Ele esperou Serra por 1 ano, pintou retrato em 10 dias e foi condenado a devolver parte do dinheiro


Apenas Gregório Gruber foi condenado por superfaturamento em serviço feito ao governo de São Paulo, em ação que chegou a ter o vice-presidente Geraldo Alckmin, governador à época, citado

Por Pedro Augusto Figueiredo
Atualização:

A Justiça e o Ministério Público de São Paulo (MP-SP) não encontraram irregularidades na atuação dos agentes públicos que contrataram Gregório Gruber para pintar um retrato do ex-governador José Serra em 2018, obra exposta na galeria dos ex-governadores no Palácio dos Bandeirantes. Mas o pintor foi condenado a devolver R$ 49 mil, parte dos R$ 85 mil que recebeu, aos cofres públicos. A 2ª Câmara de Direito Público do Tribunal de Justiça de São Paulo confirmou no último dia 5 de março a decisão de primeira instância que apontou superfaturamento e determinou a anulação parcial do contrato, em uma história que inclui meses de espera pelo “modelo” da fotografia e uma obra realizada em 10 dias.

O único agente público citado na ação foi o então governador e atual vice-presidente da República, Geraldo Alckmin (PSB). Ele foi absolvido na primeira e na segunda instância e mesmo a acusação reconheceu, ao final, que não havia provas que comprovassem o dolo ou o envolvimento dele na contratação superfaturada. Serra foi procurado por meio da assessoria de imprensa, mas não se posicionou.

O contrato foi assinado pelo Centro de Suprimentos e Apoio à Gestão de Contratos da Secretaria de Governo. A pasta era comandada por Saulo de Castro Filho. A reportagem não conseguiu localizá-lo. A decisão judicial afirma que, com exceção do superfaturamento, a contratação “aparenta ter se dado nos termos legais”. Já o MP-SP considera que não foi demonstrado no processo que algum servidor público tenha levado vantagem, agido de má-fé ou com dolo no processo.

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Retrato de José Serra foi encomendado para a galeria dos ex-governadores do Palácio Bandeirantes Foto: Divulgação/Governo de São Paulo

O advogado Marcelo Feller, que ingressou no processo do lado da acusação, chegou a uma conclusão similar. Ele relata que, ao final, pediu a absolvição de Alckmin porque não havia provas de que o ex-governador atuou ou sabia do superfaturamento.

“É evidente que havendo eventual indício de dolo na conduta de quem quer que seja, intenção de superfaturar a obra por parte dos agentes públicos, isso deveria ser investigado e seria uma conduta criminosa, não apenas de improbidade. Mas, não vi nenhum indício nesse sentido de acordo com as provas que tive acesso”, disse Feller.

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A condenação do pintor foi baseada no laudo de uma perita que utilizou como argumento principal o tempo que ele levou para concluir o retrato. O contrato dava prazo máximo de quatro meses após a obtenção de uma foto de Serra. Gruber entregou a obra em 10 dias.

Uma das sugestões contratuais era de que Serra fosse fotografado na cadeira do governador com a produção de um cenário com iluminação, sombras e ângulos adequados. Após remarcações, a foto oficial de Serra no Senado foi utilizada como base.

“A resposta acima justifica suficientemente a redução do valor pago, por não se tratar de trabalho complexo, que tenha exigido criação na execução, partindo de uma fotografia de campanha, sob a técnica de tinta acrílica, traçando a perita os parâmetros por meios de trabalhos do próprio artista”, escreveu o desembargador Renato Delbianco, que atuou como relator do caso no TJ-SP.

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“E não haveria mesmo como manter o valor pago de R$ 85.000,00, se essa estimativa o artista atribuía para a execução em tempo mínimo de 2 (dois) meses, tendo sido realizado em 10 dias”, continuou o magistrado.

No laudo, a perita afirma ainda que não há regras que precifiquem, com segurança, uma pintura e que é levado em conta principalmente o artista e sua reputação pessoal: o que críticos e historiadores de arte dizem sobre ele, onde suas obras são expostas e quais galerias vendem seus quadros.

Alckmin foi absolvido após Justiça entender que não havia provas de que ele, então governador de São Paulo, participou ou sabia que a contratação era superfaturada Foto: Cadu Gomes/VPR Foto: Cadu Gomes/VPR
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Gruber foi contratado em março de 2018 pela modalidade de inexigibilidade de licitação após ter sido indicado pela Curadoria do Acervo Artístico-Cultural dos Palácios do Governo de São Paulo. Ele havia pintado os dois últimos retratos de ex-governadores, Cláudio Lembo e Alberto Goldman, respectivamente em 2009 e 2011. Seu pai, Mário Gruber, foi o autor de outros 13 retratos de ex-chefes do Executivo paulista, entre eles Jânio Quadros, Paulo Egydio Martins e Carvalho Pinto.

A Consultoria Jurídica da Secretaria de Governo deu parecer favorável à assinatura do contrato e considerou que o preço cobrado era compatível com o mercado. Gruber afirma que quando pintou Lembo e Goldman recebeu R$ 66,2 mil por cada quadro. O processo não indica a data específica dos pagamentos, mas corrigido pela inflação de dezembro de 2011 a março de 2018, quando o contrato de Serra foi assinado, o valor de cada obra chega a R$ 96,7 mil.

O advogado Vitor Covolato, presidente do Núcleo Anticorrupção da Comissão de Direito Administrativo da OAB/SP, explica que o processo movido contra o pintor, Alckmin e o governo de São Paulo por dois advogados era uma ação popular, cujo objetivo é proteger o patrimônio do Estado.

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Na visão dele, caberia ao MP-SP e à Procuradoria Geral do Estado (PGE) eventualmente ajuizar ações contra os servidores envolvidos, seja por improbidade administrativa ou um processo administrativo disciplinar que pode ter como resultado desde uma repreensão ao servidor público até a sua demissão. Procurada, a PGE não respondeu.

Covolato pondera que, no caso da improbidade, a lei mudou em 2021. “Passou a vigorar o princípio do dolo específico, não mais o dolo genérico, que era o entendimento do STJ no passado. Em termos simples, agora você precisa procurar aquele mesmo dolo do direito penal, aquela vontade livre e consciente [do agente público] praticar o ato”, afirma o advogado.

O pintor Gregório Gruber também pintou retratos dos ex-governadores tucanos Cláudio Lembo e Alberto Goldman Foto: Denise Andrade Foto: DENISE ANDRADE
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Advogado de Alckmin, Fábio Machado avalia que o atual vice-presidente foi incluído no processo por uma questão política para dar mais notoriedade à ação. “[O contrato] Não passou por ele, isso era entre as secretarias. Não teve nenhum ato dele autorizando, determinando, aprovando nada. Por isso, foi afastada a responsabilidade dele”, declarou.

Feller só entrou no processo em um segundo momento. A acusação inicial foi feita pelo advogado Carlos Alexandre Klomfahs. Ele se notabilizou por apresentar diversas ações com repercussões políticas. Em 2017, conseguiu uma decisão liminar que suspendeu o aumento do PIS/Cofins sobre combustíveis. No ano seguinte, pediu que a Justiça recolhesse o passaporte do presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) após a condenação em segunda instância pelo TRF-4 no âmbito da Operação Lava Jato.

Klomfahs também pediu em janeiro de 2023 habeas corpus preventivo para o ex-presidente Jair Bolsonaro (PL) e o ex-ministro Anderson Torres após eles terem sido incluídos na investigação sobre os atos golpistas de 8 de Janeiro. O pedido foi rejeitado pelo então ministro do Supremo Tribunal Federal (STF), Ricardo Lewandowski, que atualmente é ministro da Justiça.

O Estadão não conseguiu contato com ele. Consulta no Cadastro Nacional de Advogados indica que a inscrição está suspensa. Ligações para o telefone profissional informado, assim como para um número de celular obtido pela reportagem, não foram atendidas.

Inicialmente, Klomfahs impetrou a ação contra a Fazenda Pública de São Paulo e a Secretaria de Governo. Gruber e Alckmin foram incluídos posteriormente. Segundo o advogado, a contratação do pintor violava a moralidade administrativa, não tinha previsão orçamentária, justificativa do preço ou parecer jurídico para embasar a inexigibilidade de licitação. O TJ-SP rejeitou as acusações e apenas a tese do superfaturamento prosperou.

‘Ficava esperando Serra por horas’, diz pintor

O Estadão conversou com Gregório Gruber por email. O pintor afirmou que ficou surpreso com a condenação, pois pediu o preço que ele praticava à época para retratos. Ele relata que expôs suas obras pela primeira vez quando tinha 22 anos no Museu de Arte de São Paulo (MASP) a convite de Pietro Maria Bardi e disse discordar da avaliação que a perita fez sobre o quadro de Serra. O artista acredita que ela não entrou em contato com as galerias que trabalham com ele, “pois estipularam um valor que não corresponde ao meu”.

Gruber diz ainda que o processo para a execução do retrato durou anos, e não meses, pois começou a trabalhar na pintura antes da contratação oficial, assinada em 12 de março de 2018. Ele diz ter recebido o “sinal verde” de forma não oficial antes da assinatura do contrato.

Segundo o artista, o primeiro contato a respeito do quadro foi feito pela curadora Ana Cristina Carvalho. Uma tela especial para o trabalho foi encomendada com antecedência, com as particularidades de tamanho e do tipo de tecido, ainda de acordo com o pintor.

Gruber também pintou o retrato oficial do ex-governador Cláudio Lembo, inaugurado por Alckmin em 2011 Foto: Ciete Silvério/Governo de São Paulo

“Inicialmente o Serra queria posar em uma determinada cadeira, a qual foi entregue na minha casa e lá permaneceu por mais de um ano. Mas o Serra nunca tinha tempo para ir posar, e a equipe que cuidava disso desistiu da cadeira e de que ele fosse pessoalmente ao meu estúdio. Nesse meio tempo cheguei a fazer um estudo da obra a ser executada. Essa obra está comigo”, conta Gruber. “Apesar de várias vezes a equipe marcar comigo e eu ficar esperando, muitas vezes por horas, ele nunca conseguiu ir ao estúdio”.

“De fato o contrato em si foi assinado na última hora, mas informalmente eu já estava executando esse retrato. Além disso, nas artes, no geral, existe um senso comum de que um traço produzido por um artista carrega em si toda sua experiência e bagagem. Imagina só se forem questionar grandes nomes da pintura como Picasso, por exemplo, que, como média, sabe-se que fazia mais de uma obra por dia”, continuou o pintor.

Gruber argumenta que, embora tenha ficado conhecido por pintar paisagens de São Paulo, há outros temas recorrentes em sua carreira, que começou nos anos 70. Além de retratos, o artista também produz desenhos, assemblages, esculturas, aquarelas e gravuras.

“Meu pai, Mário Gruber, retratou Jânio Quadros, Abreu Sodré, Paulo Egidio Martins, Carvalho Pinto e outros, inclusive por coincidência, justamente na época, eu atuava como assistente no ateliê do meu pai e acompanhei esses trabalhos de perto”, declarou.

A Justiça e o Ministério Público de São Paulo (MP-SP) não encontraram irregularidades na atuação dos agentes públicos que contrataram Gregório Gruber para pintar um retrato do ex-governador José Serra em 2018, obra exposta na galeria dos ex-governadores no Palácio dos Bandeirantes. Mas o pintor foi condenado a devolver R$ 49 mil, parte dos R$ 85 mil que recebeu, aos cofres públicos. A 2ª Câmara de Direito Público do Tribunal de Justiça de São Paulo confirmou no último dia 5 de março a decisão de primeira instância que apontou superfaturamento e determinou a anulação parcial do contrato, em uma história que inclui meses de espera pelo “modelo” da fotografia e uma obra realizada em 10 dias.

O único agente público citado na ação foi o então governador e atual vice-presidente da República, Geraldo Alckmin (PSB). Ele foi absolvido na primeira e na segunda instância e mesmo a acusação reconheceu, ao final, que não havia provas que comprovassem o dolo ou o envolvimento dele na contratação superfaturada. Serra foi procurado por meio da assessoria de imprensa, mas não se posicionou.

O contrato foi assinado pelo Centro de Suprimentos e Apoio à Gestão de Contratos da Secretaria de Governo. A pasta era comandada por Saulo de Castro Filho. A reportagem não conseguiu localizá-lo. A decisão judicial afirma que, com exceção do superfaturamento, a contratação “aparenta ter se dado nos termos legais”. Já o MP-SP considera que não foi demonstrado no processo que algum servidor público tenha levado vantagem, agido de má-fé ou com dolo no processo.

Retrato de José Serra foi encomendado para a galeria dos ex-governadores do Palácio Bandeirantes Foto: Divulgação/Governo de São Paulo

O advogado Marcelo Feller, que ingressou no processo do lado da acusação, chegou a uma conclusão similar. Ele relata que, ao final, pediu a absolvição de Alckmin porque não havia provas de que o ex-governador atuou ou sabia do superfaturamento.

“É evidente que havendo eventual indício de dolo na conduta de quem quer que seja, intenção de superfaturar a obra por parte dos agentes públicos, isso deveria ser investigado e seria uma conduta criminosa, não apenas de improbidade. Mas, não vi nenhum indício nesse sentido de acordo com as provas que tive acesso”, disse Feller.

A condenação do pintor foi baseada no laudo de uma perita que utilizou como argumento principal o tempo que ele levou para concluir o retrato. O contrato dava prazo máximo de quatro meses após a obtenção de uma foto de Serra. Gruber entregou a obra em 10 dias.

Uma das sugestões contratuais era de que Serra fosse fotografado na cadeira do governador com a produção de um cenário com iluminação, sombras e ângulos adequados. Após remarcações, a foto oficial de Serra no Senado foi utilizada como base.

“A resposta acima justifica suficientemente a redução do valor pago, por não se tratar de trabalho complexo, que tenha exigido criação na execução, partindo de uma fotografia de campanha, sob a técnica de tinta acrílica, traçando a perita os parâmetros por meios de trabalhos do próprio artista”, escreveu o desembargador Renato Delbianco, que atuou como relator do caso no TJ-SP.

“E não haveria mesmo como manter o valor pago de R$ 85.000,00, se essa estimativa o artista atribuía para a execução em tempo mínimo de 2 (dois) meses, tendo sido realizado em 10 dias”, continuou o magistrado.

No laudo, a perita afirma ainda que não há regras que precifiquem, com segurança, uma pintura e que é levado em conta principalmente o artista e sua reputação pessoal: o que críticos e historiadores de arte dizem sobre ele, onde suas obras são expostas e quais galerias vendem seus quadros.

Alckmin foi absolvido após Justiça entender que não havia provas de que ele, então governador de São Paulo, participou ou sabia que a contratação era superfaturada Foto: Cadu Gomes/VPR Foto: Cadu Gomes/VPR

Gruber foi contratado em março de 2018 pela modalidade de inexigibilidade de licitação após ter sido indicado pela Curadoria do Acervo Artístico-Cultural dos Palácios do Governo de São Paulo. Ele havia pintado os dois últimos retratos de ex-governadores, Cláudio Lembo e Alberto Goldman, respectivamente em 2009 e 2011. Seu pai, Mário Gruber, foi o autor de outros 13 retratos de ex-chefes do Executivo paulista, entre eles Jânio Quadros, Paulo Egydio Martins e Carvalho Pinto.

A Consultoria Jurídica da Secretaria de Governo deu parecer favorável à assinatura do contrato e considerou que o preço cobrado era compatível com o mercado. Gruber afirma que quando pintou Lembo e Goldman recebeu R$ 66,2 mil por cada quadro. O processo não indica a data específica dos pagamentos, mas corrigido pela inflação de dezembro de 2011 a março de 2018, quando o contrato de Serra foi assinado, o valor de cada obra chega a R$ 96,7 mil.

O advogado Vitor Covolato, presidente do Núcleo Anticorrupção da Comissão de Direito Administrativo da OAB/SP, explica que o processo movido contra o pintor, Alckmin e o governo de São Paulo por dois advogados era uma ação popular, cujo objetivo é proteger o patrimônio do Estado.

Na visão dele, caberia ao MP-SP e à Procuradoria Geral do Estado (PGE) eventualmente ajuizar ações contra os servidores envolvidos, seja por improbidade administrativa ou um processo administrativo disciplinar que pode ter como resultado desde uma repreensão ao servidor público até a sua demissão. Procurada, a PGE não respondeu.

Covolato pondera que, no caso da improbidade, a lei mudou em 2021. “Passou a vigorar o princípio do dolo específico, não mais o dolo genérico, que era o entendimento do STJ no passado. Em termos simples, agora você precisa procurar aquele mesmo dolo do direito penal, aquela vontade livre e consciente [do agente público] praticar o ato”, afirma o advogado.

O pintor Gregório Gruber também pintou retratos dos ex-governadores tucanos Cláudio Lembo e Alberto Goldman Foto: Denise Andrade Foto: DENISE ANDRADE

Advogado de Alckmin, Fábio Machado avalia que o atual vice-presidente foi incluído no processo por uma questão política para dar mais notoriedade à ação. “[O contrato] Não passou por ele, isso era entre as secretarias. Não teve nenhum ato dele autorizando, determinando, aprovando nada. Por isso, foi afastada a responsabilidade dele”, declarou.

Feller só entrou no processo em um segundo momento. A acusação inicial foi feita pelo advogado Carlos Alexandre Klomfahs. Ele se notabilizou por apresentar diversas ações com repercussões políticas. Em 2017, conseguiu uma decisão liminar que suspendeu o aumento do PIS/Cofins sobre combustíveis. No ano seguinte, pediu que a Justiça recolhesse o passaporte do presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) após a condenação em segunda instância pelo TRF-4 no âmbito da Operação Lava Jato.

Klomfahs também pediu em janeiro de 2023 habeas corpus preventivo para o ex-presidente Jair Bolsonaro (PL) e o ex-ministro Anderson Torres após eles terem sido incluídos na investigação sobre os atos golpistas de 8 de Janeiro. O pedido foi rejeitado pelo então ministro do Supremo Tribunal Federal (STF), Ricardo Lewandowski, que atualmente é ministro da Justiça.

O Estadão não conseguiu contato com ele. Consulta no Cadastro Nacional de Advogados indica que a inscrição está suspensa. Ligações para o telefone profissional informado, assim como para um número de celular obtido pela reportagem, não foram atendidas.

Inicialmente, Klomfahs impetrou a ação contra a Fazenda Pública de São Paulo e a Secretaria de Governo. Gruber e Alckmin foram incluídos posteriormente. Segundo o advogado, a contratação do pintor violava a moralidade administrativa, não tinha previsão orçamentária, justificativa do preço ou parecer jurídico para embasar a inexigibilidade de licitação. O TJ-SP rejeitou as acusações e apenas a tese do superfaturamento prosperou.

‘Ficava esperando Serra por horas’, diz pintor

O Estadão conversou com Gregório Gruber por email. O pintor afirmou que ficou surpreso com a condenação, pois pediu o preço que ele praticava à época para retratos. Ele relata que expôs suas obras pela primeira vez quando tinha 22 anos no Museu de Arte de São Paulo (MASP) a convite de Pietro Maria Bardi e disse discordar da avaliação que a perita fez sobre o quadro de Serra. O artista acredita que ela não entrou em contato com as galerias que trabalham com ele, “pois estipularam um valor que não corresponde ao meu”.

Gruber diz ainda que o processo para a execução do retrato durou anos, e não meses, pois começou a trabalhar na pintura antes da contratação oficial, assinada em 12 de março de 2018. Ele diz ter recebido o “sinal verde” de forma não oficial antes da assinatura do contrato.

Segundo o artista, o primeiro contato a respeito do quadro foi feito pela curadora Ana Cristina Carvalho. Uma tela especial para o trabalho foi encomendada com antecedência, com as particularidades de tamanho e do tipo de tecido, ainda de acordo com o pintor.

Gruber também pintou o retrato oficial do ex-governador Cláudio Lembo, inaugurado por Alckmin em 2011 Foto: Ciete Silvério/Governo de São Paulo

“Inicialmente o Serra queria posar em uma determinada cadeira, a qual foi entregue na minha casa e lá permaneceu por mais de um ano. Mas o Serra nunca tinha tempo para ir posar, e a equipe que cuidava disso desistiu da cadeira e de que ele fosse pessoalmente ao meu estúdio. Nesse meio tempo cheguei a fazer um estudo da obra a ser executada. Essa obra está comigo”, conta Gruber. “Apesar de várias vezes a equipe marcar comigo e eu ficar esperando, muitas vezes por horas, ele nunca conseguiu ir ao estúdio”.

“De fato o contrato em si foi assinado na última hora, mas informalmente eu já estava executando esse retrato. Além disso, nas artes, no geral, existe um senso comum de que um traço produzido por um artista carrega em si toda sua experiência e bagagem. Imagina só se forem questionar grandes nomes da pintura como Picasso, por exemplo, que, como média, sabe-se que fazia mais de uma obra por dia”, continuou o pintor.

Gruber argumenta que, embora tenha ficado conhecido por pintar paisagens de São Paulo, há outros temas recorrentes em sua carreira, que começou nos anos 70. Além de retratos, o artista também produz desenhos, assemblages, esculturas, aquarelas e gravuras.

“Meu pai, Mário Gruber, retratou Jânio Quadros, Abreu Sodré, Paulo Egidio Martins, Carvalho Pinto e outros, inclusive por coincidência, justamente na época, eu atuava como assistente no ateliê do meu pai e acompanhei esses trabalhos de perto”, declarou.

A Justiça e o Ministério Público de São Paulo (MP-SP) não encontraram irregularidades na atuação dos agentes públicos que contrataram Gregório Gruber para pintar um retrato do ex-governador José Serra em 2018, obra exposta na galeria dos ex-governadores no Palácio dos Bandeirantes. Mas o pintor foi condenado a devolver R$ 49 mil, parte dos R$ 85 mil que recebeu, aos cofres públicos. A 2ª Câmara de Direito Público do Tribunal de Justiça de São Paulo confirmou no último dia 5 de março a decisão de primeira instância que apontou superfaturamento e determinou a anulação parcial do contrato, em uma história que inclui meses de espera pelo “modelo” da fotografia e uma obra realizada em 10 dias.

O único agente público citado na ação foi o então governador e atual vice-presidente da República, Geraldo Alckmin (PSB). Ele foi absolvido na primeira e na segunda instância e mesmo a acusação reconheceu, ao final, que não havia provas que comprovassem o dolo ou o envolvimento dele na contratação superfaturada. Serra foi procurado por meio da assessoria de imprensa, mas não se posicionou.

O contrato foi assinado pelo Centro de Suprimentos e Apoio à Gestão de Contratos da Secretaria de Governo. A pasta era comandada por Saulo de Castro Filho. A reportagem não conseguiu localizá-lo. A decisão judicial afirma que, com exceção do superfaturamento, a contratação “aparenta ter se dado nos termos legais”. Já o MP-SP considera que não foi demonstrado no processo que algum servidor público tenha levado vantagem, agido de má-fé ou com dolo no processo.

Retrato de José Serra foi encomendado para a galeria dos ex-governadores do Palácio Bandeirantes Foto: Divulgação/Governo de São Paulo

O advogado Marcelo Feller, que ingressou no processo do lado da acusação, chegou a uma conclusão similar. Ele relata que, ao final, pediu a absolvição de Alckmin porque não havia provas de que o ex-governador atuou ou sabia do superfaturamento.

“É evidente que havendo eventual indício de dolo na conduta de quem quer que seja, intenção de superfaturar a obra por parte dos agentes públicos, isso deveria ser investigado e seria uma conduta criminosa, não apenas de improbidade. Mas, não vi nenhum indício nesse sentido de acordo com as provas que tive acesso”, disse Feller.

A condenação do pintor foi baseada no laudo de uma perita que utilizou como argumento principal o tempo que ele levou para concluir o retrato. O contrato dava prazo máximo de quatro meses após a obtenção de uma foto de Serra. Gruber entregou a obra em 10 dias.

Uma das sugestões contratuais era de que Serra fosse fotografado na cadeira do governador com a produção de um cenário com iluminação, sombras e ângulos adequados. Após remarcações, a foto oficial de Serra no Senado foi utilizada como base.

“A resposta acima justifica suficientemente a redução do valor pago, por não se tratar de trabalho complexo, que tenha exigido criação na execução, partindo de uma fotografia de campanha, sob a técnica de tinta acrílica, traçando a perita os parâmetros por meios de trabalhos do próprio artista”, escreveu o desembargador Renato Delbianco, que atuou como relator do caso no TJ-SP.

“E não haveria mesmo como manter o valor pago de R$ 85.000,00, se essa estimativa o artista atribuía para a execução em tempo mínimo de 2 (dois) meses, tendo sido realizado em 10 dias”, continuou o magistrado.

No laudo, a perita afirma ainda que não há regras que precifiquem, com segurança, uma pintura e que é levado em conta principalmente o artista e sua reputação pessoal: o que críticos e historiadores de arte dizem sobre ele, onde suas obras são expostas e quais galerias vendem seus quadros.

Alckmin foi absolvido após Justiça entender que não havia provas de que ele, então governador de São Paulo, participou ou sabia que a contratação era superfaturada Foto: Cadu Gomes/VPR Foto: Cadu Gomes/VPR

Gruber foi contratado em março de 2018 pela modalidade de inexigibilidade de licitação após ter sido indicado pela Curadoria do Acervo Artístico-Cultural dos Palácios do Governo de São Paulo. Ele havia pintado os dois últimos retratos de ex-governadores, Cláudio Lembo e Alberto Goldman, respectivamente em 2009 e 2011. Seu pai, Mário Gruber, foi o autor de outros 13 retratos de ex-chefes do Executivo paulista, entre eles Jânio Quadros, Paulo Egydio Martins e Carvalho Pinto.

A Consultoria Jurídica da Secretaria de Governo deu parecer favorável à assinatura do contrato e considerou que o preço cobrado era compatível com o mercado. Gruber afirma que quando pintou Lembo e Goldman recebeu R$ 66,2 mil por cada quadro. O processo não indica a data específica dos pagamentos, mas corrigido pela inflação de dezembro de 2011 a março de 2018, quando o contrato de Serra foi assinado, o valor de cada obra chega a R$ 96,7 mil.

O advogado Vitor Covolato, presidente do Núcleo Anticorrupção da Comissão de Direito Administrativo da OAB/SP, explica que o processo movido contra o pintor, Alckmin e o governo de São Paulo por dois advogados era uma ação popular, cujo objetivo é proteger o patrimônio do Estado.

Na visão dele, caberia ao MP-SP e à Procuradoria Geral do Estado (PGE) eventualmente ajuizar ações contra os servidores envolvidos, seja por improbidade administrativa ou um processo administrativo disciplinar que pode ter como resultado desde uma repreensão ao servidor público até a sua demissão. Procurada, a PGE não respondeu.

Covolato pondera que, no caso da improbidade, a lei mudou em 2021. “Passou a vigorar o princípio do dolo específico, não mais o dolo genérico, que era o entendimento do STJ no passado. Em termos simples, agora você precisa procurar aquele mesmo dolo do direito penal, aquela vontade livre e consciente [do agente público] praticar o ato”, afirma o advogado.

O pintor Gregório Gruber também pintou retratos dos ex-governadores tucanos Cláudio Lembo e Alberto Goldman Foto: Denise Andrade Foto: DENISE ANDRADE

Advogado de Alckmin, Fábio Machado avalia que o atual vice-presidente foi incluído no processo por uma questão política para dar mais notoriedade à ação. “[O contrato] Não passou por ele, isso era entre as secretarias. Não teve nenhum ato dele autorizando, determinando, aprovando nada. Por isso, foi afastada a responsabilidade dele”, declarou.

Feller só entrou no processo em um segundo momento. A acusação inicial foi feita pelo advogado Carlos Alexandre Klomfahs. Ele se notabilizou por apresentar diversas ações com repercussões políticas. Em 2017, conseguiu uma decisão liminar que suspendeu o aumento do PIS/Cofins sobre combustíveis. No ano seguinte, pediu que a Justiça recolhesse o passaporte do presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) após a condenação em segunda instância pelo TRF-4 no âmbito da Operação Lava Jato.

Klomfahs também pediu em janeiro de 2023 habeas corpus preventivo para o ex-presidente Jair Bolsonaro (PL) e o ex-ministro Anderson Torres após eles terem sido incluídos na investigação sobre os atos golpistas de 8 de Janeiro. O pedido foi rejeitado pelo então ministro do Supremo Tribunal Federal (STF), Ricardo Lewandowski, que atualmente é ministro da Justiça.

O Estadão não conseguiu contato com ele. Consulta no Cadastro Nacional de Advogados indica que a inscrição está suspensa. Ligações para o telefone profissional informado, assim como para um número de celular obtido pela reportagem, não foram atendidas.

Inicialmente, Klomfahs impetrou a ação contra a Fazenda Pública de São Paulo e a Secretaria de Governo. Gruber e Alckmin foram incluídos posteriormente. Segundo o advogado, a contratação do pintor violava a moralidade administrativa, não tinha previsão orçamentária, justificativa do preço ou parecer jurídico para embasar a inexigibilidade de licitação. O TJ-SP rejeitou as acusações e apenas a tese do superfaturamento prosperou.

‘Ficava esperando Serra por horas’, diz pintor

O Estadão conversou com Gregório Gruber por email. O pintor afirmou que ficou surpreso com a condenação, pois pediu o preço que ele praticava à época para retratos. Ele relata que expôs suas obras pela primeira vez quando tinha 22 anos no Museu de Arte de São Paulo (MASP) a convite de Pietro Maria Bardi e disse discordar da avaliação que a perita fez sobre o quadro de Serra. O artista acredita que ela não entrou em contato com as galerias que trabalham com ele, “pois estipularam um valor que não corresponde ao meu”.

Gruber diz ainda que o processo para a execução do retrato durou anos, e não meses, pois começou a trabalhar na pintura antes da contratação oficial, assinada em 12 de março de 2018. Ele diz ter recebido o “sinal verde” de forma não oficial antes da assinatura do contrato.

Segundo o artista, o primeiro contato a respeito do quadro foi feito pela curadora Ana Cristina Carvalho. Uma tela especial para o trabalho foi encomendada com antecedência, com as particularidades de tamanho e do tipo de tecido, ainda de acordo com o pintor.

Gruber também pintou o retrato oficial do ex-governador Cláudio Lembo, inaugurado por Alckmin em 2011 Foto: Ciete Silvério/Governo de São Paulo

“Inicialmente o Serra queria posar em uma determinada cadeira, a qual foi entregue na minha casa e lá permaneceu por mais de um ano. Mas o Serra nunca tinha tempo para ir posar, e a equipe que cuidava disso desistiu da cadeira e de que ele fosse pessoalmente ao meu estúdio. Nesse meio tempo cheguei a fazer um estudo da obra a ser executada. Essa obra está comigo”, conta Gruber. “Apesar de várias vezes a equipe marcar comigo e eu ficar esperando, muitas vezes por horas, ele nunca conseguiu ir ao estúdio”.

“De fato o contrato em si foi assinado na última hora, mas informalmente eu já estava executando esse retrato. Além disso, nas artes, no geral, existe um senso comum de que um traço produzido por um artista carrega em si toda sua experiência e bagagem. Imagina só se forem questionar grandes nomes da pintura como Picasso, por exemplo, que, como média, sabe-se que fazia mais de uma obra por dia”, continuou o pintor.

Gruber argumenta que, embora tenha ficado conhecido por pintar paisagens de São Paulo, há outros temas recorrentes em sua carreira, que começou nos anos 70. Além de retratos, o artista também produz desenhos, assemblages, esculturas, aquarelas e gravuras.

“Meu pai, Mário Gruber, retratou Jânio Quadros, Abreu Sodré, Paulo Egidio Martins, Carvalho Pinto e outros, inclusive por coincidência, justamente na época, eu atuava como assistente no ateliê do meu pai e acompanhei esses trabalhos de perto”, declarou.

A Justiça e o Ministério Público de São Paulo (MP-SP) não encontraram irregularidades na atuação dos agentes públicos que contrataram Gregório Gruber para pintar um retrato do ex-governador José Serra em 2018, obra exposta na galeria dos ex-governadores no Palácio dos Bandeirantes. Mas o pintor foi condenado a devolver R$ 49 mil, parte dos R$ 85 mil que recebeu, aos cofres públicos. A 2ª Câmara de Direito Público do Tribunal de Justiça de São Paulo confirmou no último dia 5 de março a decisão de primeira instância que apontou superfaturamento e determinou a anulação parcial do contrato, em uma história que inclui meses de espera pelo “modelo” da fotografia e uma obra realizada em 10 dias.

O único agente público citado na ação foi o então governador e atual vice-presidente da República, Geraldo Alckmin (PSB). Ele foi absolvido na primeira e na segunda instância e mesmo a acusação reconheceu, ao final, que não havia provas que comprovassem o dolo ou o envolvimento dele na contratação superfaturada. Serra foi procurado por meio da assessoria de imprensa, mas não se posicionou.

O contrato foi assinado pelo Centro de Suprimentos e Apoio à Gestão de Contratos da Secretaria de Governo. A pasta era comandada por Saulo de Castro Filho. A reportagem não conseguiu localizá-lo. A decisão judicial afirma que, com exceção do superfaturamento, a contratação “aparenta ter se dado nos termos legais”. Já o MP-SP considera que não foi demonstrado no processo que algum servidor público tenha levado vantagem, agido de má-fé ou com dolo no processo.

Retrato de José Serra foi encomendado para a galeria dos ex-governadores do Palácio Bandeirantes Foto: Divulgação/Governo de São Paulo

O advogado Marcelo Feller, que ingressou no processo do lado da acusação, chegou a uma conclusão similar. Ele relata que, ao final, pediu a absolvição de Alckmin porque não havia provas de que o ex-governador atuou ou sabia do superfaturamento.

“É evidente que havendo eventual indício de dolo na conduta de quem quer que seja, intenção de superfaturar a obra por parte dos agentes públicos, isso deveria ser investigado e seria uma conduta criminosa, não apenas de improbidade. Mas, não vi nenhum indício nesse sentido de acordo com as provas que tive acesso”, disse Feller.

A condenação do pintor foi baseada no laudo de uma perita que utilizou como argumento principal o tempo que ele levou para concluir o retrato. O contrato dava prazo máximo de quatro meses após a obtenção de uma foto de Serra. Gruber entregou a obra em 10 dias.

Uma das sugestões contratuais era de que Serra fosse fotografado na cadeira do governador com a produção de um cenário com iluminação, sombras e ângulos adequados. Após remarcações, a foto oficial de Serra no Senado foi utilizada como base.

“A resposta acima justifica suficientemente a redução do valor pago, por não se tratar de trabalho complexo, que tenha exigido criação na execução, partindo de uma fotografia de campanha, sob a técnica de tinta acrílica, traçando a perita os parâmetros por meios de trabalhos do próprio artista”, escreveu o desembargador Renato Delbianco, que atuou como relator do caso no TJ-SP.

“E não haveria mesmo como manter o valor pago de R$ 85.000,00, se essa estimativa o artista atribuía para a execução em tempo mínimo de 2 (dois) meses, tendo sido realizado em 10 dias”, continuou o magistrado.

No laudo, a perita afirma ainda que não há regras que precifiquem, com segurança, uma pintura e que é levado em conta principalmente o artista e sua reputação pessoal: o que críticos e historiadores de arte dizem sobre ele, onde suas obras são expostas e quais galerias vendem seus quadros.

Alckmin foi absolvido após Justiça entender que não havia provas de que ele, então governador de São Paulo, participou ou sabia que a contratação era superfaturada Foto: Cadu Gomes/VPR Foto: Cadu Gomes/VPR

Gruber foi contratado em março de 2018 pela modalidade de inexigibilidade de licitação após ter sido indicado pela Curadoria do Acervo Artístico-Cultural dos Palácios do Governo de São Paulo. Ele havia pintado os dois últimos retratos de ex-governadores, Cláudio Lembo e Alberto Goldman, respectivamente em 2009 e 2011. Seu pai, Mário Gruber, foi o autor de outros 13 retratos de ex-chefes do Executivo paulista, entre eles Jânio Quadros, Paulo Egydio Martins e Carvalho Pinto.

A Consultoria Jurídica da Secretaria de Governo deu parecer favorável à assinatura do contrato e considerou que o preço cobrado era compatível com o mercado. Gruber afirma que quando pintou Lembo e Goldman recebeu R$ 66,2 mil por cada quadro. O processo não indica a data específica dos pagamentos, mas corrigido pela inflação de dezembro de 2011 a março de 2018, quando o contrato de Serra foi assinado, o valor de cada obra chega a R$ 96,7 mil.

O advogado Vitor Covolato, presidente do Núcleo Anticorrupção da Comissão de Direito Administrativo da OAB/SP, explica que o processo movido contra o pintor, Alckmin e o governo de São Paulo por dois advogados era uma ação popular, cujo objetivo é proteger o patrimônio do Estado.

Na visão dele, caberia ao MP-SP e à Procuradoria Geral do Estado (PGE) eventualmente ajuizar ações contra os servidores envolvidos, seja por improbidade administrativa ou um processo administrativo disciplinar que pode ter como resultado desde uma repreensão ao servidor público até a sua demissão. Procurada, a PGE não respondeu.

Covolato pondera que, no caso da improbidade, a lei mudou em 2021. “Passou a vigorar o princípio do dolo específico, não mais o dolo genérico, que era o entendimento do STJ no passado. Em termos simples, agora você precisa procurar aquele mesmo dolo do direito penal, aquela vontade livre e consciente [do agente público] praticar o ato”, afirma o advogado.

O pintor Gregório Gruber também pintou retratos dos ex-governadores tucanos Cláudio Lembo e Alberto Goldman Foto: Denise Andrade Foto: DENISE ANDRADE

Advogado de Alckmin, Fábio Machado avalia que o atual vice-presidente foi incluído no processo por uma questão política para dar mais notoriedade à ação. “[O contrato] Não passou por ele, isso era entre as secretarias. Não teve nenhum ato dele autorizando, determinando, aprovando nada. Por isso, foi afastada a responsabilidade dele”, declarou.

Feller só entrou no processo em um segundo momento. A acusação inicial foi feita pelo advogado Carlos Alexandre Klomfahs. Ele se notabilizou por apresentar diversas ações com repercussões políticas. Em 2017, conseguiu uma decisão liminar que suspendeu o aumento do PIS/Cofins sobre combustíveis. No ano seguinte, pediu que a Justiça recolhesse o passaporte do presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) após a condenação em segunda instância pelo TRF-4 no âmbito da Operação Lava Jato.

Klomfahs também pediu em janeiro de 2023 habeas corpus preventivo para o ex-presidente Jair Bolsonaro (PL) e o ex-ministro Anderson Torres após eles terem sido incluídos na investigação sobre os atos golpistas de 8 de Janeiro. O pedido foi rejeitado pelo então ministro do Supremo Tribunal Federal (STF), Ricardo Lewandowski, que atualmente é ministro da Justiça.

O Estadão não conseguiu contato com ele. Consulta no Cadastro Nacional de Advogados indica que a inscrição está suspensa. Ligações para o telefone profissional informado, assim como para um número de celular obtido pela reportagem, não foram atendidas.

Inicialmente, Klomfahs impetrou a ação contra a Fazenda Pública de São Paulo e a Secretaria de Governo. Gruber e Alckmin foram incluídos posteriormente. Segundo o advogado, a contratação do pintor violava a moralidade administrativa, não tinha previsão orçamentária, justificativa do preço ou parecer jurídico para embasar a inexigibilidade de licitação. O TJ-SP rejeitou as acusações e apenas a tese do superfaturamento prosperou.

‘Ficava esperando Serra por horas’, diz pintor

O Estadão conversou com Gregório Gruber por email. O pintor afirmou que ficou surpreso com a condenação, pois pediu o preço que ele praticava à época para retratos. Ele relata que expôs suas obras pela primeira vez quando tinha 22 anos no Museu de Arte de São Paulo (MASP) a convite de Pietro Maria Bardi e disse discordar da avaliação que a perita fez sobre o quadro de Serra. O artista acredita que ela não entrou em contato com as galerias que trabalham com ele, “pois estipularam um valor que não corresponde ao meu”.

Gruber diz ainda que o processo para a execução do retrato durou anos, e não meses, pois começou a trabalhar na pintura antes da contratação oficial, assinada em 12 de março de 2018. Ele diz ter recebido o “sinal verde” de forma não oficial antes da assinatura do contrato.

Segundo o artista, o primeiro contato a respeito do quadro foi feito pela curadora Ana Cristina Carvalho. Uma tela especial para o trabalho foi encomendada com antecedência, com as particularidades de tamanho e do tipo de tecido, ainda de acordo com o pintor.

Gruber também pintou o retrato oficial do ex-governador Cláudio Lembo, inaugurado por Alckmin em 2011 Foto: Ciete Silvério/Governo de São Paulo

“Inicialmente o Serra queria posar em uma determinada cadeira, a qual foi entregue na minha casa e lá permaneceu por mais de um ano. Mas o Serra nunca tinha tempo para ir posar, e a equipe que cuidava disso desistiu da cadeira e de que ele fosse pessoalmente ao meu estúdio. Nesse meio tempo cheguei a fazer um estudo da obra a ser executada. Essa obra está comigo”, conta Gruber. “Apesar de várias vezes a equipe marcar comigo e eu ficar esperando, muitas vezes por horas, ele nunca conseguiu ir ao estúdio”.

“De fato o contrato em si foi assinado na última hora, mas informalmente eu já estava executando esse retrato. Além disso, nas artes, no geral, existe um senso comum de que um traço produzido por um artista carrega em si toda sua experiência e bagagem. Imagina só se forem questionar grandes nomes da pintura como Picasso, por exemplo, que, como média, sabe-se que fazia mais de uma obra por dia”, continuou o pintor.

Gruber argumenta que, embora tenha ficado conhecido por pintar paisagens de São Paulo, há outros temas recorrentes em sua carreira, que começou nos anos 70. Além de retratos, o artista também produz desenhos, assemblages, esculturas, aquarelas e gravuras.

“Meu pai, Mário Gruber, retratou Jânio Quadros, Abreu Sodré, Paulo Egidio Martins, Carvalho Pinto e outros, inclusive por coincidência, justamente na época, eu atuava como assistente no ateliê do meu pai e acompanhei esses trabalhos de perto”, declarou.

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