ministro Gilmar Mendes.
As provas da quebra de sigilo estão valendo?
A situação, no momento, é confusa. Como a Quinta Turma do STJ anulou a quebra de sigilos bancário e fiscal autorizada por Itabaiana em abril de 2019 por considerá-la mal fundamentada, o MP precisaria buscar no Órgão Especial uma espécie de revalidação das provas. Há, no entanto, recurso no STF que pede a revogação da decisão do STJ.
O que segue valendo?
O STJ discordou de dois recursos de Flávio. Num dos casos, manteve válido o relatório do Coaf que deu início à apuração do MP; no outro, confirmou que o juiz Itabaiana tinha competência legal de dar decisões no âmbito do caso, antes do senador conseguir foro especial.
O que o STF vai decidir?
O Supremo tem papel central para dois pontos da investigação. Um deles é o foro de Flávio, que pode voltar à primeira instância ou continuar na segunda. O outro é a anulação pelo STJ da quebra de sigilo, que pode ser revertida pelo STF após recurso apresentado pela PGR.
E o Queiroz?
O STJ entendeu que a prisão preventiva de Fabrício Queiroz e sua mulher havia passado do prazo legal. Eles foram presos em junho do ano passado por atrapalhar as investigações, mas já estão em prisão domiciliar atualmente. Agora, a domiciliar será revogada e substituída por outras medidas cautelares. Isso não muda nada em relação à denúncia que chegou ao Órgão Especial.