BELO HORIZONTE - A máxima de que os candidatos à Presidência que vencem em Minas Gerais são eleitos naquele ano encontra paralelo nos fatos. Desde a República Velha, todos os candidatos que ganharam a disputa no Estado triunfaram também o pleito nacional. A exceção que confirma a “regra” é a eleição de 1950, quando Getúlio Vargas perdeu em Minas mas foi eleito presidente.
Segundo cientistas políticos consultados pelo Estadão, Minas é fundamental na eleição presidencial não só por ser o segundo maior colégio eleitoral do País, com 15,9 milhões de eleitores – atrás apenas de São Paulo, que tem 33, 1 milhões de votantes –, mas por ser uma de síntese do Brasil. É uma espécie de microcosmo do País, que espelha características de outros Estados e acaba reproduzindo internamente os votos gerais dos brasileiros.
Agregador de pesquisas do Estadão
O professor da Faculdade de Direito da Universidade de São Paulo (USP) e especialista em direito eleitoral, Antônio Carlos Freitas Júnior, avalia que Minas Gerais é o “Estado que melhor espelha as eleições” no Brasil.
“Minas Gerais em toda sua diversidade contando com uma megalópole de capital e regiões interioranas de diferentes características apresenta representatividade suficiente de uma espécie de inconsciente coletivo brasileiro, reverberando as opiniões públicas em diferentes segmentos econômicos e sociais servindo, assim, de interessante termômetro para a atuação política e ideológica em todo o Brasil”, afirma Freitas.
Na eleição de 2018, por exemplo, o então candidato do PSL Jair Bolsonaro obteve 58% (6.100.107) dos votos válidos em Minas, enquanto seu principal concorrente, Fernando Haddad (PT), ficou com 41% (4.382.952). Naquele ano, Bolsonaro se elegeu presidente no segundo turno com 53% dos votos no País (57.797.847), e Haddad obteve 44% (47.040.906).
No pleito anterior, em 2014, o resultado em Minas espelhou a eleição nacional não só nos números finais, mas também no porcentual dado aos candidatos no segundo turno. Naquele ano, dois mineiros protagonizaram a disputa.
A então presidente da República e candidata à reeleição, Dilma Rousseff (PT), obteve 52,41% dos votos válidos dos mineiros, enquanto o deputado Aécio Neves teve 47,59%. Naquele ano, Dilma se reelegeu com 51,64% dos votos válidos no País, enquanto Aécio obteve 48,36%. Até em números absolutos a diferença entre Dilma e Aécio foi parecida, No Brasil foi de 3.459.963 votos, e em Minas, de 345.963.
Na primeira eleição de Dilma, em 2010, ela venceu o hoje senador José Serra (PSDB) por 58,45% dos votos válidos a 41,55%. Na contagem de votos em todo o País, a então candidata petista ficou com 56%, e o tucano com 43,9%.
No segundo turno da eleição de 2006, o então presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) venceu Geraldo Alckmin, do PSDB – hoje no PSB e seu pré-candidato a vice – por 60% a 39%. Em Minas, o resultado foi 65% a 34%.
Eleitorado
“A robustez e as características próprias do eleitorado mineiro fazem com que o Estado mantenha um protagonismo eleitoral nas eleições presidenciais”, disse o cientista político, Marco Antônio Teixeira, professor da Escola de Administração de Empresas de São Paulo da Fundação Getúlio Vargas (FGV-EAESP).
“Isso por causa não só do tamanho do eleitorado, mas pela sua geografia, por estar no centro do País, e ter fronteiras com diversos Estados, recebendo a influência de outras regiões, e com isso espelhando o quadro eleitoral brasileiro.” Teixeira lembra que Minas é o segundo Estado mais populoso do Brasil e tem influência dos vizinhos, como Mato Grosso do Sul, Goiás, São Paulo, Rio de Janeiro, Espírito Santo e Bahia. “Minas Gerais é uma síntese do Brasil”, reforça.
Marco Antonio Teixeira Cientista, político e professor da Fundação Getulio Vargas (FGV-EAESP)
Para o professor, o sul de Minas, que é uma região mais rica e próxima a São Paulo, tende a votar de maneira semelhante aos paulistas. Já o norte do Estado e o Vale do Jequitinhonha, que é uma região do semiárido próxima à Bahia, têm o mesmo comportamento eleitoral de algumas partes do Nordeste. O Triângulo Mineiro, por sua vez, que é uma região mais rica do agronegócio, tem um eleitorado mais típico dos Estados do Centro-Oeste. É como se o Estado fosse uma “versão reduzida” de um conjunto de regiões nacionais.
Vargas
A única exceção à máxima de que a eleição presidencial em Minas espelha a votação em nível nacional, em 12 disputas presidenciais desde a República Velha, foi na disputa de 1950. Naquele ano, o gaúcho Getúlio Vargas (PTB) perdeu em Minas Gerais para o brigadeiro Eduardo Gomes, da UDN, por uma pequena margem.
Há 72 anos, os mineiros depositaram nas urnas 441.690 votos (34,8% do total de votos válidos) para o brigadeiro, frente aos 418.194 (32,9%) de Vargas. O candidato gaúcho, no entanto, venceu Gomes por 48,7% ante 26%, e foi eleito presidente.
O Tribunal Superior Eleitoral (TSE) não tem o registro dos resultados das eleições presidenciais nos Estados nos pleitos anteriores ao de 1930. Segundo a assessoria da Corte eleitoral, como se trata de documentos antigos, que eram registrados em meio físico, muitos deles se perderam ao longo do tempo.
Cristiano Rodrigues, Professor do departamento de Ciências Políticas da UFMG
“Minas Gerais é um Estado demograficamente muito diverso e as suas regiões representam as regiões do Brasil”, afirmou o professor do Departamento de Ciências Políticas da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG), Cristiano Rodrigues. “Minas Gerais é uma versão reduzida do que são as regiões brasileiras. Por isso que o Estado é tão importante nas eleições presidenciais. O humor do eleitor mineiro vai se inclinando para um candidato ou outro”, disse.
Rodrigues faz a mesma avaliação que o professor Marco Antônio Teixeira sobre a importância das regiões vizinhas e seu entorno para a formação do voto dos mineiros. “O eleitor do Sul de Minas Gerais tem um comportamento muito parecido com o eleitor do interior de São Paulo”, disse.
“No Norte do Estado, Vale do Jequitinhonha e semiárido mineiro, tanto do ponto de vista climático quanto de sua população, se assemelha muito com o Nordeste e esse eleitorado tende a se comportar como o eleitorado da região. O Triângulo Mineiro, por sua vez, que tem agricultura e pecuária muito forte, tem também um eleitorado com um comportamento muito parecido com o comportamento dos eleitores dos Estados do Centro-Oeste”, completou o professor da UFMG.
Articulações
Segundo Cristiano Rodrigues, outro fator no atual quadro eleitoral brasileiro que mostra a relevância do eleitorado mineiro na disputa presidencial é a importância que os dois principais candidatos à Presidência nas eleições deste ano estão dando às articulações no Estado.
O ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT), que lidera as pesquisas de intenções de votos, já esteve em Minas ao menos duas vezes nos últimos 30 dias e fechou aliança com o ex-prefeito de Belo Horizonte Alexandre Kalil (PSD).
Já o presidente Jair Bolsonaro, que visitou o Estado em maio, tem uma aliança “tácita” com o governador Romeu Zema (Novo), que pretende tentar um novo mandato. Embora não tenha declarado apoio à reeleição do presidente – uma vez que seu partido tem o cientista político Luiz Felipe d’Avila como pré-candidato à Presidência – Zema é identificado pelos eleitores mineiros como aliado de Bolsonaro.
Rodrigues vê vantagem na aproximação entre os presidenciáveis e os pré-candidatos ao governo mineiro. “A articulação que se dá no momento entre candidatos fortes (Lula e Bolsonaro) à Presidência com candidatos também fortes (Kalil e Zema) ao governo estadual faz com que o eleitor passe a conhecer os candidatos a governador a partir da força que o candidato a presidente tem. E vice-e-versa. Essa situação faz com o eleitorado mineiro tenha também grande importância no resultado do pleito devido a esse aspecto.”
Polarização nacional deve marcar disputa no Estado
A comparação entre os números de duas pesquisas de intenção de votos para presidente, em nível nacional e em Minas Gerais, divulgadas pela Genial/Quaest em maio seguem a máxima de que o Estado reflete o humor do eleitor brasileiro.
Segundo o levantamento, o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) lidera a disputa presidencial com 46% das intenções de votos, enquanto o presidente Jair Bolsonaro segue em segundo com 29%. Os demais pré-candidatos à Presidência somam 14%, segundo este levantamento.
Em Minas, a pesquisa feita pelo mesmo instituto, também em maio, aponta que 44% dos mineiros têm intenção de votar em Lula, enquanto 28% dos entrevistados disseram que votam em Bolsonaro. A soma dos demais pré-candidatos alcança 11% em Minas.
Na disputa pelo governo do Estado, a pesquisa Genial/Quaest apontou, em maio, que o governador Romeu Zema (Novo) lidera com 41% das intenções de votos, seguido do ex-prefeito de Belo Horizonte, Alexandre Kalil (PSD), com 30%. Os números se referem à pesquisa estimulada, quando o eleitor é instigado a escolher um nome numa lista apresentada pelo pesquisador.
A pesquisa espontânea – quando o eleitor é perguntado em quem votaria, sem lista de nomes previamente estabelecida –, no entanto, sinaliza que a disputa está longe de estar definida. Neste quesito, apenas 10% dos eleitores demonstraram intenção de votar em Romeu Zema, enquanto 5% afirmaram votar em Kalil.
Sem uma lista prévia, nada menos que 82% dos eleitores mineiros afirmaram que ainda não escolheram seu candidato a governador.