Com a justificativa de que “uma pitada de religiosidade, de cristianismo, dentro do Supremo (Tribunal Federal), é bem-vinda”, o presidente Jair Bolsonaro confirmou ontem que pretende indicar o advogado-geral da União, André Mendonça, para a Corte, no lugar do ministro Marco Aurélio Mello, que vai se aposentar na próxima segunda-feira, 12. A nomeação de Mendonça precisa ser referendada pelo Senado.
Em entrevista à Rádio Guaíba, o presidente disse que Mendonça é o nome ideal para a Corte. Desde o ano passado, Bolsonaro tem prometido nomear alguém “terrivelmente evangélico” para o Supremo, mas, em novembro do ano passado, o presidente indicou Kassio Nunes Marques, que é católico, para a vaga aberta após a aposentadoria do ministro Celso de Mello.
Mendonça é pastor da Igreja Presbiteriana Esperança, localizada em Brasília. “Além de ser evangélico – ele é evangélico, mas não quer dizer que seja uma virtude; é um direito dele acreditar na Bíblia –, Mendonça tem notável saber jurídico. É uma pessoa humilde”, disse Bolsonaro na entrevista.
Ex-ministro da Justiça e da Segurança Pública, Mendonça acumulou desgastes com o Congresso e o Judiciário ao requisitar à Polícia Federal (PF) a abertura de uma série inquéritos contra adversários de Bolsonaro com base na Lei de Segurança Nacional (LSN), considerada por parlamentares um “entulho” da ditadura. As ações de Mendonça, feitas por ordem de Bolsonaro, têm sofrido reveses no Ministério Público e em tribunais onde são julgados.
Nos últimos meses, Mendonça se encontrou com diversos senadores para diminuir a resistência a seu nome na Casa, conforme relatou o Estadão. O indicado de Bolsonaro precisa de ao menos 41 votos no Senado.
Confiante da aprovação da indicação de Mendonça, Bolsonaro propôs, na entrevista de ontem, que, com o ingresso do advogado-geral da União na Corte, as sessões do Supremo deveriam incluir agora ritos religiosos. “É bom que uma vez por semana, nessas sessões que são abertas no STF, (os ministros) começassem com uma oração do André (Mendonça)”, disse.
Presidente diz que pode ‘não aceitar’ resultado da eleição
Em seguida, o presidente voltou a atacar Luís Roberto Barroso, com quem tem tido embates por causa do posicionamento do ministro, que é presidente do Tribunal Superior Eleitoral (TSE), contrário à implantação do voto impresso nas próximas eleições, uma das bandeiras de Bolsonaro.
“Porque, quando se olha para o Barroso, dado o que ele defende e as coisas que não encontram amparo nenhum no livro preto que é a nossa Bíblia, esse cara não acredita em Deus. Não quero fazer prejulgamento dele, mas não acredita em nada”, afirmou Bolsonaro. Na mesma entrevista, o presidente voltou a colocar em dúvida o resultado das eleições, caso não seja implantado o voto impresso nas eleições do ano que vem (mais informações nesta página).
O presidente Jair Bolsonaro disse que se não houver a aprovação do voto impresso para as eleições do ano que vem “algum lado pode não aceitar o resultado”. “Esse, obviamente, é o nosso lado”, disse ele em entrevista à Rádio Guaíba.
O presidente acusou o ministro Luís Roberto Barroso, presidente do TSE, de articular com o Congresso a rejeição do projeto que trata do tema. A votação da proposta estava prevista para hoje, mas foi adiada para o próximo dia 15, na Comissão da Câmara sobre o assunto.
“Não podem botar em votação (agora) porque vão perder, por causa da interferência do ministro Barroso. Um péssimo ministro”, criticou. Bolsonaro disse que, se o voto impresso – chamado por ele de “auditável” – não for aprovado, haverá problemas. “A democracia está ameaçada por alguns de toga, que perderam a noção de até onde vão seus direitos e deveres”. Procurado, Barroso não comentou.
André Luiz de Almeida Mendonça tem 48 anos, é casado e tem um casal de filhos. Se sua indicação for aprovada no Senado, ele poderá exercer a função de ministro do Supremo por aproximadamente 27 anos, até completar a idade-limite para a aposentadoria compulsória.
Nascido em Santos (SP), foi criado numa família religiosa e viveu em diferentes cidades do Estado, inclusive Miracatu, reduto da família presidencial. O pai era funcionário do Banespa.
Antes de ingressar na AGU, via concurso, foi advogado da Petrobrás Distribuidora entre 1997 e 2000. Em instituições privadas, cursou Direito em Bauru (SP) e Teologia, em Londrina (PR). Fez pós-graduação em Direito Público na Universidade de Brasília (UnB), mestrado e doutorado na Universidade de Salamanca, na Espanha.
‘Não gastamos um centavo com a vacina’
Alvo de inquérito aberto no rastro da CPI da Covid, o presidente Jair Bolsonaro disse ontem, em entrevista à Rádio Guaíba, que a comissão quer apenas desgastar o seu governo – e minimizou denúncias de cobrança de propina e outras irregularidades nas negociações para compra da vacina indiana Covaxin.
“Me acusam de ato favorável à corrupção, (mas) não gastamos um centavo sequer com a vacina e não recebemos uma ampola sequer”, declarou. “Tentam de toda maneira nos levar para o pântano em que vivia, em especial, o PT num passado bem próximo.”
Embora o Estadão tenha mostrado, em uma série de reportagens, que o governo montou um orçamento secreto por meio de emendas de relator, com o objetivo de garantir votos na eleição para o comando da Câmara e do Senado, em fevereiro, e manter a base aliada no Congresso, Bolsonaro disse que sua gestão não usa recursos públicos para comprar apoio e, mais uma vez, apontou o dedo para o PT.
Na segunda-feira, Bolsonaro cobrou da CPI que ouça o líder do governo na Câmara, Ricardo Barros (Progressistas-PR). Personagem central da comissão desde que o deputado Luis Miranda (DEM-DF) disse aos senadores que o próprio Bolsonaro atribuiu irregularidades na compra da vacina indiana Covaxin a um “rolo” de Barros, o líder do governo teve o depoimento adiado. Alvo de inquérito por prevaricação no caso Covaxin, Bolsonaro afirmou que a CPI é uma comissão marcada por um “jogo de poder” de gente “idiota” e não serve para nada. “Olha aqui, o Ricardo Barros quer falar. A CPI não quer mais ouvir ele (sic). Deixa ele falar! Estão acusando que ele fez algo de errado, deixa ele depor na CPI. Interessa ouvir (só) o que interessa para eles”, disse.